A história de Orozimbo Roxo Loureiro, o homem do Copan

Estou mergulhado no meu próximo livro, que passa por diversos pontos da história do país. Como não dará para incluir tudo, senão vira enciclopédia, divulgarei por aqui as histórias paralelas recolhidas.

Aqui se faz um pequeno interlúdio para se contar um pouco de Orozimbo Roxo Loureiro e seu Banco Nacional Imobiliário.

Orozimbo era irmão de Loureiro Júnior, genro de Plinio Salgado e um dos ideólogos do integralismo. Era um empreendedor fantástico, dotado da imaginação, ousadia e, infelizmente, do sentimento pouco prático de um artista.

A avó de Roxo Loureiro era da família da Baronesa de Guanabara. Casou-se com José Loureiro, advogado de Sertãozinho. Por influência do pai, Roxo Loureiro foi estudar no tradicional Colégio São Bento.

O início do grupo foi na parte imobiliária, com a Companhia Nacional Imobiliária. Para diretor, Orozimbo foi buscar o jovem Otávio Frias Filho, funcionário da Secretaria da Fazenda que acabou perdendo o posto quando Ademar de Barros foi apeado da interventoria do Estado.

Acertou vários compromissos de compra e venda de casas velhas em um triângulo entre a rua Direita com Quintino Bocaiuva. Os projetos eram de Niemayer, com propaganda em página dupla dos jornais mostrando a maquete do prédio. E o modelo de negócios pensado por Frias era o do condomínio a preço de custo.

Foi um sucesso retumbante e um crescimento imprudente. Quando entregou o primeiro condomínio, na rua Direita, outros onze estavam em construção, o último dos quais o Copan.

E aí decidiu transformar a Companhia Nacional Imobiliária no Banco Nacional Imobiliário, a primeira grande revolução no sistema financeiro brasileiro, ainda preso à economia do café.

Trouxe Frias como sócio, com 10% do capital e

Com bom domínio do inglês e muito arrojo, Roxo Loureiro consultou o catálogo do Bank of America e passou a escrever para seu presidente Mário Gianini, que aceitou recebe-lo nos Estados Unidos.

Mario era filho de Amadeo Gianini, o fundador do banco e a partir dos anos 30 iniciou o processo de internacionalização do banco. O Bank of America foi o primeiro a fornecer serviços par à classe média e, em 1950, o primeiro banco do mundo a utilizar a computação e a lançar o cartão de crédito.

Um dia Roxo Loureiro surpreendeu o sócio Frias com o convite.

–       Corre aqui que temos duas passagens para ir aos Estados Unidos.

Quem enviara as passagens era o próprio Gianini. Tiveram alguma dificuldade em entrar no prédio. Recebidos na sala de Gianini, este pediu:

–       Fale do Brasil com o mesmo entujsiasmo que você me contou nas cartas.

Mario Gianini e seu pai

Roxo Loureiro começou, e Gianini:

–       Já vi que nossa conversa vai longe.

Da conversa veio a convicção sobre a necessidade de abrir muitas agências e de criar uma caderneta de poupança. Lançou a primeira, o Kanguru Mirim e cerca de 30 agências por toda a cidade, saindo do centro bancário.

Depois foram visitar um gênio de underwritings no Morgan. Da conversa, veio a ideia da criação de fundos de investimento em ações.Constituiu aquele que provavelmente foi o primeiro fundo de investimento brasileiro. Seus advogados foram desenterrar do Código Comercial Brasileiro de 1850 uma certa Conta de Participação, que ajudou a dar forma jurídica ao Fundo de Investimento e Participação.

Depois, seus analistas levantaram estudos acerca de fundos estrangeiros especializados em ações de companhias de energia elétrica, petróleo e automóveis e julgaram que já conheciam tudo. Acabaram se baseando no modelo do “Investment Fund for Capital Apreciation and Dividends”, um fundo de investimento com valorização diária, dividido em quotas de participação de Cr$ 50 mil, vendidas à vista ou a prazo de dois anos.

A crise bancária

Mas os tempos não eram favoráveis. Surgiram muitos bancos novos, sem experiência na área, meramente para se valer da liquidez das empresas-mãe. E o segundo governo Ademar – eleito – arruinou completamente as contas do Estado.

Quando Ademar saiu, a instabilidade do sistema bancário chamou a atenção dos banqueiros tradicionais de São Paulo, que foram até Lucas Nogueira Garcez solicitar providências.

Egresso do ademarismo, nos três primeiros anos de governo Garcez, Ademar praticamente comandou a máquina do estado.

No quarto, Garcez rompeu com Ademar e decidiu atender às demandas dos banqueiros que exigiam que a Fazenda do Estado fosse recuperada.

Ademar tinha montado uma máquina de corrupção imbatível, emitindo títulos para pagar salários, títulos para as obras do Quarto Centenário. Como os títulos tinham poder liberatório (isto é, podiam ser utilizados para quitar tributos estaduais) formou-se um enorme mercado paralelo para negociação. Parte relevante dos títulos, estimada em 50%, foi desviada por Ademar para diversos laranjas. Para não deixar pistas, eram negociados com bancos privados na praça de Zurique.

Garcez demitiu o Secretário da Fazenda, ligado a Ademar e decidiu entrar no problema da Fazenda. Nomeou Teodoro Quartim Barbosa, do Banco do Commércio e Indústria de São Paulo. Mas não deu certo. Teodoro trouxe na sua equipe Roberto Amaral, alto executivo do banco. Mas Amaral continuou acumulando suas tarefas no Commércio e Indústria, dando expediente de três horas na Fazenda.

Os banqueiros reuniram-se e, por consenso, indicaram para Ademar o nome de Sebastião Paes de Almeida, que dirigia o Banco do Estado de São Paulo e dispunha de equipe.

Sebastião assumiu, trouxe sua equipe e ancorou-se em Portugal Gouvea, diretor geral e funcionário de enorme respeitabilidade. Iniciados os trabalhos, a equipe se deu conta da enormidade da dívida. Não eram apenas títulos da dívida, mas empréstimos vultosos vencidos com o Banco do Brasil.

As liquidações bancárias

A primeira liquidação foi do Banco Cruzeiro do Sul, de Ricardo Jafet, presidente do Banco do Brasil no segundo governo Vargas. No BB aprovou operação totalmente ilegal de Cr$ 50 milhões para seu próprio banco. Saiu do BB e não quitou o empréstimo.

O segundo foi o próprio BNI que acabou misturando seu caixa com o da imobiliária, enredeou-se nos sucessivos lançamentos financeiramente mal planejados de Orozimbo e, principalmente, com a decisão do dono de ingressar na politica.

Acabou enfrentando problemas no redesconto, ampliados depois de uma entrevista imprudente de Otávio Gouvêa de Bilhões, então presidente da Sumoc, que acabou provocando uma corrida bancária.

Para impedir que a corrida contra o BNI se estendesse a outros bancos, foi montada uma verdadeira operação de guerra. A sede do Banco do Brasil era no Largo da Candelária, no Rio. No subsolo havia um caixa imenso. Na porta de trás, a entrada de serviço.

O funcionário interventor do BNI estimou em Cr$ 50 milhões as necessidades do banco. O dinheiro foi transportado a São Paulo em caixas de pinho com duas alças para colocar as cordas que serviam para serem carregadas.

O BB tinha uma perua para transporte de material e dinheiro, um Ford verde garrafa sem placa oficial para não atrair assaltantes.

Com a perua cheia, Ary Giacomo Bisaglia, homem de confiança de Sebastiao Paes de Almeida, sentou ao lado do motorista e ordenou o destino: aeroporto Santos Dumont. Chegando lá, entrou pelo portão de serviços e foi direto para o avião da Vasp, que já o aguardava na pista.

O fim do BNI

O BNI acabou vendido com suas agências bancárias para o Bradesco. Com a crise, 80% dos condôminos do Copan interromperam os pagamentos.

Orozimbo fez um péssimo negócio. Aceitou ficar apenas com o Clube dos 500, que construíra na Dutra. Tempos depois o Bradesco fez-lhe a proposta de incorporar o Clube na recém constituída Bradesco Turismo, ficando com 5% da empresa. Deu Cr$ 1 milhão em dinheiro e Cr$ 2 milhões em ações da Companhia de Hotéis Bradesco.

Certa vez, Orozimbo Roxo Loureiro Junior encontrou-se com Amador Aguiar, que foi franco:

– Se seu pai tivesse pedido mais cem apartamentos no Copan, teríamos cedido. Mas ele só pediu o Clube dos 500.

Amador tinha uma pequena em Itajubá. Muitas vezes ia para lá com o inseparável Mário Aguiar e passava pelo Clube dos 500.

Com o tempo o isolamento no Clube dos 500 tornou-se massacrante para Orozimbo. A companhia de turismo cresceu com incentivos do Imposto de Renda, comprou terrenos em São José dos Campos, Ribeirão Preto, construiu um hotel em Nova Odessa.

Mas aí o Banco Central mudou as regras do jogo e, em vez da empresa escolher a empresa o dinheiro do incentivo ia para um fundo da Embratur onde passou a ser dividido politicamente entre Othon Bezerra de Mello e José Tjurs, do Hotel Nacional de Brasília.

Passou um tempo, Amador Aguiar chamou Orozimbo na Cidade de Deus.

Orozimbo havia recorrido a Laudo Natel contra o jogo político da Embratur. Vieram sinais de que poderia haver represálias contra o Bradesco.

– Negócio seguinte, vamos parar com essa companhia, não tem jeito. Você não quer trocar suas ações por certificados de depósito?

Trocou. Mas vieram diversos planos econômicos dos anos 80 que arrasaram com a poupança de Roxo Loureiro. Pensou em devolver os certificados a Amador Aguiar e receber de volta o Clube dos 500.

Mas, como, indagava o filho, se há diversas obras feitas posteriormente? Orozimbo imaginava pedir dez anos de prazo para quitar a diferença.

Pegou o carro, foi até a Cidade de Deus e pediu o impossível: a devolução do Clube dos 500. Amador surpreendeu-se:

– Orozimbo, não posso fazer isso. Aqui é uma empresa, fizemos negócio, negócio feito.

Vindo de um infarto, Orozimbo não resistiu, morreu na frente de Amador Aguiar.

Quando comecei a me destacar no jornalismo econômico, no início dos anos 80, recebi seu livro com uma dedicatória carinhosa. Não cheguei a conhece-lo.

 

Luis Nassif

6 Comentários

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  1. O terrível no Brasil é que há

    O terrível no Brasil é que há poucos livros de peso, não chapa-brancas sobre as personalidades políticos que fizeram e desfizeram esse país. Ademar de Barros é, sem dúvida,  uma delas. Dele veio o famoso lema  ” Rouba, mas faz.”  Estamos em um tal momento decadente que hoje nosso político rouba, e não faz (vide a expansão do metrô em Sampa ).  Talvez a coisa melhore com o fim da exigência de o biografo ter que pedir autorização do biógrafado ou da família pra escrever qualquer coisa. 

  2. Hoje um personagem desse

    Hoje um personagem desse tipo, que com todos seus erros e acertos criou tanta coisa, nem começaria, no primeiro dia

    seria denunciado pelo Ministerio Publico.

    1. depende André, se for em SP e agradar aos tucanos…

      o problema é que os tucanos gostam do tipo rouba e não faz. não do tipo que faz!

      no mp de SP, tem espaço pra muita criatividade!

  3. Off-topic

    Historia de familia:

    Vizinha pra mamae:  “mas eu acho que o nome mais feio do mundo eh Orozimba!”

    Mamae:  “Nossa, ainda bem que nao eh o meu.”

    Vizinha agora curiosa:  “qual o seu nome, dona Maria?”

    Mamae:  “eh Orozina”…

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