Drones já são uma preocupação jurídica, por André Castro Carvalho

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Em 8 de abril, a Comissão Europeia – que tem a função de propor mudanças legislativas na União Europeia – remeteu ao Parlamento Europeu o comunicado intitulado A new era for aviation: opening the aviation market to the civil use of remotely piloted aircraft systems in a safe and sustainable manner, o qual que deve balizar a elaboração de uma regulação consolidada no setor de exploração comercial de drones.

Os drones terão papel de extrema relevância a partir de 2016 – ano que deverá servir como marco de integração da aviação civil com os Remotely Piloted Aircraft Systems(RPAS). RPAs são parte de um conceito mais abrangente denominado Unmanned Aerial Systems (UAS), o que envolve sistemas para aeronaves sem qualquer envolvimento de pilotos – nem mesmo estando remotos.

Nos Estados Unidos, a principal discussão jurídica cinge-se à legalidade do uso dos drones em combates no Oriente Médio, cujas ações estão invariavelmente associadas a consideráveis baixas de civis. O país emitiu, há pouco tempo, uma norma (o FAA Modernization and Reform Act of 2012) a fim de contemplar essa propagação do uso dos drones – muito embora a população norte-americana seja um pouco refratária à sua expansão.

O Brasil já começou a trabalhar em uma regulamentação própria: desde 2011, com a aprovação do uso de Veículos Aéreos Não Tripulados (Vants) pelo Departamento da Polícia Federal, a Agência Nacional de Aviação Civil – Anac vem externando preocupação para disciplinar o tema. A Agência criou um grupo de trabalho para elaborar um ato normativo a fim de regular as operações não experimentais de RPAS. A proposta de ato normativo ainda está em discussão na Agência, cujo roadmap recente definiu a emissão do ato normativo ainda em 2014.

Nas discussões jurídicas internacionais sobre o tema, há dois usos principais que podem ser vislumbrados: militar e civil. Se no uso militar não bélico a patrulha fronteiriça é vista como uma opção menos polêmica, para fins civis é possível extrair aplicações que envolvem o alfabeto inteiro como exemplo: (a) segurança pública (patrulha, perseguição, controle de manifestações, desarme de bombas, resgate de reféns) ou privada; (b) logística – que envolve principalmente o transporte de bens; (c) atividade jornalística; (d) publicidade e marketing; (e) agropecuária; (f) construção civil e pesada; (g) extração de recursos naturais; (h) mapeamento de uso do solo urbano e rural; (i) auxílio ao Corpo de Bombeiros, inclusive em atividades de resgate e socorro médico; (j) inspeções em infraestruturas, como linhas férreas, rodovias, dutos, represas, antenas ou linhas de transmissão; (k) transporte de passageiros; (l) entretenimento e esporte (aeromodelismo); (m) transporte de produtos perigosos e armamento; (n) cinema, fotografia e teledramaturgia; (o) radares, ladares, GPS, microfones ópticos a laser e outros tipos de sensores; (p) pesquisas científicas; (q) treinamento de pilotos; (r) intervenção em sítios arqueológicos; (s) detecção e combate a queimadas florestais; (t) inspeções judiciais e monitoramento de condenados; (u) courier, como entrega de encomendas e alimentos; (v) ajudas a comunidades inacessíveis; (w) monitoramento de tráfego; (x) função meteorológica; (y) detecção de desastres e catástrofes naturais; (z) expedições espaciais.

A proposta de regulamentação da ANAC tem sido para operação comercial e corporativa, de acordo com determinadas categorias (em virtude do tamanho do Vant), sob a modalidade VLOS (onde há contato visual do piloto com o RPA) ou BVLOS (quando é remota e sem contato visual com o RPA). Percebeu-se também a necessidade de se vislumbrar uma disciplina normativa extensível aos Vants (gênero) e não somente ao RPAs (espécie) – principalmente pela importância de seu uso em atividades de segurança pública e privada, em que a figura do piloto remoto não é imprescindível. Todavia, em razão da competência específica da Anac, a proposta normativa não contemplará a maioria das aplicações acima expostas – o que deverá ensejar discussões jurídicas em um futuro próximo.

Diante do tema completamente novo e alheio à legislação preexistente no País, algumas questões polêmicas poderão emergir com o desenvolvimento dos Vants: (I) privacidade e integridade física, tanto no aspecto individual como difusa, (II) proteção de dados e ataques cibernéticos; (III) acesso a áreas específicas (inclusive internacionais); (IV) responsabilidade civil em caso de colisões e danos; (V) pouso e decolagem em aeródromos públicos; (VI) crimes relacionados ao uso, inclusive com implicações extraterritoriais; (VII) questões trabalhistas; (VIII) accountability. Todas elas exibem peculiaridades que seguramente merecerão a atenção dos operadores do direito em um futuro próximo.

Ademais, em um futuro não muito distante, haverá igualmente a necessidade de discussões jurídicas acerca de outros veículos não tripulados que não os aéreos, como automóveis, ônibus ou embarcações marítimas. Uma boa regulamentação para os VANTs servirá, seguramente, de subsídio para esse futuro tecnológico que nos espera.

 

André Castro Carvalho – Bacharel, Mestre e Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo. Advogado e Professor  em São Paulo


[1] Artigo publicado, originalmente, no Brasil Post – The Huffington Post, em 24 abr. 2014. Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/andre-castro-carvalho/drones-ja-sao-uma-preocupacao-juridica_b_5199971.html

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. A preocupação maior deveria

    A preocupação maior deveria ser com os aviões de carreira e sua segurança…

    Agora não precisa nem de suicida a bordo…

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador