Para se defender, MPF diz que membros fazem política, mas não partidária

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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do ConJur

Para se defender, MPF diz que membros fazem política, mas não partidária

Acusados de atuar como militantes de um partido político, os procuradores da operação “lava jato” reagiram. Em nota, o Ministério Público federal afirma que é papel de seus membros fazer política, sim, desde que não apoiem um ou outro partido.

“Falar sobre os grandes temas nacionais, dentre os quais está o fenômeno da corrupção e sua infiltração no aparelho político, é direito de todo o cidadão, dentre os quais se encontram também os membros do Ministério Público. Promotores e procuradores, salvo a restrição estrita de não poderem exercer política partidária, não são castrados de seus direitos como cidadãos”, diz nota divulgada pela Assessoria de Imprensa da Procuradoria da República no Paraná.

A resposta veio depois de o jornal O Estado de S. Paulo publicar um editorial com críticas ao posicionamento do procurador que coordena a autoproclamada força-tarefa da “lava jato”, Deltan Dallagnol. O procurador considera essencial eleger políticos “que tenham um compromisso claro com a causa anticorrupção”. O nome disso, define o Estadão, é política partidária.

“Em lugar de se preocupar com a obtenção de provas para sustentar as muitas acusações feitas contra políticos, alguns integrantes da ‘lava jato’ parecem mais empenhados em construir a imagem de que a operação veio para salvar o Brasil e que ela se transformou em ‘patrimônio nacional’”, acusa o jornal.

A nota do MPF rebate, mas quase que concordando com o que diz o editorial. “As investigações da operação Lava Jato apontam que a corrupção pública tornou-se sistêmica, e uma causa central desse mal são campanhas político-eleitorais extremamente caras”, diz o comunicado.

Assim, caberia ao MPF defender “reformas necessárias para reestabelecer o equilíbrio do jogo democrático”, segundo a nota divulgada.

*Texto atualizado às 21h35 do dia 24 de outubro de 2017, após o MPF divulgar uma segunda versão da nota, com alterações.

Leia o editorial do Estadão:

O partido da Lava Jato

Aos poucos, a Lava Jato, que caminha para seu quarto ano, vai deixando de ser uma operação contra um esquema de corrupção em estatais e organismos de governo para se transformar em partido político. Essa metamorfose começou a se manifestar quando alguns procuradores que integram a operação começaram a falar em “saneamento” da política como seu principal objetivo. Ou seja, ao se atribuírem uma tarefa que claramente extrapola o escopo de seu trabalho, imiscuindo-se em seara que, numa democracia, é exclusiva dos eleitores e de seus representantes no Legislativo, esses procuradores acabaram por se comportar como militantes de um partido — e, como tal, passaram a tratar todos os críticos de sua “plataforma” como adversários políticos.

Em recente entrevista ao Estado, o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, deixou clara, de vez, essa disposição. Segundo Dallagnol, a Lava Jato não revelou apenas a corrupção de um político ou de um grupo, “mas de grande parte da classe política”. Por essa razão, “o objetivo da operação é colocar essas pessoas poderosas debaixo da lei”. Mas, segundo o procurador, “há um problema: elas fazem as leis”. Ou seja, a julgar pelo que diz o coordenador da Lava Jato, a operação só será considerada bem-sucedida se varrer do Congresso “grande parte da classe política”, gente que, em sua visão, faz leis exclusivamente para se proteger da Justiça.

Para atingir esse objetivo, prossegue o procurador Dallagnol, não basta simplesmente levar aos tribunais os políticos que a Lava Jato considera corruptos, pois “apenas punições não resolvem”. É preciso, segundo ele, “avançar para reformas anticorrupção no sistema político, no sistema de Justiça e em outras áreas”, razão pela qual a Lava Jato, a título de se proteger dos atuais políticos, que seriam seus inimigos, considera essencial eleger representantes “que tenham um compromisso claro com a causa anticorrupção”.

O nome disso é política partidária. Em lugar de se preocupar com a obtenção de provas para sustentar as muitas acusações feitas contra políticos, alguns integrantes da Lava Jato parecem mais empenhados em construir a imagem de que a operação veio para salvar o Brasil e que ela se transformou em “patrimônio nacional”, conforme as palavras do procurador Dallagnol. Tornou-se assim, segundo essa visão, não apenas inatacável, mas também única intérprete autorizada dos anseios nacionais.

O problema é que a sociedade dificilmente concordará com isso. “É impossível prever o que acontecerá porque depende de um fator que ninguém controla: como a sociedade vai se comportar no futuro”, reconhece Dallagnol, admitindo que os eleitores eventualmente podem discordar da “plataforma política” da Lava Jato. Se os parlamentares eleitos pelo voto direto — legítimos representantes dos cidadãos — decidirem que algumas das leis e reformas propostas pelo partido da Lava Jato não servem para o País, isso não significa uma vitória da corrupção nem uma derrota da operação, e sim uma rejeição ao que poderia ser desde uma ideia qualquer até uma agressão ao Estado de Direito. Foi o que aconteceu quando o Congresso se recusou a aprovar o pacote de medidas anticorrupção proposto pelos procuradores da Lava Jato e que incluíam barbaridades como a aceitação de provas obtidas ilicitamente, restrições ao habeas corpus e fim dos prazos de prescrição.

A Lava Jato alcançou grande sucesso — e mudou a percepção de que tudo o que envolve gente poderosa acaba em pizza — quando se limitou a investigar a trama de relações promíscuas instalada na máquina do Estado desde que o PT chegou ao poder. De forma inteligente e sofisticada, a operação mostrou do que é capaz uma ação bem coordenada entre Polícia Federal e Ministério Público, obtendo evidências suficientes para condenar gente muito graúda a vários anos de prisão e o ressarcimento de bilhões de reais aos cofres públicos.

Limitando-se a punir quem deve ser punido, a Lava Jato presta inestimável serviço ao País. Quando se comportam como candidatos em campanha, seus integrantes se arriscam a perder credibilidade”.

Leia a nota do MPF:

“O Ministério Público não pode fugir de sua responsabilidade constitucional”, defende força-tarefa
A força-tarefa da operação Lava Jato do Ministério Público Federal no Paraná, em resposta ao editorial “O Partido da Lava Jato” do jornal O Estado de S. Paulo de 24 de outubro de 2017, esclarece que:

1. É equivocada a afirmação de que a Lava Jato está se transformando em um partido político. O editorialista desse jornal confunde a defesa do regime democrático, o que é uma função constitucional do Ministério Público atribuída pela Constituição Federal (art. 127, caput), com o exercício de atividade político-partidário que é vedada aos seus membros (art. 128, §5º, II, “e”).

2. Dentre os pilares da Democracia, está a igualdade de oportunidades entre os partidos e políticos nas eleições e o respeito à regra do jogo. Isso implica na obrigação dos poderes públicos em coibir o abuso do poder econômico como fator de injusto desequilíbrio da disputa democrática, especialmente quando esse poder econômico decorre de corrupção e desvio de recursos públicos.

3. As investigações da operação Lava Jato apontam que a corrupção pública tornou-se sistêmica, e uma causa central desse mal são campanhas político-eleitorais extremamente caras. A arrecadação de propinas permite que líderes de esquemas de corrupção nos diversos órgãos e empresas da administração pública federal, estadual e municipal dominem as máquinas partidárias e garantam a reeleição de corruptos.

4. O Ministério Público não pode fugir de suas responsabilidades constitucionais como advogado da sociedade de prestar informações sobre os fatos descobertos e de defender a Democracia, inclusive no tocante a reformas necessárias para reestabelecer o equilíbrio do jogo democrático.

5. Assim o faz em situações similares, como, em campanhas de esclarecimento sobre o trabalho escravo, sobre os direitos das crianças e dos adolescentes e outros temas de grande importância.

6. Nesse sentido, informar a população da necessidade de um voto consciente, ou seja, de um voto que contribua para a integridade da Democracia, com a redução da corrupção como um fator de desequilíbrio do jogo eleitoral, é apenas o exercício pleno das atribuições que foram determinadas ao Ministério Público pela Constituição Federal. Na mesma direção, a Justiça e o Ministério Público Eleitorais promovem com regularidade campanhas para ampliar a consciência eleitoral e cidadã.

7. Isso tudo, ao contrário do que o editorial pretende afirmar, não é, nem de longe, exercício de atividades político-partidárias por membros do Ministério Público, pois não se está de maneira alguma indicando preferência por este ou aquele partido, ou por este ou aquele candidato. O que se faz é sim informar e promover valores constitucionais no contexto da defesa da Democracia.

8. Tal atividade está plenamente alinhada não apenas com o dever constitucional do Ministério Público Federal, mas com sua missão que inclui “promover a realização da justiça” e “a defesa do estado democrático de direito”. Alinha-se ainda com a visão do Ministério Público Federal que se volta para a alcançar “excelência na promoção da justiça, da cidadania e no combate ao crime e a corrupção”. Harmoniza-se, por fim, com os valores da Instituição, que incluem iniciativa, efetividade e ética.
9. Tentar calar o Ministério Público em seu dever de informar a população e promover a democracia é tentar impor, sem qualquer sustentação legal ou constitucional, uma mordaça aos seus membros.

10. Por fim, falar sobre os grandes temas nacionais, dentre os quais está o fenômeno da corrupção e sua infiltração no aparelho político, é direito de todo o cidadão, dentre os quais se encontram também os membros do Ministério Público. Promotores e procuradores, salvo a restrição estrita de não poderem exercer política partidária, não são castrados de seus direitos como cidadãos.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

10 Comentários

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  1. Debiloides

    Cambada de picaretas, que marretam justificativas toscas para não perderem o fio da narrativa que criam para suas carreirras e casos, por puro interesse pessoal.

    Em médio prazo, qualquer governo deste País com um mínimo de força, democrático ou não, haverá de pôr limite na atuação dessa instituição, uma vez que os abusos de alguns de seus membros e a falta de controle das suas ações impossibilitam qualquer governante de atuar com um mínimo de discricionariedade, ainda que dentro da lei.

    O que se fazia com os prefeitos das pequenas cidades do interior, em que o MP ficava enviando diuturnamente Notificações Recomendatórias sobre os mais diversos assuntos, se espraiou para o plano federal. Essas intromissões exageradas do MP sobre a atuação dos prefeitos os impedia de trabalhar, porque ou ficavam amedrontados com a possibilidades de ações judiciais contra si, ou perdiam tempo com a montagem de equipes com o intuito de fornecer respostas e/ou adequações às políticas públicas acerca do que o MP mandava fazer nessas notificações.

    Ou seja, na verdade, os promotores acabavam sentando na cadeira dos prefeitos por diversos momentos, em um compartilhamento de poder sem parâmetro constitucional, e acredito que inédito no mundo, e na maioria das vezes sem respaldo popular, porque contrariamente ao que os eleitores decidiram nas urnas.

    Essa zorra acontece agora no Brasil todo. Daí que se acordou para o problema. Pobres dos membros sérios da instituição, que vão sofrer o que não merecem. Mais ou menos como aconteceu com nós, que nada têm a ver com essa barbárie que se instalou no Brasil, e que escolhemos e vencemos democraticamente viver em um país plural e com enfoque nos mais fracos, mas cuja decisão nos foi arrebatada por um golpe.

  2. Será que esse entendimento

    Será que esse entendimento serve também para os 4 juízes do Rio de Janeiro que se manifestaram contra o impedimento de Dilma ano passado e, que agora,  com o voto da carmem lúcia, o cnj vai investigar? Acho que não, a não ser, que as manifestações tivessem sido a favor do golpe né?!!  

    1. fazem….

      MP é um braço do Tucanato. Aqui em São Paulo, o MP / SP é absurdamente filiado todo ao psdb. O Promotor ou Procurador usa do cargo para um salto político e ganha um cargo dentro do partido do poder. E depois faz o “serviço” para este partido. Basta ver as figuras do MP / SP enroladas em casos de corrupção. Quem irá acusá-los? Seus parceiros? O Merendão Tucano foi capitaneado pelo promotor Capez. O que foi feito? Farinata? Isto que seria nossa Democracia Ciadã?

    2. fazem….

      MP é um braço do Tucanato. Aqui em São Paulo, o MP / SP é absurdamente filiado todo ao psdb. O Promotor ou Procurador usa do cargo para um salto político e ganha um cargo dentro do partido do poder. E depois faz o “serviço” para este partido. Basta ver as figuras do MP / SP enroladas em casos de corrupção. Quem irá acusá-los? Seus parceiros? O Merendão Tucano foi capitaneado pelo promotor Capez. O que foi feito? Farinata? Isto que seria nossa Democracia Ciadã?

  3. O MPF não faz política partidária, faz política anti-partidária

    O MPF é anti-petista e como o PT é oposição ser anti-petista equivale a ser pró-partidos da situação.

    De fato, os Promotores e Procuradores não são castrados de seus direitos como cidadãos mas eles não deveriam se valer dos seus cargos para exercer seus direitos como cidadãos.

    O Dallagnol e o Moro, entre outros procuradores e juízes, têm compromisso claro com a causa anti-corrupção. Os Brasileiros devem eleger esses Vestais da moralidade e da ética, nada obstante eles comprem imóveis de Programas destinados a pessoas de baixa renda, mesmo ganhando supersalários.

  4. O PT instalou a trama de relações promíscuas na máquina estatal

    Antes do PT não havia trama de relações promíscuas instaladas na máquina do Estado.Por isso o MPF não aciona políticos de outros partidos mas apenas políticos do PT e da base aliada.

    Se os membros do MPF têm convicção de que os petistas são criminosos, porque eles deveriam se preocupar em obter provas desses crimes?

    Ora, ora, os petistas é que devem provar que são inocentes.

  5. Juízes não são castrados nos seus direitos como cidadãos

    “Falar sobre os grandes temas nacionais, dentre os quais está o fenômeno do golpe contra uma presidente legitimamente eleita, é direito de todo o cidadão, dentre os quais se encontram também os membros do Ministério Público e do PODER JUDICIÁRIO. JUÍZES, Promotores e procuradores, salvo a restrição estrita de não poderem exercer política partidária, não são castrados de seus direitos como cidadãos”.

    Se isso vale para promotores, vale também para juízes.

    Quem deve ser punido são os golpistas, não que se opôs ao golpe.

     

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