Da Folha
Poder dos EUA foi construído com crises e Estado, dizem acadêmicos
ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO
A afirmação está na conclusão de “The Making of Global Capitalism, the Political Economy of American Empire” (A Construção do Capitalismo Global, a Política Econômica do Império Americano, editora Verso), dos canadenses Leo Panitch e Sam Gindin.
Não, esse não é um livro sobre os atuais protestos no Brasil ou em outros lugares. Trata da história e da economia norte-americana desde o final do século 19 até os dias de hoje. Mostra os passos para a construção do poder dos EUA, enfatizando o papel do Estado no processo.
Panitch é cientista político, e Gindin, economista. Ambos são professores da Universidade de York, em Toronto (Canadá) e estruturaram o livro seguindo linhas marxistas.
Até chegar à conclusão acima, descrevem momentos de exuberância, crises, resgates. Ressaltam a importância do Tesouro e do Banco Central (Fed) na definição de políticas que consolidaram a força norte-americana no mundo.
ESTADOS E MERCADO
Os autores começam desconstruindo a “falsa dicotomia entre Estados e mercados”. Narram como o Estado atuou para estabelecer regras para a propriedade e competição que facilitaram a expansão das empresas dos EUA e a acumulação de capital.
Tarifas de proteção à produção nacional, programas de infraestrutura, financiamento à inovação: tudo foi usado para a montagem do poder americano no início do século 20. Na área externa, deu apoio a ditadores locais e a proprietários de terras, o que ajudou a bloquear desenvolvimento.
Fornecedor vital de materiais e dinheiro na Primeira Guerra Mundial, os EUA deslancharam o seu papel de potência mundial nos anos 1920. No final daquela década, produziam mais de 80% dos carros do mundo.
Veio a crise de 29, o New Deal, a Segunda Guerra Mundial. O livro aponta que o acordo de Bretton Woods significou a institucionalização do papel predominante dos EUA na gestão monetária internacional e o Plano Marshall enquadrou a Europa.
Charles Dharapak – 3.out.2008/Associated Press | ||
George W. Bush cumprimenta seu secretário do Tesouro, Hank Paulson, após aprovação de pacote de resgate de US$ 700 bilhões |
Na crise dos anos 1970, quando os lucros das empresas caíam, os autores afirmam que “a principal ameaça ao capitalismo global foi o número crescente de expropriações por ano de investimentos no Terceiro Mundo”. Elas passaram de uma média de seis, na primeira metade dos anos 60, para 56 na primeira metade dos anos 1970.
O livro aborda os empréstimos de petrodólares das instituições norte-americanas “a ditaduras latino-americanas”. O lucro era tentador. Segundo os autores, atingiu o pico de 233% de capitais e reservas dos bancos em 1981.
A partir da crise dos anos 1970, transformações ocorreram no campo das finanças e das estruturas de produção. O poder de reivindicação dos trabalhadores foi enfraquecido e houve a explosão das tecnologias digitais.
CRISE
Panitch e Gindin analisam o desmoronamento das hipotecas nos EUA e mostram como o Estado salvou bancos e lançou “o maior estímulo fiscal da história norte-americana em tempos de paz”. Para eles, “a crise reforça o papel do império dos EUA”.
Sem se aprofundar em avaliações sobre outros países, os intelectuais canadenses dizem que a China está longe de ameaçar a hegemonia dos EUA: avaliam que ela parece duplicar o papel suplementar que o Japão desempenha no modelo.
Talvez esse seja um ponto que merecesse maior análise. Assim como os aspectos políticos e militares. No conjunto, porém, o livro expõe algumas raízes globais do mal-estar de hoje.
The Making of Global Capitalism
AUTORES Sam Gindin e Leo Panitch
EDITORA Verso
QUANTO US$ 29,95 (R$ 65,40, 464 págs.)
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