Atual combate à corrupção por Haddad começou com Marta Suplicy em 2001

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – São Paulo assiste hoje ao destacado trabalho contra a corrupção da Controladoria Geral do Município, assumido pelo prefeito Fernando Haddad. Mas ele herda em suas raízes uma sequência de iniciativas do período entre 2001 e 2004, quando Marta Suplicy comandava a administração da cidade. Os resultados, contudo, estiveram perceptíveis por pouco tempo, até que chegasse aos mandatos a gestão Serra-Kassab. O hiato fez renascer um novo e mais forte sistema, mas que teve seu início dez anos atrás.

Hoje, a Ouvidoria Geral do município de São Paulo é um dos braços da Controladoria Geral do Município, ao lado da Corregedoria Geral – responsável pelo controle interno, investigação e correição de irregularidades administrativas – e das Coordenadorias de Auditoria Interna (AUDI) e de Promoção da Integridade (COPI) – que fomenta a transparência e prevenção da corrupção.

Entretanto, antes da criação da Corregedoria, com a Lei 14.349 em 2007, a Ouvidoria foi um dos primeiros órgãos de São Paulo a fazer esse papel. Criada em janeiro de 2001, imediatamente após a posse da ex-prefeita Marta Suplicy, a Ouvidoria concentrava a função de fiscalizar ações e omissões dos agentes públicos, de forma autônoma e independente, sem relação hierárquica de subordinação ou dependência orçamentária. Iniciativas como o Via Rápida, para agilizar apurações dos casos de maior gravidade junto à Procuradoria Geral do Município, e o programa Plantas On-line, contra irregularidades no uso e ocupação do solo, dando transparência e celeridade a processos de grandes obras, foram impulsionadas pela Ouvidoria e criadas pela gestão da ex-prefeita.

No histórico da imprensa, pouco foi divulgado a respeito dessas ações. O registro está nos relatórios anuais inseridos no site da Controladoria Geral da prefeitura. Neles há a informação de que, em quatro anos de Ouvidoria (2001-2004), mais de 28 mil protocolos de denúncias, reclamações ou sugestões foram abertos e mais de 160 servidores efetivos perderam suas funções públicas a partir das denúncias do órgão. Só no ano em que foi criado, 2001, foram 669 processos de apuração de irregularidades graves.

E a articulação desse órgão do município com o Ministério Público não é novidade da atual gestão. A interação com o MPF, com a Controladoria Geral da União (CGU) e outras organizações de correição e investigação foi iniciada pela Ouvidoria, que também sugeria a adoção de instrumentos de controle que possibilitassem mais transparência nas ações do governo.

Claramente, a estrutura atual da Controladoria Geral do Município abarca mais preparo, com maior número de funcionários; parcerias que atravessaram a capital, como a Receita Federal; e tecnologia de ponta para as investigações do setor de inteligência, como o sistema eletrônico de declaração de bens. A essas iniciativas, deve-se a vontade política de Haddad.

Leia também: Como o governo Haddad estruturou o combate à corrupção em São Paulo

Entretanto, o embrião do que hoje pôde ser realizado com reconhecimento encontra-se nas primeiras tentativas de Marta Suplicy na prefeitura de São Paulo, a partir de 2001. Em 2004, a Ouvidoria já contava com a parceria do Tribunal de Contas do Município, da Secretaria de Estado da Segurança Pública, da Procuradoria Geral do Município, além do Ministério Público Estadual e Federal.

A Via Rápida, iniciada em 2001 e oficialmente implementada em maio de 2003 pela lei 13.519, agilizou, disciplinou e priorizou as investigações mais graves com a Procuradoria Geral do Município.

Se, por um lado, a CGM desarticulou neste último ano dois grandes esquemas de corrupção – a Máfia do ISS e a Máfia dos Alvarás –, por outro, a Ouvidoria legitimada em 2001 foi fundamental na demissão e/ou cassação de 164 servidores públicos envolvidos nos casos de corrupção do final dos anos 90, durante a CPI da Máfia dos Fiscais, por meio da Via Rápida.

Entre os anos de 2001 e 2004, os servidores foram afastados após a comprovação dos atos ilícitos, de forma célere e a um custo menor para a administração, graças à essa lei que alterou o Estatuto do Servidor. A sugestão veio da Ouvidoria, assumida pela então prefeita Marta Suplicy e aprovada por dois terços dos vereadores da Câmara Municipal.

A Via Rápida colocava um prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais 60 dias no máximo, para a conclusão dos inquéritos administrativos nos casos de prática de crimes hediondos, contra a administração pública, corrupção, prisão em flagrante ou preventiva do servidor, entre outros do artigo 189 do Estatuto. As irregularidades eram analisadas por comissões específicas da PGM, para a conclusão mais rápida dos processos de sindicâncias e inquéritos administrativos, e os órgãos públicos tinham o dever de atender as solicitações das comissões em um prazo de 24 horas.

Além disso, a apuração preliminar passou a ser feita pela própria Ouvidoria, que recebeu respaldo para convocar depoentes, requisitar documentos e, inclusive, solicitar o afastamento preventivo de servidores denunciados. Como pode ser observado, a figura de “auditor”, criada pelo atual prefeito Fernando Haddad, é uma releitura do antigo “ouvidor”, que em 2003 teve a sua autonomia para investigação reconhecida.

Se hoje a reestruturação dos órgãos de fiscalização passou por um impulso no setor de tecnologia, com a criação de um sistema eletrônico obrigatório de declaração de bens, parcerias para análise sobre o patrimônio dos servidores e estratégias para cálculos de risco; antes, as adequações também significaram uma transformação no uso da tecnologia contra a corrupção.

Depois de a Ouvidoria se deparar com denúncias de funcionários que buscavam obter vantagens com procedimentos ilegais, o Departamento de Rendas Imobiliárias da Secretaria de Finanças passou por uma informatização, colocando à disposição dos munícipes pela internet documentos, como as certidões negativas de débito. Marta também instituiu, por meio de decreto em janeiro de 2002, o Sistema de Informações Patrimoniais, um banco de dados aberto à população sobre o patrimônio público imobiliário. 

Quando o órgão constatou que a maior parte das denúncias de corrupção referia-se à aprovação e fiscalização de obras, a Secretaria Municipal de Habitação criou o programa Plantas On-Line, que trazia para a plataforma da internet a aprovação de plantas, podendo o cidadão fazer o acompanhamento. Em 2004, a Ouvidoria já recomendava ampliar o programa para as subprefeituras e a informatização completa da área de supervisão de uso e ocupação do solo, incluindo a fiscalização.

As ações causaram impacto direto nos atos ilícitos, visualizado pela queda de denúncias graves recebidas pela Ouvidoria:

O relatório referente ao ano de 2004, que apresenta todos os avanços feitos no combate à corrupção em quatro anos de existência do órgão e recomendações de melhorias, apresenta uma mudança de tom para o ano de 2005. A iniciar pelos títulos dos capítulos que abordam a problemática das denúncias graves e da ocupação do solo: “A Via Rápida e o combate à corrupção”, intitulava o ouvidor em 2004, para “Irregularidades no uso e ocupação do solo: problema histórico e sem solução à vista”, alertava em 2005.

Apesar de ambos apresentarem o histórico do trabalho da Ouvidoria e as recomendações, o início da gestão Serra em São Paulo já era estampado com pessimismo pelo órgão de fiscalização. A seguir, um trecho do relatório de 2005:

Daí para frente, o papel que a Ouvidoria vinha assumindo foi abafado pela gestão Serra-Kassab (2005-2012), que priorizaram o órgão à frente de denúncias de buracos nas ruas, comércios irregulares, perturbação do silêncio e demais reclamações de ordem urbana. Para se ter uma ideia, os relatórios de 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012 não citam uma única vez a palavra “corrupção”.

A seguir, o relatório de 2004, na íntegra:

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

10 Comentários

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  1. Os ‘martistas’ já estão

    Os ‘martistas’ já estão saindo da TOCA, é ?!? Isso só prova que o PT é o único partido que realmente combate a corrupção doa a quem dor, não é como o PSDB cuja a corrupção é estrutural e genético ao partido.Agora, se o HADDAD fizer uma boa adminstração, como vem fazendo e podemelhorar muito com a nova forma de cálculop das dívidas de estados e municípios, a preferência pela reeleição é dele e a Marta que puxe o seu banquinho e esper mais um pouquinho.

    “O BRASIL PARA TODOS não passa na REDE GLOBO DE SONEGAÇÂO & GOLPES – O que passa na REDE GLOBO DE SONEGAÇÂO & GOLPES é um braZil-Zil-Zil para TOLOS”

  2. Haddad está combatendo a

    Haddad está combatendo a corrupção de verdade.

    Marta? Inventou os Tato que até hoje mandam nos Transportes e havia um certo cavalheiro muito importante que circulava,, deixa para lá.

    Em Haddad eu acredito mas vão contar essa historia da gestão Marta para quem não conhece o samba, aliás uma gestão bem ruim, era só o que faltava a Marta querer disputar a Prefeitura contra o Haddad.

    1. Discordo Motta.  Para quem

      Discordo Motta.  Para quem pegou uma prefeitura pós Pitta, Marta acabou tendo um desempenho excelente.  Na área que eu uso, o transporte público, ela fez a melhor gestão.

      Uma das promessas que os políticos nos faziam todos os anos e não cumpriam, era o tal do bilhete único.  Pois bem, ela botou um projeto  para funcionar, em que pese a lentidão das coisas públicas.  O que acabou espirrando para todo o Brasil a partir de São Paulo. E só não fez a integração com o metrô porque o governo estadual na época não quis. 

    2. Vc não é sério e demonstra

      Vc não é sério e demonstra puro e simples preconceito com alguem da “tua classe social” (ou estirpe como vc gosta de falar) que vc mesmo pre-julgou como “rebelde sem causa e classe” em um post ontem.

      Alguem que pega a prefeitura arrombada e consegue viabilizar a aprovação de um PLano Diretor, sendo que a cidade estava sem plano desde Faria Lima (1971) e também uma ampla reforma administrativa criando as sub-prefeituras, marco histórico na descentralização administrativa da mega-cidade, além de revolucionar o ensino básico com os CEUS, e os transportes com o Bilhete único… e vc com picuinha de classe ?? Além do mais, foi ela quem chamou Haddad pra trabalhar na prefeitura. 

      E ela só não foi reeleita pq o PSDB deslocou seu melhor quadro (Serra) e a velha mídia fez de tudo pra esculhambar com ela, com histórias ridículas sobre o fim do seu casamento e outras babaquices.

      Vc não engole ela, mas ela é um sucesso em gestão pública. E vc, é quem mesmo?

       

    3. Concordo, esses argumentos do

      Concordo, esses argumentos do texto me lembram  o papo velho da turma tucana sobre a criação da CGU, como Corregedoria, e da CGA em SP, idem. Ambas só pra fazer fumaça. 

       

      Quem trabalha na Administração Pública sabe que emitir decreto e criar Ouvidoria em órgão sem mostrar resultado soa mais como cortina de fumaça e combate de fachada.

       

      Dizer que o combate a corrupção começou com a Marta é muita forçação de barra.

  3. Em que pese o “tiro no pé”, que Marta Suplicy deu em si mesma,..

    …fato é que, enquanto foi prefeita de São Paulo, sucedendo às desastrosas gestões Maluf-Pitta, revelou-se uma grata surpresa. Não só pelos famosos CEUs, mas também por diversas outras iniciativas, como a supramencionada. Triste que esteja se deixando levar pela vaidade… Espero que seja só o momento.

    1. Esteja se deixando… Já?

      Se ela realmente abandonar o PT onde se fez só para ter a vaga de candidata à prefeitura vou censurá-la. Mas antes disso, só por causa de insinuaçoes da mídia, NAO. 

  4. Tudo de bom começou com o

    Tudo de bom começou com o PT.

     Desde a libertação dos escravos até o governo Jucelino.

           O PT é o máximo.

              Sem ele o Brasil não existiria.

  5. Nick fatal

    Esta ação positiva da gestão de Marta Suplicy foi ofuscada por outra diretriz administrativa, que a fez receber dos opositores e de uma parcela da população o apelido de “martaxa” , um dos motivos de sua derrota para a reeleição.

    1. Claro, vc tem plena

      Claro, vc tem plena razão.

      Uma taxa de R$ 1 a R$ 4, à sua escolha de acordo com o peso que vc mesmo aufere ao teu lixo, para contribuir com um dos problemas de saúde pública mais graves de uma cidade, a gestão de resíduos sólidos, numa cidade falida por 8 anos de Pitta-Maluf, pois a cidade não tinha mais onde colocar lixo, e aonde se iniciou e ampliou o programa de coleta seletiva de lixo (que depois foi estagnado pelos tucanos) e a classe mérdia paulistana caiu de pau sempre manipulada pela velha mírdia. Aí veio Serra-Kassab e triplicou o ITBI, instalou a taxa de R$ 50 da inspeção veicular, botou na dívida ativa todo e qualquer devedor paulistano e ninguem falou nada.

      Eita povo inteligente, sô !!

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