Carta aberta a FHC, por Flavio Lobo

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

do Terra Magazine

Chegou a hora do vamos ver, senhor presidente

O candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, ao lado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (Foto: Arquivo/Divulgação/PSDB)

O candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, ao lado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (Foto: Arquivo/Divulgação/PSDB)
 
Por Flavio Lobo*
 
CARTA ABERTA AO EX-PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
 
Prezado ex-presidente Fernando Henrique,
 
Nos últimos anos o senhor tem se destacado, no Brasil e no exterior, como militante de uma nova abordagem para as políticas de drogas. Crítico da guerra às drogas, o senhor se tornou um dos mais conhecidos defensores de políticas que avancem no sentido na descriminalização, regulação e redução de danos.
 
Boa parte dos que já lutavam por essas mudanças quando o senhor as abraçou acolheu o senhor como companheiro e festejou a maior visibilidade e a ampliação do poder de persuasão que o seu engajamento trouxe para a causa. Outros viram a sua “conversão” com desconfiança, considerando-a mais uma estratégica para reconquistar atenção e relevância por meio da associação a uma bandeira que vem ganhando terreno e adesões mundo afora.

 
Os mais céticos lembravam que, quando presidente, o senhor teve a oportunidade de pelo menos começar a mudar os rumos do país em relação à política de drogas e não a aproveitou. Alguns diziam, inclusive, que o seu novo engajamento não resistiria a “testes de estresse”. Apostavam que bastaria que disputas de poder se apresentassem como empecilho à defesa da causa para o senhor voltar a negligenciá-la.
 
Pois bem, estamos em pleno teste de estresse.
 
Segundo o noticiário, além do entusiasmado apoio público que vem dando ao candidato do seu partido à Presidência da República, o senhor vem atuando nos bastidores como articulador da candidatura, da campanha e de alianças políticas de Aécio Neves. A defesa da redução da maioridade penal é uma das bandeiras dessa campanha. Além de frequentemente presente na propaganda do candidato, ficamos sabendo, em razão das negociações para receber o apoio de Marina Silva no segundo turno, que se trata de uma proposta inegociável – uma daquelas, portanto, que revelam a essência e o caráter do projeto de país representado pela candidatura Aécio.
 
A proposta de redução de maioridade penal defendida por Aécio e seu grupo é a mesma que foi apresentada no Congresso pelo senador Aloysio Nunes Ferreira. De acordo com ela, adolescentes a partir de 16 anos de idade poderão ser presos como adultos, em presídios comuns, se cometerem um crime hediondo ou algum dos delitos que a atual legislação brasileira classifica como igualmente grave. O tráfico de drogas é um desses delitos.
 
Resultado perverso do proibicionismo, o aliciamento de jovens pela indústria do tráfico já resulta em privação da liberdade de milhares de adolescentes brasileiros, pobres e pretos ou pardos em sua grande maioria. Se aprovado, o projeto defendido pela candidatura articulada pelo senhor irá piorar essa tragédia. Garotos de garotas de 16 e 17 anos pegos com alguma droga ilícita e sentenciados como traficantes poderão cumprir pena de reclusão em nosso vergonhoso sistema penitenciário. Poderão passar vários anos no cárcere, provavelmente sofrerão violências variadas e sairão não mais como recrutas, mas como sargentos ou tenentes de facções criminosas.
 
A proposta de redução da maioridade penal defendida pela candidatura articulada pelo senhor é um acirramento da guerra às drogas que o senhor tanto critica. Com o agravante de reforçar o viés punitivo dessa política falida justamente contra pessoas mais vulneráveis – adolescentes pobres, pretos ou pardos -, que atualmente já são vítimas contumazes tanto da repressão policial quanto da atuação discriminatória de boa parte do nosso sistema de justiça. Se aprovada, essa proposta resultará no aprofundamento de duas das maiores mazelas nacionais, legítimos carros-chefes da guerra às drogas: a criminalização da pobreza e o encarceramento em massa.
 
No momento em que ameaça dessa gravidade se apresenta como iminente, é hora de aqueles que lutam por uma política de drogas mais racional, justa e eficaz mostrarem a cara – inclusive, se necessário, correndo alguns riscos – para denunciar, esclarecer e resistir.
 
Escrevo-lhe para dizer que estou sentindo falta do senhor neste momento decisivo. E que muita gente boa ainda espera poder reconhece-lo como companheiro também na hora do vamos ver.
 
 
*Flavio Lobo é jornalista, mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP, professor e consultor de comunicação. Contato: [email protected]

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

9 Comentários

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  1. Confesso que não entendi o

    Confesso que não entendi o objetivo da carta, pois critica e pede ajuda a uma figura nefasta da política brasileira. Está mais do que na hora de esquecer essa figura que recebeu o fardão dos imortais em letras tendo pedido que esquecessem o que ele escreveu. Guimarães Rosa x Sarney… Machado de Assis x FHC… Só rindo.

  2. Ai, ai…

    É bom recordar o legado de ffhhcc na “war on drugs”: Lei do Abate (Lei 9614/98), a verdadeira institucionalização da execução pelo Estado, e “melhor”, sem processo legal algum…

    Com a devida justiça, essa política oficial de extermínio foi implantada goela abaixo até de gente que hoje posa de vestal, o “colonista” jurídico da Carta Capital, Walter F. Maierovich, então no comando da SENAD…

    Alguém realmente leva a sério o que ffhhcc diz ou escreve?

  3. O amigo

    Nassif,

    Se estão sentindo falta de FHC, o amigo nº1 dos nordestinos, assim permanecerão.

    Depois da última de inúmeras derrapadas, o sociólogo das trevas se mandou, pegou um avião e foice, para completa infelicidade da campanha de DRousseff.

    Com 83 anos de idade, bem faria o lesa pátria se ficasse em casa pajeando os netos, se distraindo com sudoku (nível elementar), seria ótimo para todos.  

    O sujeito esteve no trono durante oito anos, e nem assim foi capaz de conhecer o brasilsil.

  4. As forças mais reacionarias e

    As forças mais reacionarias e facistas do país estão com os Bicudos, (neste caso não estou falando de consumo de droga).

  5. Ninguém lembra dos cinco dedos do FHC em 94?

    Eram cinco prioridades. Não falava em nenhum momento em privatização.

    Muito menos na privataria.

    O pior do Aécio é o que ele não diz que vai fazer.

  6. Não vamos privar nosso

    Não vamos privar nosso ególatra de falar. Todas as vezes que ele abre a boca ajuda e muito a campnha de Dilma! Fala FHC! Fala!

  7. perigoso apoio

    GREGÓRIO DUVIVIER ESCANCAROU A PORTA DOS FUNDOS.

    Moro na zona sul do Rio e tenho observado que nesta eleição os ânimos estão bastante acirrados. O pleito mais parece um Fla-Flu do que uma uma corriqueira disputa política. Mesmo no chamado “meio artístico” o festival de baixarias tem sido constante. No baixo Gávea e no Baixo Leblon, redutos tradicionais da “intelectualidade” carioca, moças e rapazes se degladiam na defesa de seus candidatos. Salta aos olhos a predominância de eleitores de Aécio na boemia carioca da zona sul, talvez pelo fato de o candidato ter sido um assíduo frequentador dessa área da cidade por muitos e muitos anos. É visível o apoio a Aécio daqueles que defendem a discriminalização das drogas e são contra as UPPs. São, na sua grande maioria, pessoas de alto poder aquisitivo e que se veem constrangidos com a política de segurança do estado que reprime o tráfico de drogas. Não estou defendendo aqui candidatos ou políticas de segurança, mas sim constatando uma obviedade ululante, ou seja: o apoio quase que maciço dado a Aécio nas àreas mais ricas da cidade se dá pelo fato de o principal baluarte do partido – FHC – defender a liberalização das drogas e isso é dito em alto e bom som nas rodinhas de chopp e de bate papo. Verdadeiras  milícias formadas por pit-bulls, rapazes musculosos, integram o grupo dos que apoiam o candidato do PSDB, hostilizando todos aqueles que declaram voto a candidata do PT. Somam-se aos aecistas, paradoxalmente, ripongas, moradores dos morros e abastados senhores e senhoras que habitam as mais caras residências do país. Não é a toa que Dilma veio ontem ao RJ e permaneceu na baixada e na Zona Oeste do estado, evitando as áreas mais ricas da cidade e do estado. Que a “intelectualidade ” da zona sul do RJ deixou há muito de representar a visão mais avançada da esquerda brasileira todos já sabemos. Lobão, Gabeira, Caetano, Jabor e companhia estão aí para provar o que digo, mas daí a meter porrada naqueles que discordam de seus posicionamentos é algo que ultrapassa os limites da racionalidade. 

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