O 1% e a austeridade na Grécia, por Paul Craig Roberts

Enviado por Adir Tavares

Do Rebelión

Fúria e ruido de enorme significado

Paul Craig Roberts

CounterPunch

Toda a Europa, assim como os impassíveis estadunidenses e canadenses foram colocados em alerta pelos que representam o 1%. A mensagem representada pelo fracasso do Syriza é que o sistema de proteção social será desmantelado em todo o Ocidente. 

O primeiro-ministro grego Alexis Tsipras  cedeu ao 1% o saque dos avanços conquistados pelos gregos em matéria de segurança social depois da Segunda Guerra Mundial do século XX.. As aposentadorias e os cuidados com a saúde para as pessoas idosas estão em vias de desaparecer. O 1% precisa de dinheiro.

As protegidas ilhas gregas, os serviços de água potável, os aeroportos, todo o conjunto do patrimônio nacional devem ser vendidos ao 1%. Evidentemente, a preço vil, mas as tarifas da água que logo após virão não poderão ser discutidas.

Trata-se da terceira etapa da austeridade imposta à  Grécia, austeridade que necessita de cumplicidade do próprio governo grego. Os acordos de austeridade servem de fachada para ocultar o saqueio do povo grego, que será literalmente despossuído de tudo. O FMI é um dos membros da troika que impõe essa austeridade, embora os mesmos economistas do FMI tenham dito que as medidas de austeridade demonstraram  ser equivocadas. Foi a austeridade que provocou a ruína grega. Contudo, o endividamento grego aumentou como um pesado fardo. Cada nova medida de austeridade torna a dívida cada vez menos reembolsável.

Mas, quando o 1% saqueia, os fatos não interessam. A austeridade, que é a base do saqueio, tem continuado, embora os economistas do FMI não possam justificá-la.

A democracia grega tem se mostrado impotente. O saqueio continua, apesar de o povo grego tê-lo rechaçado através do voto há uma semana. Portanto, fica em evidência que Alexis Tsipras é um primeiro-ministro eleito que não representa o povo grego, mas sim o 1%.

O suspiro de alívio do 1% foi ouvido em todo o planeta. O último partido europeu de esquerda, ou que se acreditava de esquerda, foi chamado à ordem, da mesma forma que o Partido Trabalhista britânico, o Partido Socialista francês e todos os demais.

Sem ideologia que a sustente, a esquerda europeia morreu, da mesma forma que o Partido Democrata nos Estados Unidos. Com a morte desses partidos políticos, o povo já não tem voz. Um governo no qual o povo não pode fazer ouvir sua voz já não é uma democracia. Isso pode ser visto claramente na Grécia. Uma semana depois do povo expressar-se de forma contundente em um referendum, o governo o ignora e faz pacto  com o 1%.  

O Partido Democrata estadunidense morreu por causa da deslocalização dos empregos, que destruiu a base financeira do partido, que se apoiava nos sindicatos e nas fábricas. A esquerda europeia morreu junto com a União Soviética.

A União Soviética era o símbolo da existência de uma alternativa socialista ao capitalismo. O afundamento soviético e o “Fim da História” privaram a esquerda de um programa econômico e a deixaram, ao menos nos Estados Unidos, ocupando-se com temas sociais como o aborto, os casamentos homossexuais, a igualdade de gênero e o racismo, retirando-lhe o tradicional apoio da esquerda, a classe operária. Desapareceu a luta de classes, transformando-se em uma guerra entre heterossexuais e homossexuais, brancos e negros, homens e mulheres.

Hoje, quando os povos ocidentais enfrentam uma nova servidão e o mundo corre o risco de uma guerra nuclear devido à pretensão dos neoconservadores de acreditarem ser o povo eleito pela história para exercer a hegemonia mundial, a esquerda norte-americana se ocupa  em odiar a bandeira da Confederação.

A queda do último partido europeu de esquerda, o Syriza, significa que a menos que outros partidos mais decididos apareçam em Portugal, Espanha e Itália, a fatia será tomada pelos partidos de extrema direita, como o Partido da Independência do Reino Unido, de Nigel Farage, a Frente Nacional de Marine Le Pen e outros partidos que defendem o nacionalismo contra a extinção nacional na União Européia. 

O Syriza não poderia triunfar uma vez que fracassou na nacionalização dos bancos gregos em resposta à decisão da UE de declarar sua quebra. O 1% grego tem os bancos  e os meios de comunicação, e o exército grego não dá nenhum sinal de pensar em aliar-se com o povo. O que estamos vendo é a impossibilidade de conseguir uma mudança pacífica, como explicaram Karl Marx e Lênin.

As revoluções ou as reformas fundamentais são contrariadas ou revogadas pelo 1% sobrevivente. Marx, contrariado pelo fracasso das revoluções de 1848, e imbuído de sua concepção materialista da história, chegou à mesma conclusão de Lênin, Mao e Pol Pot: deixar vivos os membros da antiga ordem significava a contra-revolução e o regresso dos povos à servidão. Na América Latina, todos os governos reformistas correm o risco de serem depostos pelos interesses econômicos norte-americanos em comum acordo com as elites espanholas. Estamos vendo que esse processo está se manifestando na Venezuela e no Equador. Devidamente conscientes, Lenin e Mao eliminaram a antiga ordem. O holocausto de classe frequentemente foi maior do que tudo o que os judeus padeceram com o holocausto racista nazista. Contudo, para isso não se erigiu um memorial.

Os ocidentais não conseguiram compreender até hoje por que Pol Pot esvaziou as zonas urbanas. O Ocidente rechaça Pol Pot, considerando-o um psicopata e assassino massivo, um caso psiquiátrico, mas ele atuou partindo da suposição que se permitisse a permanência dos representantes da antiga ordem, sua revolução seria derrubada.

O conservador inglês Edmund Borke dizia que a via do progresso passava pela reforma, não pela revolução. A elite inglesa, embora arrastando os pés, aceitou as reformas para evitar a revolução, justificando Burke. Mas hoje, com a esquerda totalmente vencida, não é de se esperar que o 1% aceite as reformas. A única opção é submeter-se a seu poder.

A Grécia não é mais do que o começo. Os gregos foram expulsos de seu país pela derrubada de sua economia, pelo desaparecimento de seu sistema de segurança social e por uma taxa de desemprego extraordinariamente elevada, e vão contagiar com sua pobreza outros países da União Européia. Os membros da UE não estão vinculados a fronteiras nacionais  e podem migrar livremente. O fim do sistema de auxílio na Grécia levará seus habitantes a procurar os sistemas de auxílio de outros países da UE, que por sua vez serão eliminados pelas privatizações promovidas pelo 1%.  

O aniquilamento (dos bens comuns) do século XXI já começou.

Paul Craig Roberts  foi  redator-chefe do Wall Street Journal  e Secretário Adjunto do Secretário do Tesouro de EE.UU. É autor deHow the Economy Was Lost: The Lost Economy/ War of the Worlds, publicado por CounterPunch / AK Press. ISBN 978-1-84935-007-5. Seu último livro é Economies in Collapse: The Failure of Globalism, publicado na Europa, junho 2012. 

Seu site en Internet: http://www.paulcraigroberts.org

Tradução do francês para o espanhol: Susana Merino
 
Tradução do espanhol para o português: Renzo Bassanetti
Redação

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