O autoritarismo penal brasileiro explicado em ligação para Lula

Sérgio Moro ignora o resultado do resultado visado com seu ato

J B Costa (domingo, 20/03/2016 às 14:09),

Eu avalio que Lula seria mais forte preso do que com ministro do governo da presidenta Dilma Rousseff, a menos que os advogados dele peçam para a causa continuar correndo em Curitiba. Então não considero acertado ele ter se tornado ministro, mas se os advogados pedirem para a causa continuar em Curitiba talvez Lula saia lucrando politicamente com a situação, pois o juiz Sergio Moro se desnudou bastante frente a sociedade.

O depoimento coercitivo de Lula não é tanto danoso para Sérgio Moro por ter sido contra Lula e por ter sido um depoimento coercitivo. Ele foi danoso para Sérgio Moro por ter escolhido aquela sexta-feira como data para o depoimento coercitivo. Ele quis alimentar uma multidão que sofre o mesmo problema que sofre o Sérgio Moro: desconhecer a realidade. Ele sabe alguns efeitos do ato dele de fazer o depoimento coercitivo: inflamar a manifestação para favorecer o impeachment, mas não conhece a multidão que compõe a manifestação nem sabe como se comportará essa muitidão.

O depoimento coercitivo de Lula alimentou um grupo que aproxima da insanidade. Não foi por insanidade que Sérgio Moro alimentou, fomentou e fermentou esse grupo com o depoimento coercitivo de Lula, foi mais por desconhecimento. Ele acredita que esta fazendo um bem para o país agindo desse jeito, incitando a multidão e esquecendo os efeitos ruins que essa incitação produzirá. Age assim, portanto, porque conhece a realidade do direito mas não conhece a realidade em que os resultados da ação dele vão repercutir.

Esse desconhecimento é de toda ordem e eu venho falando a respeito desse desconhecimento há bastante tempo principalmente a partir das manifestações de junho de 2013. Aquelas manifestações foram mais populares do que as manifestações de março de 2015 e de março de 2016. Estas foram de pessoas mais brancas, com mais grau educacional e com mais recursos, mas onde não havia o ódio havia o desconhecimento. É claro que tudo isso motivado pelo combate correto contra a corrupção.

Combate correto que, no entanto, não deixa de esconder uma ignorância. Não há ninguém favorável ao homicídio, mas não se consegue arregimentar ninguém para fazer uma passeata contra o homicídio, pois pareceria uma passeata de néscios a não ser do homicida inteligente que fizesse parte da passeata para que ninguém desconfiasse dele.

De certo modo, uma passeata contra a corrupção assemelha a uma passeata contra o homicídio.

O desconhecimento a respeito da corrupção também é um problema sério que acomete quase todo mundo e não só no Brasil. As pessoas associam a corrução à má situação econômica, quando pode ser o contrário, afinal os países onde se acredita que há ou houve mais corrupção são os que mais crescem: o Japão na década de 60 e 70, a China na década de 80, 90 e a primeira década do século XXI. E o pior é que sempre superdimensionam a corrupção.

Bastava fazer uma leitura mais exaustiva no orçamento, separar o pagamento dos servidores ativos (Há corrupção aqui e ali fruto de uma fraude de um diploma etc, mas em valor desprezível), o pagamento de aposentados (Onde também pode ter havido alguma fraude aqui e acolá), o pagamento das despesas com juros (onde pode ser que a taxa de juro foi estabelecido por um conluio entre banco e mercado), gastos com energia elétrica, combustíveis, aluguéis, diárias etc e se vê que sobra muito pouco, provavelmente menos de cinco pontos percentuais do total dos gastos dos Estados (Em torno de 40% do PIB) em pode-se no extremo obter uns 20% de modo fraudulento, ou seja, não há como corresponder a mais de 1 ponto percentual dos 40% do PIB gastos pelo Estado.

E não se pode esquecer que este 1 ponto percentual, ou aproximadamente 2,5% do PIB poderiam ser combatidos com uma boa força tarefa atuando diuturnamente. E com novas técnicas e contando com um corpo técnico cada vez mais qualificado e com o passar do tempo esse 2,5% poderia ir diminuindo paulatinamente.

Só que a população do Brasil e do mundo cresce em uma cultura que apenas aumenta a ignorância. Vive-se em um completamente desconhecimento de tudo, salvo naquilo que que cada um é especialista. E quando aparece alguém que acha que sabe e quer espalhar o seu saber apenas repassa mais ignorância que encontra campo fértil para espalhar.

O Luis Nassif menciona muito José Ortega y Gasset. Eu não tenho essa admiração por ele e o considero bastante vinculado ao período dele. O livro “A revolta das massas” é de 1930 e talvez no livro se lançam boas explicações para o surgimento do fascismo na Europa, mas fica um tanto fora da nossa realidade. Agora há um pouco de semelhança da realidade atual com a da década de 30, pois em ambas ocorreu uma severa crise econômica. Esta coincidência é um dos aspectos relevantes que devem ser considerados para entender esses movimentos: o que os motiva, os que os faz crescer, e principalmente o que temem. Essa época de crise é essencialmente uma época de medo. E se trata de um medo ruim e que é o medo do desconhecido ao contrário do medo fundado na razão, que é um medo saudável e necessário ao ser humano.

Então em meu entendimento o que é mais importante é destacar que no afã de combater a corrupção e acreditando que a corrupção é originaria do governo, o juiz Sérgio Moro se prestou a insuflar um movimento desconhecendo totalmente a gênese desse movimento, a natureza dele e as consequências que podem advir desse incitamento.

E faço um adendo. Já disse aqui em algum comentário como se assemelha o discurso contra a presidenta Dilma Rousseff com o discurso contra Obama feito pelos seguidores do Partido Republicano. A diferença é que o discurso contra a presidenta Dilma Rousseff não contestado pela realidade.

Recentemente vi o Jabour fazendo esse tipo de crítica ao governo que em tudo assemelhava com o discurso antigo do Partido Republicano contra Barack Obama. Até 2011 o discurso do Partido Republicano colava porque era a realidade não o conseguia desmentir. Desde então, entretanto, os Estados Unidos vêm crescendo e o discurso se tivesse algum apego com a verdade deveria ser corrigido. Só que o discurso é o mesmo e as pessoas incutiram tanto esse discurso que não escutam mais nada.

Em um mundo assim em que as pessoas estão mai informadas, desconhecendo completamente a realidade fica fácil para um aventureiro aproveitar e ganhar a situação. Foi vendo esse espaço que Donald Trump chegou e radicalizou nesse discurso e todos os malucos estão correndo atrás dele. O Paul Krugman vem falando sobre isso um bom tempo. Hoje no blog de Mark Thoma, “The Economist’s view” eu fui ler o seguinte artigo de autoria de Kevin Drum, publicado no site do Mother Jones: “The Head of Jeb’s Super PAC Is Tired of the Endless Conservative Con” de sábado, 19/03/2016 às 10:01 e que pode ser visto no endereço a seguir:

http://www.motherjones.com/kevin-drum/2016/03/head-jebs-super-pac-tired-endless-conservative-con

O texto traz alguns comentários de Mike Murphy, um antigo amigo e apoiador de Jeb Bush, e que é também, segundo o Kevin Drum, “o cara que administra Right do Rise, o Super PAC, que jogou no ar $100 milhões em um épico e fútil esforço para vender Bush para as massas”.

Impressionou-me a avaliação que Mike Murphy faz de Donald Trump como se pode ver partes do trecho do artigo que transcrevo a seguir:

“Ainda assim, Murphy acrescenta, o problema com a nossa atual clima anti estabelecimento não é que as pessoas não estão corretamente identificando problemas. É que os solucionadores de problemas para os quais eles estão se voltando são maiores traficantes de óleo de cobra do que aqueles dos quais eles estão se afastando …. Vamos pensar em Trump, diz Murphy. “Ele não entende a presidência. Você não chama o presidente do México e diz: ‘Ei, eu vou construir um muro fabuloso com banheiros de ouro de primeira classe e você vai pagar por isso.’ … Ele não tem entendimento dos poderes presidenciais. Ele não tem entendimento do Congresso. É como colocar um chimpanzé no banco do motorista de um trator. “”

É claro que Donald Trump sabe muito bem que ele não vai construir muro nenhum a não ser em um modelo keynesiano para gerar emprego. Quem não sabe disso são os eleitores que foram mal instruídos.

E depois de transcrever mais falas de Mike Murphy, Kevin Drum encerra o artigo com os dois seguintes parágrafos:

“Rick Perlstein, em particular, tem escrito muito sobre como o movimento conservador moderno em grande parte se transformou em uma máquina para enganar as pessoas, especialmente os idosos. Há Glenn Beck lançando o ouro como uma proteção contra a hiperinflação inexistente. Fred Thompson vendendo hipotecas reversas. Os acólitos de mala-direta do pioneiro Richard Viguerie montando operações que assustam muito as pessoas mais velhas, mas usam a maior parte do dinheiro que levantam para pagar a si mesmos e seus consultores. Os anfitriões de programa de rádio que repetidamente insinuam que Hillary Clinton assassinou Vince Foster e, em seguida, rapidamente cortam para um comercial. Mike Huckabee vendendo de porta em porta curas de diabetes e Ben Carson elogiando as glórias de gliconutrientes aos seus fãs evangélicos. A produção infinita de livros de direita simplório para um fluxo de renda conveniente, alguns deles com mais do que o cheiro habitual de corrupção.

Até mesmo alguns conservadores finalmente começaram a reconhecer que a curto trapaceiro – que é velho o suficiente que já se tornou um longo trapaceiro – está prejudicando a causa conservadora. Mike Murphy é aparentemente um deles, e ele considera o surgimento de Donald Trump pouco mais do que apenas sobremesas para um partido que tolerou ou ativamente encorajou esse comportamento ao longo de décadas. No final, Trump tomou um olhar para o movimento conservador e decidiu que eles eram amadores. A grande trapaça precisa mais do que programas de rádio ou mala direta ou anúncios assustadores. Ela precisa de TV nacional, desde de bom grado e frequentemente – e Trump sabia exatamente como aquele jogo funcionou. Ele não está administrando sua trapaça de qualquer forma diferente do que os conservadores têm feito sempre. Ele só sabe como tirar o que pode melhor do que eles fazem”.

Nessa época de crise econômica a massa da rebelião de José Ortega y Gasset está suscetível a qualquer encenação. A encenação de Sérgio Moro insuflou uma massa que desconhece a realidade diante da qual ela reage. Sérgio Moro sabia que a massa iria reagir, mas ele não sabe as consequências dessa reação.

Clever Mendes de Oliveira

BH, 20/03/2016