Juristas pela Democracia repudia esterilização forçada

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – Frente ao exposto por Oscar Vilhena, no artigo “Justiça, ainda que tardia”, publicado na Folha, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia se manifesta sobre a uma ques~tao que não é de todo incomum, porém reflexo de situação de vulnerabilidade social e econômica a que pessoas estão submetidas.

A ABJD alerta para o caso, em que representante do Ministério Público utilizou-se de instrumento jurídico para defesa de interesses coletivos, difusos e individuais homogêneos para submeter uma mulher à esterilização forçada, por motivos eugênicos. 

Esse desvio de finalidade soma-se a um objeto ilícito da ação, já que esterilização compulsória é vedada em lei, além da violação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Tais ilegalidades, diz a ABJD, não impediram que o Judiciário concedesse a medida liminar que obrigava o Município de Mococa a realilzar o procedimento cirúrgio em Janaína, inclusive com internamento forçado.

O recurso foi feito pela Procuradoria do Município, foi acatado, mas o Acórdão só foi publicado depois do procedimento ilegal efetuado. E contestam Vilhena, quando nem tardiamente pode-se falar que tenha havido justiça. A Associação lembra que tais casos são rotineiros, principalmente tendo como alvo camadas mais pobres da população e, exatamente por isso, é preciso agir.

E a ABJD não se pautará somente na nota de repúdio pela conduta do Promotor de Justiça Frederico Liserre Barruffini, autor da petição inicial, e do Juiz de Direito Djalma Moreira Gomes Júnior, que proferriu a sentença, ambos movidos por razões eugênicas. A Associação ingressará com as respectivas representações no Conselho Nacional de Justiça e no Conselho Nacional do Ministério Público, para que as responsabilidades e sanções sejam apuradas.

Leia a nota a seguir.

ABJD – NOTA DE REPÚDIO

No artigo intitulado “Justiça, ainda que tardia”, publicado no jornal Folha de São Paulo, em 09/06/2018, Oscar Vilhena Vieira lançou luzes sobre uma situação deplorável que aflige um número considerável de mulheres em situação de vulnerabilidade social e econômica no Brasil. 

Ao abordar os desdobramentos de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo em face do Município de Mococa e de Janaína Aparecida Quirino (moradora de rua, usuária de drogas e álcool), que obteve determinação judicial para obrigar a esterilização forçada da referida mulher, o artigo nos permite refletir sobre o tratamento usualmente dispensado pelo nosso sistema de justiça à população carente e vulnerável do país.

No caso retratado, o representante do Ministério Público utilizou-se de um instrumento jurídico previsto para a defesa de interesses coletivos, difusos e individuais homogêneos, para submeter uma mulher à esterilização contra a sua vontade, por motivos eugênicos, enunciados desde a petição inicial.

Ao nítido desvio de finalidade no manejo da Ação Civil Pública podem ser adicionadas a ilicitude do objeto da referida ação, haja vista que a esterilização compulsória é expressamente vedada na Lei 9.263/1996, e a violação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Flagrantes ilegalidades, no entanto, não impediram que o Poder Judiciário concedesse a medida liminar para obrigar que o Município de Mococa realizasse o procedimento cirúrgico em Janaína, autorizando, inclusive, o internamento forçado para tanto. 

O quadro se agrava quando, ao analisar a ação judicial, constata-se que à Janaína, referida desde a petição inicial como uma pessoa sem condições de discernimento, possivelmente incapaz, não foi garantido o mínimo direito à defesa, nem sequer a ser ouvida nos autos. Em suma, foi tratada como um objeto, uma coisa sobre a qual recaiu a tutela jurisdicional.

O recurso interposto pela Procuradoria do Município foi provido e o Acórdão publicado recentemente, quando Janaína já havia sido esterilizada compulsoriamente. Ao contrário do que indica o título proposto pelo professor da USP ao seu artigo, nem mesmo tardiamente pode-se falar que tenha havido justiça. 

A história de Janaína não é atípica. Rotineiramente, cidadãs e cidadãos deste país, especialmente aqueles/as pertencentes a grupos sociais com grande debilidade econômica e/ou vulneráveis, são atingidos/as por atos arbitrários e ilegais praticados por integrantes do sistema de justiça. Contra eles, precisamos nos insurgir! 

Assentamos nosso repúdio à conduta do Promotor de Justiça Frederico Liserre Barruffini, autor da petição inicial, e do Juiz de Direito Djalma Moreira Gomes Júnior, que proferiu a sentença que acarretou a mutilação física de uma mulher, com a esterilização forçada, em situação de vulnerabilidade por razões eugênicas.

Compreendendo que a mera declaração de repúdio não possui o alcance necessário a combater abusos de poder desta natureza, informamos, desde já, que ingressaremos com as respectivas representações no Conselho Nacional de Justiça e no Conselho Nacional do Ministério Público, pretendendo que as devidas responsabilidades e sanções sejam apuradas. 

SÃO PAULO, 10 de junho de 2018

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE JURISTAS PELA DEMOCRACIA – ABJD

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

12 Comentários

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  1. Uma das possíveis consequências

    Se o Brasil não estivesse na zorra que se encontra, uma probabilidade era a de o representante do Ministério Público ser aposentado compulsoriamente, ou seja, perderia o cargo mas não perderia o salário mensal.

    É isto? 

  2. vulnerabilidade das vítimas…

    e a  mente dos que julgam, dos que educam e dos que empregam, acrescento

    Foi por isso que recomendei que estudassem, porque a coisa, o monstrengo da autoridade maior, de uma minoria sim, mas sobre tudo e de todos os vulneráveis, está se alastrando exatamente como se alastrou no nazismo

    1. o fato de poder ser pontual…

      e o fato de poder já ter ficado para trás com sendo pontual, já se completam numa barbárie assustadora, com autoridades agindo na base do que se ouve, ou lê, e não com base na gravidade do que houve

      no caso, a punição com perda total de rendimentos, cuja fonte seja o Estado, deveria servir como exemplo per ser dinheiro sujo, grana que deixou de ser aplicada em políticas públicas e que certamente reduziria em muito o número de vítimas que são deixadas ao alcance desses verdadeiros monstros da justiça cruel e desumana

  3. Perda do cargo, no
    Perda do cargo, no mínimo….

    E representação aos órgãos internacionais de direitos humanos, dizem que não dá em nada, mas essa turma tem vergonha enorme de perder a pose de moderninhos no eventos mundo afora….

  4. chocado mas não surpreso

    Não podemos aceitar uma violação dos direitos humanos com tal gravidade.

    Que sejam investigados e expulsos do serviço publico.

    Sem rendimentos.

    Mas duvido que o corporativismo permita isso!

    Já seria esperar demais.

     

  5. É a mostra da existência do sentimento nazista

    Embora Hitler tenha defendido a soberania da Alemanha, coisa que não existe em nosso País, faltava pouco para atingirmos os patamares dos sentimentos estruturais do nazismo, máxime a intolerância, o preconceito e o  ódio.

    Agora, não falta mais nada.

  6. Esterilização forsada

    Sobre este caso, gostaria de ver opinião do Conselho Federal de Medicina. O médico não poderia realizar o procedimento 

  7. Estamos chegando numa situação que medidas extremas …..

    Estamos chegando numa situação que medidas extremas, do povo em geral, deveriam ser tomadas contra este judiciário fascista, algo como tribunais populares.

  8. Dar nome aos porcos e uma correção

    Iniciativa fundamental, precisamos dar nomes aos que abusam do poder. Com isso abre-se oportunidade de  investigarmos outras decisões e exigir  que essas pessoas sejam destituídas de suas funções, pois casos assim são imperdoáveis, demonstram um desvio que  indica ser muito mais que erro, é ódio ao pobre, é o uso do poder para dominar os vulneráveis ao ponto de retirar-lhes todo e qualquer direito, inclusive de decidir sobre seu corpo.

    um pequeno erro, salvo engano meu, Oscar Vilhena Vieira não é professor da USP, é professor da FGV

  9. Na minha opinião a

    Na minha opinião a esterilização deveria ser um serviço oferecido pelo SUS a TODOS aqueles que optassem por esta solução.

    A pessoa teria a liberdade de escolher se faria ou não o processo de esterilização, mas o SUS seria OBRIGADO a executar o procedimento a quem quer que fosse e solicitasse.

     

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