A eleição à esquerda hoje, hoy, today, por Vinícius Canhoto

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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A eleição à esquerda hoje, hoy, today

por Vinícius Canhoto

Boulos e o PSOL

O portal UOL trouxe dois artigos sobre o PSOL e Guilherme Boulos. Ambos vão ao mesmo sentido: o da desconstrução do candidato. O artigo do Estadão trata do “mal-estar” interno no interior do partido que, ao filiar Boulos para candidatar-se a presidente, com anuência de Lula, teria provocado irritação em outros pré-candidatos do partido. A estratégia de filiar Boulos traz para o PSOL algo que o partido jamais possuiu: base social. Desta forma, o partido pode adquirir base popular e deixar de ser um mero partido parlamentar e de intelectuais de classe média e acadêmicos. Talvez tal estratégia tenha, segundo a matéria jornalística, “irritado” os demais pré-candidatos do PSOL justamente por trazer ao partido o que ele nunca teve: base popular.

Já a Folha de São Paulo traz um artigo, escrito por Mathias Alencastro, que trata da filiação de Boulos como um possível ocaso do PSOL. O autor traz conceitos frágeis como “pós-marxismo” e “novo populismo”, debate os argumentos de Juliano Medeiros e Ivan Valente que afirmam: “A candidatura de Boulos terá a marca da luta e da mobilização popular, inspirada nas novas experiências da esquerda de unidade e organização de baixo para cima, a exemplo do que ocorre em países como Espanha, Portugal, França e Chile”. A crítica do autor fica para o final quando Alencastro escreve: “[…] ao endossar de forma tão entusiástica como apática a candidatura de um recém-filiado, o ‘velho’ PSOL, caracterizado pela sua miopia política, declara o fracasso de sua agenda programática e se prepara para desaparecer alegremente na sombra do eu novo líder” (FSP 07/03/2018). Os jornais se notabilizaram nas últimas décadas muito mais pelo o que deixaram de noticiar do que por aquilo que noticiaram fator que traz a pergunta: Por que tal candidatura provocou tantos ruídos?

Guilherme Boulos pode vir a ser o grande herdeiro político de Lula. No atual cenário nacional não há nenhuma outra liderança popular que tenha sua origem proveniente da luta nos movimentos sociais e possa representar eleitoralmente os diversos movimentos populares. Pode ser um grande quadro para o futuro pós-Lula.

Manuela D’Ávila e o PCdoB

O grande quadro atual do PCdoB é o governador do Maranhão Flávio Dino. No entanto, a luta regional para encerrar o ciclo da dinastia Sarney na política maranhense é mais imediata. Há outros interessantes quadros políticos locais como Luciana Santos, Jandira Feghali e Manuela D’Ávila, que podem se candidatar a qualquer cargo majoritário para as disputas locais ou se candidatarem aos cargos legislativos aos quais serão facilmente conduzidas ou reconduzidas pelos bons serviços prestados à população. Mas o fator novo é a candidatura de Manuela D’Ávila à presidência da república. Uma inexplicável candidatura que já nasceu com cara de vice. Talvez a estratégia seja imediata de trazer votos por conta da cláusula de barreira ou de compor com outra candidatura majoritária ou uma estratégia de formação de um quadro nacional para o futuro. O jogo do PCdoB ainda é tão obscuro quanto a saída do seu eterno curinga: Aldo Rebelo.

Ciro Gomes e o PDT

A estratégia anfíbia de Ciro Gomes com seu “morde e assopra” tem demonstrado cada vez mais que não se trata de um candidato de esquerda. Ciro claramente busca uma posição cada vez mais fetichizada: o centro. Tenta ser radical para um eleitor de esquerda e moderado para um eleitor de direita. Assim, ele acredita que está na posição correta sendo ao mesmo tempo ácido crítico ao PT e ao PSDB. Muitas de suas críticas não são levianas, são corretas, porém eleitoralmente quem tem capturado para si as intenções de voto anti-petista e anti-tucano é o Bolsonaro. Há uma desconfiança mútua entre Ciro e Lula. Ciro sabe que só será eleito se Lula sair do páreo e não só isso, sabe também que precisa herdar os eleitores órfãos de Lula. Já Lula nunca fez de Ciro o seu candidato.

Caso não mude seu discurso e abandone a ambigüidade, Ciro Gomes corre o risco de sofrer o “efeito Marina Silva”, em suma, marinar-se. Marina Silva tentou (assim como o PSOL) angariar o eleitorado com a crítica a Lula e ao PT pela via da ética e pelas contradições petistas. Mais que o discurso da ética, o discurso da esquerda (que pode em determinados contextos representar os anseios das classes populares) é o da igualdade e não o da ética. O discurso da ética na política é o discurso para uma classe média hipócrita e ciosa de perpetuar privilégios. Não basta para Ciro dizer, assim como Marina sempre diz, que tem a “ficha limpa”. Mais que um passado desprovido de escândalo, a população quer maiores e melhores oportunidades de emprego, renda e políticas públicas. O discurso econômico de Ciro é sólido, porém seu personalismo e a ausência de um conjunto político em seu entorno, que forme uma base política sólida, dão margem à desconfiança. Queimar as “pontes” com Lula e o PT (se é que essas “pontes” de fato existam) pode tornar Ciro um candidato de si mesmo como Marina Silva foi e continua sendo. Marina ao ser candidata da Natura e do Banco Itaú, ao defender o tripé econômico, ao abraçar Aécio Neves, deixou claro qual classe social é representante. Ciro Gomes precisa decidir se irá governar para a “Casa Grande” ou a “Senzala” para a rede Globo ou para o povo pobre.

Lula e o PT

Apesar das pesquisas de intenções de voto indicarem Lula como o franco favorito para ganhar as eleições, talvez já no primeiro turno. Lula tem a oposição de dois grandes partidos hegemônicos no país: o PIG (Partido da Imprensa Golpista) nome popularizado pelo jornalista Paulo Henrique Amorim e mais recentemente o que chamo de PJG (Partido do Judiciário Golpista). Ambos patrocinadores do golpe, incriminadores e executores da caçada judicial contra o ex-presidente. Lula tem sido sistematicamente derrotado pelo Partido Judiciário (da primeira instância aos tribunais superiores) podendo ser excluído do pleito. Alegar ilegalidade das condenações se tornou ingênuo e insuficiente porque o PJG se tornou o principal partido e artífice do golpe de Estado ocorrido neste país. Lula e o PT não têm outra alternativa e manter a ofensiva política e a mobilização de resistência. Defender Lula contra uma injusta prisão e defender seu direito de ser candidato hoje significa defender uma frente contra o golpe patrocinado pelo PIG e o PJG. E não é só isso. A ausência de Lula das eleições pode beneficiar sim Jair Bolsonaro. O maior contingente de eleitores de Lula não é necessariamente de esquerda. E isso a esquerda precisa compreender. Aceitar este cenário é aceitar o golpe e a criminalização de todo o movimento social. Abandonar Lula significa abandonar estes eleitores a Bolsonaro ou qualquer outro aventureiro. Contar com o poder da transferência de voto para outro candidato petista também é perigoso porque não se trata mais do Lula que acabou de sair da presidência da república com aprovação recorde. Também vale destacar que não há nenhuma figura histórica dentro ou fora do PT da envergadura e representatividade popular de Lula. Abrir mão deste capital político pode ser suicídio coletivo.

A tese do pênalti sem goleiro

O golpe foi dado e tem se aprofundado porque a classe social representada pelos partidos citados acima percebeu que o poder de mobilização das esquerdas, de Lula e do PT está bastante reduzido. Nenhuma manifestação das classes populares superou as manifestações promovidas pela direita. Isso permitiu o avanço do golpe. As apostas em um futuro eleitoral também são bastante nebulosas, porque primeiro estamos vivendo um golpe de Estado e sob um regime de exceção, portanto não há certeza das eleições, a mesma dúvida paira sobre a candidatura Lula. O melhor jogador da camisa vermelha está prestes a receber o cartão da mesma cor que o de sua camisa. O jogo sob as regras golpistas não apenas tem goleiro e o adversário em franca ofensiva como também tem o juiz da partida para apitar contra e, diante da eventual incapacidade do jogador da direita fazer o gol, pode o próprio juiz ir bater o pênalti para garantir o resultado. Isso, claro está, caso não aparecer no meio do jogo um jogador para bater o pênalti de coturno.

 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

2 Comentários

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  1. “Nenhuma manifestação das

    “Nenhuma manifestação das classes populares, segundo a Globo, a Band, a RBS, o OESP, a Abril e a Folha de São Paulo além das estatísticas da polícia do PSDB, superou as manifestações promovidas pela direita.”

    Se as declarações de intenção de voto que apontam para Lula não são “manifestação das classes populares”, não sei o que são…

    Cuidado: à portuguesa, Boulos pode nos surpreender, hein?

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