STF julga biografias não autorizadas: entenda a polêmica

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Do Justificando

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar hoje (10) a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.815, movida em 2012 pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel), que pede a inconstitucionalidade dos artigos 20 e 21 do Código Civil para obras biográficas.

A ministra Cármen Lúcia disponibilizou o processo para julgamento três anos depois de protocolada. De acordo com o texto do Código Civil, qualquer cidadão pode impedir a publicação de biografias, “se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais”.

Segundo a presidenta da entidade, Sônia Machado Jardim, se não houver essa mudança, as pessoas ficariam a mercê apenas de biografias chapa-branca. “Toda a luta que a sociedade travou no país contra a ditadura e a censura terá sido, em grande parte, em vão”, diz. 

Nos últimos anos, diversos títulos foram retirados de circulação pela Justiça, tais como as biografias do músico Roberto Carlos e do jogador de futebol Garrincha, mas muitos permanecem nas prateleiras das livrarias de todo o País. Se, de um lado, estão aqueles que defendem a liberdade de expressão, o direito à informação e o trabalho dos biógrafos, de outro, estão os que buscam proteger a imagem e a privacidade do protagonista da biografia.

Atualmente, existe um projeto de lei em trâmite no Congresso Nacional sobre este tema que divide a opinião de artistas e famosos, da opinião pública e também dos profissionais da área do Direito.

Segundo o especialista em propriedade intelectual, Marcelo Mazzola, todo esse movimento no SFT representa uma tentativa de acabar com a chamada censura prévia no Brasil. ” A Constituição prevê a liberdade de expressão como pilar da democracia, mas também assegura o direito à privacidade e à honra. Não existe hierarquia entre tais princípios, mas na discussão das biografias não autorizadas estes caminham em rota de colisão frontal”, afirma. 

Para o especialista,  a única maneira de contemporizar seria estabelecer um percentual das vendas da obra em favor dos biografados e/ou de seus herdeiros, deixando claro, ainda, que esse valor não inibe o lançamento e a comercialização da obra, bem como a propositura de eventual ação indenizatória em caso de veiculação de afirmação ofensiva, difamatória ou caluniosa na biografia.

“Impedir, previamente, o lançamento de uma biografia pelo simples fato de se tratar de uma obra sobre a vida de alguém reaviva uma odiosa censura, incompatível com a realidade dos novos tempos”, conclui Mazzola. 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

9 Comentários

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  1. Biografias para ganhar dinheiro

    Quero ganhar um dinheiro. Pois bem, digo que entrevistei vários amigos de determinado famoso, alguns deles já mortos, como sou jornalista-biógrafo-escritor me reservo o direito de preservar todas as fontes. Então, publico que determinado famoso, no nosso exemplo a Sra. Sonia Jardim, presidente da tal entidade chamada Associação Nacional dos Editores de Livros, era na adolescência um pessoa de caráter duvidoso, que fumava muita maconha e batia em velhinhos, que praticava sexo com animais e namorava um Senador da República. Em nome da liberdade de expressão o que lhe resta é entrar na Justiça e cobrar uma indenização por danos morais, impedir a publicação dessas barbaridades nunca, pois isso seria uma censura prévia. Se concordam com essa abuso, mãos a obra, vá em frente, derrubem a proibição. Uma dica para os Robertos Carlos e companhia, a cada biografia feita para ganhar dinheiro às suas custas, publiquem a biografia do biografado, com a mesma malícia e recheada de mentiras e fatos duvidosos de que são vítimas. De resto deixa correr na Justiça, é uma esculhambação mesmo e demora viu.

  2. Quem leu o excelente livro do

    Quem leu o excelente livro do biógrafo fo Roberto Carlos, “O réu e o rei”, entendeu perfeitamente o abusrdo dessas proibições.

     

     

  3. Li hoje a petição inicial

    Li hoje a petição inicial desta ação. Creio que a mesma foi bem fundamentada, mas senti falta de um argumento.

    A CF/88 assegura aos brasileiros todos os direitos e garantias individuais prescritas em Convenções Internacionais subscritas pelo nosso país. O Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos do Homem e da Convenção Americana de Direitos Humanos, diplomas internacionais que garantem o direito à informação, da qual deriva o direito de colocar a informação em circulação e, principalmente, de utilizar a informação que circulou para a confecção de biografias não autorizadas. Este tema, contudo, não foi explorado pelos advogados do autor da ação.

    Suponho que os defensores da ação não tenham tocado neste assunto porque a questão é espinhosa. Afinal, tanto a Declaração Universal dos Direitos do Homem e da Convenção Americana de Direitos Humanos também garantem a dignidade e a imagem dos biografados, constituindo-se em matéria de defesa. O problema é que a defesa poderia utilizar este tema independetemente do mesmo ter sido levantado na inicial. Vem dai que talvez a melhor escolha seria discutir o tema desde o início. Cada advogado, porém, age como acredita ser melhor e tem o direito de fazer isto. 

    Os dados foram lançados. Agora será preciso aguardar o resultado.

     

     

  4. “Toda a luta que a sociedade

    “Toda a luta que a sociedade travou no país contra a ditadura e a censura terá sido, em grande parte, em vão” 

    Santa hipocrisia. Usar a ditadura e a censura num caso como esse que não passa de conflito de interesse é a suprema hipocrisia. O que está em jogo é apenas o interesse editorial e comercial de vender livros as custas da vida alheia. O argumento do direito a informação é só “prá inglês ver”, fica bonito para sair na foto. Se a tese dessa senhora for bem sucedida desaparece o próprio conceito de vida privada e de intimidade, vai ser autorização plena para o vale tudo, apenas para que as editoras consigam faturar os seus caraminguás usando a vida de qualquer um que seja vendável. E tudo em nome do sagrado direito a informação. Porque qualquer coisa diferente vai ser, claro, a volta da censura e da ditadura. Roberto Carlos tá certo. Tem de ser muito bobo para acreditar nos argumentos de Dona Sônia Machado Jardim.

  5. Essa discussão sobre as

    Essa discussão sobre as “biografias não autorizadas” não se restringe a um direito individual ou familiar.

    É algo bem mais amplo que toca um dos direitos fundamentais do homem lavrado em documento universal.

    Trata-se do direito a privacidade do cidadão.

    Nos tempos em que o maior imperio do mundo resolveu invadir a privacidade de qualquer cidadão pelo planeta, defender o direito a privacidade é tarefa basica.

    Os bisbilhoteiros interessados nas intimidades da vida de jogadores de futebol, cantores ou atores de novelas não dimensionam o que a quebra de tal direito pode ocasionar no futuro para todos.

    Perder esse espaço sagrado significara a perda de um dos fundamentos basicos da civilidade.

    Espanta ver que mesmo alguns de “esquerda” batalham pelo direito a invasão da vida alheia.

    Os argumentos são ridiculos, como o direito “ao conhecimento”.

    Reduzimos o “conhecimento” a conhecermos se o Milton dorme nu ou de pijama ou se o Pedro traiu a esposa com a secretaria.

    As filhas do Garrincha ou de qualquer outra pessoa falecida tem o direito e a obrigação de preservar a intimidade das vidas de seus pais.

    É o minimo que se espera de uma sociedade civilizada.

    Qualquer um tem o direito de manter para si a intimidade de sua vida.

    Trata-se de uma aberração colocar tal principio em discussão.

    A interessada maior na quebra do direito é, evidentemente, a presidente da associação dos editores de livros. Afinal visam lucro com a bisbilhotagem da vida alheia.

    Diz ela que “se não houver essa mudança, as pessoas ficariam a mercê apenas de biografias chapa-branca”.

    Se houver tal mudança teremos biografias chapa marrom, o que seria bem pior.

    O “especialista em propriedade intelectual”  classifica como “censura” alguem defender o direito a privacidade de sua vida intima.

    Esquece que todos os direitos tem limites, sobretudo quando esbarram no direito do outro.

    A civilidade impõe uma serie de regras para a convivencia entre as pessoas, não podemos praticar sexo ou urinar na via publica, fazer apologia do racismo, invadir a privacidade do meu vizinho, etc, etc, etc, etc.

     

  6. Vida privada não deve assunto

    Vida privada não deve assunto de livro de biografia. isso é invasão de domíciliio. Sobretudo, não é censura. Vida particular não se joga na sarjeta/livro biográfico.

  7. biografias

    Inevitavelmente, toda e qualquer obra historiográfica contem elemento biográfico. E muitos dos clássicos dessa área são biografias.

    Se o Código Civil for realmente seguido, estará inviabilizada a própria Historiografia.

    “ou se se destinarem a fins comerciais”

    Existe alguma obra historiográfica que prescinda de fim comercial?

    1. Concordo

      Acabei de comentar em outro post:

      “Muito bem. Quer dizer que se alguém se arvorar o direito de escrever sobre D. Pedro I ou D. Pedro II, vai ter de pedir autorização da Família Imperial Brasileira?

      Quer dizer que as obras de História, de um modo geral, invadem a privacidade das pessoas que dela fizeram parte e são nas obras retratadas?

      Então tudo que se escreve sobre estadistas, políticos, artistas ou mesmo ilustres desconhecidos que rendam uma boa crônica ou um conto, é invadir privacidade?

      Não. É censura.

      Seja na imprensa, seja em obra literária, histórica, biográfica ou o que quer que seja, deve haver absoluta e completa liberdade de expressão, de manifestação, de opinião.

      O que é preciso aprimorar é a responsabilização por eventuais abusos que possam ocorrer, de modo a manchar reputações, com mentiras, aleivosias, ofensas a honra (mesmo a dos mortos é protegida, em tese, por lei), através de mecanismos exaustivamente debatidos aqui mesmo neste espaço: indenizações, danos morais, correções, erratas, retratações, direito de resposta etc.

      Tudo isso, depois de garantir a liberdade de publicação, nunca antes, com censura prévia.

      A discussão, na verdade, não tem nada a ver com privacidade, tem a ver com grana.”

  8. Magnifica e correta decisão,

    Magnifica e correta decisão, biografia só com autorização NÃO é biografia, é propaganda. Os piolhentos do “procure saber” inventaram uma péssima causa. Quem escolheu ser figura publica não pode escolher o que pode ser publicado ou não sobre sua ilustre pessoa. Em nenhuma democracia do mundo há necessidade de autorização para se fazer uma biografia

    Quem quer esconder sua vida não escolha carreira publica.

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