Porto-Ferrovia: aliança logística, urbana e ambiental

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Do Site Portogente

Olhando para trás só se pode lamentar a “Maria Fumaça” e seus companheiros que se foram; ou o tempo em que a ferrovia era o eixo do sistema de transportes e do desenvolvimento nacional. No pico das crises de congestionamentos portuários, que travam tudo (010203), então, a saudade até aumenta e nos reforça a convicção de que os “problemas dos portos (brasileiros) estão fora do cais”; nos acessos – no caso do Porto de Santos, visto como “a prioridade nº 1”.

Olhando para frente o cenário é animador: O Plano Nacional de Logística e Transporte – PNLT enuncia, como meta, uma redução da participação (relativa!) do modo rodoviário de 58% para 33% (43%) na nossa Matriz de Transportes (2007- 2025). Paralelamente, um aumento de 25% para 32% (28%) no ferroviário. O Plano Diretor de Desenvolvimento dos Transportes –PDDT, paulista, entre 2000 e 2020, indica uma redução de 93% para 66% (29%) no rodoviário (índice mais próximo do brasileiro, atualmente). Em contrapartida, um expressivo aumento do ferroviário: 5,2% para 31,2% (6 vezes!). O Programa de Investimentos em Logística – PIL, lançado pelo Governo Federal em 2012, anuncia números expressivos: 10.000 km (ênfase em 12 trechos) e R$ 91 bilhões de investimentos nos próximos 25 anos (sendo R$ 56 bilhões já nos primeiros 5).

Acesso ferroviário ao Porto de Paranaguá, no Paraná

Ou seja, os planos para o futuro nos entusiasmam; nos trazem esperança… apenas abalada se voltamos a olhar o passado, em retrospectiva, e percebemos o que efetivamente vem ocorrendo com o PAC; e o que ocorreu com o “Avança Brasil” (2000-03), o “Brasil em Ação” (1996-99), os PNDs do período militar… que igualmente propunham um “rebalanceamento da matriz de transportes” em direção aos modos aquaviário, ferroviário e dutoviario; tendência mundial. É o caso, p.ex., da Europa, com seu “White Paper” (horizonte de 2050).

Toda vez que a discussão vem à baila, a primeira coisa que se pensa é nos investimentos. Certamente eles são necessários; são imprescindíveis. Mas não é tudo:

1) Modelagem e regulação ferroviária: Infelizmente as concessões, que resultaram nas atuais MRS e ALL, não levaram em consideração manifestação formal do CAP/Santos aos dirigentes do Programa Nacional de Desestatização – PND. Esta é uma das razões pelas quais o potencial ferroviário na Baixada Santista, uma década e meia depois, não é plenamente efetivado. Se o tivesse, essa malha seria operada centralizadamente, em “open acess” (acesso aberto); a “Ferradura” (via dupla, bitola mista em torno do Estuário) teria sido implantada; pátios para organização e despacho das composições estariam em funcionamento… em lugar de uma solução acanhada e sequer plenamente efetivada (a “Portofer”). Enfim, certamente a articulação operacional entre as duas concessões, e entre estas e os terminais portuários seria bem mais eficiente. É tarde; mas ainda há tempo de se corrigir esse equívoco!

2) Modelagem portuária: Também estimularia/impulsionaria a articulação porto-ferrovia se nas licitações para arrendamentos fossem assumidos e definidos compromissos nesse sentido. E isso, também, é possível. O momento é agora; esse 2º semestre de 2013, quando os processos licitatórios estão em curso.

3) Planejamento urbano: Efetivamente é quase impossível operar-se trens de cargas em linhas onde os de passageiros operam com intervalos (“headway”) curtíssimos (3; 2 minutos – como previsto nos planos de modernização da CPTM, em curso na Região Metropolitana de SP – RMSP). A segregação dos fluxos é imprescindível. Mas isso, tampouco, é suficiente: Sem pátios adequados é difícil, talvez impossível serem feitas operações ferroviárias e as integrações intermodais eficientes. Ou seja: Pode-se chegar ao paradoxo de se ter acessos ferroviários, trens passarem, mas sem uso efetivo. A Capital e outros municípios, tanto da Baixada Santista como da Região Metropolitana de SP, estão em fase de revisão de seus Planos Diretores. Trata-se de oportunidade preciosa para que seja reservado, e especificamente destinado para esse fim, aquilo que resta de grandes áreas junto às linhas ferroviárias: Conjuntos habitacionais (importantíssimos!), shopping centers… têm outras alternativas. Pátios ferroviários, é curial, só fazem sentido junto aos trilhos; certo? E ainda há áreas e/ou instalações ociosas, estrategicamente localizadas na RMSP, que poderiam se prestar a tanto. P.ex: na região da Av. Pres. Wilson (Ipiranga/Mooca), do Pari, Barra Funda, Lapa e Ceasa.

4) Serviços dedicados: A área da Av. Pres. Wilson, em particular, deveria ser vista/considerada como se fosse o próprio Porto de Santos; uma retroárea sua cravada na RMSP… como o fazem diversos portos mundo afora; inclusive formalmente incluídas em seus Planos Diretores. P.ex: Considerando-se que o Município de SP é “o principal cliente” do Porto de Santos, por que não se implantar um serviço expresso, ponto-a-ponto, entre o Saboó/Alamoa e um pátio moderno, multimodal, nessa área? (Algo tipo o que ocorre entre Gênova – Itália e o planalto milanês). A partir dele seriam feitas as distribuições para o Município e para a RMSP.

Dá trabalho? Sim; dá! Mas é tudo factível… e na linha das melhores práticas internacionais. Sem ações e articulações desse tipo dificilmente as metas enunciadas para os diversos planos de transporte serão atingidas. Tampouco as ambientais. E, ironicamente, sem elas, até os investimentos previstos podem vir a ter mais dificuldades para serem efetivados.

Então…“Just do it”!

Frederico Bussinger – Consultor do Instituto de Desenvolvimento, Logística, Transportes e Meio Ambiente (Idelt), foi diretor das companhias docas do Estado de São Paulo e de São Sebastião.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

1 Comentário

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  1. Expansão rodo ferroviária Parelheiros Itanhaém

    Desenvolvimento com políticas ambientais sustentáveis, não são coisas antagônicas. Qualquer pessoa com um mínimo de noções culturais sabe que investimentos em transporte, saneamento básico, urbanismo e infra-estrutura só trazem o progresso por onde passam. Os fatos refletem isto, o atual rodoanel sul não permite ligações periféricas secundárias em seu contorno, e que atravessa inúmeros mananciais, e o futuro norte estão levando em conta estas importantíssimas questões.   Com todo respeito, acreditar que o único caminho viável é deixarmos do jeito que está, é no mínimo falta de informação.

    Dentre as obras do PAC, uma que deveria estar incluída e ser priorizada é ligação rodo ferroviária Parelheiros–Itanhaém, uma vez que o porto de Santos ultrapassou seu limite de saturação com filas de navios em de mais de 80 unidades, das quais podem ser avistados da Vila Caiçara em Praia Grande, além de que a Via Anchieta por ser a única via de descida permitida para ônibus e caminhões tem registrados congestionamentos e acidentes graves semanalmente, como este de hoje 22/02/2013 em que uma trompa d’agua na baixada paulista deixou o sistema Anchieta / Imigrantes em colapso, e o transito só foi restabelecido na madrugada do dia 24 seguinte, e em épocas de escoamento de safras também a Dom Domenico Rangoni (Piaçaguera–Guarujá) se torna congestionada diariamente, ao contrário da Manoel da Nóbrega, onde somente se fica com problemas em épocas pontuais na passagem de ano, ao porto de Santos, e os futuros portos de Itanhaém / Peruíbe.

    Acredito também, como munícipe, que a estrada mitigaria as condições de estagnação que as cidades vivem, com ruas sem pavimentação, ocupação desordenada do solo, entre outras.  Uma ligação da cidade com a região sul da capital traria muitos benefícios, fornecendo mais opções, melhorar a qualidade de vida dos moradores da capital e baixada. Muitas pessoas voltariam a fixar na cidade, inclusive eu. A cidade poderia nos dar mais retorno frente aos impostos que pagamos. Investimentos em Parques Temáticos, Porto, Aeroporto, Ferrovia ligando com a existente, enfim muitos projetos que alavancariam a região como um todo, bem como o desenvolvimento global de toda a região.

    Enquanto outras cidades turísticas litorâneas avançam principalmente no norte fluminense, Itanhaem, Mongaguá e Peruíbe se voltam ás primitivas cidades sazonais caiçaras sem interesse em desenvolvimento e com metas e avanços financeiros presentes apenas nas mãos de alguns.

    Já passou á hora de ver nossa geração e de nossos filhos se enraizarem na região com bons empregos e educação ao invés de tentar uma melhor condição social em São Paulo, pois Santos também já ultrapassou o limite de saturação.

    Com relação Parelheiros, esta região rural situada ao sul do município de São Paulo, que possui uma carência de saneamento básico, ajudaria enormemente uma fiscalização, urbanização e preservação dos seus mananciais.

    Sinto que o potencial destas cidades não são utilizados, com foco noutros que beneficiam uma minoria retrógrada. Não vejo senão, o apoio irresponsável e egoísta aos interesses escusos.

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