Hoje no radar da Zelotes, APS pratica “lobby agressivo” desde os tempos de FHC

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Alexandre Paes dos Santos possuia uma bancada própria em 2001, formada por políticos do PSDB, PFL e PTB. Quem admitiu a “Bancada do K” foi o deputado Arnaldo Faria de Sá

Jornal GGN – São dois os “lobistas” que estão no radar da imprensa nas últimas semanas, em função da suspeita do Ministério Público Federal de que houve corrupção na contratação por montadoras de escritórios de assessoria empresarial para fazer “lobby” pela aprovação da Medida Provisória 471, que concede, até o final deste ano, benefícios fiscais ao setor.

Mauro Marcondes, que teria negociado a venda da MP em 2009 e, cinco anos depois, feito repasses “muito suspeitos” à empresa de marketing esportivo do filho do ex-presidente Lula, é vice-presidente da Anfavea. Já Alexandre Paes dos Santos, conhecidos como APS, é velho conhecido das páginas policiais.

Reportagem enviada ao GGN pelo leitor CEduardo, publicada por Época em outubro de 2001, mostra que Paes já era classificado por membros do governo FHC como um “lobista agressivo”, com passe livre pelos corredores do Congresso, concedido “ingenuamente” pelo então deputado paulista Arnaldo Faria de Sá, hoje do PTB. O parlamentar admitiu que APS tinha sua própria bancada na Câmara, formada por políticos do PSDB, PTB e PFL.

Àquela época, Paes já era investigado pela Polícia Federal. Ele foi preso nesta segunda (26), durante a 3ª fase da Zelotes.

Sugestão de CEduardo

Entre poder e dinheiro

Publicado por Época, em outubro de 2001

As investigações sobre as atividades do lobista Alexandre Paes dos Santos fizeram uma nova vítima: Hugo Braga, assessor do ministro da Fazenda, Pedro Malan. Braga perdeu o emprego na noite da sexta-feira, quando Época descobriu que usava um motorista particular pago pela empresa do lobista.

Poderoso pelo volume e importância de seus clientes, Santos é conhecido pelas conexões que possui na cidade. Circula pelo Congresso com uma credencial fornecida pelo deputado paulista Arnaldo Faria de Sá que lhe permite atravessar as portas da Casa sem ser molestado e até entrar no plenário. O documento não autoriza a pessoa a sentar-se na cadeira dos deputados e votar, mas abre portas de reuniões e encontros fechados, como se, em vez de empresário, com interesses privados a defender, Alexandre Paes dos Santos fosse um aplicado assessor de gabinete. Conhecido pelo empenho com que corteja o voto dos aposentados de São Paulo, Faria de Sá cultiva laços de sangue com o lobista. Os dois dividem a mesma secretária, Roselane Castelo Branco, que dá expediente no gabinete do deputado e também presta serviços à APS Consultores & Associados, a empresa de Santos, que lhe paga um fixo por mês. O problema da dupla jornada de Roselane envolve o conflito de interesses, já que a função lhe garante acesso em primeira mão a segredos do Congresso. “É uma grande mancada“, admite o deputado Arnaldo Faria de Sá, que só se deu conta do deslize durante uma entrevista a Época, na quinta-feira.

Faria de Sá não foi o único a fazer descobertas súbitas sobre suas relações com Alexandre Paes dos Santos, na semana passada. O ainda assessor parlamentar do ministro da Fazenda Hugo Braga gostava de contar que mantém uma amizade de dez anos com o lobista. “Ele é um homem bom, que ajuda quem precisa”, dizia. “Quando me separei, ele me convidava para jantar.“ Questionado sobre o motorista, a ajuda menos sentimental dessa amizade, Hugo Braga primeiro admitiu o fato sem rodeios. Em seguida fez uma pausa: “Hoje, com você me falando isso, eu acho estranho. Acho que fui ingênuo”.

A mancada de Arnaldo Faria de Sá não produziu maiores conseqüências para o deputado, ao menos até agora. Mas, para o motorista de Hugo Braga, custou o emprego. O assessor pediu demissão oficialmente por motivo de saúde. A suspeita é que se temia um pequeno escândalo. Nos últimos tempos Alexandre Paes dos Santos gabava-se de uma suposta proximidade com o ministro Pedro Malan e sua mulher, Catarina. Época ouviu de duas fontes, em Brasília, que Paes dos Santos teria aproveitado uma boa oportunidade, no ano passado, para adquirir um quadro do acervo do ministro. A própria Catarina, ouvida pela revista, desmente a história (leia o quadro).

Esse costume de se aproximar dos núcleos do poder a partir de funcionários modestos com acesso a informações estratégicas, mas sem capacidade de decisão, tornou-se um método de trabalho de Alexandre Paes dos Santos. Na semana passada, foi Débora Alves, secretária de Gonzalo Vecina Neto, presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, quem entrou na lista de candidata ao desemprego. Ela foi afastada do posto quando se descobriu que até o número de sua conta bancária constava da agenda do lobista – sem falar no registro de seis refeições de trabalho. Contar com uma pessoa de confiança no coração da Vigilância Sanitária é um trunfo considerável. Ali se aprovam autorizações para o lançamento de remédios, num mercado que faturou US$ 7,8 bilhões em 2000. “Alexandre atua de forma muito agressiva”, afirma um ex-ministro, que conversou com Época sob a condição de ser mantido em anonimato. “Seu esquema é cooptar assessores e deputados não só com dinheiro, mas com viagens e informações privilegiadas.”

Nas buscas em seu escritório desde que começou a ser investigado, a Polícia Federal apreendeu 19 fitas de vídeo, 23 fitas cassete, três disquetes e uma agenda. Época examinou todo esse material. Ali se descobriu um lobista em plena atividade pelo Congresso, junto a ministérios e autarquias. É legítimo – e saudável – que grupos de toda natureza realizem um trabalho particular de pressão no Congresso, para expor idéias e defender interesses. Democracia é conflito. A situação de Santos torna-se complicada, contudo, quando se constata que ali vigora um mundo peculiar, com regras estranhas, muito segredo – e até uma moeda própria.

Na agenda, em vários dias do ano, há listas de nomes e, ao lado, diferentes números junto à letra K. O K, uma moeda versátil, significa o acréscimo de três zeros a divisas como o real ou o dólar. K de quilômetro, 1.000 metros. K de quilo, 1.000 gramas. “Dez K, pelo sistema monetário de Santos, são 10 mil dinheiros”, diz um advogado que trabalhou com o lobista. “Ele sempre usou esse método para contabilizar valores.” Santos dá outra explicação. “O K é uma forma de codificação. Serve para codificar níveis de relacionamento”, disse ele a Época. Não deixa de ser verdade. Pelas anotações, há deputados com 5K e outros com 50K. O que configura ao menos dez níveis de relacionamento.

Não há restrições partidárias nas listas do lobista. Há tucanos como Sebastião Madeira (MA), Carlos Mosconi (MG) e Zulaiê Cobra Ribeiro (SP), pefelistas do porte de Robson Tuma (SP) e Luciano Pizzatto (PR) e ainda o neopetebista Arnaldo Faria de Sá (SP). “Realmente, nós somos a bancada do Alexandre Paes dos Santos”, admite o já notório deputado Faria de Sá, o da secretária com dupla militância. Sá, além de ter seu nome ao lado de variadas quantidades da moeda K, é o recordista de freqüência na agenda do lobista. De janeiro a outubro deste ano, seu nome aparece em 27 ocasiões.

Só a quebra do sigilo bancário proposta por uma eventual CPI sobre o caso poderá revelar a precisa natureza do relacionamento entre a Bancada do K e Alexandre Paes dos Santos. Seria errado e injusto enxergar aquilo que não se pode provar nem foi demonstrado de modo claro contra cada deputado, mas é possível procurar elementos para entender quais interesses estavam em jogo quando Santos buscou a aproximação no Congresso. Um episódio exemplar envolve a rede de supermercados Carrefour, cliente da APS e citada na CPI que investiga roubo de cargas por acusações de revender mercadorias roubadas. No dia 21 de abril, Santos anotou na agenda sua estratégia: “Abrir as portas do Carrefour para a CPI, antes que a CPI peça.

Fornecer maior número de documentos”. Ao lado da anotação, escreveu o nome do senador Romeu Tuma (PFL-SP), presidente da comissão. A estratégia não deu resultado. No dia 27 de junho, o deputado Robson Tuma (PFL-SP) apresentou requerimento pedindo para a polícia internacional, Interpol, solicitar ao governo francês relatório sobre inquérito envolvendo o Carrefour. “Existem fortes informações de que esta mesma rede de supermercados teve naquele país problemas com cargas roubadas”, discursou Robson Tuma. No mesmo dia, a agenda de Santos informa uma reunião com Robson Tuma.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

9 Comentários

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  1. Pronto, tá resolvido: a culpa

    Pronto, tá resolvido: a culpa é do FHC!!! Isso tá virando piada pronta. Cuidado que o argumento falacioso repetido à náusea pode comprometer a tese quando ele for propriamente utilizado…

     

    1. Prezado, não desconversa

      Prezado, não desconversa tentando desconstruir o fato. A sorte do FHC é ter tido (e ainda tem) a mídia nativa a seu favor. Mas um dia a casa cai.

  2. O caso Fiat

    “O Ministério Público denunciou na última sexta Paulo Baltazar e Sandro por improbidade administrativa num caso que envolve a montadora de automóveis Fiat. Rastreando a conta bancária de um escritório particular da dupla, descobriu-se que a montadora pagou a bolada de R$ 12,8 milhões por mudanças na lei para se ver livre de uma multa de R$ 643 milhões, em 1999. ”A única maneira de livrar a empresa da multa era mudando a legislação”, disse a Época o advogado Alberto Andrade, que defendia a Fiat em processos tributários. De acordo com documentos em poder do Ministério Público, os R$ 12,8 milhões que saíram da montadora foram repartidos entre Paulo Baltazar e Sandro, um escritório de consultoria chamado SBS – pertencente a ex-funcionários da Receita – e o advogado Alberto Andrade.” (Época – 2001).

  3. Do MPF, 11/05/2005

     

    MPF/DF ajuíza ação contra a Fiat e servidores da Receita Federal

    11/05/2005

    11/05/2005 17:15

     

    O Ministério Público Federal ingressou com Ação Civil Pública por Atos de Improbidade Administrativa, na última sexta-feira (6), na 8ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, contra ex-secretário da Receita Federal Everardo de Almeida Maciel, o ex-secretário adjunto da Receita Federal Paulo Baltazar Carneiro, o servidor público da Receita Federal Sandro Martins Lima, a Fiat Automóveis S.A. e seu representante legal no país Giovanni Battista Razzelli, além do advogado contratado pela Fiat Alberto Guimarães Andrade, os representantes das empresas de consultoria empresarial Romeu Salaro, Jorge Victor Rodrigues e Eivany Antônio da Silva.

    Após investigações do MPF foi constatado um esquema para livrar a Fiat do pagamento de juros e multas, no montante de R$ 629.526.072,93 referente à não contribuição da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), no período de junho de 1992 a outubro de 1997.

    A empresa Fiat, em 1998, representado por Giovanni Razzelli, contratou o escritório de Advocacia Alberto Andrade Advogados Associados S/C para “redução ou extinção do crédito tributário federal, referente à contribuição social” lançada contra a empresa. Posteriormente, o advogado Alberto Andrade subcontratou a SBS Consultoria Empresarial S/C Ltda, representada por Romeu Salaro e Jorge Victor Rodrigues, auditores fiscais da Receita Federal aposentados, para prestação de serviços de consultoria e assessoria jurídica e fiscal no interesse da Fiat. O contrato já previa o pagamento dos serviços prestados caso a empresa conseguisse “créditos que vierem a ser cancelados, total ou parcialmente, em julgamento administrativo definitivo, de órgão colegiado ou singular ou em decorrência de ato legislativo ou administrativo, que afinal cancele ou reduza efetivamente os créditos tributários” devidos pela Fiat.

    Já em 1999, o advogado Alberto Guimarães Andrade contratou a empresa Martins Carneiro Consultoria Empresarial Ltda, pertencente à Paulo Baltazar Carneiro, secretário-adjunto da Receita Federal, à epoca, e Sandro Martins Silva. Também contratou a empresa VR Consultoria Empresarial Ltda. de propriedade de Jorge Victor Rodrigues para prestação de serviços no interesse da Fiat, com pagamentos vinculados aos que seriam feitos à SBS Consultoria “em razão de contrato de mesma natureza celebrado com esta empresa”, isto é, conseguir a redução dos débitos federais da Fiat por meio de edição de ato normativo legal.

    Após todas as contratações, em 28/01/99, foi encaminhada o “Projeto de Medida Provisória e respectiva Exposição de Motivos”, pelo então Secretário da Receita Federal Everardo de Almeida Maciel ao Ministro da Fazenda Pedro Malan, que editou, no dia seguinte, a Medida Provisória nº 1.807/99, que atendeu perfeitamente ao pleito da Fiat, com a inclusão do inciso III aos §§ 1º e 2º, ambos acrescidos ao art. 17 Lei 9.779/99, pelo art. 10 da referida Medida Provisória. Tal medida beneficiou diretamente aos interesses da Fiat, uma vez que estabeleceu a exoneração da multa e dos juros devidos desde que o contribuinte tivesse ajuizado processo judicial até 31 de dezembro de 1998. E, o então Secretário da Receita Federal Everardo Maciel, edita no dia 26/02/99, a Instrução Normativa (IN) nº 26/99 determinando que os benefícios também incluíssem os processos judiciais movidos até 31/12/98, mesmo que não tenha sido concedida liminar ou medida cautelar no processo.

    No mesmo dia da edição da IN, a Fiat efetuou o pagamento do principal da CSLL, sem as multas e juros, no valor de R$ 643.042.202,50 e cinco dias após o pagamento de R$ 12.860.844,05 ao escritório de Alberto Guimarães Andrade, que providenciou o pagamento da SBS, Martins Carneiro e VR Assessoria e Consultoria Ltda. No caso da Martins Carneiro várias manobras foram realizadas para que os beneficiários pudessem lavar o dinheiro.

    Caucula-se que o prejuízo causado ao erário público, devido à manobra, gira em torno de R$ 1.358.298.044,34, correspondente à atualização da taxa Selic em cima do benefício fiscal concedido à Fiat.

    O procurador da República no Distrito Federal, Lauro Pinto Cardoso Neto, pede que a Justiça Federal determine, liminarmente, o afastamento do cargo público do réu Sandro Martins e Silva, que decrete a indisponibilidade dos bens de todos os réus, a suspensão do art. 1º da Instrução Normativa SRF 26/99. Também pede a condenação dos réus às penalidades previstas na Lei de Improbidade Administrativa nº 8.429/92.

    A ação na Justiça Federal está sob o número: 2005.34.00.013284-8.

     

     

     

    Jucilene Ventura

    Assessoria de Comunicação

    Procuradoria da Repúbica no Distrito Federal

    Fone: (61) 3313-5460

     

  4. Mais caso Fiat
    Informativo Anticartel.com (051), 19 de junho de 2006.  

    Fiat corrompe fiscais para não pagar impostos
    Do São Paulo

    19/06/2006 – Investigação mostra como altos funcionários da Receita embolsaram milhões para mudar legislação e favorecer empresas como a Fiat.
    Sabe por que o brasileiro comum paga tanto imposto? Porque não conhece as pessoas certas. Ao menos é isso o que sugere uma investigação que está em fase decisiva no Ministério Público Federal. O trabalho dos procuradores indica que grandes empresas que conheciam um grupo de consultores e funcionários da Receita Federal conseguiram, por meio de mudanças na legislação tributária, benefícios generosos do Fisco. A devassa está focada no auditor fiscal aposentado Paulo Baltazar Carneiro (na foto reproduzida), ex-secretário-adjunto da Receita Federal, e em Sandro Martins, que foi coordenador de tributação e continua no órgão até hoje. Suspeitos de enriquecimento ilícito tiveram o sigilo bancário quebrado e foram flagrados com depósitos de grandes empresas na conta.
    O Ministério Público Federal denunciou no dia 6 de janeiro, Paulo Baltazar e Sandro por improbidade administrativa num caso que envolve a montadora de automóveis Fiat. Rastreando a conta bancária de um escritório particular da dupla, descobriu-se que a montadora pagou a bolada de R$ 12,8 milhões por mudanças na lei para se ver livre de uma multa de R$ 643 milhões, em 1999. ”A única maneira de livrar a empresa da multa era mudando a legislação”, disse a Época o advogado Alberto Andrade, que defendia a Fiat em processos tributários. De acordo com documentos em poder do Ministério Público Federal, os R$ 12,8 milhões que saíram da montadora foram repartidos entre Paulo Baltazar e Sandro, um escritório de consultoria chamado SBS – pertencente a ex-funcionários da Receita – e o advogado Alberto Andrade.
    A encrenca da Fiat começou em 1997, quando a empresa foi autuada pelo fisco por deixar de pagar Contribuição Social sobre o Lucro Líquido durante seis anos. Depois de tentar derrubar a punição, sem sucesso, na Receita e na Justiça, os advogados da montadora decidiram apelar para a tática mais radical. Alberto Andrade fechou um acordo para defender a Fiat. Para cumprir o compromisso, o advogado recorreu à consultoria SBS. Esta, por sua vez, chamou a Martins Carneiro – pertencente a Paulo Baltazar e Sandro. Época teve acesso a documentos que dizem claramente que o objeto do contrato entre Alberto Andrade e a SBS é conseguir a ”edição de ato legislativo ou administrativo que afinal cancele ou reduza efetivamente os créditos tributários em questão”.
    ”Eu não sabia nada que tinha gente da Receita nessa história. Se soubesse não tinha feito”, diz o advogado que defendia a Fiat. ”Eu contratei a SBS. Só quando o serviço terminou é que eles me disseram que precisava fazer um pagamento diretamente para a Martins Carneiro. Procurada, a Fiat preferiu não se pronunciar, pois desconhece a investigação. Sandro e Paulo Baltazar também não quiseram atender a reportagem.
    O fato é que quatro meses depois da assinatura dos contratos a tal ”edição de ato legislativo ou administrativo” apareceu. O governo FHC editou a Medida Provisória 1.807/1999. O secretário da Receita era Everardo Maciel. Graças à medida, a Fiat deixou de pagar R$ 643 milhões em multas e juros à Receita (a dívida que era de R$ 863 milhões despencou para R$ 220 milhões). A medida anistiou de juros e multa, empresas que haviam sonegado Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e contestavam o pagamento do imposto na Justiça. Para conseguir direito ao benefício bastava ter ação correndo nos tribunais – não era preciso nem contar com uma sentença favorável. Semanas antes, uma outra Medida Provisória já tinha relaxado a lei, permitindo a anistia para empresas com decisão favorável na Justiça. A Fiat, no entanto, ficava fora do benefício. Na segunda mudança, foi favorecida.
    Fazer lobby para convencer o poder público a atender determinados interesses não é ilegal. O que cheira mal, na visão do Ministério Público Federal, é o suposto envolvimento de servidores – que receberam pagamento para trabalhar contra os interesses do Estado. Os procuradores têm motivos para acreditar que Paulo Baltazar e Sandro tiveram papel decisivo para que a medida provisória que ajudou a Fiat fosse editada pelo governo. Naquela ocasião, Sandro estava licenciado por motivos particulares. Paulo Baltazar, no entanto, era o secretário-adjunto da Receita Federal, segundo cargo mais importante dentro da hierarquia do órgão. Pelo serviço a Martins Carneiro, a consultoria tributária que pertence aos dois, recebeu R$ 2,1 milhões do então advogado da Fiat. A SBS, dos auditores fiscais aposentados, embolsou R$ 4,1 milhões. O Ministério Público Federal ainda não sabe onde foram parar outros R$ 6 milhões que saíram do cofre da montadora como pagamento pelo serviço.
    O secretário da Receita Federal nessa época era Everardo Maciel. Ele diz que a lei foi mudada por dois motivos. Primeiro porque, embora o Supremo Tribunal Federal tenha dado ganho de causa definitivo à União, mandando as empresas que pagassem a Contribuição Social, ele achava que era melhor abrir mão da multa e dos juros e receber o imposto devido no ato. O governo precisava reforçar o caixa rapidamente, pois enfrentava uma crise cambial. Quanto ao envolvimento de seus homens de confiança disse: ”Nunca ouvi falar nem como boato. Se tivesse, teria aberto inquérito fosse quem fosse’‘. 
    Como a Fiat se livrou de uma multa milionária aplicada pela Receita.

    O caminho da anistia
    29/12/97 
    Receita Federal autua a Fiat em R$ 630 milhões, por ter sonegado Contribuição Social sobre o Lucro Líquido de junho de 1992 a outubro de 1997. 
    27/01/98
    A montadora recorre e consegue reduzir a penalidade para R$ 550 milhões.
    15/07/98
    Fiat contrata o escritório Andrade Guimarães, de Belo Horizonte, para ”reduzir ou extinguir crédito tributário federal”.
    01/10/98
    Para cumprir o contrato com a Fiat, a Andrade Guimarães contrata a SBS e a Martins Carneiro, escritórios de consultoria tributária cujos sócios trabalharam ou trabalham na Receita Federal.
    29/01/1999
    Edição da Medida Provisória 1.807/1999.

    COMO ERA:
    A lei 9779/99 anistiava do pagamento de multas e juros, empresas que deviam Contribuição Social sobre o Lucro Líquido desde que tivessem uma decisão favorável na Justiça, mesmo que não fosse definitiva. Nesse caso, o pagamento do tributo sonegado deveria ser feito até o dia 31 de janeiro de 1999.

    COMO FICOU:
    Com a inclusão de apenas duas novas linhas na lei, a anistia foi estendida a qualquer empresa que tivesse entrado na Justiça contra o pagamento do tributo. Não precisava nem ter algum veredito que lhe desse razão na contestação. A Fiat foi beneficiada por essa mudança.
    25/02/1999
    Àquela altura, a dívida da Fiat com a Receita Federal estava em R$ 860 milhões. Favorecida pela mudança na legislação, a montadora pagou R$ 220 milhões e limpou sua ficha com o fisco. 
    03/03/99
    Dez dias depois, a Fiat pagou pelo serviço R$ 12,8 milhões ao escritório Andrade Guimarães. Desse total, a SBS recebeu R$ 4,1 milhões e a Martins Carneiro, R$ 2,1 milhões. Os outros R$ 6,6 milhões saíram da Fiat, mas ninguém sabe onde foram parar.

    Enquanto isso tudo acontecia, Paulo Baltazar Carneiro, um dos donos da Martins Carneiro, ocupava o posto de secretário-adjunto da Receita Federal, o segundo cargo mais importante na hierarquia do órgão.

     

    1.  
      Detalhe: O escritório

       

      Detalhe: O escritório “Guimarães Andrade” é do ex-advogado-geral de MG no governo Azeredo. Alberto Guimarães Andrade foi também advogado-geral adjunto de MG nos governos Aécio e Anastasia.

      Atualmente, “assessora” o advogado-geral do Estado, Onofre Alves.

  5. Deu em absolutamente nada,

    Deu em absolutamente nada, tanto que, tantos anos depois, aí está o mesmo a fazer as mesmas “negociações”. Agora, daí a “pegar” o filho do Lula, só na cabeça oca dessa juizite. Aliás, oca ou comprometida até a raiz dos cabelos?

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