A gramática da poesia: aulas em cápsulas de lirismo, por Odonir Oliveira

Como foram suas aulas de português na escola?

Teriam sido as eternas decorações das conjugações dos verbos – em particular dos pronominais, defectivos e anômalos?

Teriam sido a decoração, com duplo sentido, das regras de acentuação, da lista de substantivos coletivos, dos plurais de substantivos compostos, do emprego do hífen e do trema, da colocação dos pronomes nas orações? Hoje quase tudo fossilizado pela gramática do português brasileiro contemporâneo !

Ou você ficou estudando por uma década as funções sintáticas todas, as orações coordenadas, subordinadas, as reduzidas, sem reduzi-las ao seu verdadeiro lugar: escravas do nosso escrever.

Tudo se move; nada é imovível – diria o teórico que eu já esqueci o nome,  mas fiquei com sua fala nas mãos para usá- la a gosto . Porque as regras da gramática do português escrito são receitas, como as de bolo, as da etiqueta social, as do doutor da medicina: devem ser consultadas, usadas apenas em caso de necessidade, de precisão e, por isso, devem ser conhecidas, jamais servirem de NORMAS a serem obedecidas sem discussão, insubordinação, intromissão, irreverência.

Nossos grandes Guimarães Rosa, Manoel de Barros, Mário de Andrade e os poetas mais recalcitrantes e “modernos” recriaram seus falares e dizeres porque a língua é doce e cruel, é delgada e grossa como nossos intestinos, portanto há que se mastigá-la até o último grãozinho para degustá-la com prazer. E só assim lambuzar-se dele e nele.

As aulas de língua jamais poderiam ser e estar separadas das de literatura, bem brasileiras, dessas de a gente reconhecer pelo cheiro nas ruas, pelo gosto nas calçadas, pelo tato nos bares, dessas também de se encontrar e ser encontrado nelas.

As aulas de português deveriam ser, de uma forma ou de outra, pequenas doses de lirismo, drágeas de encantamento por ler, por escrever, por entender o lido e o escrito, para se poder ir longe com esses ensinamentos. Bem mais longe!

 

AULA DE PORTUGUÊS

 

A linguagem
na ponta da língua,
tão fácil de falar
e de entender.

A linguagem
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?

Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,
e vai desmatando
o amazonas de minha ignorância.
Figuras de gramática, esquipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me.

Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.

O português são dois; o outro, mistério.

 

Carlos Drummond de Andrade

Em Reunião, José Olympio

 

 

PREDICATIVOS DO SUJEITO

 

Meu pensar é um desafio

Meus caminhar é uma manhã

Meu joelho é uma maratona

Minhas pernas são um ímpeto

Meus braços são um berço

Minhas costas são um tronco

Meus pés são uma rota

Meus falares são cantares

Minhas mãos são meu refúgio

Meus seios são um cais

Meu deitar é um encantamento

Meu colo é um desejo

Minha pele é uma fogueira

Meu umbigo é um aconselhamento  

 

Meu coração

é um verso.

 

Odonir Oliveira

 

https://www.youtube.com/watch?v=jfO2fM4eGqg

Redação

38 Comentários

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    1. E… pontuação para quê, hem?

       

       

      Antes de Machado de Assis, que tal “roçar a língua de Luís de Camões”?

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=tX7cqBreLUY%5D

       

      A HERANÇA

      Um homem rico estando muito mal de saúde, pediu que lhe trouxessem papel e tinta.
      Escreveu o seguinte:
       

      “Deixo meus bens à minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do
      padeiro nada dou aos pobres .
      Deu o último suspiro antes de ter podido fazer a pontuação. A quem, afinal, deixava sua fortuna?”

      Eram apenas quatro os citados.
      No dia seguinte, ao receberem o papel, cada um dos citados deu ao texto a pontuação e a interpretação que lhe favorecia.

      E você aí, quer ser desafiado?

      Então, reescreva o texto pontuando da mesma forma que os outros interessados na herança. Depois vamos conversar sobre isso. Que tal?

      – O sobrinho fez a seguinte pontuação:

      – A irmã chegou em seguida e o pontuou assim:

      – O padeiro pediu cópia do original e o deixou dessa forma:

      – A notícia se espalhou pelas redondezas e um sabido homem representando os pobres deixou o texto desse jeito:

       

      1. Então … vamos ver um pouco de poesia concreta hoje !?

        A CHUVA

         

         

        A chuva derrubou as pontes. A chuva transbordou os rios.

        A chuva molhou os transeuntes. A chuva encharcou as

        praças. A chuva enferrujou as máquinas. A chuva enfureceu

        as marés. A chuva e seu cheiro de terra. A chuva com sua

        cabeleira. A chuva esburacou as pedras. A chuva alagou a

        favela. A chuva de canivetes. A chuva enxugou a sede. A

        chuva anoiteceu de tarde. A chuva e seu brilho prateado. A

        chuva de retas paralelas sobre a terra curva. A chuva

        destroçou os guarda-chuvas. A chuva durou muitos dias. A

        chuva apagou o incêndio. A chuva caiu. A chuva

        derramou-se. A chuva murmurou meu nome. A chuva ligou o

        pára-brisa. A chuva acendeu os faróis. A chuva tocou a

        sirene. A chuva com a sua crina. A chuva encheu a piscina.

        A chuva com as gotas grossas. A chuva de pingos pretos.

        A chuva açoitando as plantas. A chuva senhora da lama. A

        chuva sem pena. A chuva apenas. A chuva empenou os

        móveis. A chuva amarelou os livros. A chuva corroeu as

        cercas. A chuva e seu baque seco. A chuva e seu ruído de

        vidro. A chuva inchou o brejo. A chuva pingou pelo teto. A

        chuva multiplicando insetos. A chuva sobre os varais. A

        chuva derrubando raios. A chuva acabou a luz. A chuva

        molhou os cigarros. A chuva mijou no telhado. A chuva

        regou o gramado. A chuva arrepiou os poros. A chuva fez

        muitas poças. A chuva secou ao sol.

        Poema de Arnaldo Antunes

        1. Mas … se depois fizéssemos essa poesia de Drummond conversar

          com A chuva, de Arnaldo Antunes.

          E se comparássemos e se pintássemos e bordássemos com esses versos, suas estruturas linguísticas, suas imagens, seu sentido próprio e seu sentido figurado e se   …

           

          CASO PLUVIOSO

          A chuva me irritava. Até que um dia
          descobri que Maria é que chovia.

          A chuva era Maria. E cada pingo
          de Maria ensopava o meu domingo.

          E meus ossos molhando, me deixava
          como terra que a chuva lavra e lava.

          Eu era todo barro, sem verdura…
          Maria, chuvosíssima criatura!

          Ela chovia em mim, em cada gesto,
          pensamento, desejo, sono, e o resto.

          Era chuva fininha e chuva grossa,
          matinal e noturna, ativa…Nossa!

          Não me chovas, Maria, mais que o justo
          chuvisco de um momento, apenas susto.

          Não me inundes de teu líquido plasma,
          não sejas tão aquático fantasma!

          Eu lhe dizia em vão – pois que Maria
          quanto mais eu rogava, mais chovia.

          E chuveirando atroz em meu caminho,
          o deixava banhado em triste vinho,

          que não aquece, pois água de chuva
          mosto é de cinza, não de boa uva.

          Chuvadeira Maria, chuvadonha,
          chuvinhenta, chuvil, pluvimedonha!

          Eu lhe gritava: Pára! e ela chovendo,
          poças dágua gelada ia tecendo.

          Choveu tanto Maria em minha casa
          que a correnteza forte criou asa

          e um rio se formou, ou mar, não sei,
          sei apenas que nele me afundei.

          Carlos Drummond de Andrade

          Em Reunião.

          1. Inspiradíssima

            Odonir, inspiradíssima e perspicaz.  Os filósofos já alertavam: a virtude está no meio.

            Post belíssimo para um dia tão frio.

          2. Olhe que belíssima música para se criar uma narrativa a partir

            dela.

            Pode ser em quadrinhos – por conta dos marcadores de tempo (1ª manhã, 2ª manhã … ), com movimentação, até com recursos do youtube

            Pode ser criado um texto explicativo referencial apontando os motivos para o acontecimento do fato principal.

            E até um texto instrucional com regras objetivas para se evitar o fato principal.

            Além das ilustrações em painéis, com subtítulos etc. etc.

             

            [video:https://www.youtube.com/watch?v=RS_V-u1tXKo%5D

      1. Será?

        Eu conhecia um poema parecido que era de Bandeira ou de Oswald, mas nao achei. Procurando no Google achei este:

        Poeminha

         

        Ela disse “Dá-me um beijo”
        E eu nunca mais voltei lá
        Quem diz “dá-me” não ama
        Pois quem ama diz “me dá”!!! ( Mário Lago)

        a

        1. Ótimas lembranças, Analu

          Essa discussão na sala de aula é sensacional.

          Essa ideia da transgressão e também a do uso da norma culta em situações adequadas a seu uso é rapidamente compreendida pelos meninos e dilui-se o preconceito linguístico que os de classes sociais mais humildes têm até contra si mesmos e os das classes mais altas que “diminuem” quem faz uma concordância verbal ou nominal, até na oralidade, diferente da normatizada pelo padrão culto.

           

          Através da criação artística passam a entender e valorizar os diversos proveitos que se pode fazer da língua/linguagem.

          1. Só faço um “senao”: essa idéia de norma “culta” é um mito

            Por coincidência estou preparando uma palestra exatamente sobre isso. Norma é um conceito linguístico. Mas é um mito achar que só há uma. O projeto NURC, por exemplo, que estudou o assunto, descreve CINCO normas cultas (no sentido de linguagem usada por pessoas com nível superior) diferentes, associadas a cinco regioes metropolitanas. E teria descrito mais se tivesse tomado como objeto a linguagem de mais grandes cidades. E NENHUMA dessas normas coincide com a linguagem que é “descrita” (? antes inventada…) pelas gramáticas normativas, que se baseia apenas no uso de escritores da segunda metade do séc. XIX. Nao é linguagem real de ninguém, nem mesmo de pessoas cultas e de classe alta da segunda metade do séc. XIX, porque a escrita literária costuma ser bem diferente da escrita comum para fins de comunicaçao, e a escrita já costuma ter particularidades próprias diferentes da língua oral.

            Repare que até mesmo como descriçao da escrita é uma descriçao imperfeita, porque pega autores diferentes, de lugares e épocas diferentes, que portanto usam diferentes variedades da lingua…

            E por que seria “culta”? Isso ainda se justificaria (muito parcialmente) se correspondesse à linguagem literária. Só que nao… Desde o Modernismo os autores literários deram uma banana para a camisa de forças representada por essas prescriçoes/proscriçoes sem sentido. E o Modernismo já está quase fazendo CEM ANOS (93, para ser exata).

            A professora Eugênia Duarte, da UFRJ, tem um artigo excelente sobre isso, em que ela mostra que até a escrita PROFISSIONAL de cronistas e jornalistas está muito afastada da descriçao contida nas gramáticas normativas. Se nem eles dominariam a pretensa “norma culta”, quem domina? Virou norma oculta, como diz o Marcos Bagno.

          2. Concordo com tudo

            Essa padronização visa a estabelecer hiatos culturais, para apontar que existem uns que sabem falar melhor do que outros, Tudo isso sempre me pareceu catecismo; os jesuítas quando chegaram aqui criaram as regras religiosas e as de ensino do português, ao mesmo tempo- a língua dos que sabem mais e deve ser seguida. A normatização gramatical é fruto desse catecismo ideológico-religioso -linguístico. Durante muito tempo em nosso país havia que se ensinar a escrever e ler como os “clássicos portugueses” e depois segundo os “clássicos brasileiros”.

            A literatura era escrita segundo cânones europeus- portugueses- e era para ser lida e vendida lá –  Brasil com pouquíssimos leitores. Essa subserviência à Europa estabeleceu durante séculos também o padrão às aulas de língua portuguesa; portanto ensinar português, desde as primeiras escolas jesuítas, era seguir a cartilha, os mandamentos, as normas da gramática apenas. Ler mesmo …  eram lidos livros religiosos com ensinamentos morais etc. Escrever só se fosse conforme os modelos a serem copiados.

            E assim se passaram muitos e muitos anos e …

            a educação de língua e literatura nas escolas brasileiras ainda é o mesmo retrato na parede…

            mas como dói.

          3. Vc conhece o livro Linguagem Escrita e Poder, de M. Gnerre?

            É uma maravilha, diz tudo o que há a dizer sobre isso. Vou pôr aqui 2 trechos que amo particularmente. Sirva-se deles, quanto mais forem difundidos melhor.

            “Talvez exista uma contradição de base entre ideologia democrática e a ideologia que é implícita na existência de uma norma linguística. Segundo os princípios democráticos, nenhuma discriminação dos indivíduos tem razão de ser, com base em critérios de raça, religião, credo político. A única brecha deixada aberta para a discriminação é aquela que se baseia nos critérios da linguagem e da educação”. 

            E mais importante, sobre o caráter pseudo progressista da defesa do “ensino da norma” (piada, porque de fato ela é inensinável na fala; escrita é outra coisa): “Se as pessoas podem ser discriminadas de forma explícita (e nao encoberta) com base nas capacidades linguísticas medidas no metro da gramática normativa e da língua padrão, poderia parecer que a difusão da educação em geral e do conhecimento da variedade linguística de maior prestígio em particular é um projeto altamente democrático que visa a reduzir a distância entre grupos sociais para uma sociedade de ‘oportunidades iguais’ para todos. Acontece, porém, que este virtual projeto democrático sustenta ao mesmo tempo o processo de constante redefinição de uma norma e de um novo consenso para ela. A própria norma é constantemente redefinida e recolocada na realidade sócio-histórica, acumulando assim ao mesmo tempo a própria razão de ser e o consenso. Os que passam através do processo são diferentes dos que não o conseguiram, e constituem um contingente social de apoio aos fundamentos da discriminação com base na legitimação do saber e da língua que eles (formalmente) dispõem”.

          4. Faz muitos anos que não lia Gnerre.

            Gosto demais de M. Bagno, e tenho a Gramática do Português Brasileiro, do Perini.

            Obrigada

          5. Gosto muito do Bagno. Perini? É um novidadeiro teórico…

            Bom, há bastante tempo nao leio Perini. Mas as últimas coisas que li sao meio absurdas. Por ex., a proposta de acabar com o conceito de palavra. Ou dizer que elementos morfológicos e estrutura sintática nao existem (estou simplificando, mas era mais ou menos isso, ele dizia que tudo que existe é o som por um lado e o sentido por outro; em última instância, até está correto, só que há várias instâncias intermediárias, rs).

            O Bagno tem um problema, ficou conhecido demais, numa época em que a maioria dos estudiosos nao “militava” pela desmoralizaçao desse normativismo absurdo, ele foi um dos primeiros a enfrentar o touro à unha.. Foi fácil isolá-lo dos demais. E quando ele fala (em vez de só escrever), sobretudo quando é entrevistado, nao tem paciência nenhuma com as imbecilidades e o conservadorismo dos jornalistas, e fica parecendo antipático. É uma pena, porque é um lutador de valor contra os mitos do preconceito linguístico. Vc conhece o DVD que o IESDE publicou com a conferência dele sobre Preconceito Linguístico? Nao deve ter muita informaçao nova para vc, mas é um bom material para divulgaçao para o público em geral.

            Te aconselho a reler o Gnerre. Tem uma visao histórica muito boa, um olhar que vê para além das questoes puramente linguísticas.

             

      2. Eis o que eu estava procurando

        Pronominais

        Dê-me um cigarro
        Diz a gramática
        Do professor e do aluno
        E do mulato sabido
        Mas o bom negro e o bom branco
        Da Nação Brasileira
        Dizem todos os dias
        Deixa disso camarada
        Me dá um cigarro.

        Oswald de Andrade ANDRADE, O. Obras completas, Volumes 6-7. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972.

        a

  1. Manoel de Barros encontra Guimarães Rosa

    Levei o Rosa na beira dos pássaros que fica no
    meio da Ilha Lingüística.
    Rosa gostava muito de frases em que entrassem
    pássaros.
    E fez uma na hora:
    A tarde está verde no olho das garças.
    E completou com Job:
    Sabedoria se tira das coisas que não existem.
    A tarde verde no olho das garças não existia
    mas era fonte do ser.
    Era poesia.
    Era néctar do ser.
    Rosa gostava muito do corpo fônico das palavras.
    Veja a palavra bunda, Manoel
    Ela tem um bonito corpo fônico além do
    propriamente.
    Apresentei-lhe a palavra gravanha.
    Por instinto lingüístico achou que gravanha seria
    um lugar entrançado de espinhos e bem
    emprenhado de filhotes de gravatá por baixo.
    E era.
    BARROS, Manoel de. Retrato do artista quando coisa. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2002.

    http://enfrangalhe-se.blogspot.com.br/2009/11/encontro-de-manoel-de-barros-e.html

    1. Já pensou saborear esses versos com os meninos e recriá-los de

      muitas maneiras; criar outros a partir destes; ilustrá-los; criar narrativas a partir deles e… voar… voar…voar !

       

      O apanhador de desperdícios

      Uso a palavra para compor meus silêncios.
      Não gosto das palavras
      fatigadas de informar.
      Dou mais respeito
      às que vivem de barriga no chão
      tipo água pedra sapo.
      Entendo bem o sotaque das águas
      Dou respeito às coisas desimportantes
      e aos seres desimportantes.
      Prezo insetos mais que aviões.
      Prezo a velocidade
      das tartarugas mais que a dos mísseis.
      Tenho em mim um atraso de nascença.
      Eu fui aparelhado
      para gostar de passarinhos.
      Tenho abundância de ser feliz por isso.
      Meu quintal é maior do que o mundo.
      Sou um apanhador de desperdícios:
      Amo os restos
      como as boas moscas.
      Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
      Porque eu não sou da informática:
      eu sou da invencionática.
      Só uso a palavra para compor meus silêncios

      Manoel de Barros

      Em  Memórias inventadas para crianças, Ed. Planeta, p.13

       

  2. As sílabas do Tatit

    As Sílabas

    Luiz Tatit

    Cantiga diga lá
    A dica de cantar
    O dom que o canto tem
    Que tem que ter se quer encantar
    Só que as sílabas se embalam
    Como sons que se rebelam
    Que se embolam numa fila
    E se acumulam numa bola
    Tem sílabas contínuas:
    Ia indo ao Piauí
    Tem sílabas que pulam:
    Vox populi
    Tem sílaba que escapa
    Que despenca
    Rola a escada
    E no caminho
    Só se ouve
    Aquele boi-bumbá
    Tem sílaba de ar
    Que sopra sai o sopro
    E o som não sai
    Tem sílaba com esse
    Não sobe não desce
    Tem sílaba legal
    Consoante com vogal
    Tem sílaba que leve oscila
    E cai como uma luva na canção

    Voz e Violão: Luiz Tatit
    Baixo: Paulo Tatit
    Teclado: Ricardo Breim
    Violino: Luiz Amato
    Viola: Fábio Tagliaferri
    Cello: Mário Manga
    Bateria: Guilherme Kastrup
    Arranjo de Cordas: Fábio Tagliaferri

     

    1. Tatit, companheiro de turma.

      Tatit encanta, como Paulo, seu irmão, com as letras de “A Palavra Cantada”.

      Saborear as palavras sonoramente e depois vê-las escritas é diferente.

      Já registrei aqui na semana retrasada a diferença que Sartre narra em As Palavras, entre as histórias que lhe contava sua mãe e depois aquelas mesmas histórias quando lidas: os mistérios da palavra escrita são grandes. é preciso namorar literatura.

       

      E essa linguagem?

      Como saboreá- la?

      É preciso trazer a literatura de cordel pra dançar

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=Limghvkz_nA%5D

  3. Camões chegou reclamando de Vinícius. Diz que é um plagiador.

    Será?

    Vamos com os adolescentes para debaixo das árvores dos coqueiros ou dos laranjais e, aristotelicamente, discutir esse tema, aos moldes do Tião da Rocha, com seus meninos de Araçuaí, em MG.

    VAMOS LÁ ?

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=AIzu59oDBiw%5D

     

    SONETO DO AMOR TOTAL

     

    Amo-te tanto, meu amor… não cante

    O humano coração com mais verdade…

    Amo-te como amigo e como amante

    Numa sempre diversa realidade

     

    Amo-te afim, de um calmo amor prestante

    E te amo além, presente na saudade

    Amo-te, enfim, com grande liberdade

    Dentro da eternidade e a cada instante

     

    Amo-te como um bicho, simplesmente

    De um amor sem mistério e sem virtude

    Com um desejo maciço e permanente

     

    E de te amar assim, muito e amiúde

    É que um dia em teu corpo de repente

    Hei de morrer de amar mais do que pude

     

    Vinícius de Moraes

    Em Antologia Poética.

     

     

    ALMA MINHA GENTIL QUE TE PARTISTE

     

    Alma minha gentil que partiste

    Tão cedo desta vida, descontente,

    Repousa lá no céu eternamente

    E viva eu cá na terra sempre triste.

     

    Se lá no assento etéreo, onde subiste,

    Memória desta vida se consente,

    Não te esqueças daquele amor ardente

    Que já nos olhos meus tão puro viste.

     

    E se vires que pode merecer-te

    Alguma coisa a dor que me ficou

    Da mágua, sem remédio, de perder-te.

     

    Roga a Deus, que teus anos encurtou,

    Que tão cedo de cá me leve a ver-te,

     

     

    Quão cedo de meus olhos te levou.

     

    Luís de Camões

    Em Sonetos de Camões, Cultrix.

    1. O sentimento de um ocidental

      O sentimento de um ocidental

      José Joaquim de Cesário Verde viveu pouco mais de 31 anos, entre 1855 e 1886.

      Inteligentíssimo, soube logo distanciar-se do lirismo adocicado que melava com frequência a poesia do século XIX. Por conta disso, antecipou procedimentos literários do século XX e, entre os admiradores de sua poesia, contou-se Fernando Pessoa.

      Havia em Cesário Verde domínio rítmico e certo impressionismo literário, porém reunidos a uma franqueza de observação das mais realistas e, não raro, ao gosto pelo efeito cômico.

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=amC-PySWaKs%5D

       

      O texto de Flávio Malavoglia foi publicado no site CULTURA FM 103.3

       

      http://culturafm.cmais.com.br/radiometropolis/lavra/cesario-verde-cinismos

  4. Eu também vomito poesia.

    Meto o dedo nos miolos e sinto ânsias

    Que em vórtices despejam palavras

    Num emaranhado inteligível.

    Junto tudo sem asco,

    Regurgito desejos, sonhos,ilusões.

    Do fel da bili devassa

    Nada, nsda transpassa

    A dor lancinante dos versos

    Qual vermes imberbes

    Enchem o bucho de bichos

    Sem destino, sem rumo certo.

    Nesta fauna verborréica

    Caçador me faço

    Intuitivo, instintivo.

    Em lascivo laço.

    Capturo líricos prazeres

    Sem rimas, sem nexo

    Sem métrica,

    Apenas reflexo

    Dessa mente insana

    Que não me engana

    Expondo o que sou.

    Um lunático sonhador

    Apanhador de sonhos

    Num campo de estelas.

     

     

  5. Um pouco de Rilke

    Será que os meninos e meninas já entendem que não hada nada que possa separar o que o Amor uniu?  O que a canção embalou ?  O que o destino afastou?

     

    “Quão cedo de meus olhos te levou.”

     

    “A Vida nos vive”, Lou.

    Tapa-me os olhos

    Tapa-me os olhos: ainda posso ver-te
    Tapa-me os ouvidos: ainda posso ouvir-te
    E mesmo sem pés posso ir para tí
    E mesmo sem boca posso invocar-te
    Arranca-me os braços: ainda posso apertar-te
    Com meu coração como com a minha mão
    Arranca-me o coração: e meu cérebro palpitará
    e mesmo se me puseres fogo ao cérebro
    Ainda hei de levar-te em meu sangue

     

    Put out my eyes

    Put out my eyes, and I can see you still,
    Slam my ears to, and I can hear you yet;
    And without any feet can go to you;
    And tongueless, I can conjure you at will.
    Break off my arms, I shall take hold of you
    And grasp you with my heart as with a hand;
    Arrest my heart, my brain will beat as true;
    And if you set this brain of mine afire,
    Then on my blood-stream I yet will carry you.

    De Rilke para Lou.

    http://eternamentelou.blogspot.com.br/
     

  6. Fernando Pessoa pra crianças… quem disse? Pode não.

    “Professora, por que ela canta com um jeito diferente do da gente?”

    “Ela não fala a nossa língua, você num tá vendo, Sabrina?”

     

    – Será?

    A SABER:

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=dgcs9345u9k%5D

     

    NO COMBOIO DESCENDENTE

     

    No comboio descendente

    Vinha tudo à gargalhada.

    Uns por verem rir os outros

    E outros sem ser por nada

    No comboio descendente

    De Que luz à Cruz Quebrada…

     

    No comboio descendente

    Vinham todos à janela

    Uns calados para os outros

    E os outros a dar-lhes trela

    No comboio descendente

    De Cruz Quebrada a Palmela…

     

    No comboio descendente

    Mas que grande reinação!

    Uns dormindo, outros com sono,

    E os outros nem sim nem não

    No comboio descendente

    De Palmela a Portimão

     

    Fernando Pessoa

     

    QUERO, TEREI

    Quero, terei-

    Se não aqui,

    Noutro lugar que ainda não sei.

    Nada perdi.

    Tudo serei.

     

    Fernando Pessoa, em Obras Completas, Aguillar Editora

    1. Homenagem

      Ainda Pessoa, agora para adultos…

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=LTvjdkvDZHs%5D

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=UJpM0TnrtBw%5D

       

      Do vale à montanha

      Do vale à montanha,
      Da montanha ao monte, cavalo de sombra,
      Cavaleiro monge,
      Por casas, por prados,
      Por Quinta e por fonte,
      Caminhais aliados.

      Do vale à montanha,
      Da montanha ao monte,
      Cavalo de sombra,
      Cavaleiro monge,
      Por penhascos pretos,
      Atrás e defronte,
      Caminhais secretos.

      Do vale à montanha,
      Da montanha ao monte,
      Cavalo de sombra,
      Cavaleiro monge,
      Por quanto é sem fim,
      Sem ninguém que o conte,
      Caminhais em mim.

      Fonte: Jornaldepoesia

       

  7. Leminski

    Dor elegante

    Um homem com uma dor
    É muito mais elegante
    Caminha assim de lado
    Com se chegando atrasado

    Chegasse mais adiante
    Carrega o peso da dor
    Como se portasse medalhas
    Uma coroa, um milhão de dólares
    Ou coisa que os valha

    Ópios, édens, analgésicos
    Não me toquem nessa dor
    Ela é tudo o que me sobra
    Sofrer vai ser a minha última obra

    Paulo Leminski

  8. Ontem, no Multimídia

    Contribuição do Fernando J.

    Do Poeta Paulo C. Pinheiro

     

    TERRA DO NUNCA

    (Edu Lobo / Paulo César Pinheiro)

    com BOCA LIVRE

    A Terra do Nunca é encantada
    Fica numa nuvem lá do céu
    Tem rei, tem fada,
    Rio e passarada
    Tem brinquedos pela estrada
    Tem castelos feitos só de areia
    E jardins que dão balas de mel
    Tem ruas cheias
    De anjos e sereias
    Passeando em carrossel
    Lá tem mascarado
    E tem cavalo alado
    E tem tudo que a gente quiser ver
    E lá não tem pecado, nem castigo pra você
    A Terra do Nunca é tão distante
    Como a casa de Papai Noel
    Lá tem gigante
    Cavaleiro andante
    tem até bicho falante
    Esse paraíso é o meu reino
    Lá tem circo, parque e tem quartel
    Mas o que eu tenho
    Cabe num desenho
    De uma folha de papel
    Lá não se descansa
    É pique, roda, dança
    É festa e comilança pra você
    É a terra das crianças
    Lá ninguém tem que crescer
    A Terra do Nunca é encantada
    Fica numa nuvem lá do céu…

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=X8Z4vXVOqcM%5D

  9. Que tal a leitura de “Morte e vida Severina “?

    Namorar bastante o texto, ouvir as músicas do Chico, contextualizar a obra, a  região, os valores implícitos e explícitos e depois encenar trechos do maravilhoso poema épico, de João Cabral.

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=FIYZDM9qeW0%5D

    MORTE E VIDA SEVERINA

     

    Chico Buarque

     

    Esta cova em que estás, com palmos medida

    É a conta menor que tiraste em vida

     

    É de bom tamanho, nem largo, nem fundo

    É a parte que te cabe deste latifúndio

     

    Não é cova grande, é cova medida

    É a terra que querias ver dividida

     

    É uma cova grande pra teu pouco defunto

    Mas estarás mais ancho que estavas no mundo

     

    É uma cova grande pra teu defunto parco

    Porém mais que no mundo, te sentirás largo

     

    É uma cova grande pra tua carne pouca

    Mas à terra dada nao se abre a boca

     

    É a conta menor que tiraste em vida

     

    É a parte que te cabe deste latifúndio

    (É a terra que querias ver dividida)

     

     

  10. Já pensou em questionar, filosoficamente em uma fábula o emprego

    e as diversas formas de se grafar por que, por quê, porque, porquê…. então, senta que lá vem história aí.

    De autoria de aluno, hem. 

     

    Pequena crônica sobre o dilema dos três porquinhos com as escaramuças entre o Lobo Mau e o Lobisomem

     

     

    Os porquês do porquinho

     

    Aconteceu na Grécia !

    Era uma vez um jovem porquinho, belo e bom, muito pequenino, cuja vida foi dedicada à procura dos porquês da floresta. Tal porquinho, incansável em sua busca, passava o dia percorrendo matas, cavernas e savanas perguntando aos bichos e aos insetos que encontrava pelo caminho todos os tipos de porquês que lhes viessem à cabeça.

     – Por que você tem listras pretas se os cavalos não as têm ? – perguntava gentilmente o porquinho às zebras.

    – Pernas compridas por quê, se outros pássaros não as têm? – indagava às seriemas, de forma perspicaz.

    – Por que isso? Por que aquilo?

    Era um festival de porquês, dia após dia, ano após ano, sem que ele encontrasse respostas adequadas aos seus questionamentos de porquinho.

    Por exemplo, sempre que se deparava com uma abelha trabalhando arduamente, ele perguntava por quê. E a pergunta era sempre a mesma:

    – Saberias, por acaso, por que fazes o mel, oh querida abelhinha?

    E a abelha, com seus conhecimentos de abelha, sempre respondia assim ao porquê:

    – Fabrico o mel porque tenho que alimentar a colmeia.

    Mas a resposta das abelhas não o satisfazia, porque eram os ursos os maiores beneficiados com aquela atividade.

    – Alguma coisa deve estar muito errada, porque eram os ursões que ficavam com quase todo o mel, sem ter produzido um pingo.- pensava o porquinho.

    Então, valente como os porquinhos de sua época, seguia pela floresta à procura de ursões, fortes e poderosos, ansioso por que eles soubessem a resposta. Quando encontrava um, perguntava:

     – Senhor, grande e esperto ursão, poderias me dizer a razão e solucionar o porquê da questão?

    E alguns ursos, mais exibidos, até tentavam responder, porque de mel eles entendiam muito, mas sobre trabalho… as respostas eram sempre do senso comum de ursão e não resolviam a questão.

    – Elas fabricam o mel porque ele é muito gostoso. – diziam uns.

     – Elas o fabricam porque o mel é delicioso. – diziam outros. Havia aqueles que se limitavam a olhar feio e, ainda, aqueles que até ameaçavam o pobre porquinho e iam embora, sem dizer por quê. Apesar disso, o porquinho seguia em frente.

     Um dia – porque toda história tem um dia especial – o porquinho encontrou um oráculo em seu caminho e resolveu elaborar o seu mais profundo porquê. Afinal, oráculo é para essas coisas. Então, ele perguntou com sua voz fininha, mas de modo firme e sonoro

    – Por que existo?

    Houve um profundo silêncio na floresta e o porquinho pensou que aquele porquê nunca seria respondido, afinal.

    Mas de repente, o oráculo falou, estrondosamente, porque era oráculo.

    – Procure o Sr. Leão, rei da floresta, e pergunte a ele por que você existe. Só ele lhe dará uma resposta adequada.

    Então, feliz, animado e saltitante, lá se foi o porquinho à casa do grande e sábio rei da floresta, carregando o seu também grande e sábio porquê.

    Ao chegar à casa do leão, o porquinho bateu à porta e, quando foi atendido por sua realeza, tratou logo de lascar o seu porquê mais precioso:

     – Sr. Leão, rei dos reis, sábio dos sábios, poderia Vossa Alteza me dizer por que existo?

     E o leão, porque era leão, respondeu mais que depressa.

    Nhac.

    Porque é o  fim da história!

     

    Clóvis Sanchez

     

     

  11. E a gente decorava, e decorava…

    Lili, falando por nós todos, nas salas de aula:

    Sou doceira de verdade,

    faço qualquer qualidade,

    como ninguém faz igual.

    Só outro dia, errei:

    em vez de açúcar, botei

    duas colheres de sal…

    E nossas tristezas e espanto:

    Eu tive um cão, chamava-se Veludo

    magro, asqueroso, revoltante, imundo

    para dizer numa palavra tudo

    foi o cão mais feio que houve no mundo.

    …….

    Deserta a casa está…

    Entrei chorando, em busca de ilusões!

    Por toda a parte as pálidas visões!

    Por toda a parte as lágrimas falando! 

    ……

    Alma minha gentil, que te partiste
    Tão cedo desta vida descontente,
    Repousa lá no Céu eternamente
    E viva eu cá na terra sempre triste.

    ….

     

  12. Para os poetas e poetizas.

    Este é um poema de amor
    tão meigo, tão terno, tão teu…
    É uma oferenda aos teus momentos
    de luta e de brisa e de céu…
    E eu,
    quero te servir a poesia
    numa concha azul do mar
    ou numa cesta de flores do campo.
    Talvez tu possas entender o meu amor.
    Mas se isso não acontecer,
    não importa.
    Já está declarado e estampado
    nas linhas e entrelinhas
    deste pequeno poema,
    o verso;
    o tão famoso e inesperado verso que
    te deixará pasmo, surpreso, perplexo…
    eu te amo, perdoa-me, eu te amo…
    “Poeminha Amoroso”
    Cora Coralina

  13. A Morte

    Alberto Caeiro, Quando Vier a Primavera

    Quando vier a Primavera,
    [Se eu já estiver] morto,
    As flores florirão da mesma maneira
    E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
    A realidade não precisa de mim.
    Sinto uma alegria enorme
    Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma
    Se soubesse que [amanhã] morria
    E a Primavera era depois de amanhã,
    Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
    Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
    Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
    E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
    Por isso, se morrer agora, morro contente,
    Porque tudo é real e tudo está certo.
    Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
    Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
    Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.  O que for, quando for, é que será o que é.

  14. O tempo inexiste…

    Um terno poema para Lívia

    Alma gêmea da minh’alma,
    Flor de luz da minha vida,
    Sublime estrela caída
    Das belezas da amplidão!…
    Quando eu errava no mundo,
    Triste e só, no meu caminho,
    Chegaste devagarinho,
    E encheste-me o coração.

    Vinhas na bênção dos deuses,
    Na divina claridade,
    Tecer-me a felicidade
    Em sorrisos de esplendor!…
    És meu tesouro infinito,
    Juro-te eterna aliança,
    Porque sou tua esperança
    Como és todo o meu amor!

    Alma gêmea da minh’alma
    Se eu te perder, algum dia,
    Serei a escura agonia
    Da saudade dos seus véus…
    Se um dia me abandonares,
    Luz terna dos meus amores,
    Hei de esperar-te, entre as flores
    Da claridade dos céus…

    ————— “” —————

    O tempo… Públio aproximando-se vagarosamente do aposento e colando o ouvido à porta, ouviu Lívia cantar em voz suave e mansa, ‘qual cotovia abandonada’, as cordas harmoniosas de suas lembranças mais queridas. Públio chorava ouvindo-lhe as notas de seu poema, como se Lívia estivesse cantando para si própria, adormentando o coração desprezado, para encher de consolo as horas tristes e desertas da noite.

    Há 2.000 anos.

  15. Fecha o pano: Vinicius

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=NzNmkV2tzHM%5D

    A Rosa Desfolhada

    Tento compor o nosso amor
    Dentro da tua ausência
    Toda a loucura, todo o martírio
    De uma paixão imensa
    Teu toca-discos, nosso retrato
    Um tempo descuidado

    Tudo pisado, tudo partido
    Tudo no chão jogado
    E em cada canto
    Teu desencanto
    Tua melancolia
    Teu triste vulto desesperado
    Ante o que eu te dizia
    E logo o espanto e logo o insulto
    O amor dilacerado
    E logo o pranto ante a agonia
    Do fato consumado

    Silenciosa
    Ficou a rosa
    No chão despetalada
    Que eu com meus dedos tentei ao menos
    Reconstruir do nada:
    O teu perfume, teus doces pêlos
    A tua pele amada
    Tudo desfeito, tudo perdido
    A rosa desfolhada

     

  16. Memórias do velho barqueiro

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=NmEn39frLzo%5D

    ” veio a madrugada

    os pássaros cantavam
    ao amanhecer

    o sol nascente
    mostrou-lhe um novo barco

    desta vez
    o barqueiro era um velhinho
    de barbas tão brancas
    que pareciam de neve
    os seus cabelos

    e o caminheiro falou
    passei o dia
    e toda a noite
    sem haver barqueiro
    que me levasse
    à outra margem do rio

    atravessaram as águas
    silenciosamente

    ao abordar a margem
    frente à cidade
    o caminheiro indagou

    meu velho barqueiro
    quem é o senhor?

    eu sou o tempo
    respondeu-lhe o barqueiro

    o caminheiro desculpou-se
    beijou agradecido
    as mãos generosas do tempo
    tomou a mochila
    e rumou para a cidade
    misteriosa

    Trecho do poema de Francisco Alves de Andrade e Castro

    Leia a ìntegra do “Poema do Velho Barqueiro” em 
    https://antigomundonovo.wordpress.com

    “Poema do Velho Barqueiro”, narrado pelo próprio autor em meados da década de 1980.
    https://soundcloud.com/theoldjoey/poe… ]

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