Governos da ditadura, do PMDB e PSDB têm muitas obras com Camargo Corrêa

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Sugerido por Assis Ribeiro

Camargo Corrêa, ditadura, Petrobras e outros partidos

Por Caco Schmitt, na Carta Maior

Governos da ditadura, do PMDB e PSDB têm muitas obras com a Camargo Corrêa, que possui uma histórica tradição de se envolver em polêmicas de corrupção

Se a gente prestar bem atenção ao noticiário da grande imprensa sobre o “escândalo” da Petrobras, a Sétima etapa da Operação Lava Jato, parece que o Grupo Camargo Corrêa é novato em matéria de corrupção. Ele e todas empreiteiras envolvidas. E parece também que na Petrobras está o único caso de denúncia de corrupção envolvendo serviço público, na história do Brasil. Então, vamos recuar no tempo pra refrescar a memória.

A Camargo Corrêa foi criada em 1939 como uma simples construtora. Fez grandes obras para a ditadura militar em várias regiões do Brasil. Ouvi seu nome pela primeira vez na Amazônia, nos anos 1970. Ela participou da tentativa dos militares de construir a Perimetral Norte (BR-210), em1973. Rodovia que cortaria a calha norte do Rio Amazonas, paralela ao rio, do Amapá até a divisa com a Colômbia.


Quem pagou foram os índios Yanomami, especialmente a aldeia Xikawa, localizada no limite leste do Território Yanomami. Eles viviam em relativo isolamento e sofreram com o contato com os trabalhadores da Camargo Corrêa. Epidemias de gripe e sarampo dizimaram 80% da população da região. Depois, vieram o alcoolismo, a prostituição, a mendicância e, por fim, a desestruturação social – com aldeias inteiras reduzidas a pequenos grupos vivendo à margem da estrada inacabada – obra da dobradinha ditadura militar & Camargo Corrêa.

A Camargo Corrêa cresceu e se tornou um poderoso grupo como toda construtora da época, a Andrade Gutierrez, Mendes Jr. etc.: fazendo grandes obras para governos da ditadura militar, que afetaram negativamente a vida de índios, posseiros, agricultores, garimpeiros, o meio ambiente. Num tempo em que denunciar era impossível ou resultava em prisão e tortura. Não havia facebook, nem liberdade.

Hoje, o site oficial da empresa afirma que “o Grupo Camargo Corrêa é uma das maiores organizações empresariais privadas do Brasil. Administrado pela holding Camargo Corrêa S.A., de capital fechado e controle familiar, originou-se de uma pequena empresa de engenharia e construção, fundada em 1939 com um escritório no centro da cidade de São Paulo. Hoje, o Grupo atua nos setores de cimento, concessões de transporte, engenharia e construção, vestuário e calçados, incorporação e naval”.

Não é de hoje a existência de denúncias de suborno, propina, cartel para “organizar” concorrências, licitações de obras. Por trás de uma grande obra da Camargo Corrêa (e das outras empreiteiras), geralmente há denúncias que vêm junto. Nos anos 1970, por exemplo, a polêmica ponte Rio-Niterói foi obra de um consórcio que teve a presença da CC. Muito dinheiro sobrou para vários personagens ditatoriais. Em São Paulo, gueto tucano, existe um mar de obras: o Metrô da capital, no governo de Roberto de Abreu Sodré (1967-71), da Aliança Renovadora Nacional (ARENA); depois no governo de Laudo Natel (1971-75), também da ARENA.

A Camargo Corrêa fez a Rodovia dos Imigrantes, de São Paulo a Santos. E em 1976, a Rodovia dos Bandeirantes, no governo Paulo Egydio Martins (1975-79), também da ARENA – partido que se dividiu com a abertura política e gerou o PDS, que acabou no PP; e o PFL que acabou no DEM.

A partir de 1975, no governo do general-ditador Ernesto Geisel (1974-79), a Camargo Corrêa entrou na construção das mega hidrelétricas de Tucuruí, no Pará, e Itaipu.

Em 1980, fez a construção do o Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, no governo Paulo Salim Maluf (1979-82), então filiado à ARENA. Em 1987, a Camargo Corrêa começou o anel viário de São Paulo, no governo Orestes Quércia (1987-91), do PMDB, e, em 88, o túnel Jânio Quadros.

Nos anos 1990, sob comando de Joaquim Roriz, PMDB, a Camargo Corrêa alçou voo para o Distrito Federal e construiu o aeroporto de Brasília e o metrô, outro escândalo.

Com Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, na presidência (1995-2002), a Camargo Corrêa seguiu tocando grandes obras. A partir de 1997, o grandioso gasoduto Brasil-Bolívia, da Petrobras, e a usina de Angra dos Reis. Em 2001, a Camargo Corrêa fez refinaria de Paulínea em São Paulo, também da Petrobras.

Em 2004, sempre em São Paulo, tocou a linha 4 do metrô de São Paulo, no governo Geraldo Alkmin, PSDB, (2003/2006), e o Rodoanel Mario Covas, em 2006.

Em 2007, a Camargo Corrêa faz obras em outro ninho tucano, na cidade administrativa do governo de Minas Gerais, o palácio do governo. Aécio Neves, PSDB, governou Minas de 2003 a 2010.

Então, governos da ditadura militar, do PMDB e PSDB têm muitas obras com a Camargo Corrêa, que possui uma histórica tradição de se envolver em polêmicas de suborno e propinas. Mas nunca houve nada, certo? Errado. Em março de 2009, a Polícia Federal deflagrou a Operação Castelo de Areia que investigou indícios de crimes financeiros praticados pela construtora. As investigações da PF apontaram para doações ilegais a sete partidos: PSDB, PPS,PSB, PDT, DEM, PP e o PMDB do Pará. É só olhar no Google pra ver que o Ministério Público Federal indiciou Fernando Botelho, vice-presidente da empresa e mais dois diretores do grupo por crime de corrupção, fraude, falsidade ideológica, sonegação, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

É só olhar no Google pra ver que em janeiro de 2010, a Justiça autorizou a Polícia
Federal a abrir 19 inquéritos para apurar atos de corrupção ativa e passiva envolvendo o grupo, órgãos, agentes públicos e obras, dentre as quais o Rodoanel Mário Covas e a Linha 4 do Metrô de São Paulo, do governo do PSDB.

Será que agora a Polícia Federal, o Ministério Público, a Justiça vão retomar esses escândalos abafados?

Será que vão a fundo na Mendes Jr., mineira como Aécio Neves, que também participou da construção de Itaipu, da ponte Rio-Niterói, da Transamazônica, do metrô de São Paulo e foi pioneira em offshore em 1976, construindo plataformas para a Petrobras quando o presidente da república era o ditador Ernesto Geisel (1974-79). E, a partir de 1990, fez vários trabalhos pra Petrobras, entre eles o gasoduto Brasil-Bolívia do Fernando Henrique Cardoso, PSDB.

Será que vão a fundo na OAS — baiana como o clã dos democratas ACMs — que surgiu em 1976 e entrou na petroquímica a partir de 1986, no governo do último ditador João Batista Figueiredo (1979-85).

Vão falar da Andrade & Gutierrez, também mineira, fundada em 1948, hoje a segunda construtora brasileira e uma das maiores do mundo? Empresa que a partir dos anos 90, diversificou os negócios e entrou nas áreas de concessões públicas e telecomunicações, aproveitando a onda das privatizações iniciadas pelo governo Fernando Collor (1990-92), do PRN, e seguida por Fernando Henrique Cardoso, PSDB. E hoje tem projetos em hidrelétricas, termoelétricas, usinas nucleares, petroquímicas, mineração, siderúrgicas, refinarias, portos, metrôs, saneamento e urbanização, aeroportos, ferrovias, construção civil. No Brasil, a unidade de negócios Industrial conquistou a primeira obra, a Refinaria Duque de Caxias (Reduc) e iniciou uma parceria com a Petrobras.

No governo do mineiro Itamar Franco (1992-95) iniciou a sua atuação na área de telecomunicações, através da criação da AG Telecom, em 1993. Em 1998, a empresa venceu o leilão de privatização do Sistema Telebrás e integrou a operação da Telemar. Depois, veio a Contax, uma das três maiores empresas de “contact center” do mundo.

E foi longe, entrou na área de concessões e hoje é a maior controladora de rodovias sob concessão da América Latina. Por meio da CCR, está entre os maiores grupos do mundo em concessão de infraestrutura. No setor de Transporte e Logística, possui atuação nos segmentos de concessão de rodovias, mobilidade urbana e serviços. A CCR detém hoje participação nas concessionárias Barcas S.A., RodoNorte, ViaQuatro, STP, Controlar e Transolímpica. Além disso, é detentora das concessões das rodovias Ponte Rio Niterói, Nova Dutra, ViaLagos, AutoBan, RodoAnel. Ou seja: recebe para construir e depois segue cobrando pedágio… Por que será que a grande imprensa defende tanto as concessionárias?

Pra concluir: o que aparece nas delações premiadas da Lava Jato não são apenas empreiteiras que subornam e financiam campanhas eleitorais e compram burocratas para conseguirem obras. Lembrando que seis delas estão entre os maiores doadores da campanha presidencial de Aécio Neves. São grandes oligopólios com ramificações poderosas e relações estreitas com os subterrâneos da política desde os tristes tempos da ditadura militar. Se quiserem ir a fundo, terão que descer aos porões mais escusos da história recente do Brasil.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

7 Comentários

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  1. Propina de 10%

    Nos tempos da construção da usina hidrelétrica de Água Vermelha (Rio Grande), tempos da ditadura miliar, alguns engenheiros da Carmargo Corrêa deixavam escapar que a propina era alta – pelo menos 10%…

  2. Nunca se roubou tão pouco, diz empresário tucano

    Nunca se roubou tão pouco, diz empresário tucano

    http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com.br/2014/11/nunca-se-roubou-tao-pouco.html
    Empresário do  PSDB, afirma que a coisa já foi pior.

    Não sendo petista, e sim tucano, sinto-me à vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo histórico para este país Nossa empresa deixou de vender equipamentos para a Petrobras nos anos 70. Era impossível vender diretamente sem propina. Tentamos de novo nos anos 80, 90 e até recentemente. Em 40 anos de persistentes tentativas, nada feito. Não há no mundo dos negócios quem não saiba disso. Nem qualquer um dos 86 mil honrados funcionários que nada ganham com a bandalheira da cúpula. Os porcentuais caíram, foi só isso que mudou. Até em Paris sabia-se dos “cochons des dix pour cent”, os porquinhos que cobravam 10% por fora sobre a totalidade de importação de barris de petróleo em décadas passadas. Agora tem gente fazendo passeata pela volta dos militares ao poder e uma elite escandalizada com os desvios na Petrobras. Santa hipocrisia. Onde estavam os envergonhados do país nas décadas em que houve evasão de R$ 1 trilhão –cem vezes mais do que o caso Petrobras– pelos empresários? Virou moda fugir disso tudo para Miami, mas é justamente a turma de Miami que compra lá com dinheiro sonegado daqui. Que fingimento é esse? Vejo as pessoas vociferarem contra os nordestinos que garantiram a vitória da presidente Dilma Rousseff. Garantir renda para quem sempre foi preterido no desenvolvimento deveria ser motivo de princípio e de orgulho para um bom brasileiro. Tanto faz o partido. Não sendo petista, e sim tucano, com ficha orgulhosamente assinada por Franco Montoro, Mário Covas, José Serra e FHC, sinto-me à vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo histórico para este país. É ingênuo quem acha que poderia ter acontecido com qualquer presidente. Com bandalheiras vastamente maiores, nunca a Polícia Federal teria tido autonomia para prender corruptos cujos tentáculos levam ao próprio governo. Votei pelo fim de um longo ciclo do PT, porque Dilma e o partido dela enfiaram os pés pelas mãos em termos de postura, aceite do sistema corrupto e políticas econômicas. Mas Dilma agora lidera a todos nós, e preside o país num momento de muito orgulho e esperança. Deixemos de ser hipócritas e reconheçamos que estamos a andar à frente, e velozmente, neste quesito. A coisa não para na Petrobras. Há dezenas de outras estatais com esqueletos parecidos no armário. É raro ganhar uma concessão ou construir uma estrada sem os tentáculos sórdidos das empresas bandidas. O que muitos não sabem é que é igualmente difícil vender para muitas montadoras e incontáveis multinacionais sem antes dar propina para o diretor de compras. É lógico que a defesa desses executivos presos vão entrar novamente com habeas corpus, vários deles serão soltos, mas o susto e o passo à frente está dado. Daqui não se volta atrás como país. A turma global que monitora a corrupção estima que 0,8% do PIB brasileiro é roubado. Esse número já foi de 3,1%, e estimam ter sido na casa de 5% há poucas décadas. O roubo está caindo, mas como a represa da Cantareira, em São Paulo, está a desnudar o volume barrento. Boa parte sempre foi gasta com os partidos que se alugam por dinheiro vivo, e votos que são comprados no Congresso há décadas. E são os grandes partidos que os brasileiros reconduzem desde sempre. Cada um de nós tem um dedão na lama. Afinal, quem de nós não aceitou um pagamento sem recibo para médico, deu uma cervejinha para um guarda ou passou escritura de casa por um valor menor? Deixemos de cinismo. O antídoto contra esse veneno sistêmico é homeopático. Deixemos instalar o processo de cura, que é do país, e não de um partido. O lodo desse veneno pode ser diluído, sim, com muita determinação e serenidade, e sem arroubos de vergonha ou repugnância cínicas. Não sejamos o volume morto, não permitamos que o barro triunfe novamente. Ninguém precisa ser alertado, cada de nós sabe o que precisa fazer em vez de resmungar. RICARDO SEMLER, 55, empresário, é sócio da Semco Partners. – Artigo na Folha

     

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