Como a mídia instrumentaliza o ataque de Ciro Gomes a Fernando Holiday

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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O episódio do “Capitãozinho do Mato” serve para 3 coisas e nenhuma delas é debater no mérito do pensamento de Holiday
 
Montagem: Brasil 247
 
Jornal GGN – Ciro Gomes (PDT) participou de uma sabatina na Jovem Pan na manhã de segunda (18). Enquanto falava de uma possível e surpreendente aliança com o DEM para a eleição de outubro, destacava as diferenças programáticas com o partido e decidiu citar Fernando Holiday como exemplo de divergência ideológica. Não conseguiu fazê-lo sem gerar polêmica.
 
Ciro disse que Holiday é uma espécie de “capitãozinho do mato”. E explicou: “Pior coisa que tem é um negro que é usado pelo preconceito para estigmatizar [outro negro], que é o capitão do mato.” A emissora de rádio e outros veículos, como a Folha, chamou a manifestação de “ataque gratuíto”.
 
A analogia usada por Ciro não é nenhuma novidade para Holiday. Ao menos desde 2016 ele vem recebendo a alcunha nas redes sociais, inclusive de outros negros, pois foi nessa época que bombou um vídeo seu atacando as cotas em universidades e atribuindo a política afirmativa à agenda “esquerdista”. À época, criticar iniciativas que tivessem relações com governos do PT era o ofício de membros do MBL.
 
Naquele mesmo ano, a professora Vanessa Oliveira, uma mulher negra, escreveu um artigo para o portal Esquerda Diário avaliando que o discurso de Holiday “favorece apenas a Casa Grande, e ele como bom Capitão do Mato está defendendo os interesses do seu patrão. O impeachment de forma alguma irá favorecer as mulheres, estudantes, trabalhadores negros mas, ao contrário, a burguesia com seu discurso saudosista quer mesmo voltar aos tempos da escravidão.”
 
Holiday diz que só é chamado de capitão do mato pelo negro que é de esquerda e que não aceita que ele também seja negro, mas de direita.
 
Tudo para o hoje vereador de São Paulo, liberal na economia mas pretensamente conservador nos costumes, vira um duelo entre direita e esquerda. 
 
No Twitter, após a frase de Ciro, Holiday escreveu: “Sabe o que deve ser muito constrangedor pra esquerda? Ver eles defendendo um branco que tece comentários racistas, machistas e homofóbicos só porque está atacando alguém de direita. A coerência é marca registrada das ações dos ditos ‘progressistas’.”
 
Nem Holiday, nem a imprensa que tem aproveitado o episódio para enquadrar “a esquerda” tem dado espaço para discutir a crítica de Ciro no mérito: o que significa um negro usar o discurso da meritocracia para ser contra cotas? 
 
Os livros de história contam que os negros que cumpriam o papel de capturar os escravos que fugiam das fazendas eram chamados de Capitão do Mato. Ciro não inventou a roda, embora para muitos esteja reproduzindo racismo. Por falta de escolha ou por interesse na recompensa, fato é que a figura do negro oprimido que atuava em benefício do branco opressor não era bem vista.
 
Holiday, quando fala da política de cotas, reproduz discurso de opressor abordando “vitimismo de negros” e negando a dívida histórica.
 
Mas nada disso pauta a grande mídia quando envolve um candidato a presidente próximo da esquerda.
 
Na prática, o “ataque de Ciro a Holiday” tem servido para 3 coisas: minar a aproximação do pedetista com o DEM, dizer que Ciro não tem estabilidade emocional para ser presidentel e taxar “a esquerda” de omissa, permissiva e hipócrita por não repudiar o racismo sofrido pelo vereador.
 
A coluna do Estadão desta terça (19) diz que “caciques do DEM” passaram “o dia ontem reavaliando a ideia” de apoiar Ciro.
 
Ainda na noite anterior, o jornalista Augusto Nunes, na Jovem Pan, cobrou do DEM a defesa de Holiday e um chega pra lá no ex-governador do Ceará. A equipe do Pingo nos Is também tirou sarro de um “Coronel do Nordeste” que chama um negro de “Capitão do Mato”.
 
Gazeta do Povo deu espaço para o famigerado Rodrigo Constantino escrever o artigo intitulado “O racismo de Ciro Gomes e a hipocrisia da esquerda”.
 
Na Folha, um artigo de Bruno Boghossian insinua que Ciro não tem estabilidade emocional para ser presidente. “(…) um candidato que desrespeita opositores, grupos sociais ou instituições poderá ser um governante com essas mesmas características —péssimo prenúncio em um país já conflagrado politicamente.”
 
O Antagonista quis saber se “racismo de esquerda pode”, porque “Capitão do Mato” é um termo racista. Nenhuma explicação sobre a raiz na história.
 
Matéria do Estadão sobre o caso usou um tweet de uma internauta insinuando que o que Ciro disse é um escândalo que deve ser debatido seriamente, porque “não se trata apenas de o peixe morrer pela boca”.
 
Holiday decidiu levar Ciro à Justiça. “Não se trata de divergência ideológica, mas de injúria racial pura e simples. Justamente por isso irei processar o pré-candidato.”
 
Se Ciro errou? Para o blogueiro Bruno Barreto, que entrevistou Ciro duas vezes e não sabe dizer se ele é racista ou não, é evidente que o candidato errou ao dar corda à turba do MBL, que vai aproveitar o episódio para disseminar ódio às esquerdas nas redes.
 
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

23 Comentários

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  1. Resumo da ópera: se você quer

    Resumo da ópera: se você quer criticar as ideias de uma pessoa, critique as ideias da pessoa, não tente colar um bordão nela para encurtar caminho.

    Fernando Holiday defende tudo quanto há de pior na política. Isso não se torna mais – nem menos – grave pelo fato de ele ser negro.

    1. DiscorDonadio

      Se um branco escravocrata se levanta contra a libertação dos negros escravizados, o fato desse escravocrta ser branco não torna a sua indignação contra a libertação dos escravos negros mais nem menos grave. Mas se um negro é favorável à continuidade da escravidão dos outros negros, isso torna a sua capitania mais grave.

  2. Justiça para Ciro ?
    Ciro não pode se queixar, se Lula não merece indulto então o vale tudo fica institucionalizado em nosso país. A mentira é arma liberada, pode ser usada impunemente e o último que pode ser queixar é Ciro.

  3. Inspirado em Rugendas: em qual se espelha o fernandinho mebelê?

    Vai ver que a inspiração está em Debret: adivinhem de qual lado do açoite fica o fernandinho mebelê?

  4. Holiday é um negro de alma branca

    “Se o preto de alma branca pra você
    É o exemplo da dignidade
    Não nos ajuda, só nos faz sofrer
    Nem resgata nossa identidade”

    Jorge Aragão, Identidade
     

  5. Ciro, que passeou porc7

    Ciro, que passeou porc7 partidos, é  assim mesmo : diz uma coisa hoje, diz outra amanhã,  flerta com os demos e com a tucanagem, não têm posições claras sobre qualquer coisa. Não é  um candidato confiável para as esquerdas.Tem forte rejeição nesse campo.

  6. Fatos: “capitão do mato” não

    Fatos: “capitão do mato” não é expressão racista, é fato histórico; Holliday não é obriggado a ser a favor das cotas por ser negro, no entanto, pelo conjunto da obra é sim uma versão atualizada de capitão do mato. Os negros são massacrante maioria entre os pobres, vítimas não só do racismo mas da concentração de renda que tem como origem a escravidão, avô do capitalismo selvagem pátrio.

    Outra expressão que se usava era a famoso “negro de alma branca”. Pelé era o grande ícone, mas geralmente se aplicava a todo negro que ascendia socialmente. Holiday na minha oponião se encaixa nos dois casos. Mas no fundo é apenas um oportunista, um picareta, que usa a política para “se dar bem”, assim como todos os outros do MBL.

    Esse foi o problema do Ciro. Não existe debate com esses caras, daí entrou no terreno deles, que é a manipulação de fatos e distorção de conceitos. Vide o negócio de dizer que o nazismo era sociliasta. 

    Ele não foi racista, foi pouco inteligente. Tem que estar antenado com essa questão “do lugar da fala”, que é algo polêmico e delicado nesses dias. A professora falou a mesma coisa, mas ela é negra. É melhor o Ciro não entrar nessa celeuma, pois pode se indispor com o movimento negro

    PS: Alguém deve questionar o Holliday ser conservador nos costumes e ser gay ao mesmo tempo. Certamente a grande maioria de seus colegas são homofóbicos. Mas quem tem que fazê-lo é um gay. Lugar da fala novamente

    1. que perfeito comentário. Ciro
      que perfeito comentário. Ciro precisa ter paciência em função dos tempos da idiotice alheia. Prova disso são as perguntas dos repórteres nas entrevistas. Não há nada de profundo, apenas intrigas e mimimi. Estamos num momento delicado. Mas, vendo a repercussão do tema, foi grande o apoio recebido pelo Ciro dos negros que estão sofrendo até hoje o apartheid social…

    2. Aluga-se o “lugar da fala”.

      É boneco de ventríloquo, “lugar da fala” de aluguel. Faz o papel de negro de alívio da consciência de racistas.

      O endosso da esquerda às causas identitárias liberais – diga-se de passagem – levou a direita reacionária a disseminar a prática de alugar “lugar da fala”. Criaram uma espécie de cotas para cooptar oportunistas de diferentes minorias sociais.

      PS: Antes que me joguem pedras, considero as causas identitárias uma decorrência da Declararação Universal dos Direitos Humanos, fruto mais nobre da ideologia autenticamente liberal de classes médias em reação ao poder absolutista, que nada tem a ver com neoliberal, uma ideologia dos muitos ricos de defesa da plena liberdade ao poder opressivo do capital das corporações monopolistas.

  7. MBL diz que Ciro é “Coronel” e vai “imprimir dinheiro”

    Quando eu vi essa declaração do Ciro pensei que fosse uma óbvia resposta às provocações do MBL.

    O movimento chama Ciro repetidamente de “Coronel”, o tal de MamãeFalei insinua que ele bate na mulher e ainda fizeram vídeos falando que o plano econômico de Ciro era comprar uma impressora para imprimir dinheiro.

    Pelo jeito as provocações do MBL sumiram da mídia… só a resposta do Ciro apareceram. 

     

  8.  
    Oxente Holiday? Como esse

     

    Oxente Holiday? Como esse rapaz se ofende? Logo por ser, acertadamente identificado pela sua atuação como capitão do mato? Ora! vai-te lixar seu merda.

    Não entendi nada!

    Logo o cabra que usa o nome de puteiro, Holiday, como marca fantazia de sua carreira de político oportunista?  Ora mais Rolidei. Vai-te à PqP! Seu capacho da casa-grande…  antes que esqueça. Vai babar o ovo do teu sinhorzinho da Opus Dei.

    Orlando

     

    1. kkkkkkkk!!!!!
       

      Orlando, rachei o bico!

      Vou te pagar um café!

      Não sei como esse elemento foi eleito, mas uma coisa eu  te garanto,

      ele não é viável.

      É um fantoche, e dos mais feinhos.

       

  9. Ciro faz direita fazer propaganda gratuita

    Meus caros colegas aqui parece que não entenderam a tática adotada por Ciro Gomes.

     

    Ele está atacando o MBL para atrai atenção do público deles. Atacou o Alexandre Schwartsman pq sabe q ele é vaidoso e não ficará sem resposta. Os seguidores dessa parcela da direita irá ver os vídeos da entrevista e poderão conhecer um pouco das propostas. 
    Ciro está antenado com o perfil de presidente que o eleitorado quer e entendeu a tática de Bolsa, que é uma máquina de polêmicas e bobagens ambulante mas conquistou pelo menos 20% do eleitorado porque não sai do centro das atenções.
    Essas provocações do Ciro renderão espaço na mídia da direita por pelo menos 1 semana.Em relação ao eleitorado da esquerda que pode ficar incomodado com esse tipo de comentário, Ciro sabe que parte dessa “esquerda” (ou liberais) pós-moderna nunca cogitou depositar o voto para ele e sabe que estes são minoria em um eleitorado afoito por autoridade e polêmica.

     

  10. Capitão do mato não!

    Não diria que o Holyday é um “capitão do mato”, com aquele físico de grilo nem para isso ele serviria, eu diria que ele é só outro sociopata parido nas jornadas dos vinte centavos.

  11. Ciro tem que se policiar!

    Dessa vez fez tudo que “eles” querem para manter vivo o ódio e a difamação.  Fico intrigada com certas reacões de Ciro e, por vezes, chego a imaginar se não seria ele um personagem “borderline”, ( vulgarmente chamado de pavio curto com instabilidade de humor).  E, nesse caso, trata-se de um exacerbado pavio curto. Carece de tratamento e o indivíduo tem que se policiar para evitar conflitos e a oportunidade de fazerem mau uso de suas palavras. 

  12. bom post.

    Ora ora, o Holiday ficou ofendido.!!!

    Ele sim, ofende os negros que lutam para ser reconhecidos como cidadões.

    Ele sim, ofende as pessoas que querem um Brasil mais igualitario, mais justo.

    O Ciro só falou o que muitos pensam, inclusive eu. Meu apoio ao Ciro!

    E não sou racista, tenho negros na familia, pelo casamento, e me dou muito bem com eles. Sem falar de amigos. E sem hipocrisia. 

    Hipocrita não é a esquerda, mas a direita quer se aproveitar do assunto.

  13. O que eu quero…

    …que esse Holiday se lasque,pouco ligo para as queixas desse que é a vergonha negra,que é um negro que agora têm a alma dos brancos racistas dentro de si,a conscienciência fascista dos brancos conservadores dentro de si,enfim,um capitão do PSDB,PMDB,do golpe de 2016, do impeachment,e agora vem posando de vítima?kkkk.eu vou é contratar Zumbi dos Palmares para dá nesse mané uns golpes de capoeira como: chibata,arpão,martelo,rasteira e etc,etc,etec.kkkkk

    1. Desde quando falar a verdade equivale a injúria racial?

      Esse bostinha é mesmo um capitão do mato. Vai perseguir e capturar outros negros que fogem da escravidão para os açoitar no pelourinho dos escravocratas e para os por de volta na senzala. Faz tudo isso em troca das migalhas do banquete dos escravagistas.

      Não passará. Nem tu, Nabu!

  14. Ciro
    Nossa, quanto comentário racista. O Ciro estigmatiza o Fernando Holiday e fala que ele é que está estigmatizando o negro?? Vocês só poderiam defender um cara como esse mesmo, é como o Jean Willys defendo o Che Guevara, homofóbico. O Ciro cospe, xinga, grita, mente, ameaça todo mundo, levanta a voz, agride, desrespeita a própria mulher, e vocês ainda defendem. Putz, vocês não são nada moderados. São ideólogos. E outra, debater o discurso do Ciro no âmbito das ideias? Kkkk fala sério né, meu. O Ciro não faz e não fez isso, foi um ataque pessoal, parece que o MBL já atacou o Ciro, o F.H. não sei, mas mesmo assim.
    O Ciro é o Bolsonaro às avessas, ou pior – considerando o apoio que tem dos parlamentares.

  15. A narrativa do capitão do

    A narrativa do capitão do mato é só arma política. A não ser que você seja um tapado retardado, ninguém pode acreditar que há negros comprometidos em arruinar outros negros maliciosamente a soldo de brancos, a vida não é um filme de sessão da tarde. O Holiday, de quem eu discordo muito, é apenas um liberal que acredita que o negro, como qualquer outro homem, não deve ser dependente do Estado. Para mim e para muitos negros as cotas são um insulto racista inventado por políticos brancos que querem nos dar migalhas.
    Esquerdistas usam a narrativa do traidor da raça para serem racistas (esquerdista sempre justifica todos os males que causa). Fazem isso com judeus sionistas, com índios que sejam contra demarcações de terra e contra negros que se sintam ofendidos com cotas racistas. De Marx ao PCB a história da esquerda sempre foi muito marcada pelo racismo. A esquerda da América latina sempre destratou intelectuais negros até mesmo de esquerda. Conheci movimentos negros de esquerda que até hoje são ressentidos com a esquerda branca que se delicia ao chamar enfaticamente de “NEGRO pernóstico” quem não compra toda o manual de ideologia dela.
    E capitães do mato são esses universitários idiotas de movimento negro que, vendo outro negro ser agredido por um racistinha de esquerda, entram na briga do lado do racista para bater mais em defesa da ideologia do racista branco e alemão de Tréveris.

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