Ronaldo Bicalho
Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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Falta de diretrizes e incertezas ameaçam a entrada de novos agentes no setor de gás

Marcelo Colomer

Do Blog Infopetro

Faltando 10 dias para a realização da 12ª Rodada de Licitação da Agência Nacional de Petróleo (ANP), na qual serão ofertadas exclusivamente áreas terrestres com potencial de produção de gás natural em formações geológicas convencionais e não-convencionais, o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) ainda não se posicionaram em relação ao plano de expansão da malha de transporte de gás natural.

Ao mesmo tempo, tramita na Câmara dos Deputados projeto de Lei (Projeto 6.407/2013) que propõe, entre outras importantes mudanças na indústria de gás natural, o estabelecimento de critérios de fixação, reajuste e revisão dos preços do energético e a criação de um Operador do Sistema Nacional de Transporte de Gás Natural.

Esses fatos, somados à “verticalização” efetiva da cadeia produtiva do gás intensificam o ambiente de incerteza ao redor das atividades de exploração e produção, podendo desestimular a entrada de novos agentes, principalmente de pequenos e médios produtores.

Em Setembro de 2013 foi lançado o edital da 12ª Rodada de Licitação com os objetivos claros e explícitos de desenvolver áreas de fronteira exploratória, aumentar as reservas e produção de gás natural, descentralizar os investimentos exploratórios e fomentar as atividades de pequenos e médios produtores nacionais e estrangeiros. Estão sendo ofertados 240 Blocos exploratórios em sete bacias sedimentares: Acre-Madre de Dios, Paraná, Parecis, Parnaíba, Recôncavo, São Francisco e Sergipe-Alagoas.

A oferta exclusiva de blocos terrestres foi pensada no intuito de estimular a entrada de novos agentes, principalmente de pequenos e médios produtores em função das menores garantias e exigências financeiras necessárias para qualificar as empresas participantes do leilão. Contudo, os objetivos iniciais do leilão mostram-se ameaçados pela falta de diretrizes claras e específicas para a indústria de gás natural que aumentam as incertezas sobre a capacidade dos novos agentes de monetizar as reservas possivelmente descobertas.

Assim como em todas as indústrias de rede, o segmento de transporte é essencial para o desenvolvimento (em seu sentido amplo) da indústria de gás natural. A distância das áreas produtoras aos centros consumidores e o elevado custo dos modais alternativos de transporte do gás natural (GNC e GNL) tornam a existência de uma rede de dutos uma pré-condição essencial para a monetização das reservas. Mesmo nos projetos de exploração voltados para a exportação, a existência de gasodutos de escoamento da produção se mostra fundamental. Nos Estados Unidos, por exemplo, a extensa malha de gasodutos e a facilidade de acesso à capacidade de transporte foram fatores chaves para a rápida expansão da produção de gás natural em formações geológicas não convencionais.

Com base no exposto acima, a falta de uma indicação clara do governo sobre seu planejamento da expansão da malha de transporte contribui visivelmente para aumentar os riscos dos novos investidores, principalmente em áreas afastadas da malha já existente, como por exemplo, as bacias do Acre-Madre de Dios e do Parnaíba. A importância do planejamento do Estado na indústria de gás natural se tornou ainda maior após a promulgação da Lei 11.909 que delegou ao MME (através da EPE) a responsabilidade de definir todos os projetos de novos gasodutos a serem licitados. Em outras palavras, até que o Plano de Expansão da Malha de Transporte de Gás Natural seja publicado, nenhum projeto de novo gasoduto pode ser realizado.

A proximidade da malha de transporte não garante, contudo, o acesso dos novos investidores aos mercados. Primeiramente, o modelo de separação da atividade de transporte adotado no Brasil restringe o acesso de novos produtores aos gasodutos já existentes. Isto é; apesar da separação jurídica da atividade de transporte ser obrigatória e o livre acesso aos dutos de transporte ser garantido por lei (Lei 11.909), a falta de qualquer critério de restrição a participações cruzadas entre os diversos segmentos da cadeia da indústria de gás natural cria uma potencial barreira à utilização da rede. A segunda explicação é que em algumas regiões, a malha de transporte mostra-se no limite de sua capacidade de transporte (Região Sul), o que torna improvável o seu uso por futuros agentes produtores, a não ser a partir de operações de swap.

Outro obstáculo enfrentado pelos novos produtores é a falta de regras homogêneas sobre os mercados livres. As diferentes regulamentações estaduais sobre o tema e mesmo a inexistência da figura do consumidor livre em alguns estados contribui para a redução do mercado para os novos produtores em algumas regiões. Ainda mais se for considerada a participação da Petrobras em parte do segmento de distribuição a partir de participações acionárias significativas em um número considerável de empresas distribuidoras estaduais.

A partir da impossibilidade de transportar o gás natural até os mercados, alguns produtores estão recorrendo a projetos de produção e geração integrados, como no caso da OGX/Petra no Maranhão. Esses projetos evolvem a integração das atividades de produção de gás natural e geração de eletricidade. A viabilização desse tipo de projeto, contudo, depende da proximidade das áreas produtoras das linhas de transmissão de eletricidade e de custos de produção reduzidos, uma vez que a geração termoelétrica no Brasil é muito sensível aos preços dos energéticos utilizados (custo marginal das usinas hidroelétricas é muito baixo).

Nesse contexto, embora os projetos integrados possam ser uma solução para os pequenos e médios produtores, a rentabilidade do negócio se reduz consideravelmente em função dos baixos preços do gás natural suportados pela geração termoelétrica. Ademais, em muitos casos, a demanda de gás natural das plantas térmicas se mostra inferior à capacidade de produção dos campos obrigando os produtores a operarem com capacidade ociosa e longe das escalas mais eficientes.

Ao lado das incertezas enfrentadas pelos novos agentes nos segmentos de transporte e distribuição, atualmente discute-se na Câmara dos Deputados um projeto de Lei que altera consideravelmente a Lei 11.909 que redefiniu o arcabouço jurídico e regulatório da indústria de gás natural em 2009. As principais mudanças sugeridas pela nova proposta de Lei são a criação de mecanismos de controle dos preços aos produtores e importadores; a instituição de um mercado secundário de gás natural; a redução a zero das alíquotas do PIS/PASEP e do COFINS sobre o gás natural; a criação de um Operador do Sistema Nacional de Transporte de Gás Natural; a restrição da participação acionárias de carregadores nas empresas de transporte; e a abertura do acesso de terceiros aos gasodutos de escoamento, as instalações de tratamento e processamento de gás natural e aos terminais de regaseificação.

Independente de julgamentos de valores e da análise dos possíveis avanços ou retrocessos do projeto de Lei, a questão que se levanta é o quanto de incerteza que a perspectiva de possíveis mudanças no arcabouço institucional e regulatório da indústria de gás adiciona às decisões dos agentes interessados em participar da 12ª Rodada de Licitação. De fato, em 2013, o legislativo atuou como mais uma variável de incerteza na indústria de gás natural. Antes mesmo do projeto de Lei supracitado, o gás natural já esteve envolvido no debate acerca da reforma do ICMS como foi analisado em postagem anterior deste blog. (…) continua no Blog Infopetro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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