O trem-bala e a iniciativa privada

O problema tem a mesma base que discuti com relação aos aeroportos: a crença que a iniciativa privada pode oferecer soluções rápidas e baratas para a provisão de infra-estruturas, sobretudo de grande porte. Novamente: a participação do setor privado, que eu de uma forma geral defendo, não se destina a isso, e sim a melhorar a qualidade dos projetos.

Mas via de regra, essa participação está limitada por diversos aspectos, e seu uso indiscriminado pode levar a soluções mais caras; além disso, o processo é demorado, como se demonstrou mais uma vez com esse leilão vazio.

Se a participação da iniciativa privada pode levar a projetos eficientes e eficazes, esse ganho pode ser anulado em função dos altos custos de transação, que refletem a difícil negociação e a perda de tempo que elas produzem. Portanto, essa inserção tem de ser analisada caso a caso, e, além disso, ela tem de ser dimensionada para a capacidade da iniciativa privada poder assumir os riscos, que não é alta. 

Vale lembrar que, nesse capitalismo turbinado, os investidores são cobrados ano a ano para produzirem resultados cada vez mais espetaculares. Projetos que não se encaixam nessas exigências são ignorados. Isso não resulta da “falta de vontade” dos fundos, e sim do “bafo de onça no cangote”, com o qual os CEOs têm de  conviver para poderem continuar nos postos, no ano subsequente. Ignorar essa realidade provoca essa perda de tempo.

É sobretudo perda de tempo esperar grandes investimentos da iniciativa privada em infra-estruturas. Essa ilusão já acabou há cinco anos lá fora,  o próprio Banco Mundial já o reconheceu, e só aqui insistimos ainda nessa filosofia fin-de-siécle, até porque não a praticamos quando estava no auge (em contrapartida, não participamos da quebradeira que Grécia e Portugal estão sofrendo).

A participação da iniciativa privada tem de ser dimensionada para as capacidades reais dos fundos privados, que são mais baixas (sobretudo na atual conjuntura, onde têm de administrar diversos esqueletos). Não acho apropriado lhe transferir a concepção e a construção das infra-estruturas e os respectivos riscos. Querer insistir nisso é provocar leilões vazios ou risco de quebradeira dos fundos lá frente e problemas sistêmicos muito maiores (ver o fracasso da privatização do Túnel sob o Canal da Mancha). 

Aliás, em uma conferência especializada de fundos de investimentos em infra-estrutura me foi declarado que eles estão mais interessados em projetos “brownfield” (aproveitamento de infra-estruturas já construídas) do que “greenfield” (construção de nova infra-estrutura). Quem quiser brincar com parceria e concessão tem de levar em consideração essa notícia, senão se arrisca a perder tempo.

Essa tranferência é, ademais, economicamente ineficiente, pois transfere para o usuário todo encargo da construção, do qual se beneficia não apenas ele mas também todas as indústrias que exploram novas vantagens locacionais (sobretudo o setor imobiliário, em virtude da valorização do solo).Em última instância, toda a sociedade se beneficia em função dos efeitos  a) diretos,  b) indiretos, c) induzidos e d) catalíticos provocados pelo investimento.

Dado o caráter difuso do benefício derivado da obra, da construção de vantagem locacional e da  subsequente dinamização da economia regional e nacional em virtude da simples existência de uma nova infra-estrutura, seu custeamento tem de se dar de forma igualmente difusa, pelo sistema tributário; daí a construção ter de ficar, em boa parte, a cargo do Estado.

Em contrapartida, ao usuário, que no dia-a-dia se beneficia concretamente mais do que os outros da infra-estrutura, incumbiria o encargo da manutenção e da operação; para isso se instituiria o pedágio. Assim, a manutenção e operação é que são o espaço mais apropriado da iniciativa privada no investimento das infra-estruturas, pois podem ser custeadas pela tarifa (pelo menos parcialmente), sendo que, nesse campo, as soluções podem ser melhores dos que as governamentais (ver os terminais de ônibus concedidos e as rodovias!).Portanto, os encargos e os riscos são gerenciáveis.

Especificamente sobre o TAV, venho repetindo que esse projeto não pode ser concebido apenas como catapulta de executivos cariocas e paulistas de saco cheio do apagão aéreo. Ele tem de estar inserido em um programa territorial ao longo do seu eixo, onde as industrias e os centros de pesquisa construiriam centros de excelencia em diversos pólos urbanos já existentes (idéia do “Eixo de Excelência”, sobre qual já redigi um artigo que está anexado no meu sub-blog nas brasilianas). Essa nova dinamização é que sustentaria economicamente o projeto.

A ANTT, particulamente seu Diretor, já conhece minha posição e a elogiou; mas a prática do órgão continua sendo a mesma. Ao continuarmos assim, terminaremos a segunda década do século sem o TAV.

Por Andre Araujo

LEILÃO DO TREM BALA – Sem entrar no merito da prioridade do trem de alta velocidade, que é muito discutivel, foi chocante a falta de estrategia na preparação do leilão de um projeto de tal envergadura que envolve o bom nome do Governo do Brasil.

Um governo de um grande Pais não pode abrir um leilão que não tenha licitantes. Depõe contra o Governo e contra o Pais. Um projeto desse porte, cerca de US$20 bilhões tem que ser “”vendido”” aos interessados, por road shows que convidem potenciais interessados. Esse papel caberia ao banqueiro de investimentos do Governo, o BNDES, que fez exatamente isso nos leiloes de privatização coordenados pelo Banco. Só depois de haver razoavel certeza da existencia de licitantes e que se marca o leilão. O BNDES tem expertise e credibilidade para fazer esse papel e até coordenar consorcios, é o trabalho tipico de um banco de investimentos, seria muito mais importante do que sair correndo para ajudar uma fusão de supermercados.

Há no modelo do projeto do trem bala duas graves falhas: a ausencia de projeto basico, com o que esta se licitando uma caixa preta de custo e portanto retorno desconhecidos  e um limite injustificavel de preço de passagem, não é só o preço baixo, é mais que isso, não tem que haver limite de preço pois o trem bala terá concorrentes naturais na rodovia e no avião. Para que limitar o preço? Preço é uma resultante de uma enorme serie de variaveis, hoje desconhecidas, como se pode a priori fixar limite de preço, se não se conhece nem vagamente o custo e portanto qual a taxa de retorno Para que esse preciosismo? O interesse do concessionario é encher o trem, ele fixará um preço que seja competitivo com outros meios de transporte, o Estado não precisa fixar o preço, não é um monopolio.

Há um serio problema nas equipes que conduzem esses projetos, o que tambem ocorreu no projeto de Belo Monte: só tem burocratas. Estão faltando profissionais de mercado, pois se trata de uma venda de projeto, o projeto precisa ser vendido, é mercadoria, na marra ninguem vai entrar em leilão, especialmente porque se exige parceiro internacional com know-how e esses não virão só porque o Brasil quer. Parcerias publico privadas necessitam vendedor, com cabeça de mercado, não adianta burocrata, professor, pesquisador, academico,  isso é negocio e os interessados só vão entrar se estiveram convencidos que é um bom negocio.  A entrevista do representante do Governo apos o fracasso do leilão foi patética: Com cara de poucos amigos pontificou  “”Não vamos mudar o projeto só para adequa-lo aos licitantes”” . É inacreditavel. Se não ajusta-lo ao mercado, não terá interessados, não adianta querer impor o “”seu”” projeto, ele pode estar errado e os licitantes tem experiencia suficiente para saber isso. É i império do burocrata, isso só funcionava nos paises socialistas, se querem socio privado, o jogo é outro. Pelo visto ninguem ficou convencido ou porque não é mesmo um bom negocio ou porque ninguem se deu ao trabalho de vende-lo, de conversar, de montar consorcios, é trabalho de banco de investimentos, aonde está o BNDES nesse leilão?

As grandes firmas de engenharia do mundo estão avidas por projetos, precisam fazer negocio, se ninguem entrou é porque a coisa foi muito, mas muito, mal trabalhada.

Luis Nassif

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