Abolição da Escravatura, um 13 de maio para pensar

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Um momento musical em torno da Abolição. Não música sobre escravidão, mas permeando o trabalho extenuante a que se submete o negro… Toda a vida em um trabalho quase escravo, sendo escravo sem sê-lo.

A escravidão acabou num 13 de maio dos idos de 1888. Mas as condições mudaram tão lentamente que quase não mudaram. Como se inserir na sociedade se as condições mínimas não foram dadas? Foi um brigar constante, de séculos em busca de igualdade de condições com os demais cidadãos.

E que as dificuldades ainda permanecem, nem se discute. Não se pode tapar o sol com a peneira nem transformar a caminhada em poesia. É preciso ter olhos de ver e ouvidos de ouvir para que a história seja, finalmente, outra.

A Abolição foi em 1888 e o Brasil ainda se debate entre o sentimento branco de superioridade e o sentimento de ser brasileiro.

Um pouco de história

E os portugueses vieram, colonizando um Brasil imenso e sem mão-de-obra para tantos trabalhos. Tentaram submeter os índios às suas necessidades. Não conseguiram, pois que os religiosos entraram no circuito pois queriam que a religião fosse o norte a submeter os povos da nova terra.

Mas os portugueses não se abalaram. Como todos os europeus da época, foram em busca de negros na África, para escravizá-los e torná-los a mão de sua obra. E assim vieram os escravos para o Brasil.

Em porões dos navios fétidos, os africanos foram roubados de si, carregados em péssimas condições, muitas vidas se perdendo durante a viagem. Ao desembarcarem, eram vendidos aos fazendeiros e senhores de engenho, que os tratavam como mercadorias.

Acordam por fim alguns da terra, e formam um grupo abolicionista. Eram literatos, religiosos, políticos ou pessoas do povo, que lutavam contra o abuso. Mas uma luta infinda, pois que a escravidão permaneceu negócio por quase 300 anos.

O econômico foi o fator primordial para a manutenção da prática. A economia do país dependia do trabalho escravo, seja para as tarefas da roça ou outras tão pesadas quanto. As providências para uma libertação teriam que ser tomadas lentamente, para não ocasionar a derrocada da economia.

Em 1850 foi dado o primeiro passo, findando o tráfico negreiro. Em 28 de setembro de 1871, vinte anos mais tarde foi promulgada a Lei do Ventre-Livre, que tornava livre os filhos de escravos que nascessem a partir de então.

A região Sul do Brasil, a partir de 1870, começou a empregar assalariados, tanto brasileiros quanto imigrantes estrangeiros. Na região Norte, as usinas substituíram os engenhos primitivos, o que pedia um número menor de escravos. Nas principais cidades, acenava no horizonte o surgimento de indústrias.

Em 1885, com a lei Saraiva-Cotegipe, ou dos Sexagenários, beneficiou-se os negros de mais de 65 anos e, em 13 de maio de 1888, através da Lei Áurea, a liberdade foi finalmente alcançada pelos negros no Brasil. A lei, assinada pela Princesa Isabel, abolia de vez a escravidão no País.

E depois da lei, o que aconteceu? Assinada a lei, a vida dos negros brasileiros não ficou mais fácil. O estado brasileiro não se preocupou em dar condições para que os escravos fossem integrados no mercado de trabalho formal e assalariado. A elite brasileira continuou em seu processo de preconceito e, a prova disso, foi a preferência pela mão-de-obra européia, que aumentou sobremaneira no Brasil após a Abolição.

A maioria dos negros encontrou dificuldades para conseguir empregos e manter uma vida com o mínimo necessário para sua dignidade, como moradia e educação principalmente.

Resolvido o viés legal, o negro se viu sem eira e sem beira, sem rumo e sem norte, buscando dar conta de viver, sobreviver e ter dignidade, num mundo em que foi subjugado. Teve que fazer brotar a própria dignidade, apagar os traços da servidão e ganhar rumo, dentro de um Brasil que agora também seria dele.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

25 Comentários

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  1. Vergonha nacional. O Brasil

    Vergonha nacional. O Brasil foi o último país do mundo civilizado a abolir a escravatura. A discussão sobre quotas invariavelmente esconde esta realidade e tenta colocar que as quotas são injustas, pois o que deveria prevalecer é a capacidade de cada indivíduo, ignorando as questões de oportunidades e possibilidades de acesso das populações negras aos serviços básicos de nossa nação e a uma educação mínima que permitisse disputar cargos e empregos, se não em igualdade de condições, pelo menos com possibilidade de equilibrar os méritos. Só para informar aos que lêm pouco, gostaria de registrar a conclusão do último censo do IBGE: negros recebem 50% dos salários dos brancos em nosso país. Quando declarei esta conclusão a alguns conhecidos, um me disse que não acreditava, pois sua empresa nunca fez diferença entre negros e brancos (acredite quem quiser!), outro me perguntou se isto também era válido para o serviço público, ao que lhe respondi: não, no serviço público as tabelas de vencimentos não têm segregação entre brancos e negros, mas basta ver a quantidade de brancos e de negros no serviço público para verificar que algo está errado, pois num país com mais negros do que brancos, é no mínimo estranhável que os servidores brancos superem em quantidade absurda o número de negros. A propósito sou branco, mas me envergonho com o que os brancos dessa nação defendem no que respeita a racismo e compensação aos negros pela exploração vergonhosa praticada por séculos.

      1. Obrigado Luciano, se tu me

        Obrigado Luciano, se tu me permitires a intimidade de assim te chamar. É muito bom saber que outros pensam como nós. Esta talvez seja uma das músicas mais lindas do cancioneiro brasileiro e leva ao limite a função educativa que a música popular deve ter. Mais uma vez obrigado, amigo. Conseguiste me fazer chorar um pouco.

  2. Maravilha

    Texto pra reflexão sobre as dificuldades que estão ocorrendo ainda nos dias de hoje.

    E vivam as cotas!

    Parabéns, Luciano e Lourdes.

  3. O Navio Negreiro’Stamos em
    O Navio Negreiro

    ‘Stamos em pleno mar
    Era um sonho dantesco… o tombadilho, 
    Que das luzernas avermelha o brilho, 
    Em sangue a se banhar. 
    Tinir de ferros… estalar do açoite…
    Legiões de homens negros como a noite, 
    Horrendos a dançar… 

    Negras mulheres, suspendendo às tetas 
    Magras crianças, cujas bocas pretas 
    Rega o sangue das mães: 
    Outras, moças… mas nuas, espantadas, 
    No turbilhão de espectros arrastadas, 
    Em ânsia e mágoa vãs.

    E ri-se a orquestra, irônica, estridente…
    E da ronda fantástica a serpente 
    Faz doudas espirais…
    Se o velho arqueja… se no chão resvala, 
    Ouvem-se gritos… o chicote estala. 
    E voam mais e mais… 
    Presa dos elos de uma só cadeia, 
    A multidão faminta cambaleia 
    E chora e dança ali!

    Um de raiva delira, outro enlouquece… 
    Outro, que de martírios embrutece, 
    Cantando, geme e ri!

    No entanto o capitão manda a manobra 
    E após, fitando o céu que se desdobra 
    Tão puro sobre o mar,

    Diz do fumo entre os densos nevoeiros: 
    “Vibrai rijo o chicote, marinheiros! 
    Fazei-os mais dançar!…”

    E ri-se a orquestra irônica, estridente…
    E da ronda fantástica a serpente 
    Faz doudas espirais! 
    Qual num sonho dantesco as sombras voam…
    Gritos, ais, maldições, preces ressoam! 
    E ri-se Satanaz!…
    Senhor Deus dos desgraçados! 
    Dizei-me vós, Senhor Deus! 
    Se é loucura… se é verdade 
    Tanto horror perante os céus…
    Ó mar, por que não apagas 
    Co’a esponja de tuas vagas 
    De teu manto este borrão?…
    Astros! noite! tempestades! 
    Rolai das imensidades! 
    Varrei os mares, tufão!…

    Quem são estes desgraçados 
    Que não encontram em vós 
    Mais que o rir calmo da turba
    Que excita a fúria do algoz? 
    Quem são?… Se a estrela se cala, 
    Se a vaga à pressa resvala 
    Como um cúmplice fugaz, 
    Perante a noite confusa… 
    Dize-o tu, severa musa, 
    Musa libérrima, audaz!

    São os filhos do deserto 
    Onde a terra esposa a luz. 
    Onde voa em campo aberto 
    A tribo dos homens nus…

    São os guerreiros ousados, 
    Que com os tigres mosqueados 
    Combatem na solidão…
    Homens simples, fortes, bravos…
    Hoje míseros escravos 
    Sem ar, sem luz, sem razão…

    São mulheres desgraçadas 
    Como Agar o foi também, 
    Que sedentas, alquebradas, 
    De longe… bem longe vêm…
    Trazendo com tíbios passos 
    Filhos e algemas nos braços, 
    N’alma lágrimas e fel. 
    Como Agar sofrendo tanto 
    Que nem o leite do pranto 
    Têm que dar para Ismael…

    Lá nas areias infindas, 
    Das palmeiras no país,
    Nasceram crianças lindas,
    Viveram moças gentis…
    Passa um dia a caravana 
    Quando a virgem na cabana 
    Cisma das noites nos véus…
    …Adeus! ó choça do monte!…
    …Adeus! palmeiras da fonte!…
    …Adeus! amores… adeus!…

    Senhor Deus dos desgraçados! 
    Dizei-me vós, Senhor Deus! 
    Se eu deliro… ou se é verdade

    Tanto horror perante os céus… 
    Ó mar, por que não apagas 
    Co’a esponja de tuas vagas 
    De teu manto este borrão? 
    Astros! noite! tempestades! 
    Rolai das imensidades! 
    Varrei os mares, tufão!…

    E existe um povo que a bandeira empresta 
    P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!… 
    E deixa-a transformar-se nessa festa 
    Em manto impuro de bacante fria!…
    Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta, 
    Que impudente na gávea tripudia?!… 
    Silêncio!… Musa! chora, chora tanto 
    Que o pavilhão se lave no seu pranto…

    Auriverde pendão de minha terra, 
    Que a brisa do Brasil beija e balança, 
    Estandarte que a luz do sol encerra, 
    E as promessas divinas da esperança…
    Tu, que da liberdade após a guerra, 
    Foste hasteado dos heróis na lança, 
    Antes te houvessem roto na batalha, 
    Que servires a um povo de mortalha!…

    Fatalidade atroz que a mente esmaga! 
    Extingue nesta hora o brigue imundo 
    O trilho que Colombo abriu na vaga, 
    Como um íris no pélago profundo!… 
    …Mas é infâmia demais…
    Da etérea plaga
    Levantai-vos, heróis do Novo Mundo… 
    Andrada! arranca este pendão dos ares! 
    Colombo! fecha a porta de teus mares!Castro AlvesCaetano Veloso & Maria Bethaniahttp://www.youtube.com/watch?v=1Osbp0IMYRM

    Link: http://www.vagalume.com.br/caetano-veloso/o-navio-negreiro.html#ixzz31bZHTkfV

  4. “A escravidão acabou num 13

    “A escravidão acabou num 13 de maio dos idos de 1888 …E depois da lei, o que aconteceu? …”

    Aconteceu que logo no ano seguinte a elite bem nascida  promoveu sua primeira grande quartelada. Nos idos de novembro de 1889 proclamaram a República. Antes que perdessem as rédeas da situação, resolveram adotar o método que usariam durante todo século XX.

  5. O negro no Serviço Público

    Embora o Brasil seja o 1º em campeonatos de futebol, costuma ser dos último nas coisas importantes, tais como educação; médicos por habitantes; entrar e sair do governo militar; ou legislar eficientemente sobre crimes cometidos por menores.

    Quanto ao processo de restituir ao negro brasileiro sua isonomia em relação aos brancos, também seremos os últimos do planeta, pois os canais de TV exibirão hoje a maioria de apresentadores brancos, assim como a maioria dos comentaristas e entrevistados sobre este tema serão brancos. Aliás, quando ofendem um jogador negro celebridade com bananas, os comentários nas tvs, bons ou ruins, serão sempre, na maioria, de brancos.

    No Serviço Público, pode-se observar o seguinte: Somente a partir da Constituição de 1988, houve possibilidade de acesso “real” de negros nas melhores carreiras dos governos, via concurso público. No entanto, o percentual de negros com acesso a boas escolas de ensino fundamental é ínfimo em relação ao de brancos, ou seja, as primeiras colocações em concursos públicos hão de necessariamente contemplar esta realidade.

    Ainda assim, se o negro vencer tudo e chegar às melhores carreiras do governo, descobrirá que os cargos em comissão são também destinados à maioria branca e, quase sempre, sem competição de regras claras e imparciais. O Brasil avançou na questão do negro, desde 13 de maio de 1888, mas está atrás de países como França e EUA, por exemplo.

  6. Recuso-me “comemorar” o dia

    Recuso-me “comemorar” o dia 13 maio, foi uma farsa.

    O verdadeiro dia dos que representam  51% da população brasileira é 20 de Novembro.

  7. Dia 13 de maio é dia da consciência branca

    O dia 13 de maio, para os negros, não quer dizer muita coisa. Nada mudou. E a princesa Izabel, digo governo, só assinou a lei áurea por pressão internacional, em especial da Inglaterra. Dia 13 de Maio, na verdade, deveria ser conhecido como o dia em que a elite branca do Brasil, tentou jogar o lixo para debaixo do tapete. “Libertam-se” os negros e em seguida investe-se em maciça imigração européia, e branca, com o objetivo de extinguir qualquer traço de negritude da população brasileira. Eugenismo à brasileira – eugenia à brasileira aplaudida por caras como Nina Rodrigues e depois por Monteiro Lobato. O dia 13 de maio, pelos negros, no Brasil, grosso modo, é lembrado como o dia em os negros foram feitos de palhaços: liberdade sem emprego, sem indenizações, sem um projeto de inserção do negro na sociedade, sobretudo, sem dignidade.

  8. O negro no Serviço Público

    Embora o Brasil seja o 1º em campeonatos de futebol, costuma ser dos último nas coisas importantes, tais como educação; médicos por habitantes; entrar e sair do governo militar; ou legislar eficientemente sobre crimes cometidos por menores.

    Quanto ao processo de restituir ao negro brasileiro sua isonomia em relação aos brancos, também seremos os últimos do planeta, pois os canais de TV exibirão hoje a maioria de apresentadores brancos, assim como a maioria dos comentaristas e entrevistados sobre este tema serão brancos. Aliás, quando ofendem um jogador negro celebridade com bananas, os comentários nas tvs, bons ou ruins, serão sempre, na maioria, de brancos.

    No Serviço Público, pode-se observar o seguinte: Somente a partir da Constituição de 1988, houve possibilidade de acesso “real” de negros nas melhores carreiras dos governos, via concurso público. No entanto, o percentual de negros com acesso a boas escolas de ensino fundamental é ínfimo em relação ao de brancos, ou seja, as primeiras colocações em concursos públicos hão de necessariamente contemplar esta realidade.

    Ainda assim, se o negro vencer tudo e chegar às melhores carreiras do governo, descobrirá que os cargos em comissão são também destinados à maioria branca e, quase sempre, sem competição de regras claras e imparciais. O Brasil avançou na questão do negro, desde 13 de maio de 1888, mas está atrás de países como França e EUA, por exemplo.

  9. Eu nao sei se as coisas sao

    Eu nao sei se as coisas sao melhores para os negros em outros paises. Eh comum aqui pela Europa verificar que os negros sempre andam juntos, sendo raros os momentos em que se pode ver uma verdadeira mescla. Ha lugares em que eh evidente meu sentimento de “exotismo”. Isso eh bem diferente do Brasil e seu racismo velado, onde vemos brancos e negros andando juntos na maior parte das vezes. Sei lah…

  10. Os portugueses não

    Os portugueses não “colonizaram” nada no Brasil. Eles “invadiram” as nossas terras, que já hestava habitadas.  Era dos índios. E encheram de assassinos e bandidos perigosos as nossas terras, uma vez que lhes era oportuno deportarem os seus condenados à prisão perpétua, aqui… Vinham juntos com os africanos, que esses portugueses roubavam de seu continente. 

    Sim, o navio era fétido, havia doenças, tristeza, gestantes e bebês, crianças de todas as idades…Sim, eles os trouxeram e no final, em pleno Século XXI, vemos os resquícios dessa missigenação, no DNA de muitos de nós. Os bons e os Tudo o que vemos hoje, essa violência, é ainda consequência da tal colonização. 

    Devemos, realmente, através de seu lindo texto e canções, relembrar todas as dificuldades e humilhações que o povo africano e indígena sofreu. E agradecer-lhes por tudo o que nos ensinaram e nos  enriqueceram com a sua cultura alegre, musical e forte. E pedir-lhes muitas desculpas por tanto padecimento em suas vidas…

     

  11. O Capitão do Mato, lá do STF,

    O Capitão do Mato, lá do STF, precisa refletir muito sobre o 13 de maio e o povo Brasileiro…

    Duas coisas um homem precisa ter: raizes e asas…

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