Fernando Haddad, o pacificador, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Fernando Haddad, o pacificador, por Fábio de Oliveira Ribeiro

A eleição presidencial brasileira está mais ou menos definida. Se não derrotar Jair Bolsonaro no primeiro turno, Fernando Haddad será eleito com uma larga vantagem no segundo. As virtudes dele serão muitas: calma, experiência administrativa, pensamento prospectivo e de longo prazo, gentileza, firmeza e facilidade para construir consensos em situações adversas. Comparado ao seu rival, o candidato do PT reluz como uma folha de ouro ao lado de um pedaço de papel higiênico usado.

Os problemas que Haddad enfrentará na presidência do Brasil não são qualitativamente diferentes daqueles que ele enfrentou em São Paulo. Quando foi prefeito da maior cidade do país, o futuro presidente petista também foi sacaneado por uma oposição destrutiva no Legislativo e sabotado pelo Judiciário. Apesar das dificuldades que foram artificialmente criadas para ofuscar seu desempenho, Haddad não perdeu a cabeça e o bom humor. Ninguém pode dizer que ele tenha deixado a prefeitura em situação pior do que a encontrou. 

A prefeitura de São Paulo, entretanto, não é nenhum pouco parecida com a União. O prefeito representa a cidade. Em razão do cargo, ele é obrigado a se relacionar com autoridades dentro e fora dela. Mas sua competência fora do país é inexistente. O presidente da república, por sua vez, tem que se relacionar tanto com autoridades dentro do país quanto com as autoridades de outros países e organismos internacionais. Vem daí a necessidade de tecer algumas considerações sobre o contexto internacional que Haddad encontrará ao se mudar para o Palácio do Planalto.

O governo Michel Temer foi absolutamente desastroso para a política externa do Brasil. Tudo o que havia sido feito pelo Itamaraty nas últimas duas décadas foi destruído. A integração regional está ameaçada. As relações diplomáticas com os países da América do Sul está abalada. A credibilidade do país na ONU foi abalada em razão das declarações inapropriadas e estúpidas de Aloysio Nunes. A presença do Brasil nos organismos multilaterais se tornou irrelevante e menosprezada.

Todos os problemas criados pelo (des)governo do usurpador, contudo, podem ser contornados. A legitimidade que ele não tinha o novo presidente terá. Haddad certamente não escolherá um alcoólatra cretino, grosseiro e virulento para comandar o Itamaraty. Na arena internacional, o jogo que está sendo jogado pelas grandes potências ignorando completamente o Brasil é diferente daquele que havia nos governos Lula e Dilma.

Donald Trump enfraqueceu os organismos multilaterais e passou a hostilizar de maneira aberta tanto a China quanto a Rússia. Ele comanda uma potência em declínio, mas age como se pudesse recuperar a hegemonia mundial e o prestígio internacional do seu país fazendo chantagens e ameaças. Sempre que tem oportunidade, o novo presidente dos EUA humilha os governantes europeus. Quando não é atendido ele cruza os braços como se fosse uma criança que deixou de ganhar um pirulito. Nem mesmo na Inglaterra ele é levado a sério ou muito respeitado.

O clima de nova guerra fria criado por Donald Trump tem esquentado em razão da obsessão norte-americana de tentar cercar a Rússia de bases militares e de tentar decidir os rumos da Síria. A advertência que ele fez à China para parar de comprar armamento russo é patética, pois todo mundo sabe que os norte-americanos nunca venderiam equipamentos militares sofisticados aos chineses.

Atemorizados, os comandantes militares norte-americanos passaram a defender a tese de que podem descumprir uma ordem presidencial autorizando o uso de armas nucleares. Eles sabem que uma retaliação equivalente exterminaria dezenas de cidades dos EUA e comprometeria a vida humana em todas as outras. Apesar do aparente bom senso dos militares gringos nunca é demais recordar as palavras de Gore Vidal:

“Os rapazes que vão para West Point hoje em dia fazem-no por diversas razões, nenhuma associada ao aprendizado. Por exemplo, há o apelo romântico da Long Gray Line. Há o apelo confortável de uma vida em que todas as decisões importantes são tomadas por outros. Há o atrativo especial da aposentadoria cedo – sem falar na possibilidade de transferência para os escalões mais altos das empresas que realizam transações com o Pentágono. Basta ingressar na escala volante; quem entra em Wet Point terá o sentimento do dever cumprido, da honra mantida e da pátria servida. E também do ‘eu’ servido, é claro. É um pacote irresistível. Mesmo assim, há pouco tempo um instrutor da Academia (anônimo) comentou: ‘Os cadetes de West Point são de quinta categoria’. A resposta a essa observação tem de ser: são de quinta categoria porque isso é tudo o que o sistema exige deles. Como não são diferentes dos outros rapazes americanos da mesma idade, seu torpor intelectual resulta de um sistema que exige lealdade e obediência acima de tudo – duas qualidades que florescem com grande exuberância entre os ignorantes; e que nos fanáticos adquirem características extremamente perigosas.” (De Fato e de Ficção – ensaios contra a corrente, Gore Vidal, Companhia das Letras, São Paulo, 1987, p. 259/260)

Os militares dos EUA descartaram a hipótese de usar bombas nucleares, mas como o próprio Donald Trump eles parecem acreditar que uma guerra convencional contra Rússia e/ou a China será inevitável. Essa crença só pode ser fruto de uma ignorância exuberante ou de um fanatismo extremamente perigoso.

A guerra é um fenômeno imprevisível. Ela sempre começa antes do primeiro tiro. Um conflito diplomático não resolvido de maneira negociada tende a evoluir das ameaças para as agressões e destas para agressões cada vez maiores. Depois que a guerra começa, raramente os inimigos deixam de usar todos os meios de violência que estão à sua disposição. Na maioria das vezes – e a história tem provado isso de maneira inquestionável – dois ou mais países em guerra passam inclusive a se esforçar para desenvolver armas novas e cada vez mais terríveis para destruir o inimigo acreditando que ao fazer isso poderão se proteger.

Se os cretinos e fanáticos treinados em Wet Point começarem uma nova guerra mundial ela será a última. Vem daí a importância do Brasil ter um presidente tranquilo e pacífico como Fernando Haddad. Ao adentrar na arena internacional cercado de diplomatas experientes e não belicosos, nosso novo presidente poderá não só recuperar a credibilidade do Brasil como também desmobilizar os corações e mentes dos poderosos do hemisfério norte. A guerra não é inevitável, mas se Jair Bolsonaro for eleito ela certamente ocorrerá e chegará aos nossos quintais.

 
Fábio de Oliveira Ribeiro

17 Comentários

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  1. Pacificação requer agenda

    Não será obra de uma personalidade ou candidato. A agenda deve começar pelo isolamento dos radicais, através da incorporação pelo sistema político das tendencias moderadas que se bandearam para o lado radical por falta de opção.

    Também precisamos identificar e neutralizar os mecanismos sectários operando na sociedade, e substituí-los por discursos e praticas focados na busca de terreno comum para as diferentes tendencias operarem civilizadamente.

    A armadilha em que caímos foi armada por forças poderosas, incluido mídia, ongs, think-tanks e grupos instalados em todos os principais partidos, de esquerda e de direita ,que criaram a ilusão da separatividade com o objetivo de impor sua própria agenda.

    O mapa politico-ideológico pelo qual estamos nos orientando é fake, elaborado para impedir que uma agenda capaz de unir 70% ou mais da população ganhasse representação eleitoral e chegasse ao poder.

     

     

    1. Quem vai decidir a agenda do

      Quem vai decidir a agenda do Brasil é o povo e não você ou seus amigos de direita. No fundo, você disse apenas uma coisa: que não aceitará o resultado das urnas. Portanto, devemos concluir que você é um golpista em potencial. Além de se preocupar com o cenário externo, Fernando Haddad terá que usar o Exército para conter tipos como você? Se isso for necessário nosso novo presidente terá todo meu apoio. E digo mais: Haddad deve ser mais enérgico do que Dilma Rousseff. Chega de tolerar golpistas como você.

      1. Parece que voce acabou de

        Parece que voce acabou de confirmar meu argumento.

        O discuro sectario é o maior aliado dos fascistas, e a agenda que precisamos deve ser elaborado pelos partidos, sociedade, instituições e líderes em um debate aberto e democrático, não manipulado pela midia e pela oligarquia que nos oprime

        As eleições e a democracia são soberanas. Não defendo golpe algum, mas tenho lucidez suficiente para não me deixar cegar pelo ódio e pelo sectarismo, que tornaram a possibilidade de golpe real.

        1. Meu caro, os dois estão errados.

          Este papinho “a agenda que precisamos deve ser elaborado pelos partidos, sociedade, instituições e líderes em um debate aberto e democrático,” já era.

          Não há mais agenda nacional, nem Haddad, nem Bolsonaro, nem Ciro, nem ninguém no país formará uma agenda para o Brasil, a agenda já foi estabelecida, e só com uma ruptura muito grande que se pode querer uma aganda nacional, o resto é bla-bla-bla.

          1. Você também fala em ruptura.

            Você também fala em ruptura. Portanto, não é muito diferente do nóia que veio aqui defender uma agenda neoliberal mínima como se isso não fosse uma proposta da direita que será derrotada.

            Vocês dois não acreditam mais na legitimidade eleitoral. Ambos conspiram contra a soberania popular.

          2. Qual a soberania popular? A mesma que garantiu Dilma?

            É fácil falar em termos genéricos simplesmente desligados da realidade. Soberania popular! O que significa quando o voto é caçado por qualquer mentira que inventem.

          3. Calma, meu caro. O medo é um

            Calma, meu caro. O medo é um péssimo conselheiro. O ódio é um amigo perigoso. Ele quase sempre prejudica quem abandona o respeito pelas regras eleitorais em razão de ter se deixado conduzir pelo ódio.

        2. O único sectário aqui é

          O único sectário aqui é você.

          A legitimidade política da nova agenda anti-neoliberal para o Brasil será conferida pela maioria da população. 

          Pela maioria da população, entende? Não pela minoria abastada e abestada que você acredita ter mais direito de decidir o que é bom ou não para o país.

          Repido e digo: você é um golpista disfarçado. Se você for tratado com rigor não ficarei nem surpreso nem triste.

  2. Dilma 3.0

    Haddad será uma Dilma 3.0, isto é, fará o mesmo ajuste neoliberal que nossa ex-presidenta, a Dilma 2.0, tentou fazer.

    Fará a reforma da previdência, como Lula fez a do setor público lá atrás.

    Se acertará com todos os partidos golpistas que derrubaram Dilma.

    Se acertará até com o PSDB…

    Não aprovará nenhum projeto de controle social da mídia.

    Não tornará o sistema bancário menos concentrado nem reduzirá spread com as medidas que vem anunciando (Luiz Gonzaga Belluzo já vaticinou que isso não pode dar certo por razões estritamente econômicas).

    Continuará despejando dezenas de milhões em anúncios do governo federal no PIG. Nunca tomará a atitude do Requião que zerou essa despesa quando foi governador no Paraná.

    Não isentará de IR quem ganha até 5 salários mínimos com uma desculpa qualquer (inventará algum mecanismo que corta aqui e repõe ali ou reduz os elegíveis, pois o ajuste fiscal tem de ser feito).

    Não revogará PEC do Teto, Reforma Trabalhista ou cessão do Pré-sal: vai “amenizar” alguns dos impactos dessas medidas com uma recauchutagem das leis aprovadas, mas revogar essas leis ipsis litteris na canetada nem pensar.

    E, por fim, não dará indulto ao Lula que ainda vai mofar na cadeia por longos meses ou anos.

    Mas seus eleitores e os petistas lhe perdoarão com um argumento maravilhoso: “Você queria o que, que entregássemos o país ao Bolsonaro?”.

    Assim, nessa lógica contínua do “menos pior”, iremos de rebaixamento em rebaixamento até desaparecermos.

    Querm viver verá.

    Depois não digam que não avisei!

      1. Ciclo esgotado

        Não. É uma nota triste sobre o fim do ciclo petista.

        O PT e, por extensão, o Haddad, esgotaram sua energia política há muito tempo. Desse mato não sai mais nenhum coelho.

        Tudo o que eles têm a oferecer é mais do mesmo. É, nas palavras de uma amicíssima do Haddad (foi até secretária de uma pasta na administração dele em São Paulo), continuar conduzindo o Brasil como uma plataforma de valorização do capital internacional…

        Tenho idade suficiente para ter votado em 1989. Ali, dei meu primeiro voto ao PT na eleição presidencial. Confirmei meus votos petistas, tentando eleger Lula em 1994 e 1998. Finalmente conseguimos em 2002. Fomos bi, em 2006, tri em 2010, e tetra em 2014.

        Em 2018, talvez seja penta na prorrogação, pois no primeiro tempo não vou votar no Haddad. Obviamente, descarto votar no Bozo em qualquer eleição de que participe…

        Ainda não sei em quem vou votar no primeiro turno. Só sei que não vou votar no Haddad nem no Bozo e que também não vou anular. Penso em votar no Ciro, mas não acredito em quase nada do que ele promete, ele é quase um fanfarrão, mas pelo menos dá alguns nomes aos bois. O problem dele é esse alguns…

        No Boulos nem pensar, votei aqui e ali, em eleições legislativas, no PSOL, mas é outro partido que já foi pro saco e não faz pouco tempo não. Resta o PSTU como voto de protesto. Amoedo, Meirelles, Dias etc. são empulhações de péssimo gosto…

        Se o Ciro subir nas pesquisas, talvez vote nele para evitar um segundo turno Bozo x PT, na minha opinião bastante arriscado pela força do antipetismo e porque não quero passar mais 4 anos com um governo do PT me frustrando a cada nova medida tomada e fazendo os mesmos duplos twists carpados mentais dos últimos 16 anos para justificar para mim mesmo porque, afinal, votei neles.

        Não nutro mais ilusões com o PT. Como partido que um dia sonhou transformar o Brasil, acabou. O que resta agora é o conchavo com o atraso e uma reforminha aqui, outra ali, mas o Brasil vai continuar (até o fim dos tempos?) a ser essa desgraceira que qualquer um pode ver botando o pé pra fora de casa (e, ås vezes, nem isso, do interior dos nossos sagrados lares essa constatação já é perceptível).

        Tivemos uma chance de virar uma nação decente há 50 anos, quando éramos um terço do que somos hoje, mas o golpe de 64 abortou essa possibilidade. Não é normal viver numa sociedade que mata 60 mil pessoas por ano… E é quase impossível, ou demanda um tempo que ultrapassa a vida individual da minha geração, transformar um país de 200 milhões de habitantes.

        Não saímos da ditadura, em 1985, pois a anistia foi auto-concedida pelos militares sem que os responsáveis por inúmeros crimes fossem punidos, nem em 1988, com um artigo por eles redigido incluído na Constituição “cidadã” garantido que basta um presidente da Câmara Federal ou do Senado, um juiz do STF ou o próprio presidente (poderes legislativo, judiciário e executivo) determinarem que há “anarquia” para que os miltares intervenham LEGALMENTE.

        Enfim, quem viveu os últimos 15, 20 anos no Brasil, sabe que continua a mesma desgraceira de sempre, mesmo que muitas coisas boas tenham sido feitas aqui e ali, pelos governos do PT que ajudei a eleger, sem, no entanto, transformar de forma significativa qualquer traço da sociedade brasileira.

        A prova está na sua cara: ascenção da extrema direita partidária e pessoas completamente alienadas que espumam ódio e chegam a agredir fisicamente quem não pensa como eles em todos os cantos do país (em 1989, não tinha isso não…).

        Por isso, fico muito triste, ao ver que o partido que eu ajudei a chegar ao poder faça uma campanha prometendo coisas que não pode entregar e, mais triste ainda, vendo muita gente nos blogs sujos que frequento desde sempre, converterem-se em “minions” de sinal trocado…

  3. E quem disse que o Imperialismo quer pacificação?

    Há uma noção meio errada que um homem ou um projeto individual podem fazer uma nação.

    Achar que há possibilidade de pacificação na eleição de um ou outro personagem é de uma ingenuidade cavalar.

    O processo de ataque aos direitos sociais não algo que ocorre somente no Brasil, o Imperialismo (apesar de pensarem que ele não existe, ele mostra as suas garras por todo o mundo) está atacando por NECESSIDADE de expansão, é uma lógica que está bem demonstrada há mais de um século, logo com um pacificador ou com um fascista o programa do Imperialismo será o mesmo, drenar todas as riquezas dos países periféricos para garantir o deles.

    Logo este papo de pacificador ou de fascista doutro lado, é uma bobagem, pois o ataque ao país prosseguirá, por bem ou por mal, não se iludam.

     

    1. Se está deprimido você deve

      Se está deprimido você deve procurar um comprimido. Depois de tomá-lo sua perspectiva irá ser transformada.

      1. É não houve nada no Equador e em dezenas de outros…..

        É não houve nada no Equador e em dezenas de outros países que o Imperilismo põe a mão.

        Tens um comprimido que deixe o sujeito meio desligado da realidade internacional? Se estás tomando um desses me manda a receita.

        1. Não estou desligado, nem

          Não estou desligado, nem confundo alhos com bugalhos. É um erro acreditar que o imperialismo gringo sobreviverá ao primeiro mandato de Trump. Impérios surgem e caem. Os pacificadores são capazes de ver isso. Os desesperados não.

  4. Será que sobrinho achei o tal
    Será que sobrinho achei o tal artigo da The Nation esquizofrênico?

    Serve mais para atacar Haddad e defender o amigaço dos coronéis cearenses e tucano enrustido analisando do ponto de vista da esquerda.

    Lá diz que o amigaço não faria a reforma da previdência, mas Haddad faria por ser membro de certa escola de economia….o amigaço teria mais inclinações a intervir na economia, já Haddad seria mais diplomático………
    De qualquer forma não é o que vemos, com a rede golpe se inclinando para incensar a candidatura do tucano enrustido. Artigo bem estranho……

  5. Esse tipo de discurso NAO AJUDA

    Todos sabem aqui que sou petista ferrenha. Mas ficar dizendo que Haddad pode ganhar no primeiro turno ou ganha com grande maioria no segundo só desmobiliza. A batalha vai ser dura, e dar uma de Poliana nao ajuda nada.

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