Dossiê: As forças armadas na política brasileira, por Andrés Sal.lari

Profundidade da interferência militar na principal potência da América do Sul constitui um fenômeno que não é observado em nenhum outro país da região

Brasil: Dossiê militar

Por Andrés Sal.lari*

No relatório a seguir, apresentaremos uma série de eventos cronológicos que nos permitirão entender as ações das Forças Armadas brasileiras na vida política de sua nação, bem como avaliar a influência e o controle institucional que exerceram até hoje. A profundidade da interferência militar evidenciada na principal potência da América do Sul constitui um fenômeno que não é observado em nenhum outro país da região.

31 de março de 1964: Golpe de Estado contra João Goulart. Atualmente, o general Hamilton Mourão, vice-presidente de Bolsonaro, define como “uma contra-revolução que evitou uma revolução comunista”.

1975: O topo da ditadura à frente de Ernesto Geisel começa a visualizar a necessidade de retirar os generais da presidência da República. 

22 de agosto de 1979: A Lei de Anistia é aprovada sob o regime militar. Prisioneiros políticos são libertados e a porta se abre para o retorno dos exilados. A impunidade é concedida aos militares responsáveis ​​pela violação dos direitos humanos.

Lula da Silva no início dos anos 80.

15 de janeiro de 1985: Tancredo Neves vence eleições indiretas que encerrarão a ditadura. Semanas antes, ele se reuniu com o general Geisel para negociar uma transição confortável para os militares. Os uniformizados exigiram e conseguiram manter sob seu comando o aparato de inteligência e segurança.

Após a reunião, Neves publicou uma carta assegurando que seu governo não faria perguntas às Forças Armadas, nem mesmo para investigar os crimes da ditadura. Neves morre em 14 de março, um dia antes de assumir o cargo. 

3 de setembro de 1986: O capitão de artilharia Jair Messias Bolsonaro (31 anos) escreve um artigo na revista Veja queixa-se dos baixos salários dos militares. Ele está detido pelo texto, preso por 15 dias e sofre um processo militar por indisciplina. Também recebe 150 telegramas de solidariedade de todo o país e o apoio de oficiais e de suas esposas. Uma publicação menciona que Bolsonaro agiu como uma espécie de líder sindical militar júnior.

Entusiasmado com esse apoio, ele planeja (1987), juntamente com um grupo de oficiais, a Operação Beco Sem Saída (beco sem saída), que consistia em explodir bombas de baixa potência em quartéis e academias militares para protestar contra os baixos salários. Ele foi julgado e absolvido por um tribunal militar em 1988. Ele logo se aposentou e entrou na política sendo eleito conselheiro e, posteriormente, deputado pelo Rio de Janeiro em 1992.

5 de outubro de 1988: A nova constituição é promulgada, o corpo mãe da Nova República. Segundo os pesquisadores Lilia Schwarcz e Heloisa Starling, os militares deixaram o governo intacto, mas falharam em controlar o processo de liberalização do sistema político ou em substituir gradualmente a coerção da ditadura por um governo civil do tipo autoritário.

Essa lógica começaria a mudar em 2011 após a suposição de uma mulher na presidência, uma mulher que também pertencera a uma organização político-militar durante a ditadura. Dilma Rousseff.

29 de fevereiro de 2004: militares dos EUA sequestram o presidente eleito do Haiti, Jean Bertrand Aristide, em Porto Príncipe. Três meses depois, nasceu a Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH), que inclui a participação de militares de 24 países. O Brasil liderará a missão até sua conclusão em 2017, para isso mobilizou 37.500 militares; 11 generais exerceram comando. A maioria deles faz parte do atual gabinete de Jair Bolsonaro.

Durante essa etapa, os generais brasileiros – também conhecidos como “a geração do Haiti” – aprofundaram seus laços com seus pares no Comando Sul dos Estados Unidos.

Segundo um especialista da OEA, a experiência adquirida pelos oficiais uniformizados lhes permitiu conhecer o sistema internacional de dentro e melhorar sua preparação para o desempenho de funções estatais.

Isso foi confirmado pelo primeiro comandante dessa força, o general Augusto Heleno, que enfatizou que o Haiti era uma experiência fundamental para a atual geração de oficiais do exército brasileiro. Heleno foi afastado de sua posição na MINUSTAH em 2005, após um massacre perpetrado por suas tropas em um dos bairros mais populares de Porto Príncipe, Cité Soleil.

Heleno foi instrutor de Bolsonaro durante seu treinamento na Academia Militar das Águias Negras e atualmente é o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), onde é responsável pela inteligência do estado. 

A MINUSTAH deixou uma longa lista de violações dos direitos humanos, principalmente relacionadas à exploração sexual, estupro e mortes ilegais.

1 de janeiro de 2011: Dilma Rousseff assume a presidência.

18 de novembro de 2011. Dirigida pelo Presidente, foi criada a Comissão Nacional da Verdade, encarregada de investigar violações de direitos humanos desde a abolição da quarta constituição (1946) até o nascimento da Nova República (1988).

Como a Lei de Anistia aprovada em 1979 permaneceu em vigor, a Comissão foi impedida de acusar criminalmente os culpados.

Dilma Rousseff foi torturada durante a ditadura. Aqui o relatório da Comissão Nacional da Verdade é visivelmente comovido. Dois anos depois, seria derrubado.

26 de outubro de 2014: Dilma Rousseff é reeleita no segundo turno. Uma semana depois, começa uma campanha pedindo intervenção militar.

10 de dezembro de 2014: General Ativo Sergio Etchegoyen, chefe do Departamento de Pessoal Geral do Exército; – Neto, filho e sobrinho de líderes de golpes militares -, ele está reclamando contra a Comissão para que o nome de seu pai seja removido da lista.

De acordo com o relatório final, havia evidências suficientes para apontar o general Leo Guedes Etchegoyen como responsável pelo gerenciamento de estruturas onde ocorreram violações de direitos humanos. Etchegoyen Sr. era chefe da Polícia Civil do Rio Grande do Sul após o golpe de 1964, período em que seu escritório recebeu cursos de métodos de tortura por eletricidade pelo notório agente de inteligência americano Daniel Antonio Mitrione. Em agosto de 1970, Mitrione seria executado pelos Tupamaros, em Montevidéu, onde também aconselhou a polícia sobre métodos de tortura sob o disfarce de ser um funcionário da USAID.

Alcides Etchegoyen, avô de Sergio e pai de Leo, também foi um soldado da Guerra Fria. Em 1952, ele apoiou a assinatura de um acordo militar com os Estados Unidos para facilitar o acesso de Washington ao urânio brasileiro; outros militares nacionalistas se opunham. Um ano depois, enquanto Getúlio Vargas governava, ele se opôs à Lei Federal de 2004, que estabelecia o monopólio estatal do petróleo ao dar à luz a Petrobras. Finalmente, em agosto de 1954, ele se juntou a uma insurreição militar contra Vargas, que acabou cometendo suicídio.

1º de outubro de 2015: Em meio à estagnação econômica e assombrada pelas pressões do impeachment, a presidente reeleita Dilma Rousseff decide reduzir o número de carteiras ministeriais de 39 para 31. Entre as agências de corte está o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), um a cabeça de um militar.

19 de outubro de 2015: O comandante militar da região sul, general Hamilton Mourão, pede ao país que “acorde com a luta patriótica”. Ao mesmo tempo, um quartel sob seu comando presta homenagem ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos torturadores de Dilma Rousseff. 

O presidente o remove do cargo, mas o general não se aposenta, ele é transferido para o Ministério da Economia e Finanças do Exército.

2016. General Mourão (centro), juntamente com o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas (à esquerda) e o general Edson Leal Pujol, seu sucessor no comando do Exército.

4 de março de 2016: Dilma Rousseff telefonou para Lula da Silva para oferecer a ela o cargo de Chefe de Gabinete em meio ao assédio judicial a que foi submetida pelo juiz Sergio Moro. No mesmo dia, a gravação dos telefones tocados pelo presidente foi transmitida pela mídia e alguns dias depois os deputados autorizaram o impeachment de Dilma. 

Deve-se lembrar que os órgãos de inteligência são administrados pelos militares e que um escândalo já havia sido desencadeado pela intervenção dos telefonemas do presidente pela inteligência dos EUA, o que levou a um forte conflito diplomático.

Dilma Rousseff com a Comandante do Exército, Maj. Eduardo Villas Bôas.

17 de abril de 2016: A Câmara dos Deputados aprova o início do impeachment, o legislador Jair Bolsonaro oferece seu voto sim ao torturador Brilhante Ustra. Segundo pesquisas, 9% dos brasileiros estavam dispostos a votar nele para presidente.

12 de maio de 2016: Michel Temer assume a presidência em caráter provisório enquanto o impeachment contra Dilma termina. No mesmo dia, ele restabeleceu o extinto Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e nomeou o general Sergio Etchegoyen, o militar que havia apresentado uma queixa contra a Comissão da Verdade, como ministro-chefe. Além disso, ele o coloca no comando da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN).

A aplicação imediata dessa medida evidencia uma coordenação entre os conspiradores do golpe civil e o alto comando militar.

Etchegoyen conseguiu que o governo do ajustador Temer, que navegou em meio a uma recessão sustentada, aumentasse os gastos discricionários pelo Ministério da Defesa de 11,5 trilhões de reais (2016) para 15,3 trilhões (2017).

Michel Temer e Gral. Villas Bôas, comandante do Exército.

19 de abril de 2017 : O general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, premia o presidente Michel Temer e o juiz Sergio Moro, líder da perseguição judicial contra Lula, com ordem de mérito militar. Villas Bôas declara que “não há atalhos fora da Constituição. O caminho a seguir requer a sinergia de todos. Temos fé nos valores da democracia “.

Decoração militar para julgar Sergio Moro (2017)

Julho de 2017: Um importante líder do partido de Temer (MDB), Carlos Marun, propõe ao general Etchegoyen que se junte ao seu espaço político e participe da corrida presidencial. O general responde que essa não é sua vocação, que essa não é sua natureza. O fato representa o destaque recuperado pelas forças armadas na sociedade. Segundo pesquisa da Data Folha, as Forças Armadas foram a instituição que mais gerou confiança na população. 

Etchegoyen estava pressionando para iniciar uma intervenção militar no Rio de Janeiro, forçando o comandante do Exército, General Villas Bôas, a comparecer perante o Congresso, ao contrário da iniciativa de Etchegoyen; o caso desencadeou um curto-circuito entre os dois generais, que nasceram com três meses de diferença na cidade de Cruz Alta, no norte do estado do Rio Grande do Sul, e foram treinados juntos na Academia Militar das Águias Negras, em Resende, Rio de Janeiro.

Para o alto comando, a militarização do Rio foi uma medida improvisada e orientada para desviar a atenção de outras questões.

Villas Bôas testemunhou: “Quero deixar bem claro que não gostamos de participar desse tipo de operação”. Depois, contou uma experiência que vivia na favela da Maré, no Rio, em 2015. “Eram onze da manhã ou meio dia em um dia normal. E nosso povo, muito atencioso, muito preocupado, muito rígido e armado, patrulhou a rua por onde mulheres e crianças passavam. Eu disse: ‘Somos uma sociedade doente. O Exército aponta armas para os brasileiros “.

Tais declarações levaram muitos do arco progressista a acreditar que Villas Bôas era um militar constitucionalista.

O comandante estava acompanhado por outro general de sua confiança, que também não endossou a intervenção, Walter Souza Braga Netto, chefe do comando militar oriental. Os dois generais pediram a Temer mais recursos e impunidade para as tropas. Villas Bôas mais tarde declararia que não queria outra comissão da verdade para os militares que intervieram no Rio.

Atualmente, o general Braga Netto está na boca de todos depois de se tornar uma espécie de “presidente operacional” acima de Bolsonaro. Ele ocupa o cargo de Chefe da Casa Civil, que é conhecido aqui como Chefe de Gabinete e é de acordo com todos os especialistas e a grande mídia, que toma as principais decisões estaduais para enfrentar o coronavírus.

17 de setembro de 2017: o general ativo Hamilton Mourão intervém novamente no cenário político, declarando que pode chegar o momento; “Ou as instituições resolvem o problema político através da ação do judiciário retirando da vida pública os elementos envolvidos em todos os crimes, ou teremos que impor isso”. 

Ele pressionou para que Lula fosse preso. Desta vez, ele também não se aposentou.

11 de novembro de 2017: O Exército participa de uma ação repressiva no complexo de Salgueiro, região metropolitana do Rio de Janeiro, com um número de mortos em oito. Os soldados responderam apenas à justiça militar. A organização Human Rights Watch acusou o general Braga Netto de obstruir as investigações e apontou que o alto funcionário mostrou uma falta de compromisso real para garantir justiça às vítimas e também destacou que demonstrou um flagrante desrespeito pelas autoridades civis.

Novembro de 2017: O jornalista Fabio Victor realiza duas importantes entrevistas que publicará na revista Piauí. Um com o general Etchegoyen e o outro com o comandante Villas Bôas. O chefe do Gabinete de Segurança Institucional tenta suavizar o alerta de golpe de Mourão, catalogando o comentário como um episódio superestimado. “Mourão é um homem bom, leal, um soldado respeitado.”

Questionado sobre o crescimento de Bolsonaro na intenção de votar, ele pergunta: “Você acha que em um país que evoluiu tanto institucionalmente e consolidou uma democracia, alguém conseguirá impor uma agenda totalitária e exclusiva?”

O principal responsável pela inteligência brasileira ainda não tinha dimensão sobre o poder da semente do ódio inoculado em sua sociedade. Um ano antes das eleições, Lula liderou as pesquisas e Bolsonaro apareceu em segundo lugar com uma intenção de voto de 17%.

Quanto à geração de 64, Etchegoyen declara: “Acho que eram pessoas com um propósito muito honesto e nos educaram”.

Villas Bôas recebe o jornalista acompanhado por um grupo de generais e coronéis.

O comandante em chefe declara que os ressentimentos da liderança do Exército com o PT aumentaram após a publicação de uma resolução sobre a situação assinada pela liderança petista em maio de 2016, após o golpe de Estado contra Dilma Rousseff. Neste texto, pode-se ler uma autocrítica do PT por não ter intervindo no sistema de promoção das forças armadas e por não ter alterado o currículo das escolas militares.

Fabio Victor relata que os soldados que acompanharam Villas Bôas concordaram com a descrição de seu superior.

“Isso é algo que não é permitido pelas Forças Armadas, intervenção em nosso processo educacional. Esqueça – disse o coronel Fonseca. “Isso nos machuca profundamente. Está em nossa essência, em nosso âmago ”, eles concordaram.

Se analisarmos essa revelação, devemos concluir que a liderança militar promoveu a demissão de Dilma por medidas que o PT nunca tomou. Um verdadeiro golpe preventivo contra políticas que nunca se concretizariam; eles nem estavam na agenda do governo derrubado.

Em relação a Bolsonaro, Villas Bôas entendeu que a força do ex-capitão decorreu de uma reação da sociedade brasileira (“que é conservadora”, observou ele) contra o que chamou de “pensamento politicamente correto em seus vários aspectos”. Depois, acrescentou que “a moralidade e os bons costumes são a arma da direita contra o avanço da ideologia”.

O general Otávio Rêgo Barros, que durante anos atuou como principal assessor de Villas Bôas, também participou da reunião. Atualmente, ele é porta-voz de Bolsonaro.

30 de novembro de 2017: o comandante Villas Bôas aumenta a aposta e se junta ao golpe de Mourão contra o Twitter: 

“Samuel Huntington nos exorta: ‘Lealdade e obediência são as mais altas virtudes militares’; Mas quais serão os limites da obediência? O Estado, quando delegar o poder de exercer violência em seu nome, precisa saber que sempre agiremos pela sociedade da qual somos servos. ”

Lula ainda estava lutando para ficar livre.

16 de fevereiro de 2018: Etchegoyen consegue impor seu projeto de intervenção militar no Rio de Janeiro, uma medida sem precedentes em democracia. O líder da intervenção é o general Braga Netto, o atual “presidente operacional”. Um mês depois, a conselheira Marielle Franco é assassinada. 

Em janeiro de 2019, Braga Netto declara sobre a morte de Marielle à revista Veja: “Foi uma avaliação ruim deles, eles pensaram que ela era um perigo maior do que era”. Quando o jornalista Leandro Resende insiste em perguntar a quem ele se refere, o general muda de assunto.

26 de fevereiro de 2018: Pela primeira vez desde o advento da Nova República, um militar ocupa o cargo de Ministro da Defesa, o General Joaquim Silva e Luna.

3 de abril de 2018: poucas horas depois de uma reunião em que o Supremo Tribunal Federal decidisse se aceitaria ou não um habeas corpus que definiria a liberdade ou prisão de Lula da Silva; O comandante Villas Bôas retorna à ação via twitter: “Garanto à nação que o exército brasileiro compartilha as ansiedades de todos os cidadãos do bem na rejeição da impunidade e no respeito à constituição, paz social e democracia , além de estar atento às suas missões institucionais ”.

A pressão entra em vigor, dizem especialistas, que o voto da magistrada Rosa Weber foi revertido. Por 6 votos a 5, Lula acabou na prisão, mas ainda podia ser candidato.

O presidente Temer recebe Villas Boas no Planalto uma semana após o tweet contra Lula.

9 de setembro de 2018: Faltando menos de um mês para as eleições e quando ainda não se sabia se Lula poderia concorrer, Villas Bôas interfere novamente e declara que a candidatura de Lula era uma “afronta à constituição”. 72 horas depois, Lula se recusa e nomeia Fernando Haddad como candidato.

13 de setembro de 2018: Villas Boas coloca o influente general Fernando Azevedo e Silva (chefe do Estado Maior do Exército) como consultor especial do presidente do Supremo Tribunal Federal, magistrado José Antonio Dias Toffoli. Duas semanas depois, é comemorado o 30º aniversário da constituição de 1988 e, de maneira inédita, Dias Toffoli declara que o golpe de 64 contra Goulart não foi um golpe ou uma revolução, mas “um movimento”, gerado pela “incapacidade da esquerda” e o direito conservador de concordar.

O general Azevedo e Silva mais tarde assumirá o cargo de ministro da Defesa de Bolsonaro. A supervisão militar do mais alto órgão de justiça não termina aí. Villas Bôas nomeia um novo conselheiro especial, general Ajax Porto Pinheiro, chefe da missão militar no Haiti de outubro de 2015 a setembro de 2016. O general permanece como conselheiro especial até hoje. Nomear ele como controlador seria muito ousado?

Setembro / outubro de 2018: Em vários eventos e entrevistas da campanha, o general Mourão, agora candidato a vice-presidente de Bolsonaro, considera a possibilidade de o presidente de um “auto-golpe” em determinadas circunstâncias; defende um novo processo constitucional sem participação popular, realizado por um “conselho de notáveis”.

Na véspera do segundo turno, ele é entrevistado por Fabio Victor: “Eu sempre fui liberal. Não há como escapar da democracia liberal. O Estado precisa ser indutor, criar instalações e hoje cria dificuldades “, afirmou o general. 

Mourão era o adido militar da Embaixada do Brasil na Venezuela quando ocorreu o golpe de abril de 2002 contra Hugo Chávez. Sobre esses eventos, ele declarou: “O general Néstor González González – líder do golpe que tinha o presidente deposto sob sua custódia – perdeu a oportunidade de mudar o curso da história. Se eu tivesse matado Chávez lá, eles teriam resolvido o problema. ”

6 de outubro de 2018: Mourão chega ao aeroporto de Brasília para votar no primeiro turno das eleições presidenciais, jornalistas e sua família o aguardam. O general pede aos comunicadores que o deixem ir e, olhando para o neto, ele lhes diz: “Meu neto é um garoto muito bom, veja ele, o branqueamento da corrida”.

28 de outubro de 2018: Jair Bolsonaro vence as eleições no segundo turno.

11 de novembro de 2018: O general Villas Bôas confirma a tutela das Forças Armadas ao processo eleitoral, assegurando em uma entrevista de domingo à Folha de São Paulo que se ele não tivesse falado em abril endossando a prisão de Lula, “a situação poderia ter escapado do controle das Forças Armadas ”.

 

Conclusões

A sucessão de eventos produzidos desde a instalação da Comissão da Verdade mostra que no Brasil a vontade da maioria – que é o que constitui o núcleo central de um sistema democrático – foi violada. Isso é evidenciado pela derrubada sem motivo sério de um presidente eleito com mais de 55 milhões de votos e pela proibição do principal favorito nas eleições de 2018.

O papel dos militares que compõem “a geração do Haiti” nesses eventos foi decisivo. 

É claro que esse grupo é formado por uma elite de generais brancos da qual Bolsonaro não faz parte, que não passou por capitão. Todos reivindicam publicamente a ditadura. Para esses generais, Bolsonaro é o instrumento que lhes permitiu retornar às posições de poder político.

Villas Bôas representa o seguinte: Bolsonaro “trouxe a necessária renovação e liberação dos laços ideológicos que haviam sequestrado o livre pensamento”.

O primeiro atrito entre generais e Bolsonaro ocorreu assim que o ex-capitão do Exército foi assumido em 1º de janeiro de 2019, quando ofereceu unilateralmente ao Secretário de Estado, Mike Pompeo, a possibilidade de instalar uma base militar dos EUA no Brasil; assunto que foi descartado pelos generais.

Villas Bôas sofre de uma doença degenerativa, mas a informação oficial é que ele continua sendo consultor do Gabinete de Segurança Institucional liderado pelo general Heleno. Muitos de seus generais de confiança ocupam posições-chave e tudo indica que eles deslocaram o Bolsonaro indisciplinado e seu círculo mais próximo identificado como a “ala ideológica”, que professa um anticomunismo ainda mais extremo do que o dos generais. No entanto, não se pode esquecer que Bolsonaro é quem tem os votos, além de seu histórico histórico de rebelião contra os generais.

O vice-presidente Mourão, que nunca escondeu muito seu desprezo pelo ex-capitão, declarou nos últimos dias que o general Braga Netto está colocando a “casa em ordem”, realizando a “verdadeira governança”. “É na hora certa, no lugar certo, na hora certa.”

O dossiê evidencia a existência de uma casta militar com histórias como as do clã Etchegoyen que, desde o golpe contra Getúlio Vargas até hoje, têm operado para manter o sistema político brasileiro sob sua tutela, registrando poucos cenários em que suas diretrizes gerais foram seguidas. se contradizem.

O gral. Villas Boas foi visitado nas últimas horas por Bolsonaro. Ele sofre de uma doença neuromotora degenerativa.

Mesmo sob uma condição de saúde muito frágil, Villas Bôas continua a exercer liderança entre os uniformizados. O general recebeu uma visita surpresa do ex-capitão Bolsonaro, que veio à sua residência em busca de apoio. Após a reunião, Villas Bôas declarou que ninguém protege o presidente. 

Villas Bôas é a única pessoa que pode convocar o vice-presidente, os ministros gerais e o “conselheiro especial” do Supremo Tribunal Federal, para que esse pessoal militar influente não complique demais o governo do ex-capitão.

Como já vimos, o “presidente operacional” Braga Netto também é um homem de confiança do general convalescente.

As peças deste xadrez continuarão a se mover tanto quanto o coronavírus.

(*) Analista internacional, documentarista e colunista do Punto de Partida.

Redação

6 Comentários

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    1. Paulo: respeitando sua manifestação, discorra de um sequer “merecimento” dele, além dessa oportuna doença, digno do Povo brasileiro.

  1. Em um documentario sobre a revista rolling stone, obama ao destituir um general, comandante das tropas no afeganistão, por declarações contra sua administração em uma reportagem, afirmou: “a submissão das fprças armadas ao poder civil é um dos pilares da democracias estadunidense”……já que gostam tanto de imitar o exercito daquele país, deveriam começar por aí……o povo financia um agente repressor que age contra o próprio povo….

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