A conquista da Eletropaulo pelo capital italiano. E a cidade?, por Giusepe Filocomo

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
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do Justificando

A conquista da Eletropaulo pelo capital italiano. E a cidade?

por Giusepe Filocomo 

Em abril de 2018, a Eletropaulo, que tinha seu capital pulverizado (sem controlador) e suas ações negociadas na Bolsa de Valores, recebeu três ofertas públicas de aquisição.[1] Permaneceram na disputa a italiana Enel e a Neoenergia, controlada pelo capital espanhol Iberdrola. Em junho de 2018, os acionistas da Eletropaulo aceitaram a proposta da Enel e, de um total de 167 milhões de ações, 73,38% desse capital social foi adquirido pelo capital italiano pelo valor de 5,5 bilhões de reais.[2]

Conforme noticiado pela grande mídia italiana, “Enel conquista il Sudamerica” e obtém sucesso na oferta pública de aquisição, condicionada à aquisição de 50%+1 das ações. Ou seja, a compra apenas seria realizada se assegurado o controle da empresa, garantindo a liderança no mercado de distribuição de energia brasileiro e o resultado positivo sobre o capital espanhol, seu maior competidor na América do Sul. Ao que parece, a conquista da Eletropaulo pelo capital italiano é apenas uma etapa de um plano maior de expansão, a nível mundial.[3] Sobre isso e segundo noticiado, a Enel já está presente em 35 países, responsável pelo atendimento de mais de 63,5 milhões de pessoas, um verdadeiro gigante do setor.[4]

Para esclarecer, a Eletropaulo é atualmente a maior distribuidora de energia do país, responsável pelo atendimento de 24 municípios, e dentre eles a capital paulista. Isso significa abastecer mais de 18 milhões de usuários, mais de 1,5 mil unidades consumidoras por quilômetro quadrado, e uma receita operacional bruta de mais de 21 bilhões de reais no ano de 2016.[5] Ao assumir o controle da Eletropaulo, a italiana Enel se depara com um importante mercado consumidor, e muitos já podem estar preocupados com as implicações sobre as tarifas cobradas, ou com a estratégia de equilíbrio financeiro diante da prestação de serviços de distribuição de energia. No entanto, a prestação desse serviço é regulada e fiscalizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica, a ANEEL.[6]

A distribuição de energia elétrica é elemento importante do desenvolvimento urbano. Neste sentido, este episódio pode dar espaço a pelo menos duas espécies de debate a respeito das cidades:

Parte do debate público pode estar preocupada sobre as preferências italianas e sua participação na conformação dos fenômenos políticos, desvelando o imbricamento estabelecido entre os arranjos institucionais, os interesses organizados, o tecido relacional no Estado, as disputas eleitorais, e o impacto desta conjuntura sobre a trajetória e o desenho das políticas públicas e regulação dos serviços urbanos, centrais para a argumentação sobre as desigualdades nas cidades brasileiras.

Outra parte, no entanto, pode estar preocupada em desnaturalizar os arranjos institucionais e processos decisórios, até mesmo a própria democracia brasileira, buscando identificar o caráter geral de nossas instituições públicas, entendendo-as enquanto suporte à inserção do capital internacional sobre a prestação de serviços urbanos em um país periférico, argumentando os limites estruturais impostos à efetivação de direitos sociais a partir do estudo da produção capitalista do espaço urbano.[7]

Como um todo, o debate público poderá iluminar os diferentes significados e desdobramentos da apropriação italiana da maior empresa de distribuição de energia elétrica existente no Brasil. De modo geral, a teoria indica que a conquista da Eletropaulo pelo capital italiano poderá inaugurar uma nova fase de disputas em torno (i) da regulação e políticas de distribuição de energia; (ii)da gestão da prestação de serviços e cobrança de taxas; (iii) e expansão do atendimento e da infraestrutura urbana, por exemplo. Independentemente do enfoque, avanços sobre o tema podem ser fundamentais, já que há consenso a respeito da relevância dos serviços e infraestruturas urbanas na conformação e desenvolvimento do espaço urbano e para o entendimento e enfrentamento das desigualdades sócio-territoriais nas cidades brasileiras.

Giusepe Filocomo é Mestrando pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Arquiteto e urbanista graduado pela Universidade Estadual de Campinas.


[1] Em 1899 é fundada a The São Paulo Railway Light Power CompanyLimited, controlada a partir de 1923 pela holding BrazilianTraction Light Power Co.Ltd, que em 1956 passa a ser denominadaBrascanLimited. Em 1979, no entanto, o Governo Federal brasileiro adquire da BrascanLimited o controle acionário da Light Serviços de Eletricidade S.A. Em 1981, por sua vez, o governo do Estado de São Paulo assume o controle da Light Serviços de Eletricidade S.A., que passa a ser denominadaEletropaulo – Eletricidade de São Paulo S.A. O controle estatal (federal ou estadual) sobre os serviços de distribuição de energia no Estado de São Paulo perdurou 18 anos, até o momento de cisão daEletropaulo – Eletricidade de São Paulo S.A. em 1997. Em 1998, por meio de leilão público, o Consórcio Lightgás Ltda. assume o controle da AES Eletropaulo, criada na cisão de 1997.Em 2001, após nova reestruturação societária, a AES Eletropaulo passa a ser controlada pela AES Corp. Em 2003, após uma série de contratos, a AES Corp. transfere direta e indiretamente todas suas ações daAES Eletropaulo para uma nova controladora, a Brasiliana Energia S.A., e a Brasiliana Energia S.A. tem todas suas ações preferenciais emitidas adquiridas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Como resultado, em 2003, 53,9% do capital social da Brasiliana Energia S.A. passou ao domínio do BNDES, e 46,2% permaneceu sob o controle daAES Corp. No entanto, mesmo se somados aos investimentos diretos da União, os investimentos realizados pelo BNDES não incorporaram mais do que 26,7% do capital da Eletropaulo. Fontes: <https://www.aeseletropaulo.com.br/sobre-a-aes-eletropaulo/nossa-historia/conteudo/nossa-historia> e <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/06/acionistas-da-eletropaulo-aceitam-proposta-para-venda-de-controle-para-a-enel-por-r-55-bilhoes.shtml>. Consultado em junho de 2018.
[2]<https://www.gazetadopovo.com.br/economia/nova-economia/leilao-da-eletropaulo-italiana-vira-maior-distribuidora-de-energia-do-pais-eluxq7tv4i46fdlarq55k8ft5>. Consultado em junho de 2018.
[3]<http://www.repubblica.it/economia/finanza/2018/06/05/news/enel-198195121/>. Consultado em junho de 2018.
[4]<https://exame.abril.com.br/negocios/conheca-a-enel-a-gigante-italiana-que-levou-a-eletropaulo/>. Consultado em junho de 2018.
[5]<https://www.aeseletropaulo.com.br/sobre-a-aes-eletropaulo/quem-somos/conteudo/aes-eletorpaulo>. Consultado em junho de 2018.
[6]<http://www.aneel.gov.br/a-aneel>. Consultado em junho de 2018.
[7]<http://justificando.cartacapital.com.br/author/giusepe-filocomo-e-lyzandra-machado-martins/>. Consultado em junho de 2018.
Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

1 Comentário

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  1. É claro que a ELETROPAULO

    É claro que a ELETROPAULO tinha controlador, era a AES Corporatiom de Arlington, Va., que tinha 16,5% mais uma das ações ordinarias, portanto nomeava toda a Diretoria e o BNDESpar tinha o resto das ações votantes, 16,5% menos uma, portanto

    100% do capital votante estava com a AES e o BNDESpar, o que estava pulverizado eram as ações preferenciais, sem voto.

     

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