A tentação totalitária de Hollande, por Janio de Freitas

Da Folha de S. Paulo

A tentação totalitária

Por Janio de Freitas

Desde os atentados em Paris, as únicas palavras aproveitáveis nos pronunciamentos de François Hollande são estas: “Vive la République” e “Vive la France”. Mas a República está sendo por ele negada. E a França já está encaminhada por Hollande e seu governo a práticas próprias de estados totalitários. Deformação tão mais inquietante quanto a França, embora decadente como centro de poder político, preserva a atração encantada que projeta no mundo, há séculos.

As decisões autocráticas de Hollande repetem-se desde a noite mesma dos atentados. Já o seu primeiro pronunciamento declarava o estado de guerra, precipitação não admissível em um presidente, por sua insensatez agravada pelo desprezo às vozes autorizadas e autorizativas da República, situadas no Parlamento e no Judiciário. A França nem foi atacada por uma nação, como o estado de guerra requer. Hollande é que atribuiu esta alta condição a um movimento político-religioso, o Estado Islâmico, quando apenas presumia tratar-se do responsável pelo ataque.

Consideradas as condições emocionais da França, era improvável que o Parlamento e, se ocorresse o caso, o Judiciário deixassem de subscrever as intenções de Hollande. Foi quase unânime a aprovação, seis dias depois, da prorrogação desejada por Hollande para o estado de emergência, de 12 dias para três meses. Com liberdades de ação policial que só não são absolutas porque excluem magistrados, parlamentares, advogados e jornalistas das escutas telefônicas por simples decisão da polícia. Ninguém diz, mas a verdade é que os direitos civis estão suprimidos na França.

Nada nada, indicou a necessidade de ataques assim extremados aos direitos da cidadania. A precariedade dos grupos terroristas na Europa está comprovada no fácil e rápido encontro e extermínio dos seus integrantes pela polícia. Nem sequer têm logística para evitar pistas anteriores e segurança posterior aos atos. O que sugere que também não têm dinheiro. São pouco mais do que livre-atiradores, reunidos entre parentes e amigos. Em sentido técnico, não têm êxito: o que parece o seu êxito é o vergonhoso fracasso da Europol, o organismo da União Europeia incumbido do antiterrorismo, e dos caríssimos serviços de informação nacionais, os europeus e os americanos.

Potenciais terroristas continuam por lá, do mesmo jeito. Nem por isso Hollande promove o grande inquérito para tornar eficientes os seus serviços preventivos. O que lhe ocorre são prisões a granel para retirar suspeitos da circulação -suspeitos de quê, de quem, por quê? De fundamentalismo muçulmano, pelos serviços ineficazes, por serem jovens na exclusão social.

Mas Hollande não os quer retirar à toa, senão para os recolher a “casas de reeducação”. É uma concepção que já teve períodos de glória. Por exemplo, quando aplicada no regime nazista, até a partir da infância, o que pode sugerir algo a Hollande e a seu primeiro-ministro Manuel Valls. Mas há também, a inspirá-los, o modelo do totalitarismo stalinista, que partia da infância e, quando aplicado a adultos, fez-se conhecido no Ocidente sob o nome genérico de gulag.

Há ainda os antecedentes da coerência. Antes dos ataques, Hollande já mandara militares franceses para Mali e a República Centro-Africana, e para o Iraque; encabeçara o ataque à Líbia e iniciara a intervenção na Síria. Além disso, incorporara a França à coalizão de ataques aéreos ao Estado Islâmico. E despachara o porta-aviões Charles De Gaulle para atacar o Estado Islâmico.

Tudo isso tem um custo institucional maior e mais perigoso do que se pode imaginar. Não só para a França. Tem também um custo econômico muito pesado, para uma França cuja economia está bastante insatisfatória. Mas François Hollande ganha, como ganhou sem fazer mais do que um desfile depois do havido no Charlie Hebdo. Agora, melhora sua má posição contra Sarkozy e Marine Le Pen, para a eleição presidencial e já para as eleições regionais em dezembro.

França com ares totalitários é uma aberração. Mas os franceses estão aturdidos. François Hollande, não. “A tentação totalitária” é o título de livro já antigo do francês Jean-François Revel. Fica muito bem outra vez.

Redação

9 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Bush, a inspiração do socialista.

    A frança de Hollande imita os EUA de Bush 11/09 na repressão a liberdade de seu povo.

    Belo exemplo a ser seguido por um partido socialista.

  2. Jogou para a torcida,E foi

    Jogou para a torcida,E foi dos que proibiram pouso do avião de Evo Morales a mando dos EEUU.Agora leva guerra a outras terras e não a quer na sua;perfeita lógica imperialista.A França, iluminista, está vazia de estadistas.

  3. O Hollande é o típico político de nossos tempos: medíocre,

    covarde, defensor dos interesses dos mais ricos, mas que viu no uso da força burra e bruta uma brecha para ganhar popularidade. Populismo burro e barato, aceito num momento de desespero. Vai entrar para a historia como o Bush francês. Aqui no Brasil também sofremos do mesmo mal, mas nossa populismo barato é moralista, fruto do nosso emburrecimento, somos saqueados de direitos e recursos enquanto a turba ignorante se distrai ofendendo a Simone de Beauvoir.

     

  4. hollande tomou medidas de

    hollande tomou medidas de exceção no estado de direito da república francesa, ao cercear e aviltar direitos civis na nação que nos legara a nova república liberal cidadã, é porque o momento trágico de terrorismo planetário totalitário just in time assim exige.

    nas próximas eleições francesas, o povo franco dirá sim ou não à tomada de decisão y bastilha, do governo hollande, no calor dos acontecimentos no teatro de guerra medo pânico… por sinal, bem longe de onde seu janio de pijama entediado se encontra em refostelado amargor y rabugice y contrariedade boçal pela “causa revolucionária” do lulopetismo no poder que deu errado pra cachorro (e, doravante, sobram janices & tolices pra todo lado dos contras) … e acertou em cheio nas ideias positivistas de janio à esquerda proto-stalinista do ser jornalista.

  5. O pior é o Terror do Estado.

     

      A França aqui é apenas um exemplo. Uma pequena procura e teremos fotos de qualquer país. Esta foto é emblemática pelo fato de não ter 100 anos.

  6. Jânio de Freitas é o cara que

    Jânio de Freitas é o cara que não vê “tentação totalitária” no cara que discursa dizendo que o ideal é o partido ganhar a presidência, os 27 estados, os 81 senadores e os 513 deputados sem precisar se aliar a ninguém, mas vê totalitarismo em uma tentativa tardia de defesa da França contra o extremismo islâmico.

    Ok.

  7. Nao sei até q ponto esses ataqus acontecem p/ q isso seja possív

    Nao digo que os ataques tenham sido FEITOS para isso, mas DEIXADOS ACONTECER para isso… (no caso do 11/9 me parece óbvio). A democracia, mesmo a democracia liberal super parcial, contraria os interesses da intensificaçao do capitalismo, e da super-exploraçao dos 1% sobre os 99%. Nao se pode enganar as pessoas o tempo todo…

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador