Lei da Ficha Limpa: instrumento de controle na democracia brasileira

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – A Lei da Ficha Limpa fez o Ministério Público Federal barrar 241 candidatos, que ainda serão julgados pelo Tribunal Superior Eleitoral. A principal ferramenta para a Procuradoria Geral Eleitoral é um passo novo na história da democracia brasileira. Desde que foi criada, há quatro anos, é a primeira vez que a Lei da Ficha Limpa está sendo usada em eleições gerais. Entenda como funciona a Lei e o seu histórico:

Do Consultor Jurídico

Após quatro anos, Lei da Ficha Limpa será usada pela primeira vez em eleições gerais

No seu aniversário de quatro anos de vigência, a Lei da Ficha Limpa será aplicada pela primeira vez em eleições gerais. Sancionada em 4 de junho de 2010, a Lei Complementar 135/2010 contou com o apoio de 1,3 milhão de assinaturas para sua aprovação pelo Congresso Nacional. A legislação prevê 14 hipóteses de inelegibilidade que impedem a candidatura de políticos que tiveram o mandato cassado, de condenados em processos criminais por órgão colegiado ou dos que renunciaram aos seus mandatos para evitar um possível processo de cassação. A punição prevista na lei é de oito anos de afastamento das urnas como candidato.

A lei entrou em vigor no dia 7 de junho de 2010, data de sua publicação no Diário Oficial da União, mas foi aplicada também nas eleições municipais de 2012. Em agosto de 2010, o Tribunal Superior do Trabalho decidiu que a lei seria aplicável às eleições gerais daquele ano, ao analisar o primeiro caso sobre indeferimento de um registro de candidatura com base na inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa. Porém, o Supremo Tribunal Federal definiu que a lei não poderia ser adotada para as eleições gerais de 2010, pois desrespeitaria o artigo 16 da Constituição, que trata do princípio da anualidade eleitoral e dispõe que “a lei que alterar o processo eleitoral não poderá ser aplicada à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. Após dois anos de julgamento, em fevereiro de 2012, a Lei da Ficha Limpa foi considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

 

Naquele ano, a Lei da Ficha Limpa impediu que pelo menos 868 candidatos a prefeitos, vice-prefeitos e vereadores a se candidatassem. A Justiça Eleitoral julgou milhares de processos referentes a candidatos apontados como inelegíveis de acordo com a lei. Dos 7.781 processos sobre registros de candidatura que chegaram ao TSE sobre as eleições de 2012, 3.366 recursos tratavam da Lei da Ficha Limpa, o que corresponde a 43% do total.   

O especialista em Direito Eleitoral e analista judiciário do TSE Eilzon Almeida lembra que a Lei da Ficha Limpa não é uma lei nova em relação à inelegibilidade e que a primeira norma sobre o tema foi a Lei Complementar 64/1990 (Lei de inelegibilidades), alterada pela Lei Complementar 135/2010.

Para Eilzon, a demanda da população para alterar a lei se deu pelo fato de que, após quase 20 anos, a chamada Lei de inelegibilidades começou a ficar defasada. Os prazos de inelegibilidade eram relativamente curtos, de três anos. Segundo ele, casos clássicos, como a renúncia de mandato para fugir de uma cassação, não eram considerados. Outro exemplo era o de que a cassação por compra de votos não impedia o candidato de concorrer em eleição seguinte. “Por essas situações e também para tornar mais rigorosos os prazos de inelegibilidade veio a lei, a população trazendo esse projeto com mais rigor em relação às candidaturas”, conclui.

Improbidade administrativa

Com o propósito de fornecer à sociedade e às instituições um controle daqueles que tiveram condenações definitivas, em 2007, o Conselho Nacional de Justiça criou o Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa. A partir de julho de 2013, o cadastro passou a ser alimentado também com informações do Poder Judiciário sobre condenados por atos que tornam o réu inelegível, de acordo com a Lei da Ficha Limpa. Com as alterações, o sistema passou a se chamar Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa e por Ato que Implique Inelegibilidade.

Todos os integrantes do sistema de Justiça dos órgãos do Poder Judiciário são obrigados a alimentar o cadastro. Recentemente, o CNJ firmou acordo com os tribunais de contas dos 26 estados e do Distrito Federal para fornecerem informações que possam facilitar a identificação de candidatos inelegíveis, como contas de exercícios ou funções públicas rejeitadas por irregularidades insanáveis (parágrafo 5º, artigo 11, da Lei nº 9.504/1997) — uma das hipóteses de inelegibilidade pelo período de oito anos. Também assinaram o acordo de cooperação a Corregedoria Nacional de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça, o Conselho da Justiça Federal, a Corregedoria-Geral da Justiça Federal, o Superior Tribunal Militar, a Corregedoria da Justiça Militar da União e o Tribunal de Contas da União.

O acesso às informações públicas do CNCIAI pode ser feito pelo endereço http://www.cnj.jus.br/sistemas. Neste link, é possível fazer buscas utilizando o nome ou o CPF da pessoa investigada.

De acordo com a Lei da Ficha Limpa, a inelegibilidade alcança os que forem condenados pelos seguinte crimes: contra a economia popular, a fé pública, a Administração Pública e o patrimônio público; contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; contra o meio ambiente e a saúde pública; eleitorais para os quais a lei determine a pena de prisão; de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; de tráfico de entorpecentes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos; de redução à condição análoga à de escravo; contra a vida e a dignidade sexual; e delitos praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando.

A Lei da Ficha Limpa também torna inelegíveis os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure improbidade administrativa. Estão na mesma condição aqueles detentores de cargos públicos que beneficiarem a si ou a terceiros pelo abuso do poder econômico ou político.

Estão incluídos na condição de inelegíveis os que forem condenados por corrupção eleitoral, compra de votos, doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma.

Os políticos que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da constituição estadual, da lei orgânica do Distrito Federal ou da lei orgânica do município também são inelegíveis. Estão na mesma condição os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, por ato intencional de improbidade administrativa que cause lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.

Da mesma forma são inelegíveis os que forem excluídos do exercício da profissão, em decorrência de infração ético-profissional, e os que forem condenados em razão de terem desfeito ou simulado desfazer vínculo conjugal ou de união estável para evitar caracterização de inelegibilidade.

A lei ainda inclui os que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial, e a pessoa física e os dirigentes de pessoas jurídicas responsáveis por doações eleitorais tidas por ilegais. Por fim, são inelegíveis os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente por sanção, os que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar.

Clique aqui para ler a Lei da Ficha Limpa.

Leia também: Balanço MPF: 241 candidatos barrados pela Lei da Ficha Limpa

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

12 Comentários

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  1. Nas vésperas das eleições o
    Nas vésperas das eleições o ex-ministro da ditadura que referendou o AI-5 e “respeitado” interlocutor da esquerda meia boca, sr. Delfin Neto, revelou ao jornal paulista que emprestava veículos à OBAN seu voto para senador e dep. federal: Serra e o “ficha limpa”, procurado pela Interpol em 151 paises e governador nomeado pela ditadura, Paulo Maluf.
    A esquerda meia boca colhe o que planta.
    Vou sair para vomitar.

  2. “…ou dos que renunciaram

    “…ou dos que renunciaram aos seus mandatos para evitar um possível processo de cassação.”

    O deputado pelo PT/Pará Paulo Rocha renunciou por causa de injusta acusação no caso mensalão. Para se livrar da caça as bruxas, renunciou ao mandato. Isso foi em 2005. Somente em 2012 foi julgado na AP 470* e absolvido. Se a lei vigesse naquele tempo não poderia concorrer a cargo público. Em 2010 concorreu ao senado e teve sua candidatura barrada pela lei da Ficha Limpa. Foi readmitido por que a lei foi considerada não ser aplicável naquele pleito. Ontem se tornou senador pelo Pará.

    Creio que impedir um cidadão nessas condições de concorrer é injustiça. Impedir a candidatura de condenados em definitivo acho certíssimo, mas nenhuma lei deve abrir brecha para injustiças.

    *Enquanto isso, os réus do mensalão tucano/mineiro estão tirando onda na primeira instância. Eduardo Azeredo e outros estão passeando de mãos dadas com Aécio Neves numa boa.

     

  3. Atestado de incompetência

    A lei da ficha limpa não passa de um remendo numa justiça esfarrapada.

    Condena antecipadamente aqueles que ela é incapaz de julgar no prazo justo.

    O prazo da sentença faz parte da Justiça.

    É um atestado de incompetência do judiciário.

  4. Existe?

    Lei da ficha limpa? Existe essa lei? Se existe porque o senhor serra saiu candidato e tornou-se senador?E porque o senhor alckmin dará continuidade a disnastia tucana em São Paulo? Ou essa lei é daquelas que foi feita “para não pegar” ? Um grande amigo europeu me disse uma vez que nossos legisladores fazem as leis cheias de furos para “escaparem” caso sejam pegos, e com a certeza de que as mesmas não serão  aplicadas porque senão seriam eles os primeiros a serem punidos.

    1. Amigo, pergunte isso ao Zé da

      Amigo, pergunte isso ao Zé da justiça, ele é o único capaz de nos esclarecer porque tucano não vai pra cadeia. E se ele responder avise-nos por favor, estamos ávidos por respostas

  5. A maior excrescência autoritária…

    Como uma decisão antes do trânsito em julgado, que priva o cidadão do seu direito de ser votado, pode ser comemorado como um instrumento de controle (de aspecto positivo)?

    Só na cabeça da classe mé(r)dia…

    Imagine que o cara seja absolvido em última instância, como repetir o pleito o qual ele foi impedido de concorrer, ou seja, com refazer a História?

    Juízes estão mais aptos a julgar que o eleitor? Onde? Em que lugar do planeta uma “justiça eleitoral” (aberração) determina o curso da Democracia?

    Eis a democratura do judiciário e do minstério público, eis o que comemoram os abutres da Democracia…

    1. Pista expressa

      Essa lei foi feita para varrer pra debaixo do tapete a incapacidade do judiciário de fazer justiça num prazo justo.

      É uma fila expressa para assuntos eleitorais, do mesmo jeito que a justiça eleitoral. Se botasse esse monte de juiz eleitoral pra trabalhar o ano inteiro não precisaria dela.

      Não haveria eleições a cada dois anos sem a pista expressa da justiça eleitoral. Como nem isso resolvou, tiveram que alargar a pista e cobrar pedágio.

      A justiça eleitoral é igual à marginal pedagiada da Castelo Branco. O percurso é mais rápido mas, se o guarda achar que você bebeu, vai em cana antes de soprar o bafômetro…

  6. obvio de controle, mas

    obvio de controle, mas controle do judiciario

    ministerio publico e judiciario, NAO ELEITOS, acabam fazendo papel de peneira de quem eu posso ou nao votar,,,,

    se sujeito comete crime, lei DEVERIA puni lo, mas a crime e crimes perante a lei, alem da seletividade dos julgamentos, ex classico mensalao pt x psdb

    o vice do psol ao gov de sao paulo na eleicao de 2010 foi impedido de receber votos por se acusado de ceder um onibus aos sem teto para fazer uma manifestacao,,,,,pelo judiciario, eu queria votar nele justamente por este motivo, FUI IMPEDIDO

  7. Esse Ficha-Limpa é a maior

    Esse Ficha-Limpa é a maior fraude; todo mundo sabe que nosso judiciário é elitista e seletivo, portanto, seus ” amigos” sempre serão ficha-limpa… Isso aí é transformar o Judiciário em colégio eleitoral. Eleições indiretas, portanto, e, pior pq os membros do colégio, sequer são representantes da sociedade.

  8. Melhor seria termos os nomes

    Melhor seria termos os nomes e os partidos dos que ficaram fora das eleições deste ano. Só me lembro de Arruda;/DF.

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