A crise do setor elétrico brasileiro: a marcha da insensatez 2

Enviado por Ronaldo Bicalho

A crise do setor elétrico brasileiro: a marcha da insensatez 2

A operação do atual modelo de mercado livre no Brasil incentiva fortemente as contratações de curto prazo e, consequentemente, gera o pouco interesse na expansão da oferta

A crise atual do setor elétrico foi diligentemente construída ao longo do tempo. Entender essa sucessão de decisões equivocadas que nos trouxe até aqui é fundamental para reconhecer a natureza estrutural dessa crise, os enormes desafios que ela coloca e a absoluta inadequação das propostas governamentais colocadas na mesa para resolvê-la.

Roberto Pereira D’Araujo, do Instituto Ilumina,  preparou uma série de artigos que conta essa verdadeira saga de falsas promessas, tolices arrogantes e mimetismos provincianos.

Neste segundo capítulo, chama-se a atenção da enorme imprevisibilidade envolvida na operação de um sistema elétrico como o brasileiro, baseado na energia hidráulica.

Um Sistema singular e complexo

Imaginem se a oferta crescente de energia elétrica fosse deixada ao sabor do mercado de energia com tanta volatilidade. Dada a singularidade do sistema elétrico brasileiro, qual é o critério de equilíbrio vigente hoje?

Sempre lembrando que é preciso analisar o sistema no futuro, justamente para não ser influenciado por essas variações bruscas, uma configuração posterior do sistema é analisada sob grande número de possibilidades de afluências.

O histórico de afluências, que só tem 80 anos, possibilitou o desenvolvimento de um modelo sintético de 2.000 anos, uma amostra mais extensa para uma grandeza física tão variável. Como ficará claro posteriormente, a série sintética longa resolveu problemas de significância estatística, uma vez que, com a variabilidade da hidrologia tropical, qualquer parâmetro estimado, para poder representar o universo de dados, exigiria amostras maiores do que o histórico.

Durante as pesquisas eleitorais os brasileiros se acostumaram a ouvir o “3% para mais ou para menos”. Com apenas 80 janeiros, como ter certeza sobre a sua média, por exemplo? O modelo sintético resolveu inconsistências na base de dados, portanto, não se trata de uma extensão da série sem acréscimo de informações. Mas, como será percebido adiante, sem esse alargamento, as estimativas teriam ainda mais incertezas do que já têm.

Com essa base extensa de dados, o sistema de hidroelétricas, térmicas, e outras fontes tem a sua operação simulada com todos os custos associados. Como decidir se o sistema estaria em equilíbrio de oferta e demanda?

O critério vigente é buscar uma expansão da oferta que equilibre os custos de operação e de expansão. Se, com base nessa amostra expandida, operar o sistema fica em média, mais caro do que construir uma nova usina, é preciso ampliar a oferta. O ponto ideal é atingido quando o custo marginal de operação médio iguala o de expansão.

Só que, num país tropical, com 70% de oferta hidroelétrica, esse variável custo de operação não se comporta com a distribuição da figura abaixo, onde existe iguais possibilidades de custos acima e abaixo da média.

Distribuição normal. A curva de distribuição de valores de custos de operação, sob a hipótese de equilíbrio, é a que está abaixo.
Distribuição do Custo Marginal de Operação médio anual (R$/MWh) em situação de equilíbrio em um plano de expansão.

A barra amarela, por incrível que pareça, é a média que se iguala ao custo de expansão, no caso, R$ 120/MWh. Cerca de 70% das ocorrências são inferiores à média, cerca de 30% acima.

O eixo horizontal atinge valores muito maiores do que os R$ 600/MWh. Justamente, por analisar uma amostra de vários anos, há ocorrência até de déficits de energia, que assumem valores bem acima da térmica mais cara. Como o evento do déficit é tudo o que se pretende evitar, a operação associa um alto custo a esse evento. Para compensar essa ocorrência na amostra, vários cenários favoráveis, de baixos custos, são necessários para que a média atinja os R$ 120/MWh. (…) continua no site do Instituto Ilumina, clique aqui.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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