Biografia de Walther Moreira Salles: as semelhanças do estado de exceção de 1964 e 2018

Estou na reta final, da biografia de Walther Moreira Salles. Um dos capítulos foi sobre a perseguição política movida pelo Ministério Público e Polícia contra os inimigos do regime militar. Ainda não havia chegado o AI-5.

Qualquer semelhança com os tempos atuais decididamente não é mera coincidência

O risco de cassação

 

Walther sobreviveu à primeira onda de cassações.

A segunda investida foi em 1965, com o governador da Guanabara, Carlos Lacerda, aproveitando-se de um inquérito policial que corria em Belo Horizonte para tentar envolver Walther.

Jorge Serpa Filho, o superlobista que era quase uma lenda no Rio de Janeiro, tinha o cargo de diretor financeiro da Mannesmann, que se instalava em Belo Horizonte. Acabou se envolvendo em uma operação de colocação de títulos da empresa no mercado e foi preso em 1965.

A Polícia e o Ministério Público da época julgaram que ele poderia ser o caminho para atingir politicamente os inimigos do regime. Embora a sede da Mannesmann ficasse em Belo Horizonte, Serpa foi intimado a prestar depoimento à Delegacia de Defraudações da Guanabara. O procurador-geral do Estado designou o promotor Newton de Barros e Vasconcellos para acompanhar pessoalmente o depoimento.

O interrogatório foi acompanhado também pelo superintendente de polícia judiciária, Paulo Sales Guerra, que mantinha o secretário de Segurança, coronel Gustavo Borges, informado por meio de seguidos telefonemas, segundo testemunharam os repórteres presentes. Nos corredores, delegados vazavam aos repórteres informações de que Negrão de Lima seria o próximo a ser ouvido.

 Serpa estava com seu advogado, Tude da Lima Rocha, assessorado por Reinaldo Reis, ambos seus colegas na Faculdade de Direito.

Delegado e promotor pouco interesse demonstraram no escândalo da Mannesmann. As quatro laudas de perguntas do delegado Ilo Salgado Bastos eram sobre as ligações de Serpa com Walther Moreira Salles, Negrão de Lima e ex-auxiliares de Juscelino Kubitschek e João Goulart. A polícia queria saber se era verdade que esses personagens recebiam jetons de Cr$ 3 milhões da Mannesmann. E também de onde saíra o dinheiro para a compra do apartamento de Serpa na Avenida Atlântica[1].

Serpa não negou suas ligações com Negrão, JK, Jango e os demais, “mas fez questão de botar as coisas no seu devido lugar”. O advogado Tude estranhou as perguntas que “remontam até o desembarque de Pedro Álvares Cabral no Brasil”.

Serpa estava sem dormir fazia três noites e se sentiu mal durante o interrogatório.

No dia 12 de julho de 1965, em editorial, o Jornal do Brasil denunciou Carlos Lacerda pelas torturas infligidas a Serpa. “Estamos diante de uma acusação frontal de sevícias e torturas praticadas com o mesmo teor de perversidade fanática que tem caracterizado a política dos Estados totalitários, nazistas ou comunistas.”

Nos meses seguintes, Jorge Serpa foi submetido até a pau de arara nas dependências do Exército. Acabou aderindo à delação premiada e se aproximou do SNI. Dali em diante passou a ser o ghost-writer mais requisitado nos discursos dos militares.

Com base na suposta delação de Serpa, Homero Souza e Silva foi intimado a depor na Delegacia de Defraudações.

Nehemias Gueiros apresentou-se como advogado. No interrogatório, queriam saber se Homero havia encontrado Serpa na casa de Walther. Era uma pergunta aparentemente ingênua. Mas, antes que respondesse, o delegado baixou o tom da voz e alertou-o:

— Pelo amor de Deus, não cite o nome de seu amigo.

A pergunta havia sido colocada no interrogatório apenas para criar um motivo legal para levar Walther à delegacia e incluí-lo no inquérito.

O inquérito terminou apenas com vazamentos de factoides à imprensa, mas sem nenhuma consequência maior.

Walther não abandonou o amigo. Na fase inicial do golpe, Serpa ia até sua casa buscar dinheiro para sobreviver. Mais tarde, quando o quadro político se complicou, Walther enviava a ajuda através de Homero. Para Homero, Serpa sempre foi muito misterioso. Agradável, mas muito escorregadio. Jamais concluía coisas, nem projetos, nem frases. E nunca pensou em dinheiro. Seu negócio sempre foi a política.

 

No governo Costa e Silva, Jorge Serpa teve os bens sequestrados. Um amigo comum procurou Bartolomeu Santos, o antigo chefe de gabinete de Agamenon Magalhães e ligado ao grupo de Negrão de Lima, e pediu uma aproximação com o SNI. Santos era amigo de Otávio Medeiros, Kruel e outros generais de 1964. Da conversa com Serpa, fechou-se um acordo pelo qual o advogado se comprometia a entregar documentos de seu extenso arquivo, mais do que aqueles relativos ao caso Mannesmann, que havia sido o motivo da perseguição militar contra ele.

A confissão de Serpa não poupou quase ninguém, nem mesmo o protetor Walther. Na frente de Santos, Serpa informou que Walther tinha know-how adquirido da China, através do empresário Wai Chen, dando tintas conspiratórias para operações comerciais normais. Por detrás de si, teria o grupo Rockefeller. Generalidades, mas que satisfaziam a sede de informações dos militares.

Esse material estimulou a terceira onda contra Walther.

Luis Nassif

8 Comentários

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  1. NÃO É A PERSEGUIÇÃO INAUGURAL DE GETÚLIO E O ESTADO NOVO?

    Entedemos porque o Brasil não evolui nestes 88 anos. A Perseguição Criminal e da Polícia Política de Getúlio, se renova nos anos 60 e novamente nos anos 2000. É o Brasil que roda, roda e não sai do lugar. Potência Continental que se pensa ‘republiqueta bananeira’. AntiCapitalismo de Estado Absolutista produzido num Golpe Civil-Militar Caudilhista Esquerdopata Fascista. E estamos Nós, no mesmo lugar em 2018 !!! E OAB, o que diz de tudo isto? Entidade que surge no Alvorecer Fascista contra um Governo Eleito Diretamente e Facultativamente. E alguns fingem não entender o Brasil. Fingem também AntiCapitalistas e que Elite são os outros. País de muito fácil explicação.  

    1. Palestra ruim

      O livro pode ser interessante mas não sugiro assistir ao vídeo da palestra. Quase nada se fala da caravana. 

      Perda de tempo. Debate autorreferente, com opiniões duvidosas, mesmo clima de conversa de turma de cursinho classemediano esnobe, ou de grêmio estudantil passadas 5 décadas, totalmente alienado do que é o povo e a realidade que seguiu Lula na Caravana. Mas explica, em negativo, porque Lula fez a Caravana e viajou aos lugares mais pobres do país e buscou pessoas de carne e osso – esse pessoal que aparece no vídeo, com a vida ganha e com o orgulho de serem uma burguesia bem intencionada, fizeram a experiência de assistir ao vídeo bem desagradável. Mas confirmou algumas opiniões sobre algumas coisas e pessoas. Sinceramente, se eu não fosse de esquerda por uma escolha de princípios e valores éticos e políticos, pelo discurso de pessoas que pensam representar esse campo ideológico e filosófico eu talvez estivesse entre os que deixaram de votar e não confiam na esquerda. 

      Só uma dica, caso as eleições não tenham servido para explicar nada para esses egos ambulantes: periferia não é rato de laboratório. E o movimento ecológico deve mesmo ser muito elaborado para suas cabeças mofadas, vaidosas e confortavelmente instaladas na zona de consumismo capitalista. Com o tipo de mentalidade apresentada, se esta for a liderança da esquerda, a noite escura do neofascismo será um eclipse permanente, por inércia. 

       

      Sampa/SP, 06/12/2018 – 20:06  (em luto).  

       

  2. Se é revival, melhor com música

    Não tenho o hábito de repetir comentário, mas acho que vale a pena. 

    “Um singela paródia para o sistema de Injustiça do Brasil.  

     

    Música original: Feira de mangaio (Sivuca e Glória Gadelha)

    Paródia: Unfairness do poder moderador (Cristiane N. Vieira) 

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=3913APj59rg%5D

     

    https://www.youtube.com/watch?v=3913APj59rg

     

    Letra da paródia

    “Sentença pronta, delação sem prova

    Eu tenho pra vender, quem quer comprar

    Bajulação, palestra, apê do “Minha Casa”

    Eu tenho pra vender, quem quer comprar

    Aprovação de conta viciada

    Esquerda sai daqui, me deixa atrapalhar

    Com o dólar e o Tio Sam no comando, um abraço

    Minha mansão em Miami vai valorizar

     

    Tinha uma vendinha no canto da rua

    Onde o poderoso ia se consultar

    Comprar um parecer pra limpar seu passado

    E condomínio de luxo no Paranoá

     

    Tinha uma vendinha no canto da rua

    Com cargos e comissões para negociar

    Sob o manto da ilegalidade, quem questiona?

    dizem que o país funciona, Golpe não há

     

    Cabresto na imprensa e nos dissidentes

    Eu tenho pra vender, quem quer comprar

    Mordaça, frase feita e costas quentes

    Eu tenho pra vender, quem quer comprar

    Pavio curto de excelência e panela pra pato

    Menino vou embora

    Tenho que lucrar

    Sovar meu patrimônio

    Antes que seja tarde

    E o povo se levante, queira governar

     

    Porque tinha um Impeachfraude amarelo nas ruas

    E uma democradura pra reinstalar

    Os ricos, na surdina, concentrando renda

    A fome, o ronco do Golpe, sem parar

     

    Porque tinha um Impeachfraude no  sono das urnas

    E uma democradura pra reinstalar

    Os ricos de má sina concentrando renda

    A fome, o ronco do Golpe, veio para ficar?

     

    Eita, penduricalhos com pitadas de psicopatia” 

     

    Para a França, para temperar sua boa e velha efervescência social 

     

    Canal Clara Nunes Guerreira – Clara Nunes – Forromob em Paris – Feira de Mangaio 

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=jxdBJ9UBsTw%5D 

    https://www.youtube.com/watch?v=jxdBJ9UBsTw

     

    Sampa/SP, (postagem original em 05/12/2018 – 23:50 – alterado às 00:01 e 01:23 de 06/12/2018) – 06/12/2018 – 18:42  (em luto). 

  3. investigações

    Uma coisa parece certa: nossas Forças Armadas são a MELHOR E MAIOR escola de sociologia e política do mundo. Senão a melhor e a maior, pelo menos está sem dúvida alguma entre elas. Uma coisa é certa: forças de defesa é que não são, e sim, forças – e que forças, de seus próprios e miúdos interesses!!

    1. Ainda há militar nacionalista ?

      OCTAVIO: uma correção. Os entreguistas das Forças Armadas NÃO agem visando aos seus próprios interesses. Os entreguistas sempre serviram aos interesses dos norte-amerianos. 

      Os militares entreguistas do Golpe de 64 perseguiram até o nacionalista e democrata Marechal Lott. Foi enterrado sem honras militares em 1984. Ao mesmo tempo,o Exército protegeu e promoveu o capitão Wilson Dias Machado, aquele militar terrorista que ia explodir uma bomba no Riocentro durante um show com 20 mil cidadãos brasileiros. Os militares entreguistas assassinam brasileiros e batem continência à bandeira dos USA.

      Os generais que hoje vemos em evidência na mídia são todos, como diria BRizola, “filhotes da ditadura”.  Yes, we have bananas.

  4. A farsa da eleição e a nossa tragédia

    Com efeito as semelhanças são alarmantes e ainda ouço pessoas dizerem cegamente que não estamos caminhando para uma catastrofe com as tintas do autoritarismo ja às vistas. A imprensa nacional é outro ponto de interrogação. Como podem mostrar-se tão passivos? Mais: alguns veiculos estão de braços dados com Bolsonaro-Mourão. 

    Muita gente sofreu durante o periodo de ditadura militar e muita gente sofreu e sofre ainda durante o periodo da Lava Jato e se a tortura não é mais fisica, ela não deixa de ser menos odiosa e de deixar sequelas, não apenas em pessaos, como no Estado de Direito. 

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