Testemunho de um médico brasileiro sobre o Mais Médicos

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Foto Araquém Alcântara
 
 
Jornal GGN – O médico brasileiro Henrique Schlossmacher Passos, de Florianópolis-SC, viveu a experiência de médicos cubanos no Brasil. Ele ministrou aulas em Cuba, nos módulos de preparação de médicos antes que viessem para cá, e também foi supervisor desses profissionais em áreas bem ermas. Henrique critica a visão corporativista e a ignorância do brasileiro ao se referir aos médicos cubanos, que se esmeram em atendimento humanizado e no estreitamento de relações com seus atendidos. 

 
Leia o testemunho a seguir.
 
TESTEMUNHO DO MÉDICO BRASILEIRO  HENRIQUE Schlossmacher Passos, de Florianópolis, SC
 
“Alguns esclarecimentos, vindos daqui, de quem trabalhou e supervisionou aproximadamente 20 médicos cubanos desde 2015, no Vale do Javari (alto Solimões), no alto rio negro e em Roraima… Atendendo aldeias indígenas (Marubo, Mati, Kanamari, Baré,, Baniwa, Tucano,  Hupda, ingaricó, wapixana, yanomami,  macuxi… só pra citar algumas etnias) que antes não contavam com médico:
 
1. Nenhum médico foi obrigado a vir. Todos estavam muito contentes em servir, numa missão internacionalista, levando saúde aos povos. Inclusive, os médicos do qual fui professor em Cuba (módulos de preparação antes de virem ao Brasil, sobre SUS, epidemiologia brasileira, enfim…), constantemente me procuravam no Facebook querendo saber se eu sabia quando que o governo brasileiro iria chamar a próxima leva de médicos. Ficavam realmente ansiosos para vir. Viam como uma grande oportunidade profissional e financeira. 
 
2. 3 mil reais por mês no contexto cubano é muito dinheiro (1 kg de arroz em Cuba custa o equivalente a 0,08 reais, sim, 8 centavos). Além disso recebiam auxílio moradia e alimentação dos municípios, dos distritos indígenas…
 
3. O restante do dinheiro pago pelo governo brasileiro ia para Cuba, investido na formação de mais médicos que são enviados para missões no mundo todo (é o país que mais exporta médicos no mundo – alguns países exportam armas, outro nióbio, outros médicos…). Esse dinheiro é investido em saúde e educação de qualidade, grátis. Lembrando que a maioria dos países que recebem médicos cubanos, recebem sem custo. Quem paga é o governo cubano. Esse foi o caso no Haiti, no Congo, no Nepal, Angola e Paquistão…
 
4. Esses médicos ficavam 3 anos trabalhando nas aldeias. Vínculo e longitudinalidade recordes. Eu que sou um médico que curte estar no mato, dormindo em rede, sem wi-fi, não fiquei mais que um ano como médico de área indígena. Quis voltar a Floripa, pelos meus hábitos e maneiras.
 
5. Esses dias agora nas aldeias indígenas na terra indígena raposa da serra do Sol. Vi médicos cubanos chorando pelo fim do programa. Vi equipes de saúde emocionadas por nunca antes terem trabalhado com um médico tão compromissado e humilde. Vi médicos chorando de tristeza pelo povo que atendiam. 
 
Eu vi e vivi isso. Estava em área indígena com um médico cubano, quase fronteira com Guiana quando recebemos a noticia do rompimento de Cuba. Lamentamos, choramos juntos. Eu estava sentado e cabisbaixo. Quando o médico cubano, Miguel, toca meu ombro, sorri, e diz: “ei, doutor, vamos lá colega, não desanima, tem uma paciente gestante esperando, há trabalho agora. Levanta.”
 
Então: vontade de mandar tomar no monossílabo quem diz que eram escravos. Quem vem com cinismo classista e coorporarivista, falar do alto da distância e da indiferença, da ignorância das realidades dos rincões desse país, desse povo e das nações indígenas.”
 
TESTEMUNHO DO MÉDICO BRASILEIRO – HENRIQUE Schlossmacher Passos, de Florianópolis, SC
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. Porcos num chiqueiro são mais dignos do quem um Coxinha

    “[…]

    A burguesia não repara na dor
    Da vendedora de chicletes
    A burguesia só olha pra si
    A burguesia só olha pra si
    A burguesia é a direita, é a guerra

    […]

    Porcos num chiqueiro
    São mais dignos que um burguês
    Mas também existe o bom burguês
    Que vive do seu trabalho honestamente
    Mas este quer construir um país
    E não abandoná-lo com uma pasta de dólares
    O bom burguês é como o operário
    É o médico que cobra menos pra quem não tem
    E se interessa por seu povo
    Em seres humanos vivendo como bichos
    Tentando te enforcar na janela do carro
    No sinal, no sinal
    No sinal, no sinal

    A burguesia fede
    A burguesia quer ficar rica
    Enquanto houver burguesia
    Não vai haver poesia”

    Cazuza, Burguesia

  2. Belo relato:

    Belo relato. 

    Entretanto, os reacionários, golpistas e ignorantes políticos brasileiros não vão concordar com nada disso. A lavagem cerebral da mídia oligopolista para criminalizar o PT foi muito bem sucedida, infelizmente. Pra essa gente, vale tudo para afastar o “risco PT”.

     

  3. Menos médicos

    Durante todo o tempo dos Mais Médicos houve um problema especifico que é com Cuba. Parace que é completamente alheio ao brasileiro a compreensão do funcionamento politico cubano e, como todo papagaio de telejornal, repete sem reflexão as bobagens sobre Cuba e comunismo. A direita sempre deu um jeito de passar a mão na carteira dos trabalhadores enquanto grita “pega ladrão”.

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