Uma empresa deve ser mais do que um pote de ouro

Tradução de trecho da entrevista publicada no Upsides em 28/02/2013


Nós precisamos de um novo sistema de mercado, de acordo com Pavan Sukhdev, fundador-CEO da GIST Advisory. Um mercado que não esteja definido somente pelo sucesso financeiro, mas pelo menos uma vez, foque no quadro completo. E o ex-banqueiro está tendo um bom começo. Ao identificar o valor do impacto sobre o capital natural e humano, por exemplo.



Você acredita firmemente em repensar como os negócios funcionam. Qual é exatamente o problema?


“O problema é que baseamos a nossa visão de quão saudável é uma empresa apenas em suas finanças. Não faz parte do nosso sistema de mercado capitalista atual olhar além do estado financeiro de uma empresa como sendo um ativo de propriedade dos acionistas. Mas uma corporação em qualquer forma ou formato gera muitos impactos na sociedade. Ela cria capital social, mas também pode destruí-lo. Ela pode colocar as pessoas desempregadas ou pode colocar as pessoas em postos de trabalho. Ela pode criar comunidades. É possível trazer educação e habilidades para as pessoas. Ela pode destruir o capital natural, através das alterações climáticas e a perda da biodiversidade, por exemplo. Mas o único impacto que medimos é o impacto financeiro sobre seus acionistas! É uma falha fundamental e parece-me fora de proporção. A corporação é muito mais do que um pote de ouro. E até agora, só julgamos essas empresas por sua situação financeira. Não me interpretem mal. Eu sou um banqueiro e um cientista, então eu preciso de números. Nós só podemos gerenciar o que podemos medir. Mas precisamos olhar para além dos lucros e perdas. Precisamos incorporar outras normas importantes para os nossos métodos atuais de contabilidade. Meu principal objetivo é colocar um valor econômico sobre a natureza e os serviços que ela provê.”


A invisibilidade econômica da natureza deve terminar, e o valor dos serviços da biodiversidade e dos ecossistemas deve ser reconhecido. De que forma isto ajuda as empresas a sobrevierem?


“Quando você coloca um valor econômico dos serviços da natureza, torna-se visível quais os custos das alternativas para esses serviços da natureza. Podemos usar a natureza de graça, mas isso não significa que ela não possui valor. Em outras palavras: eles têm valor, mas não tem preço. O problema é que estamos muito ligados ao preço. Pensamos que tudo o que tem valor tem um preço, o que simplesmente não é o caso. A forma como podemos valorizar bens livres é incorporar os custos para as alternativas. Se levarmos em conta os bens que precisamos comprar que também podem ser obtidos na natureza, nós vemos o preço deles. Quando você não pode conseguir lenha da floresta nas proximidades, você precisa ir a um mercado e comprar lenha. O custo do transporte e o custo da madeira é igual ao valor da madeira livre da floresta. Se você olhar para este exemplo em uma escala maior, o mundo, você vai ficar chocado. A perda contínua de florestas representa uma perda de utilidade e serviços para a humanidade da ordem de dois a quatro e meio trilhão de dólares. Isso é dois a quatro e meio trilhão de dólares por ano! E essa perda vem acontecendo a cada ano por muitos anos. Isso se compara de forma significativa com a perda de um e meio a dois trilhões de dólares, que é a perda sistêmica de capital financeiro, como resultado do que é de fato a maior crise financeira que o mundo já viu. Então, se nós realmente reconhecermos os custos da poluição e destruição da natureza e, em vez disso usarmos ela sabiamente, poderíamos economizar muito dinheiro. E negócios da mesma forma.”


Mas as empresas estão dispostas a olhar para as suas pegadas se isso significa que elas teriam que ser transparentes sobre isso? Não seria torná-las mais vulneráveis do que já são?


“É preciso muita visão e coragem para ser transparente, mas há grandes empresas que são abertas sobre as suas pegadas. Por exemplo: Puma. Puma tomou isso em um nível ainda mais alto. Eles calcularam os efeitos de sua fabricação e cadeia de suprimentos na sociedade. Eles incorporaram a perda de florestas e o impacto da poluição na saúde humana. Agora que eles sabem o que são suas pegadas, eles podem fazer algo sobre isso. Eles agora podem demonstrar como reduzi-las. Infelizmente, nem todas as empresas estão dispostas a serem transparentes, ou não podem dar-se ao luxo de serem. É por isso que eu acho que, para serem bem sucedidos, os países precisam também olhar para além dos métodos convencionais de contabilidade (ou seja, o produto interno bruto, ou PIB). Um método alternativo que está ganhando força é a “contabilidade verde”, em que os países incorporarão bens da natureza e serviços em suas contas nacionais. Isto é feito através da quantificação do valor que os ecossistemas trazem para as suas economias, contabilizando a sua utilização, o crescimento ou declínio. Outra ferramenta importante de governos são os impostos. Se os governos taxarem os “maus” e não taxarem os “bons”, as empresas são forçadas a repensar os seus recursos e precisam dar uma olhada em suas pegadas. Nesta frente, o Brasil e a Índia estão começando a incorporar esses métodos em seu sistema de governo, juntamente com países progressistas escandinavos.”


Este novo modelo econômico não é algo que só pode ter sucesso em momentos financeiramente melhores? As corporações têm espaço financeiro para mudanças revolucionárias?


“As pessoas não pensam em mudança quando tudo está bem. Empresas e governos são inclinados a mudar somente em crises. Eles são obrigados a pensar diferente, de olhar para diferentes formas de fazer negócios e repensar mercados e a economia. Acredito firmemente que este é o momento para comunicar que há um problema com o atual modelo econômico. Se valorizamos o capital natural, se virmos o seu potencial produtivo e virmos seu potencial de emprego, podemos ter a solução em nossas mãos.”


Pavan Sukhdev sobre a invisibilidade da natureza na economia atual.


Pavan Sukhdev, fundador-CEO da GIST Advisory fala sobre a atual invisibilidade econômica da natureza. O fato de que os serviços ecossistêmicos vitais não são contabilizados no nosso PIB e lucros privados. Como membro do conselho consultivo do TEEB (The Economics of Ecosystems and Biodiversity), Pavan está envolvido no desenvolvimento de um sistema para calcular o custo crescente da perda da biodiversidade e a degradação dos ecossistemas. Essa abordagem nos permite demonstrar e capturar os valores dos ecossistemas e da biodiversidade, incluindo a forma de incorporar esses valores nas tomadas de decisão.


Clique aqui para ver o video.


NT: a expressão “money cow” foi traduzida como “pote de ouro”, por falta de uma expressão similar em português.
Traduzido por: José Luiz Berg


 

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