Têmis, Lêthê, Alétheia e a transição da justiça pública para a vingança privada

 

Duas notícias me chamaram atenção hoje. A primeira narra um fato grotesco que ocorreu no Fórum de Itatiba, em que um advogado teria agredido dois juízes http://www.tjsp.jus.br/Noticias/Noticia?codigoNoticia=50710 a outra se refere ao jejum de Deltan Dellagnol para tentar forçar o STF a não conceder Habeas Corpus a Lula https://www.oantagonista.com/brasil/o-jejum-de-dallagnol-pela-prisao-de-lula/.

Os dois episódios estão interligados. O advogado que agrediu os juízes de Itatiba teria dito que é “fiscal de todos os juízes do Brasil”. A ação do procurador da Lava Jato sugere que ele se considera “fiscal de todos os juízes do STF”. Por razões distintas, mas igualmente reprováveis, ambos parecem ter mergulhado num transe místico e emergido dele como se fossem os únicos representantes da deusa Têmis em Pindorama.

Têmis, todavia, em momento algum inspira seus adoradores a fazer justiça com as próprias mãos. A vingança não uma irmã gêmea da justiça. O vingador age pessoalmente movido pela paixão irracional. O julgador decide maneira fria e impessoal em razão do convencimento racional. O foco da vingança é a retribuição, o da justiça é o respeito à Lei e às evidências que condenam ou absolvem o acusado.

Dellagnol e o advogado citado na nota de repúdio do TJSP esqueceram o principal. A função do advogado e do promotor é argumentar e não decidir. A missão deles é tentar convencer, nunca obrigar o juiz a decidir desta ou daquela maneira. Advogados e procuradores federais devem respeitar as decisões válidas tomadas pelas autoridades competentes. Eles podem recorrer quando a Lei assim o permitir, mas em algum momento a decisão final será tomada contra ou a favor da sua pretensão.

As agressões físicas e morais atribuídas ao advogado e a agressão espiritual que o procurador federal tenta impor aos adversários de sua tese no STF não são admitidos na esfera jurídica. Agredir alguém é crime. Praticar uma religião é permitido, mas diz respeito única exclusivamente à esfera pessoal de cada cidadão.

As agressões e as religiões devem ficar fora dos Tribunais. Elas não podem ser exercitadas ou invocadas pelos advogados e procuradores como se fossem recursos extraprocessuais ou instrumentos válidos de coerção. Crença e brutalidade não tem o condão de revogar o poder/dever outorgado àqueles que foram encarregados de julgar.

Lêthê, a deusa que fez Sérgio Moro esquecer os conceitos de posse e propriedade definidos no Código Civil ao condenar Lula só porque ele foi acusado por jornalistas de receber o Triplex, parece estar agora tomando conta das consciências de advogados e procuradores federais. Os profissionais do campo jurídico não sabem mais o que podem ou não podem fazer no exercício de suas profissões. A sede de justiça está se transforma em desejo irrefreável de vingança.   

Muito semelhantes, os episódios narrados nas duas notícias mencionadas no início são sintomas de um fenômeno importante: a emoção e a irracionalidade está tomando conta daqueles que, em razão da formação universitária e atividade profissional, deveriam agir de maneira fria e racional. Isso é muito mais grave do que aparenta ser. Advogados e procuradores podem ter porte de arma de fogo. Portanto, nesse contexto me parece evidente que uma verdadeira tragédia está prestes a ocorrer.

Os juízes deveriam dar o exemplo, mas parece que alguns delese também enlouqueceram. No mínimo, os inimigos de Lula no judiciário abandonaram os domínios de Alétheia. Além de exigir auxílio-moradia se dizendo escravos (como se não recebessem salários superiores aos dos seus colegas europeus e norte-americanos) eles fazem manifestos e passeatas para forçar o STF a permitir a prisão dos réus antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória (negando aos Ministros do STF o direito ao livre convencimento racional que exigem nos casos em que atuam).

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

1 Comentário

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  1. Prezado FabioBom dia A luta

    Prezado Fabio

    Bom dia 

    A luta de classes chegou ao andar de cima!

    E quem não luta pra manter seus privilégios?

    Abração

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