TCU investiga indicado de Temer à Anvisa por superfaturamento na Funasa

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Rodrigo Sérgio Dias no dia em tomou posse como presidente da Funasa, em 25 de abril de 2017 – Foto: Funasa

Do Congresso em Foco

Por Rodrigo Zuquim  

Relatório de auditoria preliminar do Tribunal de Contas da União (TCU) aponta o advogado Rodrigo Sérgio Dias, presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), entre os responsáveis por irregularidades que ocasionaram um prejuízo de R$ 7,7 milhões à entidade. Dias foi indicado pelo presidente Michel Temer, em 19 de setembro, para uma diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O advogado ocupa a presidência da Funasa desde abril de 2017, quando foi nomeado ao cargo por indicação do bloco formado à época pelos partidos Podemos (então chamado PTN), Avante (à época, PTdoB) e PSL.

Antes de assumir a presidência da Funasa, Dias já atuava na fundação como diretor de Saúde Ambiental desde setembro de 2016, nomeado pelo então ministro da Saúde, Ricardo Barros, do PP. O advogado é primo do ministro das Cidades, Alexandre Baldy (Podemos), e de Elsinho Mouco, marqueteiro de Temer.

Dispêndio

A auditoria do TCU analisou três contratos de serviços de Tecnologia da Informação (TI), firmados com a Funasa em 2016 e em 2017, e chegou à soma de R$ 12,2 milhões em perdas. Mas Dias é responsabilizado por apenas um desses contratos.

Trata-se de um contrato de R$ 8 milhões com a empresa Linkcon para a implantação de uma plataforma eletrônica na Funasa para gestão de processos e documentos. Segundo relatório do ministro do TCU Augusto Sherman Cavalcanti, com data de 19 de setembro, as irregularidades decorreram de preços excessivos, pagamento por serviços não prestados e pagamento em duplicidade.

A equipe de auditores concluiu que 96,9% do valor do contrato foram superfaturados. Dias é responsabilizado por ter aprovado o empenho (reserva de recurso para gastos específicos) e a execução do contrato em que havia sido apontado o superfaturamento.

O relatório indica ainda agravantes na conduta do presidente da Funasa. Segundo o documento, Dias foi alertado duas vezes pela Advocacia-Geral da União (AGU) sobre os erros que cometia e, mesmo assim, decidiu seguir em frente; publicou portaria para tornar urgente a implementação do sistema eletrônico; e tinha conhecimento de que a plataforma já havia sido implantada na fundação antes da contratação.

A Funasa divulgou uma nota (leia a íntegra) informando que os processos foram suspensos e enviados para análise de uma comissão técnica independente. A assessoria da fundação afirmou ao Congresso em Foco que Rodrigo Sérgio Dias não é alvo de qualquer investigação do TCU, mesmo diante das citações formais do advogado no relatório preliminar.

“Ele é apenas o ordenador de despesas do órgão. O que está sendo feito é uma tomada de contas especial, ainda em fase inicial, para checar a regularidade do processo. Por precaução, inclusive, a direção da Funasa afastou o responsável pela área e já iniciou uma apuração interna”, argumentou a assessoria.

Na quinta-feira (27), o TCU divulgou nota ressaltando que a decisão sobre o relatório de auditoria é preliminar e trata de indícios de irregularidades que ainda serão objeto de contraditório e ampla defesa. A nota diz também que a decisão “determinou, entre outras medidas, a autuação de tomada de contas especial e a realização de citação e audiência dos responsáveis”.

“Graves impropriedades”

O Congresso em Foco também teve acesso a um relatório preliminar da Controladoria-Geral da União (CGU), datado de julho de 2018, sobre auditoria anual de contas realizada na Funasa. Auditores avaliaram atos de gestão praticados em 2017 e indicaram “graves impropriedades” nos processos de gestão de compras e aquisições analisados.

“Dentre outras conclusões, foram apontadas ausência de planejamento das contratações, direcionamento na escolha dos vencedores do processo licitatório, realização de pagamentos indevidos ou não pactuados, bem como foram apurados prejuízos financeiros decorrentes da execução dos contratos firmados”, conclui o documento.

Além de examinar a contratação de serviços de TI, analistas da CGU também identificaram problemas na locação do prédio que sedia a fundação, na região central de Brasília, entre eles “prejuízos financeiros decorrentes de locação de área maior que a necessária para a instalação da sede da presidência da Funasa; realização de pagamentos indevidos por espaços não disponibilizados pela empresa locadora; e utilização indevida de laudo de avaliação do valor locativo relativo a locação realizada por outro órgão”.

 

sede da FunasaSede da Funasa em Brasília: até a locação do prédio é alvo de investigação – Foto: Divulgação / Grupo Paulo Octávio

 

Segundo o documento, os problemas detectados acarretaram diversos prejuízos aos cofres públicos. Os auditores recomendam apuração da responsabilidade dos agentes pelas irregularidades e adoção de medidas para recuperar os recursos federais empregados indevidamente.

Sobre a avaliação preliminar da CGU, a Funasa ainda não se manifestou.

Agressão contra mulher

Em 2014, Dias foi preso em flagrante por agressão à sua ex-mulher. O advogado responde a um processo por lesão corporal desde fevereiro de 2017. Em nota (leia a íntegra), ele nega as acusações.

“O processo citado ainda está em fase de instrução. Apesar de se encontrar em uma fase inicial, já foram colhidas provas periciais, laudos de corpo de delito e filmagens, que atestam a total inocência de Rodrigo Dias”, afirma.

Um grupo de servidoras da Anvisa, chamado “Nós por Elas – Rede de Mulheres da Anvisa”, manifestou-se por meio de nota contra a indicação de Dias para a agência reguladora. “Nos preocupa muito que nesse contexto de naturalização de discursos francamente machistas não pareça existir preocupação da Presidência da República na indicação de um réu nesse tipo de processo [por agressão à ex-mulher].”

Associação dos Servidores da Anvisa (Univisa) teve acesso ao relatório do TCU e encaminhou o conteúdo aos senadores que integram a Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado. A CAS é responsável por sabatinar indicados às chefias das agências reguladoras.

Em nota, a Univisa pede que a Presidência da República reveja a indicação ou que o Senado rejeite o nome de Rodrigo Sérgio Dias para a diretoria da Anvisa. “Não se trata de um ataque pessoal ao candidato ou ao governo, mas na defesa técnica, ética e da boa governança da Anvisa”, declara.

Outro lado

Por outro lado, um grupo de mulheres servidoras da Funasa divulgou uma moção de apoio a Rodrigo Sérgio Dias, com alguns depoimentos sobre o trabalho do advogado na atual gestão da fundação.

A nota afirma que Dias “tem demonstrado zelo, responsabilidade e profissionalismo na condução da missão institucional que é levar saneamento básico e saúde ambiental aos menos favorecidos”. Diz ainda que ele tem “um cuidado especial com as mulheres que integram a equipe de colaboradores que levam a Funasa a atingir suas metas e objetivos”.

Procurado pelo Congresso em Foco, o Planalto disse que não vai comentar o assunto. A presidente da CAS, senadora Marta Suplicy (sem partido-SP), também foi procurada para comentar, mas até a publicação desta reportagem não enviou resposta.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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