Sim! Mais sobre ele e sobre muitos a quem ele deve muito, por Camilo de Oliveira Aggio

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Sim! Mais sobre ele e sobre muitos a quem ele deve muito

por Camilo de Oliveira Aggio

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Fiz um post sobre a entrevista de Jair Bolsonaro no Roda Viva de ontem e, como é de praxe, surgiram alguns comentários tradicionais, insuportavelmente conservadores e errantes, responsabilizando qualquer um que fale desse cidadão às suas conquistas políticas e eleitorais.

Aquela fórmula básica: se você fala, logo dá visibilidade ao sujeito e eis o monstro arrancado da caverna por você e livre para conquistar mentes e corações.

Eis a limitação e equívoco grave dessa crítica: foi justamente por pouco falarem de Jair Bolsonaro, por pouco terem prestado atenção nesse cidadão, por tardiamente terem se dado conta da estatura que ele poderia alcançar, que ele chegou até aqui, onde está.

O conservadorismo estúpido de nosso sistema político, partidário e de seus agentes deixou que Jair Bolsonaro passasse, pelo menos, dois anos sozinho, pleno, fazendo campanha eleitoral sem disputar a condição de candidato com ninguém.

Ao menos desde o longo processo de impedimento de Dilma Rousseff e das operações persecutórias com a finalidade de sequestrar quaisquer chances presidenciais do PT que Jair Bolsonaro domina as dinâmicas políticas e sociais das redes digitais (menos pelo que faz do que fazem por ele, talvez) e roda Brasil afora consolidando seu nome e suas posições como nenhum outro, com exceção de Lula.

(Há muito os que conversam comigo por aqui sabem que sustento que a operação Lava Jato, muito provavelmente, estava tirando do páreo o único cara com chances de bater esse cidadão na eleição presidencial.)

E o que fizeram (e fazem) agremiações partidárias, agentes da política e até a imprensa diante desse sujeito? Sentaram e sentam em cima da crença de que, uma vez que os cenários de coligações e alianças tradicionais começassem a se desenhar e se consolidar, o cidadão ia começar a desidratar. Da mesma forma, sustentaram e sustentam que, uma vez que as campanhas começassem a invadir os tradicionais espaços televisivos, o sujeito ia, inexoravelmente, ser jogado para o rodapé das intenções de voto.

Uma leitura de cenário não apenas conservadora, mas inacreditavelmente distraída. A roda da história social e política brasileira foi rodando nos últimos 3-4 anos e esses atores e instituições persistiram olhando para o passado para lidar com o futuro.

Não perceberam o estágio de degradação política e moral do sistema político, dos partidos e políticos tradicionais, menosprezaram a força do antipetismo – que transcendeu o partido de referência e se tornou um sentimento de oposição a uma caricatura de esquerda amplamente disseminada- e não perceberam quem foi o maior herdeiro desse espólio. Não perceberam, ainda, que combater a força da candidatura de Bolsonaro demandaria pensar, seriamente, em união de forças e não no investimento em fragmentação.

Agrava ainda o fato de que, curiosamente, depositaram – e ainda depositam – uma enorme esperança de que televisão e coligações operarão milagres diante de uma conjuntura tão singular que mudou profundamente os cenários de comportamento social, político e eleitoral brasileiros. Nesse imaginário conservador e distraído, não existem redes digitais. Não existem redes de sociabilidade por onde fluxos torrenciais de informação política circulam e onde opiniões, climas de opinião, disposições políticas e preferências eleitorais são formados.

Apostaram tanto na ideia de que o amadorismo, a imbecilidade, o despreparo e a truculência do sujeito minariam suas chances tão logo as campanhas começassem a invadir so media que, ontem, tiveram que engolir, talvez, o último de seus dogmas ou “wishful thinking” sobre o candidato do PSL: apesar de tudo isso, saiu-se muito bem diante de um cerco hostil de entrevistadores.

E quais os efeitos concretos disso? A pesquisa mais recente, feita por encomenda de Veja, mostra que as intenções de voto ESPONTÂNEAS do sujeito cresceu e que aquele seu suposto teto na estimulada pode ser, realmente, apenas um suposto equivocado. Jair Bolsonaro chegou a 14% nas sondagens espontâneas. Com exceção de Lula, vejam quanto pontuam seus adversário diretos nesse tipo de sondagem: 2-3% com muita boa vontade.

E isso se deve, sim, ao fato de que esse sujeito está trabalhando em sua candidatura, isoladamente, há muito, sem ser incomodado por quem o assistia e o subestimava, e que está conseguindo se consolidar eleitoralmente como nenhum outro à exceção de Lula. E vem construindo sua imagem mais ou menos assim.

1) Parece ser, cada vez mais, a representação da única direita legítima, verdadeiramente antiesquerda nessa disputa;

2) Honesto (“meu nome não é mencionado em nenhum caso de corrupção”);

3) Aquele que vai resgatar os valores tradicionais da família e se enquadra num levante conservador reativo crescente no Brasil. E não achem que se trata de conservadorismo de viúvos e viúvas da exceção – é simplesmente aquele comum, latente e desde sempre presente no país que apoia a proteção das crianças contra a suposta pedofilia, que repudia tentativas de induzir sexualidade e orientações sexuais em crianças, que ficam enojadas com tentativas de naturalizar o que consideram anomalias, ainda mais quando chegam a invadir nossas casas por meio das teledramaturgias da Globo, que querem transformar meninos em meninas e por aí vai. Esses sentimentos são menos pontuais e singulares do que se imagina.

4) É o que dialoga com novas gerações que acham que medidas de combate a injustiças e assimetrias sociais históricas são expedientes de concessão de privilégios a determinados grupos em detrimento deles. Sistema de cotas, por exemplo, mas também toda essa chatice esquerdopata que fica criando um monte de vítimas e vitimizações que sequestram nosso direito de discriminar: que, para eles, é só brincadeira. Pura extroversão. Ou vocês acham que o sucesso de Danilo Gentilli é um ponto fora da curva? Nunca. É índice.

5) O sujeito que melhor representa nosso cansaço de ficar ouvindo ladainhas de políticos tradicionais que dizem que vão resolver problemas com exposições longas e evasivas, e não resolvem nada. O cansaço de ficar tratando bandidos como vítimas da sociedade, quando o que deviam receber mesmo era bala. Assim como estupradores. Direitos Humanos é prerrogativa de defesa de bandida contra o cidadão de bem.

6) Trata-se do candidato que melhor representa o levante de um espírito do tempo brasileiro cultivado pela Lava Jato: a truculência, a arbitrariedade e a violência como métodos legítimos se for para combater o mal maior. Tudo se legitima sob o argumento falacioso do combate ao “inusual”, “ao extraordinário”. É assim, inclusive, de Lava Jato a Lava Jato, de Jair a Jair, que se desmantela o Estado de direito e se abre o corredor para o fascismo. É assim, também, que Jair vai crescendo.

7) Ele tem conseguido, de forma similar, assumir o posto do candidato não apenas perseguido pelo establishment político, mas pela tal da “mídia”.
O discurso antimídia, que por muito tempo foi monopólio da esquerda, é adotado pela direita e Bolsonaro é quem tem melhor conseguido, não sem razão, se colocar como alvo da imprensa que ele diz representar os interesses da velha política que precisa ser dizimada. E isso mobiliza seus apoiadores, simpatizados e inclinados: “Se instituições com tão baixa credibilidade estão perseguindo-o, então algo de certo ele está fazendo”, tendem a pensar.

8)É o candidato que, livre, correu leve e solto na consolidação de uma enorme rede de apoiadores graças ao que conseguiu fazer – e o que fizeram por ele – nas redes digitais: essa coisa que seus adversários, conservadores, anacrônicos e distraídos não só subestimam ou ignoram, como acham que será suplantada pela televisão.

Enfim, tudo isso é um edifício, meus caros. Um edifício nojento, moral e intelectualmente repugnante, torpe, mal cheiroso. Mas tem alicerces firmes que foram construídos aos poucos e sem fiscalização de quem deveria ter fiscalizado.

Jair Bolsonaro vem submetendo sua candidatura a testes ao longo de anos num mar de indefinições e letargias partidárias. O que é hoje não é por acaso e não creio que seja momentâneo. Parece sólido.

Enfim, o erro não é falar de Jair Bolsonaro. O erro foi não ter falado. Foi ter subestimado e deixa-lo atuar sozinho, sem adversários, por anos. Erro ainda maior é falar tardiamente porque, a essa altura, nada mais pode fortalecer sua candidatura do que demonstrar que é perseguido e desagrada todas as instituições e sujeitos que, tradicionalmente, nos trouxeram até aqui: da política aos partidos, passando pela imprensa.

Dessa vez não vou dizer “eu avisei”.

Camilo de Oliveira Aggio – professor na UFMG

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

12 Comentários

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  1. Realidade
    Concordo principalmente pela falta de seriedade das cabeças pensantes da esquerda que nunca levaram a sério o anti candidato Bolsonaro. Ele estará no segundo turno, e pode até levar no primeiro, caso Marina venha a desidratar.

  2. eu visto a carapuça…

    Considerando que a direita não conseguiu nenhum “outsider” tipo Hulk, Joaquim Barbosa, Justus, etc para canalizar os votos dos conservadores que gostam de se camuflar, reconheço agora que chances são enormes de acontecer uma “saída em massa do armário” dos conservadores hipócritas e os votos direcionados para Bolsonaro. 

    Acusá-lo de homofóbico, preconceituoso, inimigo dos direitos humanos etc, só irá torná-lo ainda mais forte. 

    Mas ele possui dois pontos fracos:

    1. é político tradicional desde 1989

    2. não é honesto.

    Acho que só temos isto contra ele. 

    Fica a dúvida: teremos 50% de eleitores com coragem suficiente para seguir nesta loucura??

     

     

    1. Se existem 50% com coragem

      Se existem 50% com coragem suficiente? Aí depende do adversário…se for da esquerda, sim, vão existir 50% de eleitores com coragem suficiente. Ele perde no segundo turno para alguém do centro, mas para alguém da esquerda, não. Eu sei que alguns estão prontos a dizer: “perde pro Lula!!”, mas o Lula não está no páreo, e não estará.

  3. De fato, Bolsonaro não é

    De fato, Bolsonaro não é alguém que se leve a sério, vamos combinar. Contudo, concordo radicalmente com o analista: ele se criou dentro de uma cultura (sim, de bactérias) que favoreceu o fortalecimento de seu nome por todos os pontos que já foram elencados.

    Na minha humilde opinião, o que sacramenta o jogo a favor de Bolsonaro é ele se viabilizar como “não tem tu, vai tu mesmo…” em contraposição a Lula ou seu indicado no campo da esquerda. Já se vê por aí, notícias de que o Chorão da AMAN frequenta rodas da alta banca já sendo visto com olhares menos repugnantes.

    E isso tem duas razões básicas: 1) o medo de Lula e 2) o de ser uma marionete.

     

    E a esquerda batendo cabeça com seus orgulhos e perconceitos. Vão acabar entregando o país de bandeja para o fascismo.

    1. e fez o que fez…

      além das barbaridades mais conhecidas, desmantelou toda a estrura militar tradicional do país

      sem falar da invasão violenta de competências em todos os sentidos que há de se manter a ordem e a hierarquia dos poderes, inclusive empresarial

  4. Faltou educação

    Considerando a aprovação a Lula quando deixou a presidência e o crescimento da candidatura de Bolsonaro nota-se a profunda estupidez da nossa classe média – hoje expandidas, tanto a classe quanto a estupidez, graças ao próprio Lula – no trato de política, da coisa pública. A menção a Danilo Gentilli é adequada e oportuna: é óbvio que décadas de martelação pela empresas de comunicação social de que políticos e celebridades midiáticas são a mesma coisa acabou resultando positiva para quem gosta de dólares sem controle estatal. Ainda estamos com a tarefa de construir um país em aberto. E se depender dos tais formadores (forjadores?) de opinião, assim permaneceremos por um bom tempo.

    Iniciativa privada é assim mesmo: você dá o dedo e ela te arranca o braço. São possíveis, entretanto, outras formas de produção e controle de riquezas, de construção de sociedades prósperas sem deixarem de ser justas, soberanas sem deixar de participar das comunidades internacionais. Mas aí a turma, se deixando levar pela ilusão de liberdade (outra criação midiática), teme… Fazer o que senão amargarmos a ditadura da iniciativa privada? E, com coragem, lançarmo-nos a aprender a lição.

  5. E sim, o candidato da

    E sim, o candidato da “direita” não é Alckmin e nenhum outro que não Bolsonaro. Tirando paixões e vaidades pessoais, o próprio Geraldo Alckmin e sua turma serão muito mais beneficiados com Bolsonaro na presidência do que ele próprio seria: Geraldo Alckmin perderia a imagem de santo. Com Bolsonaro, Alckmin mantém a imagem e ainda desfrutará de uma sociedade não de cidadãos mas de consumidores, empregados e “empreendedores” a destruir as possibilidades de soberania e prosperidade nacional.

    Se a economia fosse mesmo globalizada por que é que só um país emite e controla a pretensa moeda mundial?

  6. Agora, Quanto Mais Falar Pior. Fazer Mostrar-se, ‘Mostrando-se’

    Vai ao ponto no diagnóstico geral, mas considero que erra, ao afirmar que nesse momento deve-se sim falar dele, quando na realidade o momento pede que seja MOSTRADO e que MOSTRE-SE, muito, mas sem contraditórios e criticas,  diretos, de confronto, mas subliminares, na forma “cerca lourenço”, sutis, nas entrelinhas, deixando espaço para que a possível vitima ‘perceba’ o predador, ‘por si’.

    Nessa linha, à entrevista da Cultura, não corresponde que “saiu-se muito bem diante de um cerco hostil de entrevistadores”, mas sim que os entrevistadores, extremamente controlados e cirúrgicos, não deram chance a que comportando-se hostis, esse os hostilizasse e como ‘pobre vítima’ trucidada pela horda inimiga, saisse do entrevero (evitado) um Charles Anjo 45 maior, como desejava. 

    Não apenas não saiu-se bem, além convertidos de mesma raiz, como foi levado pelo estado ‘zen’ dos entrevistadores (que impediu o pugilato desejado), a auto-revelar a paupérrima figura que estampa, deixando-se apalpar no que tem de pior, nada ter que acrescente, pelos possíveis discípulos a caminho e novos a chegarem. Um desastre.

    No atual momento não adianta chorar o leite derramado, insisto, agora é hora de mostra-lo e deixar-se mostrar, a exaustão, até cansar, para que os brasileiros o descubram, ‘por si’, ou seja, com aquela ajudazinha basica e fundamental, um palmo abaixo da rasura, deixando a rasura, espaço à ‘descoberta’ pelas possiveis vítimas, do predador. 

    PS: Lembrem-se de Trump, nada mais explícito contra, é inteligente. Posts como esse não mais deveriam ser publicados, enquanto não imobilizado o predador. 

  7. Muito importante falar do

    Muito importante falar do “fator starter” (inventei isto agora) para explicar como Jair Bolsonaro cresceu tanto. Acho que todo mundo conhece aquele aparelhinho, o starter, de lâmpada fluorescente, fundamental pra fazer a luz acender, mas que é difícil de explicar a mágica da coisa. O “fator starter” funciona também na internet. Você é uma pessoa desconhecida e publica, por exemplo, um vídeo numa “rede social”. Daí outra pessoa, também desconhecida, publica o mesmo vídeo no mesmo minuto. Eis que um vídeo “bomba” na web com milhares de visualizações num único dia; e o vídeo da outra pessoa fica encalhado, por anos, com algumas dezenas de visualizações. O que explica a diferença? É uma conjunção de fatores, mas o principal é o ambiente em que você publicou; e que você tenha a sorte de que alguma pessoa famosa (popular na web) tenha assistido ao seu vídeo, tenha gostado, compartilhado etc. O maior “fator starter” que existe hoje é a TV aberta. Sim, não nos enganemos: a TV aberta ainda é o poder nº 1 das comunicações – com milhões de espectadores em tempo real. E se a pauta é oportuna, óbvio que o assunto vai “bombar” na web. É aqui que entra o “fator starter” do fenômeno Bolsonaro. Qual foi o fator que chocou o ovo da serpente, já que Bolsonaro estava há décadas na mesma função política, como deputado federal, e relativamente sem destaque no chamado ‘baixo-clero’ do Congresso? E para quem a mídia em geral (acertadamente) raramente dava voz? O fator se chama “CQC” (Custe o Que Custar), da TV Bandeirantes – mais especificamente Marcelo Tas, que deu um forte tempero fascistoide ao programa de origem argentina (e olha que a versão original do CQC, na Argentina, tinha até um caráter mais progressista). Tudo aconteceu em 2011, na polêmica (fabricada) em que Bolsonaro atacou Preta Gil (clique AQUI). Tenho para mim que o CQC, tendo Marcelo Tas como âncora, colaborou muito para a desconstrução do debate político entre a juventude. Eu poderia escrever um calhamaço dissertativo sobre o desserviço que o CQC, que tinha uma enorme audiência entre a juventude, fez à política. Já escrevi um pouco sobre isso, como, por exemplo, no episódio do factoide da “PEC da cachaça” que o CQC inventou (clique AQUI). Óbvio que seria injustiça debitar somente na conta do CQC a destruição da política que, na verdade, é fruto do “conjunto da obra” de toda essa mídia e que a gente sabe muito bem – e que calhou na catarse que ficou conhecido como “jornadas de junho” cujo legado, entre outros trágicos exemplos, foi o pior parlamento da história, eleito em 2014. Estou falando especificamente do CQC porque o assunto é Bolsonaro. Aquela polêmica criada e depois, pela audiência, realimentada em outros programas foi tudo que o (até então obscuro) deputado Bolsonaro precisava pra ganhar a simpatia da parcela fascista da juventude, fazer barulho e virar o “mito” que virou. É de Paulo Maluf a famosa frase: “falem mal; mas falem de mim”. Enfim, se existe uma pessoa a quem a família Bolsonaro tem uma impagável dívida de gratidão, essa pessoa se chama Marcelo Tas.

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