Os contornos principais do mundo moderno foram desenhados pela Paz de Vestfália em 1648. Soberania nacional, não intervenção, relações pacíficas entre Estados nacionais e tolerância religiosa, esses foram alguns dos princípios que orientaram os tratados de Münster e Osnabruque que colocaram fim às guerras religiosas que devastaram a Europa durante 30 anos.
Todos esses princípios foram referendados pela Constituição Cidadã. Entre nós a liberdade de crença é garantida aos cidadãos. Nenhuma instituição religiosa pode ser discriminada pelo Estado. Todavia, um grupo religioso não tem o direito de invocar seus próprios dogmas para oprimir outro sem sofrer as consequências legais.
Em nosso país o fundamentalismo religioso foi equiparado ao terrorismo pelo art. 2º, da Lei 13.260/2016:
“art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.”
Há alguns dias a Justiça autorizou a interrupção da gravidez numa menina de 10 anos que havia sido estuprada. O processo corria em sigilo para impedir que a vítima fosse publicamente exposta. Mesmo assim, Sara Winter obteve e divulgou o endereço em que a menina seria operada provocando cenas de terror que foram filmadas e divulgadas pelo Twitter:
https://twitter.com/carolinatre/status/1295109904915718146
A propósito de interromper o que consideram ser um crime (o aborto), fanáticos religiosos se reuniram e tentaram invadir o hospital. A segurança da menina, dos outros pacientes e dos profissionais de saúde foi colocada em risco. A polícia teve que intervir, o episódio poderia ter resultado numa tragédia.
Não é a primeira vez que Sara Winter desafia uma decisão judicial. Há bem pouco tempo ela foi presa em virtude de incentivar atos de violência contra o STF e de ameaçar e ofender moralmente os Ministros daquele Tribunal. O que ela fez ontem é inadmissível e deve provocar algum tipo de reação das autoridades do Sistema de Justiça. A energia criminosa inesgotável dela pode e deve ser repelida e reprimida na forma da Lei.
A perversidade de Sara Winter não é banal. Ela tem ambições eleitorais. Até bem pouco tempo essa moça obtinha lucro na internet politizando seus preconceitos religiosos e mobilizando o ódio contra o STF. Fria e calculista, essa heroína/vilã bolsonarista provocou um incidente na porta do hospital para se projetar nacionalmente com o intuito de seguir os passos de Carla Zambelli.
Ninguém pode ser considerado criminoso por ter ambições eleitorais. Todavia, e isso precisa ficar bem claro, incentivar o terrorismo religioso não é uma maneira legítima de conquistar o poder. Em virtude do que fez ontem, Sara Winter ficou mais próxima da prisão do que do Congresso Nacional.
Os militantes evangélicos que tentaram invadir o hospital também merecem ser tratados como criminosos. Na pior das hipóteses eles podem ser processados com base na referida Lei 13.260/2016, na melhor a conduta deles deve ser enquadrada no art. 330, do Código Penal.
A radicalização política dos evangélicos está se tornando um fenômeno mais e mais perigoso e insuportável. Possuídos por seus preconceitos religiosos, alguns deles já ousaram quebrar imagens católicas. Outros se organizam para invadir terreiros de candomblé e de macumba a fim de agredir os praticantes de religiões afro-brasileiras.
Xamãs indígenas foram agredidos e obrigados a abandonar suas crenças por missionários evangélicos. A Paz de Vestfália significa bem pouco para esses fanáticos dispostos a recomeçar as guerras religiosas encerradas em meados do século XVII.
Por fim, não podemos deixar de notar a evidente semelhança entre o que está ocorrendo no Brasil e o que ocorre no Oriente Médio. Desde a década de 1950 o fanatismo religioso islâmico vem sendo mobilizado, instrumentalizado, financiado e armado para desestabilizar e destruir os Estados nacionais laicos que existiam no Irã, Egito, Afeganistão, Líbia, Iraque, etc..
Sara Winter é uma ponta de lança. Impossível dizer quem segura o cabo da arma mortal encostada no coração do Estado laico brasileiro.
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