Quando a promiscuidade entre público e privado envolve Serra, mídia silencia

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – A delação de Odebrecht na Lava Jato reafirmou um dos capítulos do manual de redação usado por veículos da grande mídia: se atinge José Serra (PSDB), a notícia deve ter o valor de um Snapchat, ou seja, duração de, no máximo, 24 horas. Depois disso, o silêncio é a regra. Aprofundar uma denúncia ou fazer associações entre esquemas? Jamais.

É isso o que aponta o jornalista João Filho no portal The Intercept, após analisar a reação da grande mídia à informação, colhida pela Lava Jato, de que Serra teria recebido R$ 23 milhões. 

Da mesma maneira, outros escândalos envolvendo a promiscuidade entre o público e o privado foram sepultados. É o caso da funcionária de seu gabinete, Margrit, que não aparecia para trabalhar – e já vinha fazendo isso de outros gabinetes tucanos. “Mag” – como é chamada por Serra – seria só um caso de funcionária fantasma não fosse o fato de ela ser irmã de Miriam Dutra, a ex-amante de FHC. Há a suspeita de que parte do dinheiro que recebia de tucanos era repassado à irmã que, depois de grávida, foi morar no exterior.

“Seria um escândalo para atormentar qualquer político, ainda mais um senador da República. Mas Serra não é qualquer político e nunca mais foi incomodado com o assunto”, apontou João Filho.

Por João Filho

No The Intercept

O fenômeno José Serra

QUANDO ACORDEI NO domingo e vi a manchete “Serra recebeu R$23 milhões via caixa 2, diz Odebrecht” na capa da Folha, não acreditei. Li mais algumas vezes para me certificar. Denúncia contra o Serra na capa da Folha? Numa manchete com letras garrafais? Sim, não era uma miragem.

Passado o espanto, lembrei que notícias ruins sobre o Serra são como vídeos no Snapchat: duram 24 horas. Resolvi aguardar o desenrolar dos acontecimentos. Na segunda-feira, começo a desconfiar de que meu palpite estava correto: nada mais sobre Serra na Folha. Nenhum colunista indignado, nenhum aprofundamento sobre o assunto. Na terça, a mesma coisa. Na quarta, uma novidade: Elio Gaspari comenta o caso e a coluna ganha uma chamadinha de capa. Mas não se emocione. O nome de Serra, o principal personagem do texto, não aparece nela. O que vemos é apenas um genérico “PSDB paulista”. Detalhe: essa chamada está presente somente na edição nacional. Na edição para o estado de São Paulo, onde o PSDB reina há 22 anos, ela simplesmente não existiu. Talvez essa notícia não seja do interesse do povo bandeirante em ano de eleição.

Há muito o que se comentar sobre as diferenças das capas, mas não comecemos com trololó. Certamente se trata apenas de uma opção editorial.

É inegável que não há nem sombra daquele ímpeto investigativo que vemos contra outros políticos. Aquela volúpia fiscalizadora parece não incomodar nosso chanceler. Talvez não seja à toa, já que todo jornalista brasileiro já ouviu alguma história referente à influência de Serra sobre as redações do país. Heródoto Barbeiro e Gabriel Priolli que o digam.

Quando ministros são acusados por corrupção, uma enorme pressão se levanta contra eles. No próprio governo Temer, três ministros foram forçados a pedir demissão após citações na Lava Jato. Editoriais do Globo, por exemplo, pressionaram Temer pela demissão de Fabiano Silveira e Romero Jucá. Mas, quando o nome é José Serra, ninguém ousa pedir sua cabeça. O ministro continua firme e forte no cargo, sem nenhuma pressão, sem ninguém cogitar sua queda.

Outro caso que evaporou do noticiário foi o da funcionária fantasma contratada para o seu gabinete no Senado, Margrit Dutra Schmidt. Ela passava de manhã para pressionar sua digital no ponto eletrônico e voltava ao fim do expediente apenas para registrar mais um dia não trabalhado – porém, muito bem remunerado pelos cofres públicos. Nenhum dos funcionários do gabinete a conheciam. Quem a conhecia muito bem é Álvaro Dias (PV). Quando ainda estava no PSDB, o tucano a exonerou do gabinete da Lucia Vania (PSDB) pelo mesmo motivo: ela não aparecia para trabalhar. Sabe onde ela não trabalhou também? No gabinete do Arthur Virgílio (PSDB).

É bonito de ver a solidariedade dos tucanos com essa trabalhadora, ainda mais eles, que são tarados por cortes de gastos públicos. Mas por que o PSDB a paparicava tanto? Não se sabe, já que esta é uma notícia natimorta, sem aprofundamento, uma notícia fantasma. Mas vamos dar uma escarafunchada nela.

Mesmo sabendo do seu passado fantasmagórico em gabinetes tucanos, Serra pediu para que Álvaro a nomeasse para o seu, porque “desejava que ela se dedicasse a um projeto na área de educação (…) Ainda é um projeto sigiloso. Lançarei em breve. Queria alguém que me ajudasse em questões não econômicas. Conheço a Mag há muitos anos. Tenho relações pessoais e intelectuais”.

Questionado sobre onde Mag trabalhava nesse projeto educacional ultrassecreto, o ex-senador não soube dizer se era em casa ou no Senado. Quando lhe informaram que nenhum funcionário do gabinete a conhecia, subitamente retomou a memória: “Ela trabalha de casa. Meu gabinete tem pouco espaço, não tem sala para todo mundo.” Ou seja, Serra não sabia onde ela trabalhava, mas, no segundo seguinte, lembrou que o gabinete era tão apertado que nem fantasma cabia. O remendo só piorou a coisa, já que, pelo regimento interno do Senado, os funcionários são proibidos de trabalhar em casa.

Seria um escândalo para atormentar qualquer político, ainda mais um senador da República. Mas Serra não é qualquer político e nunca mais foi incomodado com o assunto.

Só que Mag também não é uma funcionária qualquer. Ex-mulher do lobista Fernando Lemos e irmã de Miriam Dutra – a ex-amante de FHC –, Margrit não ficou famosa apenas por ganhar sem trabalhar em gabinetes do PSDB. Além de ser uma empolgadíssima militante anti-petista nas redes sociais, a amiga de Serra enviava dinheiro para a irmã, que havia se mudado estrategicamente para Europa após engravidar – ou não – do ex-presidente. Segundo Noblat, Miriam “recebia uma mesada em dólar paga por FHC e dinheiro que sua irmã e o marido lhe enviavam regularmente”.

A catalã Carme Polo, uma das melhores amigas de Miriam Dutra, disse ao DCM que Serra “era o contato de Miriam com Fernando Henrique Cardoso”. A relação era tão próxima, que o ministro das relações exteriores chegou a ir para Barcelona para acompanhar uma reforma no apartamento da irmã de Mag.

Aqui não estamos falando apenas da vida pessoal, mas da evidente promiscuidade entre a coisa pública e a privada – um costume político brasileiro sempre muito criticado por Serra. Mas podemos nos fazer de inocentes e acreditar que todos esses empregos fantasmas que Mag conseguiu no ninho tucano não tinham nada de mais. Assim como acreditamos que a cocaína presente no helicóptero da família de um outro senador não tinha dono.

Agora voltemos para as propinas da Odebrecht. Breno Costa, repórter do The Intercept Brasil, escreveu matéria intitulada “José Serra propôs lei que beneficia empreiteiras com redução de impostos e punições”. A Folha teria todas as condições de fazer essa relação e aprofundar o assunto. Mas não, o jornal que já publicou uma ficha policial falsa de Dilma na capa não foi capaz de levantar essa lebre. Parece que a cota de notícia ruim sobre o Serra na semana já havia sido preenchida no domingo, não é mesmo?

O novo escândalo pode trazer de volta uma figura relegada ao ostracismo: Paulo Preto, o ex-diretor da Dersa responsável pela contratação das empreiteiras que comandaram grande obras quando Serra era governador de São Paulo. O mesmo Paulo Preto cuja filha advogava para essas mesmas empreiteiras e emprestava dinheiro para Aloysio Nunes (PSDB). O mesmo Paulo Preto que Serra, ao ser questionado na campanha presidencial de 2010, afirmou não conhecer quando Dilma trouxe seu nome para um debate: “Eu não sei quem é o Paulo Preto. Nunca ouvi falar. Ele foi um factoide criado para que vocês fiquem perguntando”.

Irritado com a já famosa falta de memória de Serra, Paulo Preto fez uma afirmação – ou uma ameaça – que se tornaria clássica: “Não se larga um líder ferido na estrada a troco de nada. Não cometam esse erro”. Ainda sobre a falta de memória do ex-governador, declarou: “Não somos amigos, mas ele me conhece muito bem”.

Mesmo arranhada por tantos espinhos, a imagem de homem ilibado, competente, dotado de espírito público continua protegendo a figura de Serra. Nosso ministro é mesmo um fenômeno. Tanto que, ao ter seu nome ventilado para o ministério de Temer, Sardenberg chegou a elogiá-lo pelo – pasmem! –“rigor com as contas públicas”. A Mag que o diga!

Vamos aguardar o desenrolar dos fatos. Há muitos fantasmas no armário de Serra. Com as delações das empreiteiras prontas para sair do forno, será cada vez mais difícil manter a blindagem do nosso valoroso chanceler. Até agora, ninguém parece disposto a largá-lo ferido na estrada.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

16 Comentários

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  1. Serras e Monturos.

    Uma Serra que a grande mídia se recusa a escalar.
    Mas qualquer monturozinho envolvendo petistas ela transforma numa montanha sem fim, vide pedalinhos, sitios e barquinhos.

  2. Segundo o Paulo Henrique

    Segundo o Paulo Henrique Amorim, que sou obrigado a acompanhar: o serra, mesmo sem nunca haver trabalhado, além dos cargos públicos, é uma das pessoas mais ricas do país, tudo em nome da sua filhinha e alguns aparentados. A pergunta é recorrente: afinal, de que vive o serra?

  3. Eu já expliquei anteriormente

    Eu já expliquei anteriormente que Serra está na folha de pagamento da CIA* (malditos cabeças-brancas, de novo)… Ou vocês já esqueceram?

     

    * Eu adoraria provar com documentos mas eu estou bem longe de ser um Tom Cruise para invadir e acessar documentos da CIA, além de que eu seria julgado e executado como espião por mais errada que a CIA esteja em fazer esse tipo de coisa. Então fiquem com a minha palavra sobre o assunto, embora os indícios de que estou falando a verdade estão se acumulando por tanto tempo que já deveriam ser suficientes por si mesmos.

    1. Tenho certeza absoluta que

      Tenho certeza absoluta que este verme é preposto dos EUA no Brasil.

      Foi dedo duro dos esquerdistas chilenos. Foi dedo duro dos esquerdistas brasileiros.

      É o que há de pior na raça humana.

    2. Não é só o Serra. Tem a

      Não é só o Serra. Tem a família  Neves de MG. Tancredo foi Ministro de Vargas mas passou ileso por todos os governos. A mídia sempre o apoiou. Os militares chegaram a escolhê-lo para a tal transição democrática. A sua filha casou-se com Aécio Cunha, da Arena. Os seus netos (Aécio e Andréa) têm a proteção incondicional da mídia. Andréa Neves foi testemunha do atentado no Rio Centro, uma coincidência muito estranha. Eles possuem contas em Liechtenstein e até hoje não se sabe os valores que trafegaram por lá, a mídia esconde a sete chaves. Fora as trocentas delações da Lavajato e as diversas denúncias de corrupção que envolvem a dupla.

  4. O autor provavelmente é um

    O autor provavelmente é um mal-amado invejoso !!! A verdade é que todos amam José Serra !!! Um sujeito cativante e envolvente !!!

    Até Plínio de Arruda Sampaio, que não gostava de ninguém, amava José Serra !!!

  5. Prezado Nassif, tú acredita

    Prezado Nassif, tú acredita mesmo no que escreveu no último parágrafo? Sei que não acredita, afinal és o homem que mais esclarece sobre o lado que nosso judiciário sempre esteve, e está. Portanto, nosso serrote pode não só dormir em paz como continuar sendo um supermaracutaioso. Viva Brusundanga!!! kkkk

  6. Milionário ou Zé Rico

    Disse o Zé Simão: “Moro contratou o Bolt pra pegar o Lula. E o Rubinho pra pegar a mulher do Cunha.” No caso do Serra, Moro contratou uma ‘nona’ da Móoca, que sofre de catarata e anda de bengala pra investigá-lo. Depois de morto, TALVEZ Serra leve a culpa de alguma coisa. E olhe lá.

    PHA sempre questiona: de que vive o Serra? Dia desses postou uma história estranhíssima sobre o vamp (http://goo.gl/XCxKnN): no dia seguinte à derrota de 2010 para Dilma, foi visto hospedado num dos mais caros hoteis de NY. Provavelmente, chegou lá de jatinho fretado. Quem pagou? Como um cara que começou como professor universitário, e depois só trabalhou como político, pode ter tantos sinais aparentes de riqueza? Nem o velho ACM, que começou a vida como professor primário, era tão cara de pau.

    Como disse o chargista Bessinha: “Madame, olhando pro Serra, a senhora vê o Milionário ou Zé Rico?”
     

  7. Este é o preposto dos EUA no

    Este é o preposto dos EUA no Brasil.

    Anotem: Vai ser o próximo presidente ou primeiro ministro do Brasil, a não ser que uma bala o atinja na testa, porque se bolinha de papel não vale.

  8. Quem se dá ao trabalho de ler

    Quem se dá ao trabalho de ler na integra o texto acima,verá de forma inquestionavel que o País apodreceu.A Suprema Corte,de olhos bem fechados,quando chamado a retirar o material putrefato da via publica,despudoradamente informa que ainda está doente,enfermo.As favas os bons modos.Um canalhocrata como Serra,recebe a titulo de propina,$ 23 milhoes de reais,em paraiso fiscais,e ninguem investiga nada,por que a mídia está na outra ponta do chicote.Volto a Papai.Como um cidadão de bem pode viver em uma infelicidade desta.Nem na ditadura militar,nos anos mais terriveis,o nivell de semvergonhice,safadeza,cinismo,hipocrisia,descaramento,canalhice,canalhada,canalhismo,sequer chegou perto dos niveis de hoje.A mesma coisa que deve está sentido minha amiga Analu,sinto agora.Se não tivesse,um membro da minha passando por grave enfermidade,,se fosse pouco o que a vida me reservou,procuraria outro País da America do Sul para amarrar meu bode.Menos a Argentina.

  9. Denúncia contra Serra durante Olimpíada “não foi por acaso”

    No fim de semana em que o Brasil estava extasiado com a abertura dos Jogos Olímpicos, a imprensa brasileira publicou duas denúncias envolvendo o governo interino, originadas nas delações da empreiteira Odebrecht à Operação Lava Jato. Na opinião do cientista político Frédéric Louault, especialista em política brasileira da Universidade Livre de Bruxelas, o timing da divulgação sobre a ocorrência de financiamento ilegal de campanha de José Serra e Michel Temer “não foi por acaso” – o que, segundo ele, ajuda a explicar a fraca repercussão das acusações.

    “Não tem acaso na agenda política brasileira”, afirma Louault, que também é pesquisador da Sciences Po, de Paris. “A divulgação dessas informações durante os Jogos pode ser uma estratégia para reduzir o efeito que as mesmas notícias teriam em setembro, depois das competições e logo antes das eleições municipais. O impacto também seria diferente se tivessem sido publicadas às vésperas da votação final do impeachment”, indica o professor.

    Íntegra em:

    http://br.rfi.fr/brasil/20160815-denuncia-contra-serra-durante-olimpiada-nao-foi-por-acaso

     

  10. folha ameaça publicar, para muito chantagear.
    No texto abaixo, Ciro Gomes diz que fhc não rouba mas deixa roubar. Nós sabemos que fhc, não rouba pouco.Brasil / 2010 / 09 / 13 / Burburinho: tudo sobre Serra, FHC, Preciado e Ricardo Sergio   –   

    Burburinho: tudo sobre Serra, FHC, Preciado e Ricardo Sergio   –

    Stanley Burburinho localizou na Folha, na Folha (!) a resposta ao que este Conversa Afiada tinha sugerido.   –

    http://www.conversaafiada.com.br/brasil/2010/09/13/burburinho-tudo-sobre-serra-fhc-preciado-e-ricardo-sergio    –
    Stanley Burburinho, o reparador de iniquidades, localizou na Folha (*), na Folha (!) a resposta ao que este Conversa Afiada tinha sugerido, antes do debate na Rede TV: botar o Preciado e o Ricardo Sérgio no pedaço.

    O amigo navegante verá que o Farol de Alexandria diz ao Mendonça de Barros: não te meta nisso !

    Digno de um estadista, não ?

    De um “primeiro mandatário” da Nação.

    (Disse o Ciro Gomes: o FHC não rouba, mas deixa roubar.)

    Vamos ao implacável Burburinho e chore de vergonha, amigo navegante (por falar nisso, por onde anda o Fernando Rodrigues ?):

    Abaixo, quatro matérias publicadas pela Folha de São Paulo em 2002, no espaço de cinco dias, falando das ligações de Ricardo Sergio com o

    Serra, Preciado e FHC e com explicações sobre os bastidores da privatização da Vale:   

    1 – No BB, Ricardo Sérgio ajudou empresário ligado a Serra

    2 – Entenda o caso da privatização da Vale do Rio Doce

    3 – Saiba os bastidores da privatização da Vale do Rio Doce

    4 – Saiba mais sobre Ricardo Sérgio, ex-diretor do Banco do Brasil

     

    No BB, Ricardo Sérgio ajudou empresário ligado a Serra

     

    FERNANDO RODRIGUES

    da Folha de S.Paulo, em Brasília

    O empresário e economista Ricardo Sérgio de Oliveira ajudou a favorecer no Banco do Brasil, em 1995, empresas de um dos doadores de campanha do pré-candidato tucano a presidente, José Serra. A pessoa favorecida também mantinha um terreno em sociedade com o tucano.

    Segundo documentos do BB, a ajuda contou com “operações heterodoxas” e “atípicas” de empréstimo e de redução de dívidas. Ricardo Sérgio foi diretor da Área Internacional do banco de 95 a 98.

    O beneficiário foi Gregorio Marin Preciado, um empresário espanhol naturalizado brasileiro que atua na região do ABC, na Grande São Paulo. À época da operação, ele tinha um terreno no Morumbi, bairro nobre da cidade de São Paulo, em sociedade com José Serra. A mulher de Marin, Vicencia, é prima em primeiro grau do tucano. A mãe de Vicencia é irmã da mãe de Serra.

    O BB concedeu a Marin uma redução de dívida de, pelo menos, R$ 73,719 milhões resultantes de juros e encargos acumulados sobre empréstimos. Esse benefício foi dado a duas firmas de Marin, a Gremafer e a Aceto, que estavam em situação de inadimplência crônica com o banco.

    Em 25 de julho de 95, quando as empresas Gremafer e Aceto continuavam inadimplentes, houve uma tentativa do Banco do Brasil de arrestar bens pessoais de Marin. Depois de fazer uma pesquisa em cartório, o Banco do Brasil elaborou lista de bens pertencentes ao empresário.

    Um desses bens foi o terreno que Marin possuía em sociedade com Serra no Morumbi. Vários documentos do banco citam o caso, alguns mencionando o nome do tucano.

    Antes que a Justiça pudesse agir, Marin foi mais rápido. Vendeu, junto com Serra, o terreno do Morumbi em 19 de setembro de 95, menos de dois meses depois de o banco ter decidido entrar na Justiça. Impediu assim que a ordem de arresto fosse cumprida, driblando a tentativa do Banco do Brasil de recuperar parte da dívida.

    O valor oficial de venda do imóvel foi de R$ 140 mil, segundo registro no 15º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo. O comprador, a construtora Alfons Gehling & Cia Ltda., projetou para o local um prédio de 12 andares e dois subsolos, depois de ter comprado um lote vizinho e aumentado a área para 1.620 m2.

    Primeiro empréstimo

    O negócio da Gremafer e da Aceto com o Banco do Brasil começou em 93. O primeiro empréstimo foi equivalente a US$ 2,5 milhões, em agosto daquele ano. Era denominado em dólar porque saía por meio da Resolução 63, um instrumento que os bancos têm no Brasil para captar dinheiro no exterior e repassá-lo a tomadores no país.

    O segundo empréstimo saiu no final de 95. Foi equivalente a US$ 2,8 milhões. No total, a Gremafer e a Aceto receberam em reais um valor correspondente a US$ 5,3 milhões do BB. A dívida disparou por causa dos juros altos e da falta de pagamento. Chegou a passar de R$ 61 milhões em novembro de 98, quando o Banco do Brasil finalmente desistiu de ajudar as empresas -uma data que coincide com a saída de Ricardo Sérgio da instituição.

    Apesar de lhe faltar dinheiro para pagar em dia o Banco do Brasil, Marin encontrou fundos para fazer doações de campanha a Serra em 94. Ao todo, a Gremafer e a Aceto doaram R$ 62.442,82, segundo a prestação de contas do tucano. No começo de 95, as empresas estavam com dívidas de mais R$ 20 milhões.

    Ricardo Sérgio e charutos

    A Folha entrevistou sete funcionários do Banco do Brasil que participaram formalmente das decisões a respeito da Gremafer e da Aceto. Em reserva, dois confirmaram inteiramente a influência de Ricardo Sérgio na aprovação da redução de dívidas. Dois disseram que não sabiam. E três se recusaram a falar sobre o assunto, alegando sigilo bancário.

    O próprio Marin não esconde que Ricardo Sérgio teve participação na aprovação das operações de empréstimos. “Estive com ele algumas vezes nesse período”, disse o empresário ontem, usando um celular na Espanha, onde se encontra no momento.

    Marin faz a ressalva de que as operações não lhe foram favoráveis, e que Ricardo Sérgio esteve presente em reuniões sempre com outros funcionários do Banco do Brasil. A Folha apurou, porém, que as relações do empresário com o ex-arrecadador de fundos do tucano foi mais próxima do que isso.

    Em um determinado momento, durante a negociação do empréstimo e da recomposição das dívidas da Gremafer, Marin mandou de presente uma caixa de charutos para Ricardo Sérgio. Confrontado com essa informação, o empresário ficou em silêncio alguns segundos e disse: Eu fumo charutos”. E a Folha: “E daí?”. Ao que o empresário concluiu: “Daí, pronto. Já estou te respondendo. Não vamos entrar nesse nível de detalhes”.

    Em seguida ao diálogo sobre o charuto, a ligação caiu. Até o final da tarde de ontem Marin não telefonou novamente para a Folha, embora o jornal tivesse insistido com seu filho, Gregorio Marin Junior, que desejava continuar a entrevista.

    Diretores do BB

    O superintendente do BB em São Paulo à época da operação com a Gremafer e com a Aceto era Wolney Ferreira. Ele escreveu uma correspondência contundente a respeito do episódio.

    Arquivada em meio a centenas de papéis desse caso, a carta de Wolney dá a impressão de que seu autor se precavia contra futuros problemas -afinal, apesar da influência de Ricardo Sérgio, eram funcionários de escalão inferior que tinham de assinar os relatórios favoráveis.

    A preocupação de Wolney era com a operação aprovada em 8 de novembro de 95 pela diretoria do BB. Nessa data, foi aprovada uma redução de R$ 16,453 milhões na dívida das empresas de Gregorio Marin Preciado. Além disso, a Gremafer e a Aceto receberam um novo empréstimo no valor equivalente a US$ 2,8 milhões.

    Ao comentar essa operação, Wolney redigiu sua carta em 27 de novembro de 95. Endereçou-a ao então presidente do BB, Paulo César Ximenes. Wolney, hoje aposentado e vivendo em Nova York, começava dizendo que a redução de R$ 16,453 milhões e o dinheiro novo se tratavam de “operações em curso anormal”. Eis alguns trechos do documento:

    – “Essas soluções heterodoxas e atípicas e, como tais, não ajustadas às normas têm sido invariavelmente submetidas ao Conselho Diretor, com vista ao seu exame e decisão a respeito” (…);

    – “Buscou-se dar total transparência sobre a situação dos capitais mutuados, abrangendo desde a sua origem até a eventual decisão de continuidade de cobrança judicial -implementada para pressionar os devedores-, passando, obviamente, por detalhada análise da realidade patrimonial das empresas e coobrigados e, principalmente, posição mercadológica e possibilidade de recuperação econômica dos devedores” (…);

    – “No caso da Gremafer e da Aceto, foi efetuado, inclusive pela Diretoria, completo exame de todas as variáveis, tendo sido adotada opção por solução heterodoxa, compreendendo programa de desimobilização [arresto de imóveis], inclusive com concessão de crédito novo para retomada das atividades produtivas dos devedores (…)”.

    Parte do BB foi contra

    Segundo a Folha apurou, em novembro de 95 havia divergência dentro do Banco do Brasil sobre se essa era a melhor opção a ser adotada. Mas a decisão final foi a de reduzir a dívida e dar mais dinheiro a Marin.

    Quem lê as páginas do processo da Gremafer e da Aceto nota que tudo tramitou pelas instâncias normais do Banco do Brasil. Não há nos documentos nenhuma indicação clara de pressão política. Mas fica evidente que as duas empresas tinham situação muito delicada para serem agraciadas em 95, com redução de dívida e mais dinheiro novo.

    A descrição do esquema está em um documento de outubro de 95. A conclusão formal é que o BB deveria aprovar a proposta formal de redução de dívida e oferecimento de dinheiro novo. Apesar dessa decisão favorável, o corpo do texto de 14 páginas traz inúmeros argumentos contrários.

    Por exemplo, depois que Gregorio Marin Preciado recebeu seu primeiro empréstimo em 93, diz o documento, “houve considerável saldo financeiro remanescente que passou a ser renovado sem nenhuma amortização”.

    E mais: “Para fazer frente aos inúmeros investimentos idealizados pelo sócio majoritário do grupo, a administração da agência optou por continuar assistindo as duas empresas, acatando expressivos valores em cheques em conta corrente”.

    Depois de fazer uma primeira recomposição de dívida em maio de 94, “em vista das expressivas obrigações assumidas pelas empresas junto ao banco e a terceiros que oneravam toda a sua capacidade de pagamento, foi realizada uma única quitação de uma única parcela, em outubro de 94”.

    Ou seja, as empresas de Gregorio Marin Preciado estavam em situação de inadimplência crônica em 95. Há também uma acusação contra o empresário. O documento do BB de outubro de 95 dizia: “Destaca-se que os recursos captados em nome do grupo possivelmente foram utilizados em diversos negócios pessoais do sr. Gregorio. (…) Tais investimentos não obtiveram o retorno esperado (…) provocando total descasamento entre a capacidade de geração de receitas e fluxos de desembolso das obrigações assumidas”.

    Desconto de R$ 57,3 mi

    Ainda assim, com toda a depauperação da situação financeira da Gremafer e da Aceto, o Banco do Brasil optou em 95 por dar mais um empréstimo e conceder uma redução de dívida. O argumento básico era que o caminho por via judicial resultaria na obtenção de “créditos em valores inferiores aos apurados” na proposta de recomposição.

    A maior redução de dívida ainda estava para acontecer. Em 1998, o Banco do Brasil resolveu liquidar as operações e fazer uma nova recomposição.

    Infladas pelos encargos e juros altos, a dívida da Gremafer e da Aceto estava em R$ 61,380 milhões. Conseguiram um abatimento de R$ 57,266 milhões e passaram a dever apenas R$ 4,114 milhões e novas condições de pagamento.

    Não adiantou. A Gremafer e Aceto nunca saldaram suas dívidas. Hoje, a Gremafer deve R$ 3.142.937,30, valor que consta na contabilidade do BB no último dia 25 de abril. A Folha não obteve o valor atualizado do débito da Aceto. As duas empresas lutam na Justiça para não pagar. Querem receber de volta algum dinheiro, pois acham que os imóveis que cederam como penhora foram subavaliados.

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    Entenda o caso da privatização da Vale do Rio Doce

     

    da Folha Online

    Veja, a seguir, os principais fatos que envolvem a suposta cobrança de propina durante a privatização da Companhia Vale do Rio Doce:

    Acusação

    O economista Ricardo Sérgio, ex-diretor do Banco do Brasil, é acusado de cobrar comissão para ajudar a montar o consórcio que comprou a Companhia Vale do Rio Doce, em 1997. A acusação é feita por Benjamin Steinbruch, que liderou a compra da Vale e se tornou presidente de seu conselho de administração. Ricardo Sérgio nega as acusações.

    Queixa

    Após ter arrematado a Vale, Steinbruch, segundo reportagem da revista “Veja”, teria se queixado em 1998 ao então ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros (Comunicações) e ao ministro Paulo Renato de Souza (Educação) sobre o comportamento de Ricardo Sérgio.

    Valor

    Segundo Mendonça de Barros, Steinbruch relatou que o valor pedido por Ricardo Sérgio era de 15 milhões de dólares ou reais – à época, o dólar tinha a mesma cotação do real. De acordo com o ministro Paulo Renato, seriam R$ 15 milhões.

    O presidente

    Mendonça de Barros diz ter informado o presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o caso. FHC teria dito não saber nada sobre o assunto e teria recomendado ao ministro a não se envolver no assunto.

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    Saiba os bastidores da privatização da Vale do Rio Doce

    da Folha Online

    Veja como aconteceu a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, em 1997:

    Privatização

    A CVRD (Companhia Vale do Rio Doce) foi privatizada em 6 de maio de 1997. O consórcio Brasil, liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional, de Benjamin Steinbruch, adquiriu o controle acionário da Vale por R$ 3.338.178.240.

    A surpresa

    O resultado do leilão causou surpresa. O consórcio favorito era o Valecom, liderado pelo Grupo Votorantim, de Antônio Ermírio de Moraes, que contava com a participação da Anglo American, do Centrus (fundo de pensão do BC), do Sistel (fundo de pensão da Telebrás), da Caemi-Mitsui e da Japão-Brasil Participação (formado por 12 corporações).

    Intervenção

    Para fazer frente ao Valecom, o governo FHC interveio no processo, impedindo que os demais fundos de pensão de estatais aderissem ao consórcio de Antônio Ermírio e optassem pelo consórcio de Steinbruch, que ficou assim:

    CSN, Previ (fundo de pensão do BB), Petros (fundo de pensão da Petrobrás), Funcef (fundo de pensão da CEF), Funcesp (fundo de pensão dos empregados da Cesp), Opportunity e Nations Bank (fundo).

    Opportunity

    O Banco Opportunity, o mesmo que Ricardo Sérgio favoreceu em 1998 no leilão do Sistema Telebrás, criou o Sweet River Fund (Fundo Rio Doce) para atrair cotistas no exterior.

    Ermírio chegou a se reunir com FHC para reclamar da concentração de fundos no Consórcio Brasil e pediu uma participação mais equilibrada. Apesar disso, o Consórcio Brasil acabou ficando com a maioria dos fundos.

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    Saiba mais sobre Ricardo Sérgio, ex-diretor do Banco do Brasil

    da Folha Online

    e da Folha de S.Paulo

    O ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira teria cobrado do empresário Benjamin Steinbruch, que liderou a compra da Companhia Vale do Rio Doce, R$ 15 milhões para organizar o consórcio vencedor da privatização, segundo reportagem da “Veja”. O ex-diretor nega as acusações.

    Veja, a seguir, as principais ligações de Ricardo Sérgio com o caso Vale e com políticos:

    Pré-história

    Ricardo Sérgio de Oliveira, formado em economia pela PUC-SP e pós-graduado pela Fundação Getúlio Vargas, tornou-se em 1989 sócio da corretora de ações RMC S/A Sociedade Corretora.

    Em 1994, Ricardo Sérgio trabalhou informalmente como arrecadador de fundos para a campanha de José Serra (PSDB-SP) ao Senado, embora não aparecesse como tesoureiro.

    Início no BB

    Em 1995, foi indicado pelo ministro Clóvis Carvalho (Casa Civil), com endosso de Serra, para ocupar a diretoria da Área Internacional do Banco do Brasil.

    As privatizações

    Ricardo Sérgio desempenhou um papel decisivo no processo de privatização das estatais no governo FHC, influindo na atuação da Previ, fundo de pensão dos funcionários do BB.

    A Previ fez parte do Consórcio Brasil, que arrematou a Vale do Rio Doce em 1997, e do Consórcio Telemar, que adquiriu a Tele Norte Leste em 1998.

    Crise

    Em 8 de novembro de 1998, foram divulgadas gravações clandestinas de telefonemas na sede do BNDES entre autoridades do governo sobre o leilão da Telebrás, em 29 de julho de 1998.

    As fitas indicam o interesse do ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e do presidente do BNDES, André Lara Resende, para que o Opportunity vencesse um dos leilões.

    Nas conversas, o próprio presidente Fernando Henrique Cardoso permitiu que seu nome fosse usado para pressionar a Previ a entrar no consórcio liderado pelo Banco Opportunity.

    Em uma conversa com Mendonça de Barros, Ricardo Sérgio revela que deu uma carta de fiança para o Opportunity, assegurando sua participação no leilão da Tele Norte Leste.

    Saída do BB

    O escândalo da privatização das teles leva Ricardo Sérgio a deixar o cargo de diretor do BB em novembro de 1998.

     

    (*) Folha é um jornal que não se deve deixar a avó ler, porque publica palavrões. Além disso, Folha é aquele jornal que entrevista Daniel Dantas DEPOIS de condenado e pergunta o que ele achou da investigação; da “ditabranda”; da ficha falsa da Dilma; que veste FHC com o manto de “bom caráter”, porque, depois de 18 anos, reconheceu um filho; que avacalha o Presidente Lula por causa de um  comercial de TV; que publica artigo sórdido de ex-militante do PT; e queé o que é,  porque o dono é o que é; nos anos militares, a Folha emprestava carros de reportagem aos torturadores.

     

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