Resolver problemas estruturais demora mais, diz pesquisador

Do Estadão

“Resolver problemas estruturais demora mais”

Estudo do pesquisador, que compara 2000 . com 2010, revela que renda melhorou, mas a desigúaldade continua

Isadora Peron

Ao lançar na semana passada o slogan “O fim da miséria é só um começo”, a presidente Dilma Rousseff antecipou-se às crí­ticas dos que certamente apon­tariam as fragilidades sociais vi­vidas pelas famílias que agora irão passar a receber uma renda de R$ 70 por pessoa. A avalia­ção é do professor da Universi­dade Federal do ABC e pesqui­sador do Cebrap Arilson Favareto, que publicará nas próximas semanas um estudo que compa­ra a evolução dos indicadores de renda, pobreza e desigualda- de entre 2000 e 2010. A pesqui­sa mostra que em 70% do País a melhora desses três indicado­res caminhou junta, mas a desi­gualdade persiste.

Se o fim da miséria é só um começo, o que vem a seguir?

O governo foi muito feliz com esse slogan, porque foi uma ma­neira de se adiantar às críticas. Com isso, o governo dialoga com a crítica de que o patamar de R$ 70 é muito baixo e com o fato de que a pobreza não se me­de apenas pela renda.

E o que o governo precisa fazer agora pára avançar?

Uma vez resolvidos os proble­mas da pobreza monetária, os outros começam a aparecer. A tendência é que, ao longo dos próximos dez anos, a agenda do combate à pobreza se desloque da questão monetária para os problemas mais estruturais, por­que as próprias famílias vão co­meçar a cobrar isso. A questão antes era emergencial: precisava- se de dinheiro para comer, para comprar roupa e remédio. Uma vez resolvidos esses problemas, as preocupações das pessoas co­meçam a ser outras. Elas vão querer mais qualidade na educa­ção, mais saúde, obras de sanea­mento, essas coisas.

E como dar isso às pessoas?

Hoje o desempenho dos indica­dores nesse campo é muito he­terogêneo: você tem indicado­res onde as coisas vêm melho­rando num ritmo significativo, como é o caso sobretudo dos li­gados à área da educação, e ou­tros, como é o acesso a pontos de água e saneamento, onde o progresso é extremamente len­to. Então o desafio agora é in­tensificar o progresso desses indicadores.

Por que o saneamento básico avançou tão pouco?

Resolver os problemas estruturais é mais de­morado. Transferên­cia de renda é algo mais rápido, é só dar o dinheiro na mão das pessoas. Fazer sanea­mento envolve obras de infraestrutura, o que leva bem mais tempo.

Que outros indicadores vão precisar de mais atenção do go­verno federal?

Os que medem a qualidade na educação, que têm apresentado algum progresso, mas estao em patamares muito baixos. E tam­bém a quantidade de médicos por habitantes, particularmente no interior do País. Há uma dificuldade grande hoje de con­vencer bons profissionais a ir trabalhar em regiões distantes.

A sua pesquisa mostra que ape­sar do aumento da renda a desi­gualdade permanece. Por quê?

Isso acontece porque o governo tem uma estratégia meio esquizofrênica: por um lado ele me­lhora a situação dos pobres, com a trans­ferência de renda, mas, por outro, com os re­passes do BNDES , ele es­timula a expansão da pecuária, uma ativida­de que concentra terra e renda. Essas pessoas que recebem o Bolsa Família ficam menos po­bres, mas, ao mesmo tempo, o governo estimula um tipo de uso dos recursos naturais que é altamente concentrador.

As críticas ao baixo crescimen­to do PIB do pré-candidato tuca­no à Presidência Aécio Neves serão suficientes para levar a oposição de volta ao poder?

Esse problema é distante para a maioria da população. Embora o País tenha crescido pouco nesses últimos anos, a melhoria dos indicadores sociais foi expressi­va. Mesmo com problemas para ainda serem resolvidos, a gente vê uma melhoria no entorno e é por isso que o discurso da oposi­ção não cola. Se você visitar  uma família do sertão da Paraí­ba, vai perceber que a educação e a saúde das pessoas é melhor hoje do que era há dez anos. Pa­ra desespero do PSDB, os pro­blemas estruturais desse estilo brasileiro de desenvolvimento  só tendem a ser sentidos daqui a uma década ou mais.

Luis Nassif

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