Só o pacto social possibilitará a quebra do poder dos bancos, por J. Carlos de Assis

Só o pacto social possibilitará a quebra do poder dos bancos, por J. Carlos de Assis

Entre os jornalistas políticos, há uma grande maioria que não se interessa o mínimo pelos temas econômicos.  Entre os economistas neoliberais, quase todos são absolutamente ignorantes de temas ligados à ciência política. Na condição de jornalista econômico e de economista político, considero um dever cívico contribuir para esclarecer essa dupla situação tendo em vista o fato incontornável de que jornalistas políticos e economistas neoliberais são inquestionavelmente os principais formadores de opinião no Brasil.

Primeiro convém distinguir o economista neoliberal daquele que se convenciona considerar como seu oposto, ou seja, o economista keynesiano – ou heterodoxo. É uma distinção no campo teórico e também de conteúdo. Sem me deter em tecnicalidades, defino o economista neoliberal como aquele que acredita que se houver equilíbrio ou superávit no orçamento público os empresários ficarão tão alegres que não pararão de investir, independentemente da questão imediata da demanda e do ciclo econômico.

Já os economistas keynesianos acham que a economia evolui por ciclos de alta e de baixa por razões tanto financeiras (Minsky) quanto reais (Marx), e nos momentos de baixa é fundamental recorrer-s ao déficit público para reativar a demanda, o investimento e o emprego (Keynes). Em termos de conteúdo político, a distinção é mais simples: o economista neoliberal presta serviço aos banqueiros e financistas, e secundariamente ao capital em geral, enquanto o economista keynesiano considera objetivo central da economia o pleno emprego, agradando empresários produtivos e trabalhadores.

Se o mundo fosse governado pela inteligência e não por relações de poder, é evidente que o keynesianismo seria imbatível. Claro, quem, em sã consciência, pode repelir a ideia do pleno emprego? De fato, nos anos gloriosos do pós-guerra as políticas keynesianas de pleno emprego reinaram absolutas na Europa Ocidental. Houve momentos, na Alemanha e na França, em que a taxa de desemprego ficou próxima de 1%. O mesmo ocorreu no Japão. Foi considerado a era gloriosa do capitalismo, conciliando interesses do capital e do trabalho.

É verdade que os fortes partidos comunistas da França e da Itália não eram muito simpáticos à ideia de uma economia de pleno emprego porque isso de uma certa forma retardava as condições para a revolução proletária a seu ver inevitável. Por outro lado, se não houvesse, do outro lado da Europa, a ameaça real ou virtual de um sistema econômico radicalmente contra o capital privado, o sistema soviético, dificilmente as classes dominantes do lado de cá tolerariam o progresso da economia do bem estar social, como não toleraram nos Estados Unidos.

Tudo isso agora é passado. O keynesanismo, com sua política de pleno emprego, está sob ataque feroz das classes dominantes europeias que falam abertamente em liquidar com o estado de bem estar social. De fato, fiquei estupefato ao ler uma entrevista do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, onde ele afirma literalmente que para recuperar eficiência a Europa Ocidental tem que acabar com o estado de bem estar social. Mais estranho ainda é que não vi nenhuma reação especial a esse ataque à fronteira da civilização ocidental.

Essa é uma boa demonstração de que economia não é ciência da inteligência. É ciência do poder. Não o poder político, totalmente subordinado ao poder econômico, mas o poder do controle da moeda e da riqueza. É verdade que o velho Marx explicou tudo isso com uma pedagogia irreparável, mas hoje praticamente ninguém lê Marx fora de algumas universidades, e em especial a classe trabalhadora a que dele dirigiu sua obra máxima, e que só reteve do socialismo “científico” algumas palavras de ordem.

O domínio absoluto dos banqueiros no Brasil ocupa a semântica. São eles que, nos bastidores, controlam a grande mídia. Lembram-se de quando Dilma mandou o Banco Central baixar as taxas de juros? Os economistas neoliberais, com total cobertura da grande mídia, caíram de pau em cima. Ela teve que recuar, já que Presidente da República não tem poder real sobre banqueiros e financistas. Precisam de mais uma? De onde vem o Ministro da Fazenda, senão de um banco? E quem escapa de seu “ajuste fiscal”, a não ser bancos?

 Não é apenas aqui, mas no mundo. O tremendo processo de concentração de renda das últimas três décadas resultou do poder neoliberal de dar todas as vantagens ao capital financeiro, à margem do próprio capital produtivo. No Brasil, a situação é ainda mais grave, pois os bancos impõem ao público e ao Governo juros pornográficos. Até a terminologia econômica é dominada. Por exemplo, desapareceram com o conceito de “senhoragem” dos manuais de economia neoliberal para esconder melhor o roubo da emissão monetária, antes do Governo ou partilhada com ele, hoje praticamente apropriada apenas pelos bancos pela forma peculiar como aqui opera a política fiscal-monetária.

Não vejo solução para essa situação fora de uma rebelião ordenada do setor produtivo. Deem o nome que quiserem, mas estou falando de um pacto social ou de um grande acordo social básico entre trabalhadores e empresários, ou seja, entre os que realmente produzem riqueza e que tem perdas objetivas se a economia continuar ladeira abaixo. Os exemplos históricos de soluções políticas pactadas ao nível da sociedade civil são muitos, da Suécia à Espanha, passando por toda a Europa Ocidental. No nosso caso o pacto não é apenas um processo político ao nível das classes sociais mais relevantes para sairmos da crise; é o caminho para evitarmos uma convulsão social alimentada pelo desemprego e pela queda da renda da população.

J. Carlos de Assis – Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor entre outros livros de economia política de “Os Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, Ed. Textonovo.

Redação

10 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Pacto Social

    O mesmo vale para uma reforma tributária séria!

    Agora… o texto diz o seguinte. As forças progressistas – principalmente elas – ganham o governo mas não o poder. Vide Grécia e agora Portugal.

    Quem manda no Brasil são os diretores do Banco Central.

    A Europa está nos imitando (rsrs…)

  2. Esta proposta é tão idealista

    Esta proposta é tão idealista que não merece sequer ser considerada com seriedade. O autor continua acreditando que nação, Estado e democracia são categorias relevantes no mundo dos banqueiros.

    Os banqueiros não existem mais no mundo real. Eles existem apenas na internet, onde criaram um “país fora de todos os países” para se relacionar e produzir dinheiro à qualquer custo (e inclusive com custos sociais terríveis para os povos condenados a existir no mundo real). Naquele mundo de bits (em que o próprio dinheiro é expresso em bits que podem ser convertidos em qualquer moeda real)  não há regulamentos que possam limitar as atividades bancárias.

    A “desnacionalização dos trabalhadores”, desejada por Karl Marx, se tornou algo totalmente obsoleto pela “desmaterilização dos banqueiros”. Não foi a toa que o neoliberalismo e a internet cresceram juntos para produzir um mundo fora do mundo e que só será implodido quando o próprio mundo explodir em guerras civis ou entre aqueles que foram deixados para traz (os Estados nacionais).

     

  3. Bom texto
    Mas é a idéia mais idiota da década.
    Mane pacto social o que.

    Isso será resolvido na porrada. Ou o PT perde o controle, ou o Governo ganha o controle de algumas empresas de mídia.

    Faça quebrar!

    Mas o PT prefere pagar bilhões a eles todos os anos na esperança de fazer um grande pacto social, como vc sugere.

    Na boa, casei desse papinho. Eu quero ver cadeia!

  4. Compor não existe.
    Não
    Compor não existe.

    Não escreva seus textos tomando champagne e comendo caviar.

    Chegou a hora da porrada! Quero saber se o PT vai por esse caminho.

    Se for para compor, eu voto PMDB!

  5. Não se cospe no prato que se come

    Para se tornar possível tal pacto seria necessário desmontar todo um arcabouço de pseudo socialismo que se tentou implantar, conjugado com a irresponsabilidade daqueles que administraram a economia na ultima decada e que remonta ao fracasso do sistema financeiro atual.

    Uma coisa esta conjugada com a outra. Como tentar um pacto agora com as forças produtivas se tudo que fizeram nas ultimas décadas foi um desmonte persistente e inflexível destas forças?

    É verdade que os fortes partidos comunistas da França e da Itália não eram muito simpáticos à ideia de uma economia de pleno emprego porque isso de uma certa forma retardava as condições para a revolução proletária a seu ver inevitável. E o que vem fazendo os políticos, desde então? Institui-se leis de cunho demagógico no próprio proveito, prejudicando reiteradamente esta mesma força que agora se tenta cooptar.

     Claro, quem, em sã consciência, pode repelir a ideia do pleno emprego? De fato, nos anos gloriosos do pós-guerra as políticas keynesianas de pleno emprego reinaram absolutas na Europa Ocidental. Houve momentos, na Alemanha e na França, em que a taxa de desemprego ficou próxima de 1%. O mesmo ocorreu no Japão. Foi considerado a era gloriosa do capitalismo, conciliando interesses do capital e do trabalho. O que acontecia então nos chãos das fabricas e nos departamentos de venda das industrias? O patrão não era considerado o inimigo a ser combatido, o explorador de pobrezinhos empregados desprotegidos. Regeram a orquestra de forma intermitente, batendo na mesma tecla da proteção do empregado contra patrões desalmados, instituíram-se leis que confrontavam diretamente os custos da produção sem se importar com que pagaria a fatura, isto acontece até hoje, a ultima aqui no Brasil com as empregadas domesticas.

    O caso das empregadas domesticas é o exemplo mais recente desta distorção que beneficia somente os políticos que lutam por si mesmos para ficarem bem na foto. Usar a empregada domestica como exemplo de justiça trabalhista é de uma simplificação ineficaz, dizer que se pretende esperar o filho da empregada domestica, estudando junto com o filho do patrão, faz parte do discurso populista que levaram as sociedades latino americana para o buraco que se encontram. É fumaça, desprezando as graves questões estruturais que verdadeiramente boicotam com qualquer avanço social.

    As leis trabalhistas no Brasil, verdadeiramente desestimulam e afastam as possibilidades de implantação de um mercado solido, bem estruturado e justo. Ao apertar o garrote dificultando as possibilidades do empreendimento o que acontece é que o crescimento que traria a justiça social é na verdade boicotado. É o contrario que acontece, leis que deveriam distribuir justiça, tornam-se criadoras de guetos, privilegiando alguns trabalhadores e excluindo a maioria.

    O caso das empregadas domesticas se tornou exemplar neste assunto. Enquanto algumas poucas, ganharam tudo, ou aparentemente ganharam, porque tem que pagar pelos pretensos direitos, a maioria não ganhou nada, muito pelo contrario, perderam o pouco que tinham.

    Qdo era jovem o ambiente de trabalho era muito diferente do que é hoje, os funcionários eram considerados parte da estrutura que existia para conquistar o mercado através da produtividade e da melhor capacitação frente ao concorrente. A fidelidade do empregado diante da empresa era indiscutível. A coisa de vestir a camisa, a paixão do torcedor hoje com seu time de futebol era os sentimento que o empregado sentia com a empresa que trabalhava. A greve era sinal de traição. Lembro que era estagiário de vendas na antiga Bozano, que posteriormente foi vendida para a Revlon americana, de qdo surgiu uma greve na fabrica, como nosso departamento era mais próximo da diretoria, sentíamos na pele a animosidade que se instalou, até brincávamos entre nós da aderência ao movimento e do disparate da possibilidade, era como se um recruta desertasse em pleno campo de batalha. Lembro que nas gondolas dos S.Mercados se travavam batalhas diárias entre os estagiários de venda de empresas rivais, para melhor se expor os produtos. O funcionário era valorizado e até disputados pelos concorrentes.

    Hoje os funcionários são inimigos dos próprios empregadores, isto muito por culpa de uma legislação trabalhista que o induz a extorquir quem lhe da condição de levar o sustento para sua família. Jurisprudencia que institucionalizou a extorsão. Qualquer sujeito, faça parte ou não do regime da CLT, consegue entrar na justiça exigindo “direitos” inexistentes. O que se procura hoje é parasitar com a empresa que trabalha, não existe qualquer motivação como se não existisse futuro, o que interessa é o seguro desemprego até o próximo emprego.

    Sem a vontade nem a legitimidade para interromper a espiral infernal na qual a demagogia meteu o país, governo algum terá condições de recuperar a confiança empresarial, imprescindível para o restabelecimento da estabilidade econômica.

    A ideologia dos direitos sociais levando em consideração a tal luta de classes e o confronto com o patrimonialismo, caducou, principalmente aqui no Brasil, que o fisiologismo, a corrupção e o oportunismo politico corre solto.

    Vai ser difícil reverter a situação que a demagogia colocou o setor produtivo.

  6. Rá!

    O Governo Federal é que se deixa mandar pelos bancos. Ele é possuidor dos dois maiores bancos do país e ainda gerencia o Banco Central. Taxas, juros, serviços são altos porque o governo quer.

    A política é culpada pelo não pacto social. 

  7. Pacto social é
    Pacto social é uma palavra gasta e as intenções idem.
    Virou coisa bem decada 80.

    O setor produtivo jamais vai brigar duramente ocm banqueiro. São todos da Burguesia e eles sabem que o inimigo é outro.

    Como ninguém lê Marx? Eu leio.
    Qualquer pessoa culta deve ler, e não precisa virar marxista. Tem alguma obras bem legais de ler. Agora o Capital é um saco, lá isso é.

  8. Preconceitos ideológicos
    Primeiro, economista liberais (porque neoliberal é o boneco de Judas da esquerda) não são as Polianas do equilíbrio fiscal e nem marionetes dos banqueiros. Eles apenas acreditam que o governo, uma vez que não é submetido à pressões do mercado e, por definição, não pode falir; e porque sofre pressões políticas não é o melhor agente na hora de decidir como alocar recursos e investir. Concorde ou não, sempre é elegante ser honesto com quem discordamos.

    Segundo lugar, o autor omite convenientemente que Keynes também diz para gastar menos em tempos de crescimento, não gastar como se não houvesse amanhã – por isso chamamos de política anti-cíclica e não política independente do ciclo. Se você não consertou o telhado quando estava sol, não pode reclamar das goteiras quando a chuva vem.

    Em terceiro lugar, o pleno emprego não é necessariamente um objetivo a ser perseguido. Caso contrário, poderíamos acabar com as centrais telefônicas e criar milhares de vagas para telefonistas, acabar com a manufatura de roupas e sapatos e criar milhares de vagas para sapateiros e alfaiates, acabar com a mecanização agrícola e criar milhares de vagas para lavradores. Porque não se faz isso até atingir o pleno emprego? Porque isso empobrece o país como um todo: do que adianta ter um trabalho e não poder comprar comida ou um sapato, já que para sustentar o pleno emprego, o preço precisa aumentar até ficar inacessível para a maioria das pessoas?

    Não discordo de Keynes, mas tem muito keynesiano que acha que basta imprimir e jogar dinheiro a torto e a direito para promover o crescimento econômico. Keynes fala de investir: escolher cuidadosamente projetos que, além de aquecer a economia, promoverão um retorno quando o ciclo se inverter suficiente para pagar no futuro o déficit contraído no presente.

    Talvez seja por isso que muita gente reclama do empresário que não investe: ninguém coloca dinheiro do próprio bolso apenas para ajudar o governo (até porque, ao contrário do governo, o empresário está sempre a um investimento mal-feito da falência). Se alguém pega emprestado 100 para pagar 110, é porque tem a certeza razoável que vai ganhar pelo menos 120. É por isso que os liberais falam de confiança como condição NECESSÁRIA porém não necessariamente SUFICIENTE para investir.

  9. Guerra

    De tanto ler s/ economia e mesmo assim não entender nada, estou chegando a conclusão que a melhor coisa a acontecer para mudar o mundo, seria a 3a. guerra mundial. Perdoe-me Papa Francisco ! e outros.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador