Thomas Mann no Brasil (I), por Walnice Nogueira Galvão

Thomas Mann no Brasil  (I)

por Walnice Nogueira Galvão

Em boa hora a Companhia das Letras empreita uma nova edição da obra de Thomas Mann, a cargo do especialista em letras alemãs Marcus V. Mazzari, da USP, que tem um respeitável acervo na área.

Destacamos a edição bilingüe, com revisão da tradução que Jenny Klabin Segall fez nos anos 50 do Fausto de Goethe, acrescida de notas e novo prefácio, num total de 1.700 páginas, pela Editora 34. E a dos Contos de Grimm pela Cosac Naify, outra de perto do milhar de páginas.

Ainda dentro da missão que assumiu de promover edições, Mazzari encarregou-se de  outro livro de Goethe (Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister) e de dois de ensaios reunidos de Walter Benjamin, um dos quais traduziu.

Menos conhecidas são suas traduções de dois romances suíços. O primeiro é o encantador Romeu e Julieta na aldeia, de Gottfried Keller, uma das mais perfeitas bucólicas que já se escreveram. E o outro o clássico fantástico de J. Gotthelf, A aranha negra, sendo ambos acompanhados de eruditos estudos de sua autoria.

Dentro dessa rara especialidade em nosso país, Mazzari fez mestrado e publicou Romance de formação em perspectiva histórica – O tambor de lata de Günter Grass. Aguarda publicação seu doutorado após cinco anos de Germanística em Berlim.  

Também de sua autoria, Labirintos da aprendizagem coleciona ensaios sobre Goethe, Gottfried Keller, Thomas Mann, Bertolt Brecht, Günter Grass, Robert Musil, aos quais acrescentaria os brasileiros Raul Pompeia, Manuel Bandeira e Guimarães Rosa.

Sua contribuição à Germanística em nosso país é de tal ordem que ele mereceria não só uma mas duas condecorações, uma da Alemanha e outra da Suíça, por serviços prestados.   

No momento dedica-se a capitanear a reedição das obras de Thomas Mann, da qual, para começar pelo alto, já saiu o livro máximo, Doutor Fausto, que efetua um balanço do nazismo alemão através da figura de um protagonista músico que vende a alma ao diabo. Saíram igualmente A morte em Veneza e Tonio Kroeger. As traduções que se seguirão ou são novas, feitas por profissionais qualificados, ou são as clássicas de Herbert Caro para a Globo com revisão atualizada. Entre as principais estão ainda Os Buddenbrook e A montanha mágica. Mas também serão publicados Sua Alteza Real, Mário e o mágico, As confissões de Felix Krull, e mais os quatro volumes que compõem a tetralogia José e seus irmãos. E assim por diante. É reconfortante ver um escritor da envergadura de Thomas Mann vir novamente à luz, já para outra geração de brasileiros,  após meio século da histórica Coleção Nobel da Globo, sempre lembrada como parâmetro jamais atingido. Quanto a receber tantos cuidados editoriais, ninguém discute que sua preeminência assim exige.

É de consenso ser Thomas Mann um dos maiores romancistas do séc. XX, e certamente  o maior dentre os alemães desse século. Este filho de brasileira teve o destino de sua obra dependente de alguns mediadores no Brasil: os críticos literários, os tradutores, os editores e os jornais. Tangidos pelo horror nazista, aqui arribariam antes da Segunda Guerra Mundial extraordinários intelectuais centro-europeus, que fertilizariam nossa cultura, inclusive no que concerne a Thomas Mann. Eram eles Otto Maria Carpeaux da Áustria, Anatol Rosenfeld e Herbert Caro da Alemanha, Paulo Rónai da Hungria, entre outros.

Destacamos aqui Herbert Caro, por ter sido ele o responsável por elevar o nível das traduções literárias no Brasil, encarregando-se dos três principais (e volumosos, além de difíceis) romances de Thomas Mann: Os Buddenbrook, A montanha mágica e Doutor Fausto. Como se não bastasse, traduziu ainda, do mesmo autor, A morte em Veneza, Tristão e As cabeças trocadas. E cerca de outros 40 livros de autores germânicos (Oswald Spengler , Elias Canetti, Hermann Broch, Emil Ludwig, Hermann Hesse, Franz Werfel ) e não germânicos, como John Steinbeck.

Ele é agora merecidamente homenageado com a reedição, revista e atualizada, de suas imbatíveis traduções de Thomas Mann.

Walnice Nogueira Galvão

1 Comentário

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  1. Dois pontos

    1. Será que está incluída uma obra de Thomas Mann, que deveria servir de reflexão para todo escritor, “A gênese do Doutor Fausto”?

    2. Nunca será demais a lembrança de Paulo Rónai, uma universidade em pessoa, que organizou a tradução de toda Comédia Humana. Nela, escreveu prefácios, resumos biográficos, notas dos romances de Balzac. Um trabalho de gigante.

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