Empresa condenada não deve ser aniquilada, por Luciano Godoy

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Para o advogado, professor da FGV e ex-juiz federal Luciano Godoy, a Lei Anticorrupção deve atender à preservação das empresas nacionais acusadas de improbidade, com objetivo de evitar ou amenizar impactos na economia. De acordo com Godoy, o acordo de Leniência prevê esse princípio de proteção e a atual lei Anticorrupção não atende à essa finalidade. 
 
“A empresa envolvida em atos de corrupção não deve ser aniquilada, sim preservada”, escreveu, completando: “Uma empresa é uma pluralidade de interesses – colaboradores, administradores, acionistas, fornecedores, credores – todos frutos da geração de renda e riqueza em um negócio, interferindo positivamente em uma comunidade também pela geração paralela e indireta de empregos e pelo pagamento de impostos e taxas às diversas esferas do Poder Público”.
 
Leia o artigo completo:
 
Por Luciano Godoy*
 
Acordo de leniência e preservação da empresa
 
Do JOTA
 
Rtorno ao tema do acordo de leniência e a insuficiência do seu marco legal na atual Lei Anticorrupção. Estou convicto de que o instituto possui um eixo no valor da preservação das empresas, dos seus negócios, dos empregos e da sua capacidade de gerar riqueza. Por isso, a preservação da empresa acusada de atos de improbidade gera reflexos na economia como um todo.
 
O modelo posto na Lei Anticorrupção não atende à finalidade que se pretende atingir com o instituto. É insuficiente. A empresa envolvida em atos de corrupção não deve ser aniquilada, sim preservada. Logicamente, punições na esfera penal dos seus acionistas e administradores, multas e distrato de contratos, hão de ocorrer. No entanto, a empresa como um todo deve continuar sua vida.
 
Uma empresa é uma pluralidade de interesses – colaboradores, administradores, acionistas, fornecedores, credores – todos frutos da geração de renda e riqueza em um negócio, interferindo positivamente em uma comunidade também pela geração paralela e indireta de empregos e pelo pagamento de impostos e taxas às diversas esferas do Poder Público.
 
Trata-se de um núcleo de convergências de interesses públicos e privados de diferentes origens, que devem ser todos considerados e tutelados, fruto da concretização do princípio da função social da empresa. Manterem-se os olhos na empresa pela consideração somente dos interesses dos sócios controladores e acionistas é a visão antiga, superada desde os anos de 1970.
 
Virando a página. O acordo de leniência incluído na Lei Anticorrupção – Lei 12.846/2013 – caracteriza-se como a colaboração da empresa, pessoa jurídica, no reconhecimento dos “pecados” praticados por seus prepostos e acionistas em atos de corrupção e que lhe geraram benefício econômico. Seu desenho precisa ser aperfeiçoado. Não há previsão de suspensão da restrição de a empresa voltar a contratar com o Poder Público, participar de licitações, tomar empréstimos em bancos públicos. Hoje nem mesmo é possível encerrar as ações de improbidade administrativa com uma segurança legal.
 
Aqui o ponto – a função do acordo de leniência vai além da colaboração à investigação; há um valor a ser encampado pelo Estado – é necessário ao país, à sociedade, à economia, a preservação das empresas.
 
Paralelo ao que ocorre na Lei de Falência e Recuperação Judicial. Com dívidas incapazes de permitir a preservação da atividade econômica da empresa, a lei traz meios de reestruturação das dívidas para que a atividade econômica seja mantida. Várias vezes já confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça, o núcleo da legislação da Lei 11.101/2005 é a preservação da empresa e da sua atividade econômica.
 
O acordo de leniência deve ser visto com o mesmo objetivo – um pacto de colaboração com as autoridades com o fim de aprimorar a investigação, que favorece o ambiente de negócios, mas também a preservação da empresa com a recuperação das suas atividades econômicas e negociais, pelo princípio da função social da empresa.
 
Nesse pacto de leniência podem (e devem) ser consignadas punições, como o pagamento de multa ou indenização pelos controladores ou administradores; ou mesmo o afastamento desses da empresa, inclusive com a alienação do controle da companhia a terceiros – aliás, esse foi o tema da entrevista do Ministro da Transparência nessa última semana; ou, ainda, o bloqueio de pagamento de dividendos e lucros. Em cada caso, haverá uma negociação com Controladorias Gerais, órgão das Advocacias Públicas e Ministério Público.
 
A operação Lava-Jato é um sucesso, busca a punição de muitos atos de corrupção que contavam com executivos e acionistas de empresas, políticos e operadores financeiros. O que trará resultados positivos ambiente de negócios. E ao pactuar a leniência, as empresas pagarão pelos atos dos seus colaboradores e acionistas, com multas e indenizações, implantando novos meios para assegurar o cumprimento da lei nos seus negócios e trazendo novas informações para o aprimoramento das investigações; no entanto, preservadas para continuarem gerando renda e riqueza para o país e todos que a cercam.
 
*Advogado em São Paulo, sócio do PVG Advogados, Professor da FGV Direito SP, ex-Juiz Federal. É mestre e doutor em Direito pela USP e foi Visiting Scholar na Columbia Law School
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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

4 Comentários

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  1. A lava jato é um sucesso?

    À “força tarefa” (!) tem sido violentamente danosa à economia, o que aparentemente não interessa ao moro, procuradores e pfs, escudados que estão com seus altos salários. Os empregos que se perderam, o desespero dos desempregados importa? O dano ao Brasil e à Petrobras importa?

  2. Empresas ou famílias?

    Olá debatedores,

    concordo em partes  com o advogado. 

    Ele foi mais preciso, digamos assim, no uso do vocábulo “empresa”.  Mas, isso é o mínimo para quem já foi juiz e sempre atuou com o direito( de acordo com o seu míni currículo publicado no artigo).

    Notemos bem, “empresa”, é isso mesmo: uma pluralidade de interesses.

    Vejamos o que ele disse:

    Uma empresa é uma pluralidade de interesses – colaboradores, administradores, acionistas, fornecedores, credores – todos frutos da geração de renda e riqueza em um negócio, interferindo positivamente em uma comunidade também pela geração paralela e indireta de empregos e pelo pagamento de impostos e taxas às diversas esferas do Poder Público.

     

    Interpretando o texto, podemos extrair que os “interesses”  são de seres humanos e não da “empresa”. A empresa  “é” a pluralidade de interesses e não o “interesse” em si.

    No entanto, para ser mais preciso ainda, prefiro tratar esse vocáculo “empresa”  ( nesse contexto econômico) como uma atividade.

    Uma atividade oriunda das “famíias” que já possuem algum fator de produção e compram outros para produzir bens, gerar consumo, tributos, etc e “externalidaes”. ops…

    Dependendo da “externalidade” essa “atividade” não deve e não pode continuar, certo? Ou será que vamos “abrir uma empresa” para explorar todo o petróleo escondido na planície sedimentar do amazonas sem se importar com a floresta( destruindo-a)?

    Nesse sentido, há atividades que devem ser PROIBIDAS, eliminadas, diminuídas, etc, etc, mesmo que tais proibições vão de encontro a  vários stakeholders.  Afinal, na economia de mercado é crescer sim, mas  com desenvolvimento.

    O autor usou o vocábulo “comunidade”. Todavia, no contexto atual- desde Comte –  eu prefiro sociedade formada entre contrários( no Brasil). Sociedade antagônica apoiando-se, cada vez mais, no direito posto, na lei, no processo. Longe de uma “comunidade” de ameríndios sob a tutela de um pagé.

    Nos tempos atuais, breve imagino que o ato de dar  “bom dia” , em um lugar qualquer, será cobrado. 

    -Vende-se “bom dia” por  5 unidades monetárias. ( pode ser a prazo com juros “adequados”  para gerar receita para “outras empresas”, xiiii, e que “empresas hem?” Antes “intermediárias” da ” economia real”  agora, principais.)

    Taí, mais uma “indagação” para os economistas de escol e de meia tigela: A “economia real” é agora intermediária? O que diz o monstro sagrado do lago ness( o mercado)?

    E as “famílias” com suas propriedades privadas “naturais” (meritocráticas, muitas vezes fruto de um boa herança no Brasil, sem contar com os dinheiros depositados em paraísos fiscais hã? Que tal?)

    No mundo que não é encantado da fada madrinha, as “empresas” só querem , necessariamente, gerar lucro.

    O lucro, ora, nada contra o lucro, é a “remuneração” daqule stakeholder  famliar que “organizou os fatores de produção”.

    Vejam vocês que alguns stakeholders também “organizaram” fatores de produção para gerar muito lucro, ainda que um rio de lama , mortes ( de outros stakeholders) etc, possam, eventualmente, ocorrer, certo?

    Lindo não? Não. Nada de lindo. Terrível. ( é o mínimo que se pode dizer)

    ————-

    O advogado parece que só atual com direito em sua carreira. Quem frequenta uma “empresa” geradora de lucro, com meta em cima de meta, que por sua vez, gera outra meta e tem que “entregar resultados” – não raro – fazendo com que os “fins justifiquem os meios”, vai saber, muito bem que há “empresas” que não devem continuar pois foram concebidas somente para gerar resultado positivo a qualquer custo, ou melhor com o menor custo, ou melhor ainda, sem custo. Depois de explodir algum pepino, “um passivo oculto” por exemplo, o dinheiro já estará devidamente hedegeado numa paraíso fiscal da vida…

     

    Mas, há “empresas” cujas “famílias” merecem respeito. Não é mesmo?

     

     

     

     

     

     

     

     

  3. engenharia
    “Uma empresa é uma pluralidade de interesses – colaboradores, administradores, acionistas, fornecedores, credores – todos frutos da geração de renda e riqueza em um negócio, interferindo positivamente em uma comunidade também pela geração paralela e indireta de empregos e pelo pagamento de impostos e taxas às diversas esferas do Poder Público”.
    No caso de uma empresa de engenharia, isso vai mais longe. É um repositório de conhecimento e tecnologia que em sua quase totalidade não tem registro físico, mas é inserido em seu quadro técnico.
    Com o desmanche da engenharia nacional no reino dos fernandos, esse repositório se perdeu. Levamos anos para recuperá-lo, e agora volta ao desmanche.

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