“Políticas regionalizadas incentivam competição entre escolas”, aponta especialista

Ana Basílio, do Centro de Referências em Educação Integral

A avaliação das políticas de educação prioritárias implementadas pela França e outros países da Europa deu sequência ao debate sobre as desigualdades socioespaciais e escolares em seminário realizado pelo Cenpeq na última quarta-feira (06/11), no Sesc Pinheiros, em São Paulo.

O professor e sociólogo francês Sylvain Broccolichi se debruçou sobre os resultados alcançados com as ZEPS (zona de educação prioritária) – primeira política educativa francesa de ação afirmativa implementada já nos anos 80 –, para evidenciar a necessidade da criação de políticas públicas educacionais cooperativas e integradas. O especialista apontou que grande parte das iniciativas regionalizadas acaba por estimular a concorrência entre as unidades escolares e fortalecer a hierarquização, segregando ainda mais os espaços.

Na análise de Broccolichi, a França vivenciou um exemplo claro desse cenário com as ZEPs. As ações de caráter sócio-econômico, urbanista e cultural previstas aos territórios franceses com alta vulnerabilidade social e altos índices de fracasso escolar tiveram maior eficiência nas escolas de zona rural, onde não há predomínio de competitividade. Nas zonas urbanas, onde a oferta de aparatos educacionais é maior, prevaleceu o esvaziamento desses locais, evidenciando que eles não figuram entre a escolha das famílias e nem dos professores, que acabam migrando para espaços educativos considerados melhores.

Por outro lado, nas escolas que se sobressaíram com melhorias educacionais foi condicionante a presença de uma equipe pedagógica estável e que atuava em regime de cooperação diante das tomadas de decisões, envolvendo também os familiares dos alunos.

Para o especialista, esses dados são fundamentais na construção de uma política assertiva. Mas, para tanto, é preciso análise. “Entender a necessidade de continuação ou reforço dessas iniciativas a longo prazo”, reforçou. Na visão de Broccolichi, isso é o que torna exemplo a realidade educativa da Finlândia: “lá as avaliações são ferramentas a serviço da ação e não meios para fazer com que os estabelecimentos compitam entre si”, pontuou. Os diagnósticos compartilhados trariam, de acordo com o professor, uma busca de soluções mais realistas aos territórios vulneráveis.

Cenário nacional

A necessidade de uma política de cooperação com esforços de objetivação e entendimento também é sentida pelos gestores da cidade de São Paulo. Manoel Romão de Souza, diretor regional de educação de São Miguel Paulista, zona leste de São Paulo, listou como principal desafio local a manutenção dos professores. “O acúmulo de conhecimento acaba por fazer com que eles migrem para localidades menos problemáticas”.

Para Fátima Aparecida Antônio, diretora de Ensino Fundamental e Médio da Secretaria Municipal de Educação, embora existam problemas locais, o desafio é de toda a rede. “É preciso uma política de integração aos territórios que preveja, inclusive, o estreitamento com as famílias”. No entanto, Fátima pontuou que essas iniciativas devem ser encaradas como “políticas de estado”, com continuidade e reajustes em longo prazo.

Cleuza Repulho, secretária de Educação de São Bernardo, citou a formação dos professores como ponto chave para a manutenção das equipes nos locais de maior vulnerabilidade. “Temos professores especialistas em Vygotsky que se desesperam diante da primeira dificuldade de aprendizagem. Precisamos olhar para a formação deles. Hoje, fica claro que a oferta não dá conta da vida real. Ou estreitamos o diálogo das universidades com as escolas públicas ou vamos continuar ‘enxugando gelo’”. Para Cleuza, a pobreza territorial não é condicionante para qualificar a educação.
Ainda assim, Maria Alice Setubal, presidente do Conselho do Cenpeq, afirmou que acredita ser prudente a criação de uma política de enfrentamento à violência nesses territórios em diálogo constante com outros atores locais. “Em São Paulo, nos centros expandidos, não fica clara a liderança exercida pelos poderes paralelos. Mas quem vive diariamente nos territórios vulneráveis sente isso na pele”, concluiu.

Redação

1 Comentário

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  1. Ë meio que óbvio isso, mas vale a pena dizer

    Nem sempre o óbvio é facilmente visível, porque mauitas vezes vai contra a ideologia e os interesses de quem poderia ver mas nao vê. TODAS AS POLÍTICAS BASEADAS APENAS EM “BÔNUS”, AVALIAÇOES E QUETAIS SÓ PROVOCAM FRAUDES, NAO MELHORIAS REAIS. Desvirtuam todo o trabalho feito. 

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