Como a Alemanha lida com o nazismo: para que a história não se repita

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Tropas nazistas aguardam pronunciamento de Adolf Hitler / Reprodução

Tropas nazistas aguardam pronunciamento de Adolf Hitler - Créditos: Reprodução

do Brasil de Fato

Como a Alemanha lida com o nazismo: para que a história não se repita

Em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, historiador alemão diz ser tolice taxar o nazismo como movimento de esquerda

José Eduardo Bernardes

Brasil de Fato | São Paulo (SP)

Setenta e três anos após a derrota do nazismo, a Alemanha mantém o empenho de explicar os horrores produzidos por Hitler e seus aliados. Segundo o historiador alemão, Daniel Bratanovic, editor do jornal Junge Welt, “desde cedo, a educação nas escolas da Alemanha Oriental era anti-fascista. Em 1968, começou a se falar nas escolas de todo o país”, afirma.

Recentemente, a Embaixada da Alemanha publicou um vídeo explicando como o nazismo era tratado entre os alemães, e recebeu uma enxurrada de comentários de brasileiros. Os internautas afirmavam que o nazismo era ligado às ideologias de esquerda e contestavam o holocausto.

O vídeo da embaixada descreve que, entre os 13 e 15 anos, as crianças apreendem, em sala de aula, os riscos do nazismo. Mas a publicação também lembra que, desde cedo, elas têm contato com as memórias do período do Terceiro Reich andando pelas ruas de cidades alemãs. 

Em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, Bratanovic afirma que “é uma reivindicação tola de que o nazismo poderia ser um movimento de esquerda”. Segundo ele, “o movimento nazista, desde o começo, recebeu dinheiro e suporte de importantes setores militares, também de setores do capital, por exemplo de proprietários de fábricas de aço, preparando a Alemanha para a guerra”.

Além de questionar as posições ideológicas de Hitler, nos comentários, apoiadores do candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL) acusavam a embaixada de influenciar nas eleições brasileiras, ao ligar o nazismo à extrema direita alemã.

 

 

 

 

 

 

 

Outros questionavam o espectro político de Hitler, baseado no nome de seu partido político:

 

 

 

 

 

 

 

Bratanovic afirma que “se alemães descobrissem que existe este tolo debate, por exemplo, no Brasil [de que o nazismo é de esquerda], eles diriam que isso é bizarro, porque geralmente ninguém na Alemanha reivindica que o nazismo seja de esquerda”. 

A ascensão do fascismo em vários países da União Europeia, e agora também no Brasil, carece de estudos: “É interessante, porque quando a esquerda na Alemanha e na Europa se questiona sobre a ascensão da extrema direita, nós não temos respostas concretas. O fato é que a extrema direita é capaz de captar o ódio e o descontentamento em sociedades ao redor do mundo”.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. “Tropas nazistas aguardam

    “Tropas nazistas aguardam pronunciamento de Adolf Hitler / Reprodução”

    Aqui as tropas bolsonaristas esperam, com a faca nos dentes,  o pronunciamento de Frau Webber acessorada por Herr Etchegoyen, Herr Jungmann, Herr Galloro & Ms Dodge.

    Todos nós esperamos que Rosa, Sérgio, Raul, Rogério & Raquel deêm uma resposta a altura da gravidade da denúncia sobre o Bolsolão. Pelo histórico dos personagens, a expectativa não é promissora, mas quem sabe.

    Dependendo da atitude, corajosa ou covarde, das autoridades citadas, o Brasil pode ser tornar pioneiro no combate a essa praga que promete corroer a democracia, não só aqui, mas também no resto do mundo.

     

  2. O Direito Nazista – Breves considerações

    THIAGO HANSEN

    Do site JOTA

    18/10/2018 07:49

     

    Em 2013, tive o privilégio de estudar em um renomado instituto de pesquisa alemão. Lá, tive uma das experiências acadêmicas mais interessantes da minha vida: aprender com os alemães o que foi o Direito nazista.

     

    Longe de querer fazer uma comparação grosseira com o cenário atual, apenas gostaria de ressaltar algumas características dessa experiência e um pouco dessa história, e aí, caso a carapuça sirva, não há nada que se possa fazer.

     

     

    Primeiro: uma das mudanças introduzidas no Direito nazista foi aumentar a autoridade e força das decisões judiciais para garantir ordem e aquilo que se denominava de “proteção do povo alemão”. Era uma estratégia utilizada para expandir a força repressora e ao mesmo tempo legitimá-la judicialmente.

    Expressões como “carta branca” ou “retaguarda jurídica” estavam presentes no vocabulário de juristas que visavam legitimar o Estado nazista matar criminosos ou suspeitos. Não se deve esquecer, ainda, que o uso político da violência sempre se aloja na definição jurídica de suspeito, que sempre é amplificada ou flexibilizada, com o objetivo de enquadrar comunistas, judeus, ciganos, poloneses e pretensos espiões. Uma ditadura não depende, necessariamente, da suspensão de uma Constituição. Basta, muitas vezes, uma profunda reforma no sistema de Processo Penal para atingir tal finalidade.

     

    Segundo: tradicionalmente, a historiografia observou o impacto que o nacional-socialismo impôs ao Direito a partir dos anos 1930, olhando para os grandes eventos jurídicos, como a criação do decreto para a proteção do povo e do estado (Verordnung des Reichspräsidenten zum Schutz von Volk und Staat) logo após o incêndio do Reichstag. Esses grandes eventos revelam rupturas importantes e momentos chave da história política do nazismo, mas perdem a oportunidade de olhar mais de perto uma seara de profundas implicações do regime autoritário: o Direito Privado.

    Conceitos como boa-fé, obrigação e contrato foram contaminados por premissas nazifascistas que acabavam por criar, através das chamadas cláusulas gerais, mecanismos de fuga da aplicação da lei (o BGB de 1900) no caso concreto para contornar garantias previstas no Direito Civil para minorias políticas e étnicas, como judeus. Assim, lentamente apareciam causas de anulabilidade e nulidade de negócios jurídicos firmados por partes que não eram mais encaradas como sujeitos abstratos e individuais, mas vistos como parte de um corpo social maior. Através desses mecanismos se esvaziava o direito à propriedade, à liberdade de negociar (dos não alemães) e os direitos de personalidade.

     

    Terceiro: muitos juristas importantes acabaram se relacionando com o regime, sendo os mais famosos Carl Schmitt, Karl Larenz e Franz Wiacker. Ainda, houve no mesmo período a formação de um Comitê Jurídico Ítalo-Alemão que se reuniu em Viena, Berlim e Roma com vistas a organizar bases teóricas comuns para os regimes totalitários. Foi preciso uma investigação profunda e contundente, como a feita por Bernd Ruthers (no livro Die unbegrenzte Auslegung) para identificar o quanto ainda somos dependentes de conceitos construídos com intuitos pragmáticos de fortalecimento do regime nazista no Direito Privado contemporâneo. Curiosamente, muitos institutos que por vezes se apresentam como oxigenados aos novos tempos e sensíveis às demandas contemporâneas, são por vezes reensaios de conceitos estabelecidos com objetivos bem menos nobres.

     

    Quarto: os alemães fizeram um julgamento interno, anos depois do fim do nazismo, sobre a responsabilidade do ocorrido. Deliberaram o seguinte: a população alemã foi considerada, pelos próprios alemães, responsável pelos massacres e absurdos ocorridos nos anos 30.

    Não se queria com isso dizer que todos os alemães eram nazistas sádicos de carteirinha, desejosos por morte e pelo holocausto. A culpa ali foi construída por outro motivo: o silêncio e a falta de oposição concreta ao regime viraram uma espécie de cegueira deliberada. O totalitarismo naquele país foi se alastrando lentamente, ocupando casa a casa pelo silêncio, pelo comodismo, e por argumentos que se expressam hoje como, por exemplo: “o outro lado também é violento”; “eu não sou responsável por isso, foram só meus seguidores”; “mas e a corrupção dos judeus?”; entre outros usos.

     

    Quinto: muitos acusaram depois que a população era refém e não tinha o que fazer por ser oprimida pelo mesmo regime. O mesmo se disse para os soldados que obedeciam a ordens em campos de concentração ou em missões militares claramente criminosas. O Estado Alemão, após a democracia, desenvolveu uma série de teses e técnicas para desmentir esse argumento fácil e ligeiro. Iniciaram um profundo estudo e uma autocritica partindo desde uma readaptação da Teoria do Domínio do Fato fundamentada em Welzel para culpabilizar oficiais, passando por espaços de memória coletiva e, especialmente, pela tentativa de compreensão da adesão tácita do povo àquele regime.

     

    Concluiu-se que a força do nazismo veio do medo e do silêncio imposto, do receio de falar o que se queria, do medo de andar portando determinados livros, jornais ou vestindo um quipá na rua. Somado a tudo isso, convivia ainda uma espécie de nacionalismo autorreferente que julgava que somente quem estava inserido naquele sistema de pensamento entendia verdadeiramente o que estava acontecendo, ainda que a imprensa de todo o mundo dissesse que havia algo de podre ali.

    Aqueles que afirmavam não compartilhar o que o regime pregava e dizia na sua integralidade, mas apenas buscava nele a solução para problemas específicos (graves, sérios e urgentes) da população, por ver ali uma força, uma autoridade, e um desejo rápido de solução, tiveram o mesmo destino nos tribunais alemães: essas pessoas foram consideradas culpadas pelo que aconteceu. E depois não adiantava falar que não sabia, não era a intenção ou o desejo. Estava tudo ali na frente para qualquer um ver.

     

    A Alemanha continua assumindo sua responsabilidade pelas catástrofes dos anos 1930, inclusive financeiramente. E é, sem dúvidas e em grande parte por esse trabalho de autocrítica, um exemplo de democracia para todo o mundo. Por fim, e para encerrar esse curto texto sem grandes pretensões, segue uma lista de decretos da cidade de Berlim proferidos durante o regime Nazista que demonstra como se dava o avanço lento e gradual do regime, para além do âmbito do Direito Público, nos espaços do Direito Privado.

     

    Decretos

    Para evitar uma impressão ruim aos visitantes estrangeiros, placas com conteúdo extremo devem ser removidas; são adequadas placas como “aqui os judeus são indesejados” (29/01/1936)

     

    O batismo de judeus e a conversão ao cristianismo não tem relevância para a questão de raça (04/10/1936)

     

    Judeus devem usar o nome “Israel” e judias o nome “Sara” como prenome adicional (17/08/1938)

     

    Judeus em cargos de chefia podem ser demitidos sem direito a indenização ou previdência (12/11/1938)

     

    É proibida a visitação por judeus a cinemas, teatro, ópera e concertos (12/11/1938)

     

    Judeus devem entregar joias, objetos de ouro, prata, platina e pérolas (21/02/1939)

     

    Judeus não podem mais deixar suas habitações após as 8h da noite (9h no verão) – (01/09/1939)

     

    Na Praça Bávara (Bayerischer Platz), Judeus apenas podem usar os bancos marcados em amarelo (relato de testemunha ocular, 1939)

     

    Os judeus em Berlim somente podem fazer compras de alimentos à tarde, entre 4 e 5 horas (04/07/1940)

     

    Judeus não podem mais adquirir sabão e creme de barbear (26/06/1941)

     

    20 de janeiro de 1942: Conferência de Wansee em Berlim, oficialato alemão é informado da “Solução Final” em curso.

     

    Judeus não podem mais comprar jornais e revistas (17/02/1942)

     

    Crianças judias somente podem usar os meios públicos de transporte a caminho da escola, caso a escola esteja a mais de cinco quilômetros de sua habitação (24/03/1942)

     

    Judeus não podem mais adquirir cigarros ou charutos (11/06/1942)

     

    Poloneses e judeus não são ouvidos no tribunal como testemunhas contra alemães (07/08/1942)

     

  3. Óbito certo

    Nassif: queira ou não esses bichos d’agua são uns gênios. Livram-se dos SS mando-os para a América Latina, com sede no sul do Brasil. Lógico, de lá se esparramam, como as metástases cancerosas. O organismo verdeoliva tá quase que totalmente  tomado. A equipe de cuida da saúde do daBale disse que o óbido da democracia brasileira é questão de pouco tempo.

  4. chocado mas não surpreso.

    Não podemos subestimar a ignorância do brasileiro médio, é DESUMANA.

    Pior, nada sabem, nada lêem, e têem orgulho disto. E detestam ser contrariádos pelos fatos.

    Isso ocorre na familia de minha esposa, conhecidos etc

    ( graças à educação que recebi não corro esse perigo.)

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