As mudanças na relação do governo com o setor privado, por Delfim Netto

Da Carta Capital

Mudança de atitude

O governo altera sua relação com o setor privado e colhe frutos nos leilões de infraestrutura, o que tende a reduzir o grau de incerteza que inibe os investimentos
 
O futuro será nosso se percebermos que não há oposição entre governo e empresários. Há uma perspectiva de cooperação. Há, sobretudo, vontade política do governo de cooperar com todos os empresários e empresárias de pequeno porte, médio porte e grande porte.”

Selecionei esse pequeno trecho da fala da presidenta Dilma Rousseff na abertura, em 18 de novembro, do Congresso da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo, em Campinas, porque ele veio confirmar de forma muito enfática os sinais claros de uma nova postura política de seu governo que, a meu ver, terá enorme influência na redução das incertezas a inibir a aceleração dos investimentos privados em nossa economia.

Ninguém ignora que grande parte das dificuldades que retardaram os investimentos na infraestrutura neste ano, por exemplo, derivou da falta de flexibilidade nas negociações da autoridade com o setor privado para acomodar interesses contraditórios. Recentemente, isso começou a mudar quando o governo entendeu que as concessões de estradas de rodagem, energia e aeroportos não podiam conter exigências inaceitáveis.

Os resultados logo apareceram, como se verificou nos leilões dos aeroportos do Galeão, no Rio de Janeiro, e Confins, que atende a região de Belo Horizonte, e nas concorrências para as rodovias no Centro-Oeste. Nestas, a BR-050 (que liga Minas Gerais a Goiás) atraiu empresas organizadas em oito consórcios. O leilão do trecho de Mato Grosso da BR-163, que fará a ligação de asfalto de Cuiabá a Santarém, em território paraense, teve o concurso de sete empreiteiras.

Mesmo o leilão do Campo de Libra terminou muito melhor do que muitos imaginavam, dado o clima de aparente desconfiança que o cercava até as vésperas. E nesta primeira semana de dezembro, na quarta-feira 4, a presidenta Dilma voltou a comemorar o sucesso de mais um leilão de concessões rodoviárias, desta vez de 1,17 mil quilômetros das BR-060, 153 e 262 em Goiás, Minas Gerais e Distrito Federal, vencido pela oferta de menor valor da tarifa de pedágio, equivalente a um deságio de 52% do valor máximo fixado.
Esses resultados confirmam: houve uma mudança importante da atitude do governo nas suas relações com o setor privado. As oportunidades de investimento no Brasil são imensas para as empresas privadas, e o governo se convenceu de que com bons projetos e oportunidades de competição adequadas é possível transferir os monopólios públicos para o setor privado, com benefícios sensíveis para o estatal e maiores ainda para a sociedade.

Isso é facilitado quando são construídas agências reguladoras como instrumentos do Estado, não da ação política. Demorou um pouco para entender que não valia a pena impor condições que acabavam por impossibilitar a realização dos leilões, mas hoje parece ter sido superada essa postura. A importância desses fatos é já permitir perceber que tem diminuído o mal-estar que em um dado momento passou a existir nas relações do setor privado e governo.

O esforço para reduzir as incertezas e recapturar a confiança dos cidadãos de que é possível melhorar os níveis de crescimento (e certamente os de empregos) é objetivo universal prioritário para 2014. Com exceção da China, as demais economias importantes do mundo terminam 2013 com crescimento fraco: os Estados Unidos deverão ter um crescimento de 1,7% do PIB. A equipe econômica de Obama faz projeções de 2,5% em 2014 e de 3% de crescimento em 2015. O PIB mundial deve crescer 2,3% em 2013; a fantástica China prevê 7,5% neste ano, mas admite crescer algo como 7% em 2014.

A economia brasileira, quando comparada com as demais emergentes, não está em situação das mais confortáveis, mas deve terminar 2013 com um PIB a crescer em um ritmo próximo de 2,7%, acima, portanto, da média mundial. E com perspectiva de continuar crescendo em 2014 e nos anos seguintes.

Para terminar, registre-se o comentário do presidente Xi Jinping sobre o comportamento da segunda maior economia do mundo, ao falar em um simpósio em 22 de novembro último, divulgado pela Xinhua, a agência oficial de notícias da China: “Embora a situação como um todo seja boa, o ambiente de 2014 para o desenvolvimento econômico e social não é otimista”.

 

Redação

4 Comentários

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  1. O assunto é de grande importância política no longo prazo

    Delfim não conta tudo o que sabe, já que ele é um elemento muito importante neste dialogo.

    Mas estamos vendo a 2ª fase do dialogo Governo do PT com o Grande empresariado.

    A 1ª foi iniciou-se em 2002, e coube a Lula abrir canais com algumas grandes empresas: as mais importantes foram Odebrecht, Andrade Gutierrez, Bradesco, Abílio Diniz (mais a pessoa que a empresa CBD que não é tão estratégica assim num projeto de desenvolvimento).

    A grande dificuldade era abrir um canal de discussão, e nisso Lula é um estadista. Pelo caráter monárquico da nossa “república” o número grande de empresas tem hojeriza á origem do petismo: Itau-Unibanco é o caso mais claro, mas há muitos outros.

    Quando se iniciou a fase dos grandes projetos, basicamente 2010 e governo Dilma, havia do lado do governo uma grande desconfiança contra os possíveis ofertantes nos leilões, pelo histórico de carteis mais ou menos claros, de taxas de retorno absurdamente altas nos casos organizados pelos tucanos, seja a nível federal seja estaduais (o estado de SP é o caso mais absurdo).

    O que está acontecendo é que os 2 lados estão perdendo as suas desconfianças:

    – o governo percebe que quando ameniza as tentativas de controles anti-cartel há respostas muito positivas nos leilões, e

    – as grandes empresas estão se convencendo que o governo quer resultados e está empenhado no sucesso dos investimentos.

    A base de apoio dos psdb-psb da vida vai se limitar a Camargo Corrêa (saudade do janio quadros!), Itau-Unibanco e os administradores de fundos. 

  2. timming correto

    Vou discordar do Delfim no sentido de que a Dilma deveria mesmo ter levado as negociações ao extremo. A posição da Dilma é de quem busca o melhor para o interesse público, o imediatismo é sempre um inimigo.

    Entendo que o timming das negociações estão corretos.

  3. Neste momento é importante o

    Neste momento é importante o governo ceder um pouco como o fez. O problema do Brasil era a falt de planejamento neste momento parace que o tem.

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