Os desafios da democracia digital

Coluna Econômica

Tem-se uma enorme oportunidade e um risco grandioso na transição da democracia formal para a democracia digital.

Graças às redes sociais, nunca se discutiu tanto – no Brasil e no mundo. Em tempos de menor interação, os centros de formação de opinião eram muito concentrados:

Os partidos políticos, e sua estrutura de diretórios.

Os poderes constituídos, especialmente aqueles dotados de burocracia interna.

A mídia, sempre atuando com mão única – de entregar o produto notícia pronto e acabado.

As religiões.

Algumas organizações da sociedade civil – como Rotary, Lyons, maçonaria.

Sindicatos e associações empresariais.

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Com menor ou maior abragência, em todos esses setores havia a homogeneização de bandeiras, seja pelo próprio objeto da organização seja pelo chamado efeito-manada – típico das democracias.

Sempre foi muito difícil o questionamento a essa ordem antiga. Com poucos instrumentos externos de controle, praticamente todos esses grupos se estratificaram, criaram barreiras de entrada intransponíveis para a ascensão de grupos críticos, de oposição que revitalizasse as organizações.

A mídia, que poderia operar como um agente externo influente,  também se oligarquizou, restringiu suas bandeiras e não abriu espaço para o novo.

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Agora se tem uma praça pública – a Internet e as redes sociais – na qual todos os agentes interagem – de jornais a blogs, de partidos políticos a indivíduos. E há uma gama infindável de temas e posições, cada qual galvanizando atenções, promovendo discussões.

Tome-se um exemplo simples: responsabilidade fiscal e gastos sociais. É possível encontrar quem seja a favor do rigor fiscal e contra os gastos sociais; a favor dos gastos sociais e contra o rigor fiscal; e a favor do rigor social e dos gastos sociais. É possível encontrar pessoas a favor do casamento gay e contra o aborto; a favor da demarcação de terras indígenas e contra hidrelétricas na Amazonia; ou a favor da demarcação e das hidrelétricas.

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É um mundo extraordinário, multifacetado, que exige o exercício diuturno da negociação, das alianças, dos argumentos. Que partido político poderá dar conta de homogeneizar tanta heterogeneidade? Por outro lado, como pretender governar sem a figura estabilizadora do partido político?

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Em uma primeira etapa, a nova democracia digital exigirá a disponibilização de dados da administração pública na Internet – processo já iniciado com os sites públicos e a Lei da Transparência.

Depois, mecanismos que permitam o acompanhamento permanente das políticas públicas, através de indicadores ou outras formas – como o acompanhamento in loco de obras públicas.

Na parte propositiva, um primeiro passo é estender o modelo de orçamento participativo – no qual os cidadãos podem opinar sobre algumas destinações orçamentárias.

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Mas é apenas o início. Com o tempo haverá a necessidade de repensar toda a estrutura institucional que marcou as democracias ocidentais nos últimos séculos. Como montar uma estrutura suficientemente ampla, para abarcar essa multidão de cidadãos online, e, ao mesmo tempo, restritiva para impedir que o excesso de opiniões resulte em caos.

Luis Nassif

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