O STF e os Relógios de Dali

Enviado por Rádio do Moreno -18.11.2011 |14h41m

THEÓFILO SILVA

O STF e os Relógios de Dali

Reprodução internetAs imagens do médico de Michael Jackson saindo do tribunal algemado, após ter sido condenado a quatro anos de cadeia – julgado dois anos apenas, depois da morte do cantor – são prova da eficiência da justiça americana e uma espécie de soco na cara da lerda justiça brasileira. Uma justiça que lembra os lânguidos relógios de Salvador Dali.
Enquanto isso, aqui, os três médicos assassinos de Taubaté – eram quatro, um já morreu – que mataram quatro pessoas e lhe roubaram os rins e os venderam em 1986, embora julgados e condenados (25 anos depois) a 17 anos de prisão, continuam soltos, e foram vistos dando gargalhadas nas tumbas de suas vítimas. E pior, continuam trabalhando como médicos, já que o Conselho de Medicina não os expulsou, nem os expulsará.
O também médico Roger Abdelmassih, que molestou centenas de mulheres, foi julgado (o julgamento foi rápido, pois o pervertido mexeu com gente poderosa) e condenado a 278 anos de prisão, mas foi solto – fugiu para o Líbano, onde vive tranquilamente – pelo ministro do STF Gilmar Mendes. Pergunto se Gilmar Mendes dorme a noite e, se dorme, se não tem pesadelos?
Já prometi a mim mesmo não escrever mais sobre essa tragédia que é o poder judiciário brasileiro, em particular as suas cortes superiores. Talvez a culpa seja de Shakespeare que me ensinou que o estado de direito é mais importante do que a economia.
Como posso deixar de falar, se o preço do pão, a batida de carro, a viagem de ônibus, a escola dos filhos, a casa própria, o caos na saúde e o meu próprio sono, enfim, tudo que faço sobre a terra é afetado pelas leis do meu país? Como agir diferente, se a riqueza e a pobreza, o sucesso e o fracasso, a dor e a alegria, o trabalho e o desemprego, a infâmia e a lealdade estão todos sujeitos ao “Estado Democrático de Direito”?
“A não ser que haja um mundo consolador melhor do que o nosso.”, como disse Isabela, que foi ultrajada pela justiça, em Medida por Medida de Shakespeare. Será que nossos juízes supremos esperam pela justiça divina? Como permanecer calado, assistindo a iniquidade e a injustiça campeando? Como diria Isabela: “A quem me queixarei?”.
A primeira instância, ou justiça dos pobres, não conta, essa de certa maneira funciona. O problema está nas cortes superiores, cujas decisões são politizadas. Vejamos a novela do projeto Ficha Limpa, já dura quanto tempo? Quem se lembra da lei da Cláusula de Barreira, que disciplinava o número de partidos políticos, engavetada por dez anos, até ser sepultada pelo STF? Quando teremos uma sentença transitada em julgado? Como se sente um ministro do STF ao ver Paulo Maluf, livre leve e solto nessa terra de Vera Cruz, sendo procurado pela Interpol no restante do mundo, a exceção da Somália?
Se formos comparar o crime de Conrad Murray, médico de Jackson, ao praticado pelos médicos assassinos de Taubaté e os de Abdelmassih, veremos que o crime de Murray é uma brincadeira de criança. No Brasil sequer ele teria sido julgado.
Infelizmente, três quartos do povo brasileiro não têm a menor ideia do que seja Estado Democrático de Direito. Se soubessem, se revoltariam. No Brasil, o estado de direito é mero blá, blá, blá.
Lembro-me de Isabela, em Medida por Medida, clamando ao duque de Viena para que puna o juiz Ângelo: “Ó digno príncipe! Não desonreis vossos olhos pousando-os sobre qualquer outro objeto, até que tenhais escutado minha queixa legítima e feito justiça, justiça, justiça, justiça!”.
Somos todos Isabelas gritando justiça, justiça, justiça! Lembrando que os malemolentes relógios de Dali não representam a preguiça, mas a impotência!

Theófilo Silva é articulista colaborador da Rádio do Moreno.

http://oglobo.globo.com/pais/moreno/posts/2011/11/18/o-stf-os-relogios-de-dali-417290.asp

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