Pelo fim da DRU

Do Valor

A renovação da DRU não faz mais sentido

O próximo presidente da República terá que decidir se encaminhará ao Congresso, logo no início de seu mandato, uma proposta de emenda constitucional (PEC) prorrogando a vigência do mecanismo que desvincula 20% da arrecadação da União. Ele acaba em 31 de dezembro de 2011. A DRU (Desvinculação das Receitas da União), como é conhecida, não é mais uma unanimidade entre os técnicos do governo e na área acadêmica. Muitos acreditam que ela perdeu o sentido.

O mecanismo foi criado em 1994, originalmente com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE). Ele nada tinha de social, mas ganhou esse nome, como revelou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em seu livro “A arte da Política”, para facilitar sua aprovação no Congresso. O FSE foi, na verdade, uma maneira de permitir ao governo dispor como quisesse de 20% das receitas da União constitucionalmente vinculadas a despesas específicas, como educação e seguridade social. 

OOrcaO Orçamento da União era, como é até hoje, muito engessado e os economistas que elaboraram o Plano Real precisavam de uma margem de manobra que garantisse recursos para a necessária amortização das dívidas ou o financiamento de programas considerados indispensáveis, fossem eles sociais ou não. Inicialmente, segundo FHC, os economistas pretendiam propor uma lei geral de finanças públicas que assegurasse melhor manejo dos recursos orçamentários. Mas, diante das dificuldades políticas que essa proposta enfrentaria, terminaram se contentando com um “remendo”, que foi o FSE. O FSE foi desenhado pelo economista Edmar Bacha, com a colaboração dos economistas Raul Velloso e Daniel de Oliveira.

Aquilo que era um “remendo” provisório, com tempo definido para acabar, foi sucessivamente prorrogado com outros nomes e pequenas modificações. Passou a se chamar Fundo de Estabilização Fiscal (FEF) e depois DRU.

A aprovação e renovação desse mecanismo no Congresso nunca foi fácil e sempre resultou em desgaste político para o governo. O FSE só conseguiu ser aprovado quando o ex-presidente FHC aceitou retirar da proposta a desvinculação das receitas que iam para os Estados e municípios. Ao longo dos anos, as pressões continuaram para que o governo aceitasse excluir da desvinculação outros setores. 

A última mudança ocorreu no ano passado, quando o governo Lula aceitou excluir do mecanismo a educação. De acordo com a emenda constitucional 59, apenas 5% dos recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino serão desvinculados este ano e, em 2011, não haverá nenhuma desvinculação.

Mas a DRU perdeu sua importância não apenas porque o governo terminou cedendo às pressões políticas. Hoje, não faz mais sentido desvincular as receitas destinadas a financiar a seguridade social (saúde, previdência e assistência social) pela simples razão de que esse orçamento é deficitário. O relatório e parecer prévio do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre as contas do governo de 2009 mostra que mesmo que a DRU não existisse, o orçamento da seguridade social seria deficitário em R$ 30,3 bilhões.

Segundo o relatório, as receitas da seguridade social atingiram R$ 360,8 bilhões no ano passado, contra despesas de R$ 427,4 bilhões, o que resultou em déficit de R$ 66,6 bilhões. A DRU ficou em R$ 36,3 bilhões, montante insuficiente para reverter o resultado negativo, como mostra a tabela abaixo. Não faz sentido, portanto, desvincular receitas de uma área que é deficitária. Ela está sendo, em parte, financiada com recursos do orçamento fiscal, ou seja com as receitas de outros impostos.

O novo governo terá que decidir se vale a pena lutar no Congresso pela renovação da DRU com o objetivo de desvincular pequenas receitas, como aquela que vai, por exemplo, para o BNDES. Talvez não. Mesmo porque o governo descobriu, com a experiência da execução orçamentária ao longo dos anos, uma maneira menos desgastante de desvincular as receitas de despesas específicas. Basta não gastar o dinheiro vinculado e deixá-lo para o superávit primário, como vem fazendo, por exemplo, com parte das receitas destinadas às agência reguladoras ou ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust).

Ribamar Oliveira é repórter especial em Brasília e escreve às quintas-feiras

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Luis Nassif

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