Senado testa limites para garantir defesa em investigações

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Desde que se tornou mira recorrente das investigações da Operação Lava Jato, principalmente após os vazamentos das conversas com o ex-presidente da Transpetro, Sergio Machado, o peemedebista Renan Calheiros (AL) busca formas de aumentar os direitos de defesa dos investigados e brecar os abusos de investigações brasileiras.
 
Os limites dessas tentativas são, por outro lado, pouco a pouco testados pelo senador. O projeto que quer mudar as regras atuais da Lei de abuso de autoridade, por exemplo, enfrenta fortes resistências do Ministério Público Federal, Polícia Federal e juízes.
 
Mas, ainda, avançam outros projetos que trazem benefícios ao Código de Processo Penal brasileiro, no sentido de ampliar e assegurar as garantir dentro do Estado democrático de direito e da presunção da inocência. Foi o caso da regulamentação da audiência de custódia, aprovada na noite desta quarta-feira (14) pelo Senado. 
 
Leia mais: Os abusos nas investigações brasileiras, por Vladimir Barros Aras
 
Mudanças que garantem defesa
 
O projeto (PLS 554/2011) estipula um prazo máximo de 24 horas para que um preso em flagrante seja levado a um juiz. A proposta altera o CPP, assegurando que o preso terá direito de realizar exame de corpo de delito e depor na presença de um advogado, membro do Ministério Público ou da Defensoria. 
 
Ainda, se a audiência de custódia não ocorrer, o Ministério Público, a Defensoria ou o Conselho Nacional de Justiça deverão ser notificados a fim de avaliar a necessidade de que medidas sejam tomadas. 
 
A audiência terá como objetivo a verificação pelo juiz se os direitos fundamentais do preso estão sendo respeitados. Nesta sessão, também estará mantida a garantia de que as informações prestadas pelo preso não serão usadas contra ele. Trata-se especificamente de analisar a legalidade e a necessidade da prisão, prevenir torturas ou maus-tratos por investigadores ou esclarecer ao preso os direitos que detém.
 
O projeto também acrescenta que imediatamente após o registro de prisão em flagrante, se o investigado alegar a violação de direitos fundamentais, a autoridade policial será obrigada a tomar medidas para preservar a integridade do preso e pedir a apuração dos fatos com a instauração de um inquérito.
 
Outra garantia é de que se o crime for afiançável e for constatado que o preso não tem dinheiro para pagar essa fiança, o juiz pode dispensar o recolhimento do valor. Em troca, terá que comparecer à autoridade sempre que intimado e periodicamente, não poderá mudar de residência sem prévia permissão ou ausentar-se de casa por mais de oito dias sem comunicar onde poderá ser encontrado.
 
Apesar de ser aprovado pelo Plenário do Senado, o projeto de lei ainda precisará ser votado em mais um turno, o que ocorrerá após o recesso branco, em agosto.
 
Abuso de autoridade
 
Já o Projeto de Lei 280/216, que quer mudar as regras da Lei de abuso de autoridade, foi recebida com resistência e oposição por magistrados e investigadores, que temem que a mudança intimide juízes, desembargadores, ministros e autoridades na aplicação, por exemplo, de prisões em casos de corrupção ou outros cometidos por “poderosos” e políticos.
 
Esse foi o posicionamento manifestado pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), em nota oficial divulgada nesta quarta (13). Segundo a Associação, “alguns artigos da proposta criminalizam diretamente a atividade judicial, abrindo a possibilidade de punição ao juiz pelo simples fato de interpretar a lei”.
 
Como mecanismo de demonstrar o temor da comunidade jurídica, a Ajufe sustenta que algumas investigações hoje em curso que miram políticos, como a Lava Jato, Zelotes, Acrônimo, etc, podem ser abafadas. Com esse argumento, apelou à opinião pública para se manifestar contrária ao projeto, em petição online.
 
“Os magistrados pedem a participação de cidadãos do Brasil inteiro no abaixo-assinado”, disse a entidade, interpretando que a forma de atuação de investigadores, hoje, é com base “na aplicação da lei penal” e, por isso, estaria legítima.
 
Dentro do Senado, os parlamentares que tentam agilizar a proposta, como Renan e Romero Jucá (PMDB-RR), contrariam a tentativa de interferência nas investigações e alegam que o projeto apenas assegura direitos. O projeto já tem data marcada: no dia 16 de agosto, na agenda do Senado, deve ser votado o parecer. 
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

5 Comentários

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  1. Sempre dá prá melhorar

    Podem chamar de poliana mas só o fato de estarem em pauta debates como esses já é um avanço. Se as medidas forem aprovadas melhor ainda. Ótimo será quando introjetarmos a cultura da punição aos abusos de juízes e policiais. E o ideal será quando os próprios juízes e policiais introjetarem essa postura, tornando desnecessárias as punições a eles.

  2. Senado testa…

    Acorda Nação Canalha, senão por sua própria natureza, por sua suprema omissão. Quer dizer que os milhares de presos nas cadeias brasileiras, cidadãos brasileiros, não representavam nada até agora? 24 horas nas mãos do Estado sem a ciência do Poder Judiciário e de um juiz? Isto é o que querem aprovado? Então o que se tem hoje é ainda pior? Onde estão os órgãos de direitos humanos, nosso Poder Judiciário, onde está a OAB? O Estado brasileiro pode dispor da liberdade de uma pessoa sem nem ao menos comunicar a um juiz? O que se entende por Idade Média ou aberração aqui neste país? 

  3. Abuso tolerável? Isso pode, Arnaldo?

    O Senado está propondo uma Lei que atualiza condutas de autoridades e agentes públicos para considerá-las criminosas. Penso que de fato, existem condutas que são mesmo abusivas.

    Mas a iniciativa do Senado nos leva a raciocinar sobre condutas também praticadas por Senadores sabidamente abusivas.

    Por exemplo, quando o MP diz que pedalada fiscal não é crime, mas o Senado iniste em dizer que é, como ficamos? Qem está abusando e extrapolando de suas funções? O MP ou o Senado?

    Seria possível aceitar que o Senado, agindo politicamente, considere crime uma conduta que a lei não tipifica como tal ou vice-versa?

     

     

  4. Quando os abusos estavam

    Quando os abusos estavam viciosamente ocorrendo contra Lula, Dilma e o PT , ninguém via nada de errado nisso.

    Agora que a coisa avançou sobre todo o espectro PODRE da nossa republiqueta, as excelências estão todas apavoradas!

    Gostaria muito de acreditar que a Lava Jato queira mesmo passar o Brasil a impo processando e condenando corruptos e ladrões de todos os partidos. Já mostrou que não.

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