Entre sigilo jornalístico e violação de segredo judicial, o que o Judiciário deve fazer?

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Marcelo Frullani Lopes

Entre sigilo jornalístico de fonte e violação de segredo judicial, o que o Judiciário deve fazer?

No Justificando

No momento em que a discussão sobre a liberdade de imprensa e seus limites atinge seu auge, um caso de enorme relevância deve ser julgado em breve pelo STF (Supremo Tribunal Federal) envolvendo um dos inúmeros aspectos desse tema.

Trata-se de uma Reclamação apresentada pela ANJ (Associação Nacional de Jornais), por meio da qual a entidade pede a cassação de decisão proferida pelo Juiz da 4ª Vara da Justiça Federal de São José do Rio Preto, que determinou a quebra do sigilo telefônico de um repórter e de um jornal da cidade.

Resumidamente, em 2011 foram publicadas duas reportagens sobre a “Operação Tamburutaca”, realizada pela Polícia Federal para investigar suposto esquema de corrupção na Delegacia do Trabalho do município. Nas matérias, foram expostos trechos de conversas telefônicas interceptadas por ordem do Juiz da 4ª Vara da Justiça Federal, no bojo de processo que corria em segredo de justiça.

Inconformado com isso, o Ministério Público Federal pediu o indiciamento criminal do repórter, com a finalidade de apurar o cometimento de crime previsto no artigo 10 da Lei n° 9.296/96, isto é, a quebra de segredo de Justiça.

No decorrer dessa investigação, foi solicitada autorização judicial para quebra do sigilo telefônico tanto do repórter quanto do jornal, para que se identificasse a fonte das informações transmitidas ao jornalista. Esse pedido foi acolhido pelo Magistrado.

Assim, a ANJ ajuizou Reclamação sob o argumento de que essa decisão fere a autoridade do julgado vinculante do STF na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) n° 130, isto é, a ação por meio da qual a chamada “Lei da Imprensa” (n° 5.250/67) foi considerada não recepcionada pela Constituição de 1988.

Em decisão proferida no recesso judicial, o Ministro Ricardo Lewandowski ressalta que o caso é extremamente complexo, pois de um lado se encontra a garantia do sigilo de fonte e, do outro, a violação do segredo de justiça. Sem entrar no mérito, o Ministro determinou a suspensão da decisão do Juiz de Primeiro Grau para preservar eventual utilidade do provimento judicial até o julgamento definitivo.

Em que pese a decisão no sentido de suspender a quebra de sigilo ter sido correta, o Ministro partiu de um ponto de vista equivocado. O caso envolve uma série de discussões jurídicas importantes, porém devemos identificá-las e discuti-las separadamente.

Isto é, o conflito e a eventual necessidade de ponderação entre normas constitucionais referentes à liberdade de expressão/informação e segredo de justiça tem relevância no contexto da discussão quanto à tipicidade/atipicidade da conduta do jornalista. Não é esse o objeto da ação que corre no STF.

A Reclamação apresentada pela ANJ questiona a legalidade da quebra de sigilo telefônico de um jornalista, ao longo de um procedimento investigativo, para a apuração de suas fontes.

A decisão do Juiz de Primeira Instância afronta claramente o artigo 5°, inciso XIV, da Constituição Federal, que assegura a todos “o acesso à informação” e resguarda “o sigilo de fonte, quando necessário ao exercício profissional”. Nenhuma investigação, independentemente da natureza do suposto crime, pode ignorar tal preceito. Por isso, a decisão deve ser cassada pelo STF.

Isso não impede que o jornalista seja processado pelo crime previsto no artigo 10° da Lei n° 9.296/96. Essa é uma outra discussão extremamente importante, neste caso envolvendo, sim, conflito entre dois preceitos constitucionais, mas que ainda não foi sequer tratada em primeira instância.

Dessa forma, a norma que prevê o sigilo de fonte não se encontra em conflito com aquela que garante o segredo de justiça, pois eventual cometimento de crime por parte do jornalista ou de algum servidor público pode ser apurado por outros meios.

Neste momento, o importante é que a Corte Suprema assegure o respeito ao sigilo de fonte. A investigação sobre um suposto crime cometido pelo jornalista ou por servidor público pode prosseguir sem a necessidade de se violar uma norma tão indispensável à liberdade de expressão e de informação.

Marcelo Frullani Lopes, advogado graduado na USP (Universidade de São Paulo), sócio do escritório Frullani Lopes Advogados.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

7 Comentários

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  1. Lava Jato: delator vai receber dinheiro por delatar

    O crime compensa. E com aval do Judiciário.

    http://tijolaco.com.br/blog/?p=24368

     24 de janeiro de 2015 | 08:22 Autor: Fernando Brito

    alberto

    É inacreditável a alegria pelo “bom negócio” feito pelo doleiro Alberto Youssef contina das declarações de seu advogado tucano hoje na Folha.

    Já havíamos ficado sabendo que o acordo de delação restringe a pena de Youssef a três anos em regime aberto. E que ele vai conservar parte do patrimônio adquirido com o seu papel de “lavador” das roubalheiras de Paulo Roberto Costa.

    Agora, graças aos repórteres Mario Cesar Carvalho e Gabriela Terenzi, ficamos sabendo que ele vai ganhar “comissão” sobre o dinheiro roubado, num valor que pode chegar a R$ 10 milhões, uma quantia impensável para nós, mortais comuns e honestos, mesmo depois de uma longa vida de trabalho honesto.

    O advogado Figueiredo Basto comemora: diz ele que a ” delação premiada” contém a noção de que o criminoso “vai ganhar algum prêmio no final do processo”.

    O prêmio, claro, na visão dele, deve ir além de uma pena menor.

    É em dinheiro, mesmo.

    No caso, em dinheiro público surrupiado nas negociatas.

    Imagine: você rouba um banco, é preso. Aí, negocia entregar seus cúmplices. E também os não-cúmplices que, do jeito que são a Justiça e a mídia brasileira, passam a ter de “provar” que não roubaram.

    A polícia vai atrás do dinheiro e você, depois de um pequeno castigo, recebe uma mala de dinheiro – os tais R$ 10 milhões – e é mandado embora, com um “muito obrigado”….

    No caso de Youssef, com o agravante de que já negociou um acordo de delação e continuou a roubar, nas barbas do juiz Sérgio Moro, porque Youssef prometeu a ele que, depois de operar criminosamente dinheiro do Banestado, do Governo do Paraná, até porque ninguém foi saber o que ele fazia durante sua “liberdade condicional”.

    E, também, a cara-dura do Ministério Público de dispor do dinheiro que vier a ser recuperado para o pagamento de comissões ao ladrão.

    Quem sabe o MP não resolve estender a “promoção” para seus demais delatores. Vai ser uma festa. Todo mundo saindo livre e ainda com uma “mala” de dinheiro bem lavado.

    Se o acordo com Youssef for assim, é difícil crer que se queira “restaurar a moralidade”.

    Não se pode fazer isso com a imoralidade desta corrupção legalizada e referendada pelo Judiciário, como a que se propõe para o doleiro ladrão

     

  2. ficou claro que o sigilo

    ficou claro que o sigilo jornalístico deve ser mantido

    mas não como o ometimento do suposto crime do jornalista e do agente público

    podem ser apurados, a não ser a expressão “por outros meios”.

    quais seriam eses outros meios com mais profundidade?

    algum especialista poderia parofundar com mais detalhes?

     

  3. se houve um crime, deve ser investigado.

    senão essa imprensa criminosa, não será desmantelada nunca.

    liberdade tem limite, senão é essa anarquia em que vivemos hoje!

  4. Para vc ver o custo que o

    Para vc ver o custo que o analfabetismo funcional tem em mossa sociedade.

    O crime e o vazamento da informacao. O reporter nao vazou nada. Ele apenas publicou o quw foi vazado.

    Quem vazou e criminoso e o mp que se vire para identificar.

  5. E os jornalistas da Veja, Globo, Folha e Estadão?

    Por que o Minist[erio Público resolveu acionar este jornalista por conta do vazamento a ele entregue e por ele publicado, mas não resolveu acionar os jornalistas do PIG por publicarem vazamentos MIUTO mais notórios, tão recentemente??? Por que será???

  6. E Veja, Globo, Folha, Estadão?

    Por que o Minist[erio Público resolveu acionar este jornalista por conta do vazamento a ele entregue e por ele publicado, mas não resolveu acionar os jornalistas do PIG por publicarem vazamentos MIUTO mais notórios, tão recentemente??? Por que será???

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