Relatos da Pandemia: As medidas tomadas em Angola, por Mário de Lemos

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Houve alguma resistência ao Estado de Emergência, tanto passiva quanto ativa, pois boa parte da população está na informalidade do comércio, dependendo da venda diária de produtos para sustento da família.

Jornal GGN – Mário de Lemos, angolano, é Psicólogo Criminal, Docente Universitário da Universidade Metodista de Angola e da Universidade Técnica de Angola, além de porta-voz da Revista Psicólogos Angola. Ele aceitou participar desta série de entrevistas do GGN, porém por problemas técnicos a entrevista precisou ser escrita.

Até o dia 18 de abril, Angola contava com 24 casos de Covid-19, sendo 16 ativos, 6 recuperados e duas mortes. Todos os casos são importados, ou seja, pessoas que chegaram de países com circulação comunitária de vírus, sendo que destes 24 casos, 22 chegaram em voos de Portugal, 1 da África do Sul e 1 do Brasil.

Lemos relata que, desde o dia 8 de março, Angola decretou que todos os viajantes oriundos de países com circulação comunitária de vírus deveriam cumprir uma Quarentena Institucional Obrigatória, em locais organizados pelo governo. Os viajantes saíam dos voos direto para tais Centros de Quarentena e Hotéis.

Todos foram testados e foi exatamente neste grupo que os 22 casos foram detectados. As duas mortes também estão no grupo de pessoas que voltavam do estrangeiro.

Quanto ao isolamento social, no dia 24 de março, antes do primeiro caso, as aulas foram suspensas em todos os sistemas de ensino e, no dia 27 de março, começou a vigorar o Estado de Emergência de 15 dias decretado pelo Presidente da República, que impôs um conjunto de medidas de distanciamento social.

Nos dias anteriores ao início do Estado de Emergência, Mário relata que houve uma corrida desenfreada para a procura de bens essenciais, mas a partir do segundo dia, as coisas entraram nos eixos.

Houve alguma resistência ao Estado de Emergência, tanto passiva quanto ativa, pois boa parte da população está na informalidade do comércio, dependendo da venda diária de produtos para sustento da família. Isso dificultou e tem dificultado o cumprimento das medidas de prevenção, mas o manejo da crise tem sido feito com sucesso, tanto pelo governo como por parte da população. Em 11 de abril, o Estado de Emergência foi prorrogado por mais 15 dias, com mais medidas para controle da pandemia.

Na avaliação de Mário de Lemos, a comunicação do governo com o povo não prima pela excelência, mas tem surtido efeitos para a realidade. Foi criada uma Comissão Interministerial, e esta já fez várias coletivas. As atualizações dos dados no país têm sido feitas diariamente, em boletins a partir das 19h de Angola (15h no Brasil).

Com relação aos trabalhadores que precisam de ajuda e outras populações, o Executivo angolano, com ajuda de parceiros, elaborou um conjunto de medidas que passam pela distribuição de cestas básicas, água para os bairros sem canalização e a colocação de moradores de rua em Centros de Acolhimento. Para Mário, pode-se dizer que tais medidas conseguiram 60% de eficácia.

Os mercados abrem em dias alternados para que pessoas possam fazer suas vendas. Mas, segundo ele, nem tudo corre às mil maravilhas.

Angola tem um sistema de saúde bastante precário, com poucos hospitais especializados e com muitas doenças endêmicas, e que matam diariamente.

Apesar de algumas melhorias conseguidas depois de algum investimento em termos humanos e materiais, o sistema de saúde está longe da excelência. Os dirigentes angolanos, por anos, sempre preferiram tratar de sua saúde e dos seus no exterior, o que não ensejava uma aposta séria neste setor.

Mário afirma que Angola não está preparada para enfrentar uma demanda dos números que ocorrem na Europa e América, por isso tem apostado na prevenção. A Saúde é pública e universal, mas existem os serviços de saúde privados e que, a esta altura, estão se ligando ao Executivo para enfrentamento da pandemia.

O governo angolano solicitou mais de 240 médicos cubanos, de várias especialidades, que chegaram no dia 12 de abril para o trabalho conjunto com os médicos locais em todos os municípios. Mais de 300 respiradores foram adquiridos e foram montados Centros de Quarentena e Tratamento em todas as 18 províncias.

Apesar dos receios da OMS, Angola e África têm sabido lidar com a doença, pois foi muito rápida em acatar as medidas de prevenção ditadas pelo Estado de Emergência, diz Mário. E cabe à Angola e à África darem uma resposta positiva ao mundo, entende ele, não se vitimizando, mas dando um exemplo de trabalho e mostrar o outro lado.

A demografia é outro ponto em favor da África, que é um continente muito jovem, com idade média de 18 anos. Por outro lado, a África já tem alguma experiência em lidar com doenças virais muito letais, tal como a ebola, que tem assolado os Congos.

Lemos diz que já há, hoje, um maior cumprimento das medidas de prevenção ditadas pelo Estado de Emergência e pela OMS. É obrigatório o uso de máscaras por parte de todos os profissionais de saúde, atividades recreativas estão proibidas e há cerca sanitária em todas as províncias, ou seja, ninguém vai a outra província se não for por extrema necessidade. E quem vai de uma província a outra é obrigado a cumprir quarentena.

Os transportes públicos foram obrigados a reduzir a sua capacidade de levar passageiros, ou seja, só podem carregar a metade ou menos em cada viagem.

Na outra ponta, relata Mário de Lemos, o número de pessoas com máscaras e luvas nas ruas aumentou bastante, o que fez surgir o negócio das máscaras de tecido.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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