Estatuto da Igualdade Racial completa 5 anos com desafio de equiparar direitos

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Da Agência Brasil

Por Mariana Tokarnia

O Estatuto da Igualdade Racial, Lei 12.288/2010, completa cinco anos de vigência nesta segunda-feira (20), com desafio de equiparar direitos e superar o racismo, segundo especialistas. Em 65 artigos, o estatuto abrange diversas áreas como cultura, esporte, saúde, moradia, religião e comunicação. Mas, para que a norma seja efetivada, é preciso atuação de órgãos federais, estaduais e municipais, além da participação do setor privado.

Para o professor de direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro Thomaz Pereira, algumas medidas do estatuto são gerais e demandam algum tipo de iniciativa específica. “Às vezes, é uma lei, às vezes, são medidas no âmbito das secretariais estaduais, municipais ou de ministérios”, diz o professor.

Os negros são, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013, mais da metade da população brasileira, 52,9% – soma daqueles que se declaram pretos e pardos. A porcentagem, no entanto, não se repete em espaços acadêmicos. De um total de 387,4 mil pós-graduandos, 112 mil são negros – menos da metade dos 270,6 mil brancos. Também não se mantém na Câmara dos Deputados, onde quase 80% dos deputados se declararam brancos, tampouco nos meios de comunicação.

Histórico

O professor explica que projeto de lei surge a partir da demanda da sociedade, dos movimentos sociais, em um contexto em que diversas medidas vinham sendo tomadas para promover a igualdade racial. Entre as medidas, está a adoção das cotas raciais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e, no âmbito federal, pela Universidade de Brasília (UnB).

“O estatuto é quase como se fosse uma mini Constituição no sentido de representar e de unir em um  documento só medidas diferentes. Uma coisa interessante no estatuto é a sua própria estrutura. Ele trata de saúde, de educação, esporte e lazer, além de direito de liberdade de consciência, de crença, de cultos religiosos, de acesso à moradia, de trabalho, dos meios de comunicação. Todas essas diversas áreas aparecem de maneira diferente e exigem soluções diferentes”, explica o professor.

“Se as pessoas continuam afirmando que não existe racismo no Brasil, fica muito mais difícil superá-lo. O primeiro passo da superação é reconhecer que ele existe”, diz Vera Baroni, integrante da coordenação da Rede de Mulheres de Terreiro de Pernambuco e da Articulação de Mulheres Negras Brasileiras. Segundo ela, apesar dos esforços feitos até agora, o estatuto ainda não está devidamente conhecido para que possa ser mais amplamente cobrado e efetivado.

Estatuto da Igualdade Racial

Reforma

O diretor executivo da organização não governamental (ONG) Educafro, frei David Santos, defende uma reforma do estatuto. Segundo ele, as mudanças feitas durante a tramitação da lei no Congresso Nacional enfraqueceram o dispositivo. Termos que obrigavam certas medidas foram substituídos por mais brandos, que apenas as incentivavam. “Estamos procurando deputados de vários partidos que possam ajudar na composição de equipe pluripartidária que trabalhe com garra nessa missão.”

Ele cita como exemplo a retirada, do texto-base do estatuto, da obrigação de pelo menos 20% dos atores e figurante de filmes e programas de televisão serem negros. Segundo ele, caso isso ocorresse haveria mais negros nesses espaços e ações de racismo, como as sofridas pela jornalista Maria Júlia Coutinho, a Maju, seriam reduzidas.

“O Brasil atravessa o momento de despertar do povo negro. A questão do negro vai continuar essa luta até que a sociedade branca consiga entender nosso direito e assim teremos a inserção de negros e brancos como irmãos, que é o que queremos”, diz.

Para o senador Paulo Paim (PT-RS), autor do projeto que deu origem à lei, uma reforma seria retrocesso. “O estatuto não é uma lei perfeita, mas não dá para usar a desculpa de que teve esse ou aquele veto para enfraquecer uma conquista do povo brasileiro”, diz.

“O que temos que fazer são reformas pontuais, propondo projetos que possam incorporar alguns artigos. A política de cotas na educação, por exemplo, não entrou no estatuto, mas trabalhamos de forma pontual e hoje ela está incorporada”, acrescenta.

Perguntado se, em cinco anos, o estatuto cumpre seu papel, Paim diz que isso deverá ser feito ao longo da história. “São dezenas de artigos e cada um cria uma lei. Até que seja implementado, leva tempo. Mas acho que tem ajudado. Se com a lei tudo pode, fora dela, não pode nada. A lei é um instrumento para combater o racismo e conseguimos avançar em algumas questões”.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

2 Comentários

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  1. Um monumento à demagogia

    Um monumento à demagogia politica aliada a coletivos não eleitos que estelionatarios da democracia como são, se passam por representantes da sociedade civil ou contra o racismo.

    Na verdade a missão desse entulho não é e nunca será espalhar justiça, dignidade ou muito menos igualdade.

    A função dele é semear a odiosa ideia de PERTENCIMENTO RACIAL

    O resto é aplauso de pelego para os chapabranca de sempre dormir tranquilho…

     

    Obs: Direitos são obrigatoriamente de alcance universal , jamais podem ser pautados por criterios raciais, quando isso ocorre não é direito é privilégio…

  2. O primeiro passo de superação é reconhecer que o Racismo Existe.

    “Tirem o galo do alto da Igreja e coloquem um urubu”. Sim, isso existe, Kamel

    3 de dezembro de 2014 | 13:34 Autor: Fernando Britopadrewilson

    O papa Francisco bem que poderia ser informado de uma história que está os jornais de hoje, já que ele está manifestamente preocupado com o esvaziamento da Igreja Católica.

    O padre  Wilson Luís Ramos foi afastado da Matriz de Santo Antônio, em Adamantina, cidade do interior paulista entre Presidente Prudente e Araçatuba.

    O motivo?

    Padre Wilson é negro mas não é  isso, segundo Bispo de Marília, diocese à qual a paróquia pertence, não é esta a causa de seu afastamento.

    Mas o racismo está lá no cotidiano da elite da cidade .

    O próprio Wilson admite que viu duas fiéis conversando sobre a troca do galo que fica no catavento da igreja “por um urubu”.

    Ele falou deste racismo logo que assumiu a Matriz:

    “As pessoas ainda tem dificuldade de aceitar a raça negra. As pessoas dizem que não, mas eu senti isso da parte de alguns, percebi uma certa rejeição em função da minha cor. Se doeu? Claro que doeu, sou humano, mas isso não pesou na minha missão”.

    A principal causa para a transferência é a divisão que Ramos teria causado na paróquia. “O padre Wilson tem sofrido com essa questão. Houve preconceito por parte de fiéis, mas o padre foi vencendo e o que está em jogo agora não é o preconceito, mas sim a divisão que ele causou na paróquia”, afirmou o bispo.

    Que divisão?  Um grupo de fiéis tradicionais que enviou cartas ao bispo reclamando do “jeito” simples do padre e, principalmente, do fato de ele atrair pessoas pobres e jovens usuários de drogas para a igreja.

    O bispo de Marília mandou, então, dois padres para ouvir os fiéis.

    Quase 700 foram ao Instituto Pastoral de Adamantina, cidade que tem pouco mais de 30 mil habitantes.

    Segundo o Estadão, a maioria depôs em favor em favor de Wilson.

    Que, apesar disso, “rodou”.

    Mas, segundo o Ali Kamel, diretor da Globo,  não há racismo no Brasil.

    Só em Adamantina, né?

    Com todo o respeito, isso não é um problema de religião. É um problema de humanidade.

    http://tijolaco.com.br/blog/?p=23444 

     

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