Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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“Agricultura sem nome, dibujos”, por Rui Daher

“Agricultura sem nome, dibujos”, por Rui Daher

Noto uma recorrência encabulada nos meus inícios de projetos de escrita. Assim reservei os meses de novembro e dezembro para estar em Terra Magazine, entre 2008 e 2010; em CartaCapital, a partir de maio 2013 no site e antes na versão impressa; e o Blog BRD e variantes, no GGN do Nassif, de fins de 2013 e até hoje.

As crónicas do livro “Dominó de Botequim”, projeto finalizado em dezembro de 2015, foi publicado um ano depois. O mesmo acontece agora com o livro “Agricultura sem Nome”.

Creio ter a ver com aquelas promessas de fim-de-ano, sobretudo em anos muito insolentes com as verdades. “No ano que vem paro de ingerir bebidas alcoólicas, apenas antidepressivos e soníferos com receitas médicas obtidas, ao menos, a 800 pilas cada, o que leva a um gasto médio anual de “US$ 10 Grands/Year”.

Zé Maluco, lá no Bar do Tontinho, em Alumínio (SP), quarta branquinha, abriu a braguilha, puxou a arma e berrou: “Podem vir, aqui procês, ó!”

São tantas as promessas para os anos vindouros: “vou permitir minha sogra vir morar em casa”; “não vou mais com a camisa do Mengo em jogo do Vasco: “em 2022, voto Erundina para presidente”; “juro que peço o divórcio”; e assim vai.

Pouco disso acontece. Tragédias e felicidades vêm ao acaso ou, como pensam os religiosos, determinados por deuses unos e verdadeiros ou, na acepção destes últimos, por deuses hunos e míticos, sem qualquer relação com a ciência. Que manda uns e outros se foderem.

Como sabem, sou por todos eles, medo; e nenhum, também medo.

Por questão de primazia, reproduzo abaixo meu texto inaugural em Terra Magazine, concessão do excelente jornalista Bob Fernandes dada a mim por intercessão de Márcio Alemão, criador de Hulk Daher. Idos de dezembro de 2008.

PRAZER EM CONHECÊ-LOS

Dizem que em dia de estreia palhaço não deve dar salto mortal. Daí eu não tratar nesta primeira coluna das relações econômicas do agronegócio ou de seus desdobramentos sociais e ambientais.

Ocupo-me aqui de homens e mulheres do campo, lavradores e criadores rurais, pouco lembradas nas origens e sobrevivência de todos nós.

Darcy Ribeiro, em seu “O Povo Brasileiro” (Companhia das Letras, SP, 1995), mostra que ainda no século XVI, com o comércio da madeira e os engenhos de açúcar, a Colônia já se buscava desenvolver autonomia, engajando o escravo índio ao setor agroexportador.

Dessa célula brotariam as cinco variantes de nossa identidade étnica.

Crioula, a partir dos engenhos de açúcar do Nordeste; cabocla, engajada ao extrativismo amazônico; sertaneja, a espalhar gado do Nordeste ao Cerrado Central; caipira, que partiu do comércio de índios, passando pela mineração de ouro e diamantes, até se consolidar nas grandes fazendas de café; finalmente, a gaúcha, do pastoreio extensivo.

A todas essas, mais recentemente, juntaram-se imigrantes europeus e asiáticos.  

Resultado de um processo agrário-mercantil voltado à exportação, que após cinco séculos ainda persiste, o Brasil produtor de alimentos é uma nação de índios, escravos, mamelucos, caboclos, sertanejos e caipiras – imigrantes ou não a quem nunca se deu muita bola.

Ao contrário do que pensa a escritora Danuza Leão, uma nação de Jecas Tatus, o anti-herói definido por Monteiro Lobato em “Urupês/Velha Praga”, de 1914, como “um parasita, piolho da terra (…), espécie de homem baldio, seminômade, inadaptável à civilização; [que] à medida que o progresso vem chegando (…) encoscorado numa rotina de pedra, recua para não adaptar-se”

Dez anos depois, o escritor quis dar uma nova versão ao mito. Para promover um fortificante dos laboratórios Fontoura, criou o Jeca Tatuzinho, que mantinha a indolência descrita em 1914, mas agora com causa e solução: a saúde precária e a cura pelo “BIOTÔNICO”.

Em 1947, nacionalista e já próximo do PCB, acrescentaria à má saúde do Jeca, duas outras agruras, o latifúndio e a estrutura agrária do país, Lobato revia alguns conceitos.

Todas as revisões, de Lobato ou de estudiosos do caráter do camponês brasileiro, só fizeram a emenda sair pior do que o soneto. Ajudado por um processo de industrialização tardio, paroquial e originário de velhas oligarquias rurais, o estigma estava criado e nunca mais abandonaria o imaginário da crescente população urbana.

Uma espécie de maldição que caricaturava tanto a passividade do lavrador (em Lobato) como a sua valentia (na literatura de cordel): “Esse Antônio Cobra Choca/era filho do Teixeira/era um tipo sarará/os beiços cheio de frieira/e lá no dia de sábado/comprava briga na feira”.

Continua pequena a percepção urbana e de seus arautos na mídia de que a maior parte de nossos usos e consumos é de extração agropecuária, movida por camponeses Jecas, mesmo quando enfeitados pela publicidade.

Pois bem, essa gente é responsável por mais de um terço da riqueza nacional.

E para que uma autoridade ousasse chamá-los de heróis, debaixo de muita crítica, tiveram que vestir terno e gravata, aderir ao mercado financeiro e, diante de algum desinteresse ou estratégia, comprar os ativos da Esso Brasileira de Petróleo, ramo da maior empresa norte-americana do setor, a EXXON MOBIL CORPORATION.

Nota: relendo este texto de dez anos atrás fico tentado a desistir do livro. O que mudou?

https://www.youtube.com/watch?v=fOF-KoPiHzw]

[video:https://www.youtube.com/watch?v=eg-upV1aqK4

 

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

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  1. RODOVIA RAPOSO TAVARES SP270 EM ALUMINIO/SP

    20 anos esperando por Duplicação. Gostou da rodovia de pista simples com carretas e caminhões entre Crianças e Idosos no meio da estrada? Mas teve que pagar em Estrada Privatizada por CCR/ViaOeste, Pedágio de 9 Reais na entrada da Cidade. A mesma Rodovia da Região de Sorocaba, onde o Brasil ficou indignado como ‘Racha’ entre Charretes. Como isto é aceitável num País de Bem Estar Animal? O mesmo País que não se assombra quando uma Senhora, nesta mesma região, é Eletrocutada por um Guarda Municipal, ao filmar o abandono de um Posto de Saúde na Cidade de Sorocaba. Faltam Médicos. Mas Vigilantes e Guardas Muncipais, sobram. Você tem todo Direito de morrer sofrendo e abandonado. Desde que não faça propaganda disto e… quieto !!!! 2018. O Brasil de fáil explicação. abs.

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