A Huawei e a nova diplomacia do capitalismo de vigilância, por Fábio de Oliveira Ribeiro

O isolamento geográfico da América do Sul condicionou o desinteresse brasileiro pelas disputas geopolíticas em torno da Eurásia.

Foto: Reprodução/Huawei

A Huawei e a nova diplomacia do capitalismo de vigilância

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Boris Johnson descartou o uso de produtos da Huawei no desenvolvimento da rede de 5G da Inglaterra. A reação chinesa foi imediata.

O mundo parece não ter mudado muito desde que Halford John Mackinder desenvolveu sua teoria geopolítica segundo a qual quem domina a Eurásia governa o mundo. Assim, a união sem precedentes de Inglaterra e EUA contra a Huawei – empresa que forneceu equipamentos para a rede de 4G inglesa – parece ser consequência do acordo firmado entre China e Rússia.

A Alemanha, que se distancia dos EUA à medida que aumenta o consumo de gás e petróleo russo, preferiu não hostilizar a China. Coração pulsante da União Europeia, Berlim pode ter aproveitado a oportunidade para dar uma cutucada em Londres por causa do Brexit.

Outro aspecto importante desse conflito é a disputa pelo controle de Hong Kong. Os chineses decidiram finalmente combater o separatismo da ilha ocupada pelo exército derrotado de Chiang Kai-shek. Ao que parece, a marinha dos EUA não está mais em condições de fazer ameaças para impedir as ações políticas chinesas em Hong Kong. O predomínio chinês no Mar da China já é uma realidade.

As represálias comerciais contra a Huawei podem, portanto, ser consideradas um preço que Pequim terá que pagar por causa do sucesso de sua política regional. Mas há um outro universo sendo construído nesse momento.

Segundo Mackinder o Coração da Terra era um espaço geográfico cujo controle ou não deveria ser disputado para possibilitar ou impedir o surgimento de um governo planetário. O espaço que a Huawei trabalha para expandir ao infinito é virtual e a infraestrutura de 5G é considerada fundamental para o sucesso da IoT.

No século XIX e XX as potências militares disputavam o controle ou a influência em espaços geográficos. No século XXI as disputas não são necessariamente militares e geográficas, pois o espaço em que a economia se movimenta passou a depender menos do território e mais dos “excedentes comportamentais” extraídos pelos gigantes de internet.

O mercado da internet das coisas já vinha sendo estimado em 101 bilhões de dólares para 2021. A pandemia do COVID-19 afetou de maneira negativa os negócios tradicionais, mas pode ter acelerado as ambições dos capitalistas de vigilância. O aumento dos negócios “on line” produzido pelo Lockdown planetário também pode ter condicionado as represálias à gigante de tecnologia chinesa.

O isolamento geográfico da América do Sul condicionou o desinteresse brasileiro pelas disputas geopolíticas em torno da Eurásia. Essa falha diplomática, que impediu nosso país de se desenvolver aumentando as relações comerciais com a Rússia, Oriente Médio e Ásia no século XIX e início do século XX, foi corrigida pela diplomacia “ativa e altiva” dos governos Lula e Dilma Rousseff.

Desgraçadamente, a diplomacia religiosa e ideológica do desgoverno Jair Bolsonaro desperdiçou todos os sucessos diplomáticos de Celso Amorim e Antonio Patriota. O estrago causado por Ernesto Araújo é imenso e já começou a produzir efeitos econômicos negativos. Eles serão ainda maior se o Brasil se posicionar contra a Huawei no exato momento em que o capitalismo está sendo renovado pela IoT.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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