Última saída na estrada para a autocracia, por Paul Krugman

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – O Prêmio Nobel de Economia e colunista do jornal The New York Times Paul Krugman, em artigo publicado na Folha, aborda a eleição norte-americana que ocorre no meio do mandato de Donald Trump. Para ele, existe ali uma chance de recuperar os valores democráticos. E, veja bem, não importa o que aconteça na eleição no meio do mandato, as consequências sempre serão feias.

Mas, pondera ele, é uma bifurcação na estrada. Se se segue um caminho, haverá pelo menos uma chance de redenção política, de recuperar os valores democráticos dos Estados Unidos. E, escolhendo o outro, o que se tem é a estrada para a autocracia, e sem saída visível.

Segundo ele, é claro que os democratas receberão mais votos que os republicanos. Assim indicam as pesquisas. Na Câmara dos Deputados, a margem de vantagem pode chegar a sete pontos percentuais, o que representaria a maior vitória da era moderna. Mas, diz ele, a manipulação do traçado de distritos eleitorais e outros fatores distorcem muito a competição, e mesmo uma vantagem dessa ordem pode não bastar para que o partido ganhe o controle da Câmara.

Para Krugman, mesmo que os democratas consigam superar esse desafio, quem imagina que os republicanos aceitarão o resultado graciosamente não está prestando atenção. Basta lembrar, diz ele, que Donald Trump afirmou (e falsamente) que mil~hoes de imigrantes votaram ilegalmente em uma eleição que ele venceu.

Isso foi dito em uma vitória, agora imagine o que ele dirá se perder, e o que seus partidários farão em resposta à sua reação, questiona Krugman. E se e quando uma Câmara controlada pelos democratas tentar exercer seus poderes, pode estar certo de que isso não será aceito com tranquilidade, não importa o que diz a constituição.

Mas por mais que a cena seja feia caso os democratas vençam, será muito pior se perderam, aponta Krugman. “De fato, não é hipérbole dizer que, caso o Partido Republicano consiga se manter no poder, a eleição da terça-feira pode ser o último pleito mais ou menos decente em nossa história”, diz.

E exemplifica com o caso da Geórgia, onde Brian Kemp, o secretário de Estado republicano, que organiza as eleições, está disputando o governo do estado contra a democrata Stacey Abrams. E aponta para o fato de que uma democracia não permitiria um homem supervisionar uma eleição na qual ele é candidato é inconcebível. “Mas é assim que são as coisas na Geórgia, e Kemp está abusando ao máximo de seus poderes”, diz.

“Nos últimos anos, ele expurgou milhões de eleitores dos registros eleitorais do estado, sob pretextos dúbios. Ao se ver envolvido em uma disputa eleitoral acirrada apesar desses esforços, tentou excluir ainda mais eleitores, com base em critérios tão espúrios que os tribunais bloquearam suas medidas – por enquanto. Assim, no final de semana anterior à eleição, o gabinete de Kemp lançou um alerta, sem quaisquer provas e sem oferecer informações específicas, de que democratas talvez tivessem tentado invadir o site de registro de eleitores”, diz em seu artigo.

Se houvesse compromisso com a democracia e o fair play, tal partido político trataria Kemp como pária. Mas, no lugar, ele recebe pleno apoio da direção nacional republicana.

Mas a Geórgia não é caso único. Houveram tentativas semelhantes, mas menos espetaculares, de manipular a votação no Kansas e em Dakota do Norte, onde eleitores que vivem fora desses estados foram informados que só poderiam votar pelo correio se preenchessem as cédulas com tinta da cor certa – e em seguida receberam informações conflitantes sobre qual seria essa cor.

À nível federal, Krugman aponta que o Executivo não controla diretamente o processo eleitoral, mas Trump ainda assim se envolveu em abusos de poder na campanha. Enviou forças militares à fronteira do México, ao custo de centenas de milhões de dólares, em tentativa de exagerar a suposta ameaça de uma pequena e maltrapilha caravana de refugiados que estava a mais de mil quilômetros da fronteira. “O movimento de tropas claramente não serve ao interesse nacional; é um uso indevido gritante do poder da presidência, para conferir vantagem a um partido político”, diz Krugman.

“A lição que aprendemos com todos esses abusos de poder é que os republicanos atuais são exatamente como seus colegas nacionalistas brancos na Hungria e Polônia, que apesar de manterem fachadas democráticas na verdade estabeleceram regimes autoritários de partido único. Tudo que vimos indica que os republicanos farão qualquer coisa que puderem para tomar e reter o poder, e a eleição da terça-feira pode ser a última oportunidade de impedir que se firmem permanentemente no controle”, aponta.

“Oh, e caso você esteja tentando afirmar que os dois lados fazem o mesmo: não, não fazem. Restringir o registro de eleitores é quase exclusivamente um hábito republicano. Os democratas não são santos, é óbvio, mas parecem acreditar em democracia, e seus oponentes não”, critica Krugman.

“Agora que o momento crucial chegou, todo mundo deveria ter em mente o que está em jogo. Não se trata apenas dos cortes de impostos ou do sistema de saúde, e qualquer pessoa que vote pensando apenas nessas questões está desconsiderando o quadro mais amplos. A sobrevivência da democracia dos Estados Unidos depende das urnas”, finaliza Paul Krugman.

Leia o artigo na íntegra aqui.

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

2 Comentários

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  1. Bem, faz tempo que a

    Bem, faz tempo que a democracia dexiou de existir nos EUA. Quem manda de fato são as corporações. Lá como cá, as instituições são apenas uma fachada. E sim, os democratas são iguais ou piores que os republicanos.

  2. O artigo é da véspera da eleição, 5/11/2018

    A leitura dos trechos trancritos mostra isto claramente. A Folha reproduziu o artigo dois dias depois da eleição, talvez devido a alguma obrigação contratual com o jornal americano. O texto original pode ser lido em → Last Exit Off the Road to Autocracy

    Agora, se você deseja um comentário objetivo sobre os resultados de três dias atrás, sugiro o seguinte:

    Eleições no EUA: O Avanço dos Progressistas

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